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FB Nathalie Carvalho

FB Nathalie Carvalho

A "beleza de Bardella", a economia e a "forte" candidata luso-francesa. Em Étampes vota-se na União Nacional (mas não se fala sobre isso)

Étampes faz parte da zona rural de Essone, onde há uma grande comunidade portuguesa. Aqui, a UN tem larga vantagem e a candidata explora as raízes nacionais. Mas poucos eleitores o dizem em público.

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Étampes é uma típica vila rural francesa. Tem ruas estreitas, casas de pedra, antigas fortificações e muitas igrejas. Há barulho de carros e motas que atravessam o centro, mas o rebuliço está longe de ser o de uma grande cidade. A vista do comboio à medida que nos aproximamos da região de Essonne, a sul de Paris, torna tudo claro: os prédios altos vão ficando para trás, sendo substituídos por vivendas baixas e muitos campos agrícolas, onde pastam cavalos. Mesmo estando nós apenas a uma hora da capital.

A vila tornou-se um símbolo de como a União Nacional está a alargar o seu voto para lá de determinadas zonas rurais e a aproximar-se de locais perto das grandes cidades. Em 2022, Étampes elegeu pela primeira vez uma deputada da UN, Nathalie Conceição Carvalho; agora, dois anos depois, outros círculos eleitorais da região a que pertence, Essonne, podem seguir-lhe o passo.

O comércio domina grande parte do centro da vila de Étampes

Cátia Bruno/Observador

Em toda a região — e Étampes não é exceção — a proporção de imigrantes é superior à média nacional. E a maior comunidade aqui é a portuguesa, segundo os dados oficiais. O que não significa, porém, que seja mais fácil um jornal português encontrar quem queira falar sobre estas eleições e admitir por que votam no partido de Marine Le Pen. “Você aqui não vai ter sorte nenhuma”, decreta ao Observador Hélene, viúva originária do sul de França, que se mudou há uns anos para Étampes para cuidar de uma filha doente que aqui vive. Está a apanhar um pouco de sol na esplanada da padaria Maison Pasard, quando mete conversa. “As pessoas aqui votam todas na UN, não tenha dúvidas. Mas não lhe vão dizer isso, vai ver.”

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“Nós sempre precisámos dos estrangeiros. Quem é que vai limpar as casas-de-banho? Quem é que vai apanhar a fruta? Não vão ser os franceses… Bardella, para além de não ter experiência, é filho de uma imigrante. As pessoas não veem a contradição?”
Hélene, viúva de um português, que se absteve na primeira volta

Não é, de todo, o seu caso. Foi durante anos casada com um português, do Porto, que emigrou para França aos seis anos. E esta reformada não consegue conceber como imigrantes e os seus filhos podem apoiar um partido como a UN: “Nós sempre precisámos dos estrangeiros. Quem é que vai limpar as casas-de-banho? Quem é que vai apanhar a fruta? Não vão ser os franceses…”, afirma. “Bardella, para além de não ter experiência, é filho de uma imigrante. As pessoas não veem a contradição?”, acrescenta, irritada.

Não votou na primeira volta, porque se sente também desiludida, quer com Emmanuel Macron, quer com a esquerda. “Mélenchon é demasiado extremista, não sei o que vai acontecer a este país…” Admite que este domingo, talvez, se passar por uma mesa de voto, venha a tomar uma posição. Nesta segunda volta, aqui é Étampes, só há uma hipótese para quem não quer apoiar a UN: votar no deputado municipal da França Insubmissa (FI), Mathieu Hillaire, que concorre com a Frente Popular. Há dois anos, a escolha foi exatamente a mesma, entre os dois, e Nathalie Carvalho bateu-o com 53,3% dos votos na segunda volta.

Nathalie Conceição, a deputada casada com um português que leva os luso-descendentes a votarem na União Nacional

Hélene talvez tivesse razão sobre a questão do silêncio. Não é por falta de gente: a praça principal de Notre Dame, no centro da vila, está um rebuliço. Monta-se um palco e várias bancadas para o festival que terá ali lugar essa noite, promovido pelos comerciantes locais. Mas no principal café da praça, o Le Balto, a vontade de falar com uma jornalista é nula. Até o empregado português — facilmente distinguível pela camisola da seleção nacional que traz vestida, neste dia de jogo contra França — é taxativo: “Sobre política não vou falar, não vale a pena tentar.”

Em Étampes, a população de imigrantes é superior à média nacional. Os portugueses são a maior comunidade

Cátia Bruno/Observador

Emmanuelle é a exceção (mas sem dar o apelido ou permitir tirar uma fotografia). O manequim enrolado na bandeira portuguesa que está na montra da sua loja não engana quanto às suas origens — é filha de mãe francesa e pai português — e a jovem de 38 anos não tem problema em conversar sobre o tema das eleições. Sobretudo sobre Nathalie da Conceição Carvalho, a candidata local da UN. “Ela já veio cá à loja uma vez, disse-me que é francesa e só tem este apelido por ser do marido, ele sim português”, confessa a lojista. “É combativa, não tem medo, assume as suas ideias. É uma mulher forte e com ligação a Portugal. Não tenho como não votar nela!”, assume claramente.

A história de vida de Nathalie Carvalho é pouco conhecida. Sabe-se que nasceu em Blois, no centro de França, e que já trabalhou como secretária e auxiliar num lar de idosos até se tornar organizadora de eventos. Em 2022, entrou com estrondo na cena política ao ser eleita deputada pela UN neste círculo eleitoral de Essonne, tradicional feudo dos Republicanos (centro-direita). O silêncio não é apenas entre os eleitores: o Observador tentou por várias vias, ao longo de vários dias, pedir uma entrevista à candidata, mas nunca obteve resposta.

Quando foi eleita pela primeira vez, Nathalie assumiu numa entrevista ao jornal Le Parisien que o seu pai (aparentemente de origem francesa) sempre foi um apoiante histórico da Frente Nacional de Jean-Marie Le Pen. Ela, nem por isso. Despertou verdadeiramente para a política, diz, só depois dos atentados terroristas em Paris em 2015. “Disse a mim mesma que a França estava muito mal. Enviei um email para a sede do partido e disseram-me que Marine Le Pen iria estar num evento em Arpajon [em Essonne]. Fui lá e juntei-me imediatamente.”

Certo é que Nathalie Carvalho tem explorado profundamente a sua ligação a Portugal num círculo eleitoral onde os luso-franceses representam grande parte do seu eleitorado. No seu Facebook pessoal, por exemplo, é possível encontrar uma foto da deputada com o cantor Tony Carreira, uma mensagem a assinalar o 13 de maio em Fátima, em honra da sua “segunda família de coração”, e uma fotografia histórica do 25 de Abril.

Nathalie Carvalho numa das últimas ações de campanha desta segunda volta

Na noite do passado domingo, no evento em que acompanhou os resultados da primeira volta, até um deputado português esteve presente, de acordo com Le Parisien (embora a sua identidade e filiação partidária não tenham sido identificadas no artigo). O jornalista testemunhou como uma das eleitoras, imigrante portuguesa, perguntou em voz alta a Nathalie “Se a Marine vencer, os portugueses podem continuar a viver em França?”. A resposta foi uma gargalhada geral dos presentes.

Em Étampes, a lojista franco-portuguesa Emmanuelle percebe perfeitamente a reação. “Há pessoas que não assumem que votam nela, porque há quem pense que a UN é um partido racista. Mas ela não é.” E, portanto, à medida que vai montando a bancada para o festival dessa noite em frente à sua loja, Emmanuelle dá esse assunto por encerrado.

“Precisamos de uma maioria absoluta de direita. Caso contrário os Insubmissos vão tornar tudo num bazar e não vão deixar mudar nada”

Umas portas ao lado, o dono da loja de queijos La Boite à Fromages confessa que não conhece muito bem a candidata. Mas não se opõe a que seja ela a representar esta segundo círculo eleitoral de Essonne: “Faz sentido que seja ela a candidata eleita. Esta é uma região tradicionalmente à direita e ela representará a região. A nível nacional é outra coisa.”

“O problema não é a integração dos imigrantes, é dos filhos deles, dos que já nasceram cá. Precisávamos de ter feito uma integração correta: escolas verdadeiramente laicas, entender que a religião se pratica em casa e não na rua, fazê-los ver que França é que é a pátria deles.”
Christian, eleitor tradicional do centro-direita que vai votar na UN este domingo

É difícil perceber, contudo, qual é exatamente o sentido de voto de Christian, francês de 58 anos, que também não quer ser fotografado nem conceder o seu apelido. “Na primeira volta votei à direita, como sempre votei na minha vida, costumo apoiar os Republicanos. Considero-me um eleitor de centro-direita”. Uma declaração ambígua, já que o LR não apresentou ninguém neste círculo, deixando apenas como alternativa à UN à direita o independente Pierre Mayeur (que foi pouco além de 3% dos votos).

Nesta segunda volta, não há grandes hipóteses. Três candidatos passaram: Nathalie, o candidato da esquerda Mathieu Hillaire e Naïma Sifer (membro do Horizontes, partido de Édouard Phillippe que apoia atualmente Macron na Assembleia). Mas depois de ter garantido que não iria desistir a favor de ninguém, Sifer acabou por retirar-se da corrida na terça-feira passada, sem dar qualquer indicação de qual dos dois prefere: “As pessoas estão fartas de indicações de votos”, justificou.

Perante este cenário, Christian acaba por assumir que vai votar na UN, embora reafirme constantemente que se considera “um centrista”. “Sinto-me obrigado a votar à direita, porque a UN é extremista mas a FI é ainda mais”, admite. “Precisamos de uma maioria absoluta de direita. Caso contrário os Insubmissos vão tornar tudo num bazar e não vão deixar mudar nada. Olhe para o que o Mélenchon diz…”

Nathalie Carvalho a festejar a passagem à segunda volta, no domingo passado

Twitter Thomas Diquattro

Mesmo que a maioria absoluta seja atingida (apenas pela UN ou, no cenário que preferia, em conjunto com deputados dos Republicanos que a apoiem), Christian admite que vêm aí tempos difíceis. “Bardella não terá a capacidade total que é precisa. Ele é um tipo capaz, mas está limitado, não tem toda a liberdade, porque o Presidente continuará a ser Macron.” Um homem que, sublinha o comerciante, é “detestado pelos franceses”, porque “não acredita em nada”.

A mudança, acredita, é necessária. E, ao contrário de tantos que invocam as dificuldades económicas e o aumento do custo de vida para votar na UN, este francês é claro sobre o tema que mais o preocupa: a imigração. “O problema não é a integração dos imigrantes, é dos filhos deles, dos que já nasceram cá”, explica. “Precisávamos de ter feito uma integração correta: escolas verdadeiramente laicas, entender que a religião se pratica em casa e não na rua, fazê-los ver que França é que é a pátria deles.”

Emanuelle, a luso-descendente que torce por Portugal no futebol e deseja uma vitória da União Nacional. “Não acredito que eles sejam tão radicais como dizem por aí”

Já a luso-descendente Emmanuelle, poucas portas ao lado, tem um entendimento diferente. Vai votar na UN por uma outra questão: a economia. “Os franceses não têm esperança, a França está em queda livre. Nós, comerciantes, sofremos imenso com os impostos. Nem na Covid isto esteve tão mal!”, queixa-se.

A deputada Nathalie Conceição, parece ter noção disso. Muitos dos temas em que se envolveu durante a última legislatura são muito mais focados em propostas como a redução dos impostos e em medidas que beneficiem os pequenos comerciantes — que compõem grande parte do seu círculo eleitoral. Já em 2022, o Le Parisien notava que assuntos como “a imigração e a insegurança” não constavam no seu programa. Mas a candidata dizia “concordar a 100% com todo o programa” da UN, incluindo nesta matéria.

“Não acredito que eles sejam tão radicais como dizem por aí. Bardella seria um bom primeiro-ministro. É jovem, fala bem… É bonito!”
Emanuelle, luso-descendente francesa que vai votar na UN

Emmanuelle, filha de um português e uma das poucas eleitores em Étampes que aceita falar com o Observador, também desvaloriza algumas propostas mais radicais da UN, como o fim da dupla nacionalidade. “Não acredito que eles sejam tão radicais como dizem por aí. Bardella seria um bom primeiro-ministro. É jovem, fala bem… É bonito!”, acrescenta com uma risada.

À noite, durante o festival local, a dona desta pequena boutique irá estar de olho no jogo de Portugal com França e a torcer pelo país onde o pai nasceu. “Sabe como é, os pais têm sempre mais influência do que as mães no que toca ao futebol…”, justifica. Mas no próximo domingo, não tem dúvidas que irá votar na União Nacional e espera contribuir para que Bardella seja nomeado primeiro-ministro.

Mas qual o cenário ideal para esta habitante da região rural de Essonne? Uma maioria absoluta totalmente dominada pela UN? Ou admite que uma coligação com os Republicanos, partido com forte implantação na região, poderiam ajudar a moderar alguns aspetos da extrema-direita? Emmanuelle abana a cabeça como quem desvaloriza a pergunta e encolhe os ombros. “Para mim tanto me faz, desde que tudo mude. Isto precisa.”

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