Pensavam que iam morrer. O vírus do Ébola já os apanhara. Mas não. Na terça-feira, tanto Nancy Writebol como Kent Brantley chegaram aos EUA, sãos e salvos. Tudo graças a um medicamento experimental, não testado em humanos, que lhes foi administrado e que, quase de um dia para o outro, lhes permitiu recuperar. Milagre? Talvez. É cedo demais para o saber, avisaram já dois especialistas ouvidos pelo Observador. Mas não o foi para a Libéria, que já começou a fazer perguntas.

As autoridades do país africano, onde Writebol e Brantley se encontravam, ambos, a realizar trabalho humanitário, já questionaram como foi possível que os dois cidadãos norte-americanos tivessem acesso ao medicamento. “As pessoas aqui estão a perguntar: ‘Disseram-nos que não existia cura para o Ébola, mas os americanos estão a curá-lo?’”, lamentou Tolbert Nyenswah, vice-ministro da Saúde da Libéria, ao Wall Street Journal. “Isto dificultou o nosso trabalho”, acrescentou.

Alguns responsáveis do governo liberiano vão esta quarta-feira reunir-se com a Organização Mundial de Saúde e discutir a hipótese de o medicamento — chamado ZMapp — ser distribuído pela população do país. Além da Serra Leoa e da Guiné, a Libéria, recorde-se, é um dos focos da epidemia do vírus do Ébola, que já matou cerca de 800 pessoas na região.

Porquê? É isso que o país africano quer saber. Por que razão o medicamento foi transmitido apenas aos norte-americanos. Bernice Dahn, diretora dos serviços médicos da Libéria, explicou ao Wall Street Journal que qualquer medicamento utilizado no país teria antes de ser aprovado pelo Comité de Ética do Ministério da Saúde liberiano. Algo do qual a dirigente afirma não ter tomado conhecimento — embora tenha admitido que tal pode ter sucedido sem que tenha sido informada.

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O diário, citando uma fonte do governo norte-americano, escreveu que o medicamento foi disponibilizado aos dois missionários pela Samaritan’s Purse, uma instituição humanitária que apoiava o trabalho de Kent Brantley, médica, de 33 anos, na Libéria. Antes, porém, a Food and Drug Administration (FDA, na sigla inglesa), entidade que regula os alimentos e medicamentos nos EUA, terá de ter aprovado a utilização do MZapp, antes de este ser testado em humanos.

Algo possível. Isto porque a FDA dispõe de um mecanismo que lhe permite conceder acesso a um medicamento experimental, em território norte-americano. Ainda não é claro, porém, como e quando o MZapp foi transportado para a Libéria, a par de quem autorizou a sua utilização na nação africana.

O Ébola é transmitido através de fluidos e, por norma, causa febre, dores de cabeça, vómitos e diarreia. O vírus costuma ser fatal e desde fevereiro que uma epidemia se alastra pela Libéria, Guiné e Serra Leoa. Neste país, aliás, a CNN noticiou esta quarta-feira que a nação “não consegue lidar” com o surto do vírus, citando responsáveis do país para escrever que é necessária mais ajuda vinda de organizações internacionais.