Vinte e um de junho de 2002. Quis o destino que o Sporting, há 20 anos, quisesse inaugurar a Academia em Alcochete no mesmo dia em que começa o verão. Quase como se, de forma profética, acreditasse que a inauguração dessa mesma Academia em Alcochete era também o começo de uma nova estação do futebol português. Passaram 20 anos. E o tempo, as estações e os verões provaram que o destino estava certo.
Esta terça-feira, o Sporting assinalou as duas décadas de existência da Academia. Uma Academia que já teve os naming rights vendidos mas que, desde setembro de 2020, deixou de ser apenas de Alcochete e passou a ser Cristiano Ronaldo, homenageando aquele que é, foi e será o principal produto da formação leonina. O capitão da Seleção Nacional, que curiosamente foi o primeiro jogador a estrear-se na equipa principal depois da inauguração da Academia, não marcou presença na cerimónia mas deixou uma mensagem a assinalar a data redonda do local onde passou o final da sua adolescência.
A mensagem do nosso @Cristiano ???? pic.twitter.com/oMuVFkow27
— Sporting CP ???? (@SportingCP) June 21, 2022
“Olá, pessoal. Quero mandar-vos um grande abraço de êxito e sucesso por estes 20 anos da Academia do Sporting, por tudo aquilo que alcançaram e por todo o sucesso que tiveram. Para mim, é um orgulho ter o meu nome na Academia. Espero ver-vos em breve. Grande abraço, malta”, disse Ronaldo, que chegou a viver no Lar do Jogador, que tinha acesso pela entrada da antiga Nave de Alvalade (o último pavilhão do clube até à chegada do João Rocha), e numa pensão perto do Marquês de Pombal nos primeiros anos de Sporting, tendo depois feito parte da primeira geração de jovens jogadores que viveu e cresceu em Alcochete.
Num evento de consagração onde marcaram presença Fernando Gomes, presidente da Federação Portuguesa de Futebol, e também Pedro Proença, presidente da Liga de Clubes, bastava entrar no relvado sintético que serviu de auditório improvisado para perceber que a manhã seria dividida entre o salto até às memórias e o pulo até ao futuro. Bem no centro do espaço, surgiam as camisolas de Cristiano Ronaldo, Nani e Rui Patrício, três nomes fortes da formação do Sporting — mas também a de Ana Borges, capitã da equipa de futebol feminino, numa clara representação da inclusão da equipa feminina na Academia. Frederico Varandas, quase como mestre de cerimónias, foi o primeiro a tomar a palavra.
“A formação é um dos pilares e uma base do futuro do clube. A Academia faz 20 anos, tendo sido o primeiro projeto do género em Portugal, mas a formação do Sporting leva quatro décadas e parte da visão do nosso querido Aurélio Pereira. São 40 anos a formar talentos. Destes, temos de destacar Cristiano Ronaldo, o melhor jogador português de todos os tempos, com cinco Bolas de Ouro. Mas também Luís Figo, com uma Bola de Ouro, e Paulo Futre, com uma Bola de Prata. Não há nenhum clube no mundo que tenha tantas Bolas de Ouro ou Prata na formação, estamos no topo. Foi um projeto visionário que, para bem do futebol português, os nossos adversários copiaram”, disse o presidente dos leões, recordando depois que dez dos 14 jogadores portugueses que jogaram a final do Euro-2016 como titulares (oito) ou suplentes (dois) são formados no Sporting.
Em seguida, Varandas lembrou que os clubes portugueses são “formadores”. “São municiadores da Seleção, o que custa milhões de euros. Mas somos esquecidos. Não pela Federação mas sim pelas principais figuras de Estado. São os clubes os principais agentes desportivos do país”, acrescentou, não deixando de lembrar a invasão à Academia, em 2018, e o período de paragem do futebol motivado pela pandemia. “Não houve só dias de sol. Houve também algumas tempestades. Como o dia 15 de maio de 2018, conhecido como o dia do ataque à Academia, e os dois anos de pandemia. Foram momentos que conseguimos ultrapassar. Estamos mais fortes e competitivos. Desde setembro de 2018 que a formação foi a prioridade das prioridades para esta administração”, afirmou, deixando por fim a ideia de que “formar vem antes de ganhar”.
Para além de ter contado com a presença de vários jogadores formados no Sporting, como Adrien, Miguel Garcia, Bruno Pereirinha, André Santos ou Carlos Saleiro, a cerimónia desta terça-feira teve como figura central um único nome: Aurélio Pereira, o “Senhor Formação”. O antigo coordenador do Departamento de Recrutamento e Formação, principal responsável pela descoberta de Ronaldo mas também de Ricardo Quaresma, Luís Figo ou Simão Sabrosa, foi incluído numa das duas mesas redondas e referido diversas vezes por antigos dirigentes, antigos e atuais jogadores e elementos das equipas técnicas. O Mestre, que dá nome ao estádio com capacidade para mil espectadores que atualmente recebe jogos de vários escalões de formação e do futebol feminino em Alcochete, reconheceu que cada vez tem mais dúvidas sobre o que é e o que significa o talento.
“Agora é só Cristianos Ronaldos por todo o lado e os pais a quererem ser o Jorge Mendes. Quem está no Sporting tem sempre talento. Depois, há uns que conseguem ultrapassar as dificuldades e outros que não conseguem. A personalidade do atleta faz toda a diferença, não deixar que se envolvam com empresários aos dez ou 11 anos”, disse Aurélio Pereira, que dividiu a mesa redonda com José Couceiro, atual Diretor Técnico da Federação Portuguesa de Futebol, José Manuel Torcato, antigo dirigente do Sporting, e também Paulo Bento, que participou por vídeoconferência diretamente de Seul, na Coreia do Sul, onde é selecionador nacional.
Mais à frente, e antes de uma segunda mesa redonda que juntou Dário Essugo, o adjunto Carlos Fernandes e Tomaz Morais, diretor do Departamento de Formação dos leões, Auréio Pereira elogiou as instalações da Academia, que “está aí para as curvas”, e sublinhou o trabalho de Rúben Amorim. “Há uma estratégia da administração e o treinador é funcionário do clube, tem de responder a essa chamada. Rúben Amorim é um rapaz que se interessa pela formação, é muito acessível. Sai do treino dos seniores e vem logo direto aqui aos campos para ver o que se passa. Está sempre atento”, completou, deixando ainda a ideia de que uma “formação vencedora traz a formação de vencedores”.
Atualmente, os 22 hectares de Alcochete albergam as nove equipas masculinas do Sporting, desde os Sub-14 à equipa principal (os escalões mais jovens até esse primeiro ano de iniciados continua a trabalhar no Pólo do Estádio Universitário de Lisboa), e ainda a equipa principal de futebol feminino. À margem dos atletas e ao longo dos dez campos, nove balneários, três ginásios e 91 quartos, trabalham 159 funcionários, sendo que 64 jovens jogadores residem na Academia. Desde que as infraestruturas foram inauguradas, há 20 anos, os leões conquistaram 23 títulos nacionais nos três principais escalões de formação (sete de juniores, sete de juvenis e nove de iniciados). No passado mês de setembro, o Sporting recebeu o prémio da Associação Europeia de Clubes (ECA) na categoria Futebol de Formação, sendo que em 2017 já tinha sido galardoado pela ECA com a distinção de Clube de Futebol Feminino do Ano.
O evento desta terça-feira, para além de ter servido para assinalar duas décadas de Academia, para homenagear Aurélio Pereira e para recordar os principais nomes da formação leonina, foi também o momento ideal para projetar e anunciar o futuro de Alcochete. Num projeto avaliado em 12 milhões de euros, a Academia vai crescer — literalmente — e renovar-se, numa obra que ainda não tem data de início nem de conclusão mas que a direção dos leões vê como “brilhante” se ficar concluída até ao fim do atual mandato, em 2026. O projeto, que inclui o alargamento dos limites das instalações em seis hectares, passando de um total de 22 para 28, prevê a construção de um estádio semelhante ao Aurélio Pereira, também com capacidade para mil espectadores, cinco novos relvados com bancadas de apoio e blocos de balneários, a união dos dois ginásios da formação para ampliação do espaço, um edifício de acolhimento e ainda um parque de painéis fotovoltaicos.
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Adicionalmente, o Sporting pretende dar alguma independência à equipa principal para encontrar mais espaço para a formação, num passo que foi detalhado por Paulo Gomes, o atual diretor da Academia. Será construído um novo pólo, totalmente independente das infraestruturas atuais, onde a equipa de Rúben Amorim ficará mais perto do relvado em que treina e onde poderá preparar as semanas de trabalho de forma mais isolada. No edifício já existente, as equipas da formação, assim como a equipa principal de futebol feminino, vão ocupar os locais que agora ainda pertencem aos seniores.