O PS decidiu apresentar o programa em três fases e entre as três há surpresas e algumas omissões. No cruzamento dos três documentos – cenário macroeconómico “Uma década para Portugal”, no projeto de programa e no documento final que serve de programa eleitoral ao partido – aparecem medidas que mudaram de cara, outras que são novas e ainda umas que ficaram pelo caminho. O Observador fez um rastreio aos principais recuos e às principais surpresas do programa dos socialistas às eleições legislativas.

Recuos

  • Subida do salário mínimo sem valores

O PS promete aumentar o salário mínimo nacional, mas não se compromete com valores. Em julho, durante a campanha para as primárias no PS, António Costa defendeu um aumento para os 522 euros, mais do que as propostas da UGT e da CGTP. Em outubro, o valor subiu, mas ficou nos 505 euros.

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  • Reposição de feriados

António Costa havia prometido repor os quatro feriados que o Governo extinguiu (o 1 de dezembro, o 5 de outubro, o Corpo de Deus e o Dia de Todos os Santos), mas o programa nada diz sobre isso.

  • Agravamento do IMI para habitações não utilizadas como residência

O cenário macroeconómico feito pelos economistas do PS – e o pré-programa eleitoral – definiam um agravamento das taxas de IMI para penalizar a “tributação da acumulação de riqueza imobiliária residencial (2ª e 3ª habitação) como estimulo à acumulação de poupança financeira e de financiamento ao investimento produtivo”. A intenção era promover a “acumulação de riqueza sob a forma de casas de habitação sem arrendamento”.

Para isso, os economistas propunham “um agravamento da taxa de IMI aplicável a prédios urbanos de habitação ou frações, a partir de um valor a definir, que não sejam habitação própria e permanente do seu proprietário, num montante intermédio entre as atuais taxa normal e taxa aplicável a prédios devolutos e em ruínas”. Na versão final do documento, os socialistas deixam cair esta medida e passam a falar apenas em “revisão da tributação municipal do património (…), com as finalidades de redução das desigualdades de riqueza, maior eficiência na utilização do património edificado e  incentivo à adoção de políticas de desenvolvimento económico pelos municípios”.

  • Alterações no IMT

Todas as alterações ao Imposto Municipal sobre Imóveis desapareceu da versão final do documento. As propostas dos economistas, refletidas no projeto de programa, passavam por “simplificar a atual tabela de taxas do IMT para aquisição de habitação própria, alargando o limite de isenção e reduzindo a taxa marginal aplicável a habitações de valor médio” ou ainda a redução de IMT quando se adquire nova habitação própria ou permanente. No programa eleitoral, os socialistas optam por juntar IMI e IMT e falar na tal “revisão da tribuação municipal do património”.

Surpresas

  • Descongelamento de carreiras

Começam as surpresas. António Costa compromete-se a “iniciar em 2018 o processo de descongelamento das carreiras e de limitação das perdas reais de remuneração que deverão ser avaliadas tendo em conta o impacto transversal de algumas carreiras em vários programas orçamentais”. Ou seja, devolve até 2017 os cortes salariais na função pública e, no ano imediatamente seguinte, começa a introduzir as progressões que estão congeladas.

  • Mobilidade na função pública

O PS defende a revisão do regime da requalificação “em especial favorecendo um regime de mobilidade voluntária dos trabalhadores para outros serviços da Administração Pública com comprovadas necessidades de pessoal, sem excluir a adopção de incentivos especiais para este efeito”. Nos documentos anteriores, não aparecia referência a esta alteração.

  • Contrato-Geração

De acordo com o programa do PS, este “Contrato-Geração” permite incentivar o envelhecimento ativo e o emprego jovem, bem como “diminuir a rigidez da opção entre prolongamento das carreiras profissionais e reforma antecipada com fortes penalizações, promover a partilha de experiências intergeracionais e assegurar a substituição harmoniosa de gerações”.

A medida exige que as empresas contratem de forma permanente – embora o PS admita excepções – jovens desempregados ou à procura de primeiro emprego e desempregados de longa duração através de um “programa de apoio” que exigirá a “criação de emprego líquido”.

  • Cessação de contrato por mecanismo conciliatório

Os socialistas querem comparar o regime de cessação do contrato de trabalho por via conciliatória a “despedimento involuntário” e deixam as regras que querem impor: “Quando se utilize este processo conciliatório, as indemnizações por despedimento serão mais elevadas do que as atuais: pelo menos, 18 dias por cada ano de antiguidade nos primeiros três anos e 15 dias por cada ano adicional, com mínimo de 30 dias e um máximo de 15 meses, no respeito pelos instrumentos de negociação coletiva. Estas indemnizações estarão isentas de impostos.

  • Descontos dos recibos verdes para a Segurança Social

O PS quer rever “as regras para determinação do montante de contribuições a pagar pelos trabalhadores que passam recibos verdes, por forma que estas contribuições passem a incidir sobre o rendimento efetivamente auferido, tendo como referencial os meses mais recentes de remuneração”.

  • Contratos a termo

O cenário macroeconómico limitava os contratos a termos a situações de substituição temporária de trabalhadores. O programa eleitoral fala agora em “limitação da utilização de contratos a prazo” para “diminuir o número excessivo de contratos a prazo, melhorar a proteção dos trabalhadores e aumentar a taxa de conversão de contratos a prazo em permanentes”.

  • Pedidos de fiscalização do Tribunal Constitucional

Para “melhorar a qualidade da democracia”, o PS defende uma “intervenção mais direta dos cidadãos junto do Tribunal Constitucional”. Atualmente, os cidadãos apenas podem pedir a fiscalização sucessiva concreta quando são parte num processo judicial.