Ainda não se tinham esgotado todas as palavras para escrever sobre o naufrágio de domingo ao largo da Itália, e já duas novas situações se verificavam. Uma ao largo da Grécia, com pelo menos três mortos, outra mais próxima da Líbia, envolvendo pelo menos dois barcos e mais de 400 pessoas. Pelo menos 20 pessoas morreram neste último incidente, segundo uma das pessoas a bordo, que pediu ajuda a uma organização internacional quando o navio se estava a afundar. Entretanto já ao final do dia de segunda-feira Espanha resgatou no mar mais 43 imigrantes ilegais.

O porta-voz da Organização Internacional para as Migrações (OIM), Joel Millman, referiu que o gabinete da organização em Roma recebeu o pedido de uma de três embarcações próximas que se encontravam em águas internacionais. “O interlocutor disse que havia 300 pessoas na sua embarcação e que esta se estava a afundar (e) falou de mortes, 20 pelo menos”, escreveu um colega de Millman em Roma, Federico Soda, através de correio eletrónico.

Federico Soda disse que a organização contactou a guarda costeira e forneceu-lhe as coordenadas das embarcações. “Mas eles não têm os recursos para fazer esses salvamentos no momento”, adiantou. Segundo a OIM, “os guardas-costeiros vão provavelmente tentar redirecionar navios comerciais” para o local onde o barco se está a afundar. Uma operação que não é fácil dado que, segundo a organização, alguns navios comerciais “não querem colaborar”.

O primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, citado pelo Telegraph, confirmou que existiam duas embarcações de borracha a precisar de auxílio a 50 quilómetros da costa líbia- uma embarcação com 300 pessoas outra com 100-150. Até ao momento ainda não foi possível confirmar se os pedidos de auxílio referidos pelo primeiro-ministro italiano correspondem aos recebidos pela OIM. Facto é que, no rescaldo do incidente de domingo, Itália e Malta não tem meios disponíveis para socorrer todos os pedidos de ajuda que têm recebido.

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Horas antes do novo incidente mais próximo de Itália, um barco com dezenas de pessoas naufragou ao largo da ilha grega de Rhodes. O incidente fez pelo menos três mortos, noticiou o Telegraph. Foram resgatadas 94 pessoas com vida, das quais 30 foram encaminhadas para o hospital, noticiou Rodiaki. A mesma fonte confirmou que recuperaram três corpos da água já sem vida – um homem, uma mulher e uma criança. Entre os sobreviventes estarão, aliás, vários menores.

De acordo com a guarda costeira italiana morreram, pelo menos, 24 pessoas nestes naufrágios 28 sobreviveram. Vinte e sete dos 28 sobreviventes do naufrágio de uma traineira ocorrido no domingo no Mar Mediterrâneo chegaram segunda-feira ao final do dia ao porto de Catania, na Sicília, transportados pela guarda costeira italiana, para identificação.

Num vídeo divulgado pelo site noticioso grego Rodiaki, veem-se os destroços no mar, ao longo da costa rochosa, náufragos sobre uma placa instável do que já foi barco e a luta de quem quer salvar e de quem quer ser salvo. Mas a Grécia, segundo refere a agência Lusa, não dispõe de infraestruturas adequadas para abrigar o número crescente de migrantes que chegam ao seu território, muitos dos quais pretendem alcançar outros países da Europa ocidental.

Nos últimos 10 dias, aumentou o número de imigrantes que chegam à Grécia, a maioria provenientes da costa ocidental turca e tendo como destino as ilhas gregas, noticiou a Lusa. Os habitantes e veraneantes da praia mais central da ilha de Rhodes aperceberam-se da chegada do barco de dois mastros que acabou por ficar preso nas rochas e ser desfeito pela força das ondas. As imagens foram registadas pelos populares e divulgadas pelo site Rodiaki. (Pode ver as fotografias aqui)

O barco foi destruído a poucos metros da costa. E enquanto algumas pessoas tentavam chegar a terra com a ajuda dos locais, outros permaneciam agarrados aos destroços da embarcação.

Estas notícias surgem depois de este domingo um naufrágio ao largo de Itália ter causado a morte de pelo menos 700 imigrantes ilegais, segundo números dados por um dos sobreviventes resgatados. Outro dos sobreviventes falava em mais de 900 pessoas, que incluíam 200 mulheres e cerca de 50 crianças. Este sobrevivente falava que muitos dos imigrantes ficaram presos no interior do barco.

As primeiras reações

Aquela que já foi considera a maior tragédia envolvendo imigrantes ilegais no mar Mediterrâneo motivou uma reunião de emergência dos ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia, aos quais se juntarão durante a tarde de segunda-feira os ministros da Administração Interna. “Não temos mais desculpas. A UE não tem mais álibis, os Estados-membros não têm mais álibis”, disse a alta representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros, Federica Mogherini, antes da reunião desta manhã. Admitiu que “não há uma solução fácil, não há uma solução mágica”, mas que “há uma responsabilidade europeia”. Portugal esteve representado na reunião do Luxemburgo pelo secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Bruno Maçães.

Donald Dusk, presidente do Conselho Europeu, anunciou uma reunião extraordinária esta quinta-feira para discutir com os chefes de Estado e de Governo da União Europeia.

“A situação no Mediterrâneo é dramática. Não pode continuar assim. Não podemos aceitar que centenas de pessoas morram ao tentar atravessar o mar rumo à Europa. É por isso que decidi convocar um Conselho Europeu extraordinário para esta quinta-feira”, afirmou Donald Tusk, numa mensagem vídeo divulgada na sua conta na rede social Twitter.

Segundo Dusk, a reunião tem como objetivo discutir medidas para combater o tráfico humano e para a melhoria na política de cooperação entre os estados membros da União Europeia e os países de origem e de trânsito dos imigrantes.

O primeiro-ministro Passos Coelho afirmou esta segunda no final da XII Cimeira Luso-Marroquina, em Lisboa, que espera que sejam tomadas novas medidas no Conselho Europeu para evitar tragédias no Mediterrâneo e que “ninguém com certeza convocaria uma reunião para fazer uma mera reflexão” e que “alguma decisão há de ser tomada”. O primeiro-ministro defendeu que a União Europeia deve tratar “esta questão da imigração ilegal” como “um problema de todos” os Estados-membros, o que significa utilizar “os meios que estão à disposição para evitar estas tragédias possam ser reforçados”.

Carlos Coelho, eurodeputado do PSD, defende em comunicado à imprensa “um debate de urgência em Estrasburgo” e que Comissão e Conselho digam que medidas vão adotar para começar a aplicar o regulamento sobre a questão dos imigrantes em situação de perigo.

Fernando Nobre, presidente da Fundação De Assistência Médica Internacional, alertou em declarações à Lusa que os incidentes desta segunda-feira já são uma tragédia recorrente e que vão acontecer muitas mais vezes. “O que está a acontecer é apenas a ponta de um ‘iceberg’ e vai tomar proporções, eu diria bíblicas. Estes naufrágios vão repetir-se a menos que as forças navais ousem entrar nas águas europeias do Mediterrâneo”, alertou o responsável.

Alguns líderes europeus também já se manifestaram sobre os eventos acontecidos nos últimos dias no mar Mediterrâneo. O primeiro-ministro espanhol Mariano Rajoy lamentou as mortes nos naufrágios, mas avisa em citação do Telegraph: “Não espero quaisquer soluções rápidas para as causas da migração, pois não há nenhum. Se existissem, teríamos usado há muito tempo”.

Angela Merkel, chanceler da Alemanha, convocou todos os países da União Europeia para combater a imigração ilegal e tráfico humano. “Vamos fazer de tudo para evitar que novas vítimas pereçam à nossa porta no Mediterrâneo da maneira mais dolorosa”, afirmou esta tarde em Berlim.

Ban Ki-moon, secretário-geral da Organização das Nações Unidas, disse que o Mediterrâneo tornou-se um “mar de miséria” e que as mortes dos últimos dois dias “deveria causar impacto à consciência global”. “Peço à União Europeia para demonstrar solidariedade ao acelerar o seu apoio”, acrescentou.

David Cameron, primeiro-ministro do Reino Unido, afirmou que é possível fazer mais. “Acho que o que precisamos é de um plano abrangente. Isso envolve elementos de busca e salvamento, mas fundamentalmente temos que fazer mais para lidar com os problemas nos países de onde essas pessoas estão vindo e nós temos de derrubar os traficantes que estão no cerne do problema”.

Espanha resgata no mar mais 43 imigrantes ilegais

Entretanto já ao final do dia de segunda-feira, 43 migrantes de origem subsaariana, entre eles quatro mulheres e quatro crianças, foram resgatados pelas autoridades espanholas perto da ilha de Alborán, entre Espanha e Marrocos.

Segundo as autoridades de busca e salvamento marítimo, citadas pela agência de notícias Efe, a embarcação foi localizada por um avião Sasemar 102 a cerca de 15 milhas a sudoeste da ilha de Alborán e os seus ocupantes foram transportados para outro barco.

[Atualizado pela última vez às 24h20]