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Dan Kitwood/Getty Images

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A Catalunha vai ser independente? Seis respostas para uma pergunta

Puigdemont pediu esta segunda-feira que o conflito em Espanha fosse mediado por estrangeiros. Mas, embora esteja disponível para negociar, não põe de lado uma declaração unilateral da independência.

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A Catalunha vai fazer uma declaração unilateral de independência?

Sim, se o parlamento regional assim o quiser, a Catalunha pode avançar para uma declaração unilateral nos próximos dias. Foi isso que ficou claro na declaração do presidente do governo regional da Catalunha, Carles Puigdemont, no domingo à noite. “O governo [regional] vai transferir para o parlamento da Catalunha, que é a expressão da soberania do nosso povo, os resultados do dia de hoje, para que atue de acordo com o que está previsto na lei do referendo”, disse.

Ora, segundo a lei do referendo, basta que haja mais votos no “Sim” do que no “Não” para o processo independentista continuar ao seu rumo. “Se na contagem dos votos validamente emitidos há mais votos afirmativos do que negativos, o resultado implica a independência da Catalunha. Nesse caso, o parlamento da Catalunha celebrará, nos dois dias seguintes à proclamação dos resultados por parte da Comissão Eleitoral Catalã, uma sessão ordinária para efetuar a declaração formal da independência da Catalunha, os seus efeitos e acordar o início do processo constituinte”, lê-se na lei do referendo catalão. Este processo é iniciado com a aplicação da lei da transitoriedade, igualmente votado pelo parlamento regional catalão.

No final do referendo, Carles Puigdemont disse que "a União Europeia já não pode olhar para o outro lado" (JORDI BEDMAR / HANDOUT/EPA)

JORDI BEDMAR / HANDOUT/EPA

Existem aqui vários problemas. Primeiro: o referendo foi proibido pelo Tribunal Constitucional e declarado inválido. Segundo: a contagem dos votos levanta muitas questões e dúvidas. Terceiro: a Comissão Eleitoral Catalã foi formalmente dissolvida pelo Governo espanhol. Quarto: a lei do referendo foi considerada inconstitucional. Quinto: a lei da transitoriedade também foi considerada inconstitucional.

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Ainda assim, Carles Puigdemont sublinhou esta segunda-feira que o resultado é “vinculativo”. Quando os números oficiais e finais forem conhecidos — e isso ainda está para acontecer, sendo que as previsões apontam para cerca de 90% de votação no ‘sim’ — o parlamento tem 48 horas para votar a sua decisão. Se o anúncio for feito ainda esta terça-feira, é possível que a votação no parlamento regional da Catalunha aconteça na quarta-feira, dia 4 de outubro.

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E o parlamento regional catalão quer fazer uma declaração unilateral da independência?

Isso ainda não é certo. No parlamento regional catalão, existe um equilíbrio frágil que permitiu a aprovação de todo este processo à revelia de Madrid. Frágil porque não há uma maioria de independentistas (que são representados pelos cinco partidos que formam a coligação Juntos Pelo Sim e pela extrema-esquerda do CUP), mas sim de deputados a favor da realização de um referendo (En Comú Podem, uma espécie de sucursal do Podemos na Catalunha). Entre estes últimos alguns não querem a independência, embora reconheçam o direito à escolha.

A verdade é que a ideia de uma declaração unilateral de independência assusta até alguns independentistas. Menos de uma semana antes do referendo, Carles Campuzano, líder da bancada parlamentar do Partido Democrata Europeu Catalão (PDeCat), da coligação Juntos Pelo Sim, garantiu no parlamento regional que a “declaração unilateral da independência não está no nosso mapa”. Também do lado do En Comú Podem, Xavier Domenech deu a entender que não era esse o desejo da sua formação política.

O parlamento regional tem uma maioria de partidos a favor do referendo à independência, mas não tem uma maioria de independentistas. Isto pode fazer toda a diferença na altura de passar (ou bloquear) uma declaração unilateral da independência da Catalunha.

Assim, pode ainda dar-se o caso de o parlamento regional catalão não chegar a acordo para declarar unilateralmente a independência da região. Um fator que pode pesar para os parlamentares mais hesitantes é o facto de o referendo não ter decorrido normalmente. Esquecendo o facto de o referendo ter sido declarado inconstitucional — argumento que, entre os independentistas e os defensores do referendo, não colhe — há outros dados a ter em conta. Entre eles estão o facto de ter havido várias assembleias de voto fechadas pela polícia e também o baixo número participação eleitoral (em torno dos 42%), mesmo que, na lei do referendo catalão, não tivesse sido estipulado nenhum mínimo para que o resultado fosse vinculativo.

É possível que o parlamento regional da Catalunha venha a dizer ao presidente da Generalitat que, em vez de dizer “Adéu, Espanya”, se sente à mesa e comece a negociar com o Governo de Mariano Rajoy.

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Carles Puigdemont pediu mediadores internacionais para falar com Mariano Rajoy. Porquê?

Para já, porque parece estar disposto a negociar com o Governo de Espanha. Porém, se houver condições no parlamento regional da Catalunha para que se faça uma declaração unilateral da independência, esta negociação acontecerá já depois desse passo. Caso não haja declaração unilateral da independência, é possível que as conversas sejam mais longas mas também mais frutíferas para a Catalunha, que estará em posição de pedir tudo a Madrid, menos a independência.

“Eu não estou a declarar a independência, o governo [regional] não decidiu declarar a independência. Chegou foi ao entendimento de que estamos num momento em que se deve apelar à mediação e, se ela acontecer, que se fala de tudo”, disse Carles Puigdemont, numa conferência de imprensa depois de uma reunião com o governo regional da Catalunha.

Carles Puigdemont acredita que para haver uma mediação "eficaz" com o Governo de Espanha, esta terá de ser feita por "gente de fora" (QUIQUE GARCIA/EPA)

QUIQUE GARCIA/EPA

“Temos de falar disto, temos de falar da relação Catalunha-Espanha, que é algo a que me têm dito «não» reiteradamente”, disse Carles Puigdemont novamente esta segunda-feira. “Seria uma irresponsabilidade não aproveitá-lo, já que há atores interessados”, acrescentou. Ele próprio, sublinhou, tem esse interesse: “Se me chamarem hoje para falar, hoje mesmo eu vou”.

Mas há condições: que não haja condições. Isso mesmo explicou Carles Puigdemont, deixando claro que não admite que Mariano Rajoy lhe feche a porta caso ele queira levar avante o processo independentista catalão. “Simplesmente, pedimos que não nos ponham condições”, sublinhou. Ora, no discurso que fez no domingo à noite, também Mariano Rajoy disse estar disposto a negociar com todos os partidos. Porém, sublinhou que é preciso falar “sempre dentro da lei e com a marca da democracia” para dar seguimento a essas conversas. Ou seja, para Mariano Rajoy está fora de questão que a palavra “independência” seja alguma vez posta em cima da mesa.

Por tudo isto, tendo em conta a animosidade que separa o Governo central espanhol do governo regional da Catalunha, Carles Puigdemont pediu mediação internacional. Ao fazer este apelo, Puigdemont disse que o tema da Catalunha “é um assunto europeu, não é doméstico” e sublinhou que a “União Europeia não pode olhar para o outro lado”. Ainda assim, quando lhe perguntaram que papel a UE poderia ter na mediação que ele mesmo pedia, disse que “não tinha nenhum indício de que a União Europeia possa apadrinhar esse processo”.

Assim, afinal, quem podem ser estes mediadores internacionais? Carles Puigdemont não respondeu. E, até agora, não há candidatos de peso a desempenhar esta tarefa hercúlea.

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O que diz a comunidade internacional sobre o referendo catalão?

No discurso que fez na noite de domingo, Carles Puigdemont apelou a uma reação da União Europeia. “Os catalães ganharam o direito a ser respeitados pela Europeia. A União Europeia já não pode olhar para o outro lado”, disse.

As reações da parte de líderes e políticos europeus foram tíbias — pelo menos, tendo em conta os objetivos de Carles Puigdemont, que passam por uma legitimação internacional da Catalunha como um país independente. No próprio dia, as reações não foram muitas, nem partiram de destacados líderes europeus. Entre os governantes que condenaram a violência policial na Catalunha, estiveram os primeiros-ministros da Escócia, Bélgica e Eslovénia, tal como o ministro dos Negócios Estrangeiros da Lituânia. Depois, também houve declarações do francês Jean-Luc Mélenchon (líder da França Insubmissa), de Jeremy Corbyn (secretário-geral do Partido Trabalhista britânico) ou de Yanis Varoufakis (ex-ministro das Finanças da Grécia) críticas para com o Governo de Madrid. Fora da Europa, falou Nicolás Maduro. E, a partir da Embaixada do Equador em Londres, também Julian Assange se fez notar.

De resto, manteve-se um silêncio ensurdecedor ao longo do domingo. Na segunda-feira de manhã, ele seria quebrado por uma personalidade de topo da Europa.

"Este é um assunto interno da Espanha que deve ser abordado de acordo com a ordem constitucional de Espanha."
Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia, sobre a crise na Catalunha

Em comunicado, o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, teve uma reação que fez mais ressalvas a Espanha do que à Catalunha. Jean-Claude Juncker escreveu que o que se passa na Catalunha é um “assunto interno da Espanha que deve ser abordado de acordo com a ordem constitucional de Espanha” e acrescentou que não são tempos “para a divisão e fragmentação”.

A única parte em que Carles Puigdemont e o governo regional da Catalunha poderá pegar para arremessar contra Mariano Rajoy é aquela em que o presidente de da Comissão Europeia escreve que “a violência não pode ser um instrumento da política”. Mas, logo a seguir, Jean-Claude Juncker refere que a confia “na liderança do Presidente do Governo, Mariano Rajoy, para gerir este difícil processo dentro do pleno respeito da Constituição espanhola”.

Da parte das Nações Unidas, houve uma reação distinta. O alto comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Zeid Ra’ad Al Hussein, escreveu que estava “muito perturbado pela violência de domingo na Catalunha”. “Perante centenas de pessoas que ficaram feridas, insto as autoridades espanholas a assegurarem a realização de investigações minuciosas, independentes e imparciais sobre todos os atos de violência”. O alto comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos disse ainda que a “situação atual deve ser resolvida através de diálogo político, com todo o respeito pelas liberdades democráticas”.

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O que vai fazer Mariano Rajoy?

Para já, Mariano Rajoy diz que vai falar com os partidos com representação parlamentar. No seu discurso de domingo à noite, o Presidente de Governo disse que não vai “fechar nenhuma porta”, mas colocou como condição para o diálogo que este fosse “honesto e sincero, sempre dentro da lei e com a marca da democracia”.

As consultas que Mariano Rajoy está a fazer nestes dias servirão para preparar uma intervenção extraordinária que lhe caberá fazer no Congresso dos Deputados. Segundo o El País, o discurso, que posteriormente poderá contar com perguntas e respostas com os líderes da oposição, deverá acontecer entre 10 e 11 de outubro — ou seja, terça ou quarta-feira da próxima semana. Pormenor bastante importante: até lá, o parlamento regional da Catalunha poderá declarar unilateralmente a independência da Catalunha.

Para já, Mariano Rajoy dialoga com os outros partidos. Esta segunda-feira, falou primeiro com o PSOE, de Pedro Sánchez, e logo a seguir com o Ciudadanos, de Albert Rivera.

Depois de falar com os partidos com assento parlamentar, Mariano Rajoy deverá falar ao Congresso dos Deputados sobre a Catalunha. Em princípio, a sessão será dia 10 ou 11 (JUAN CARLOS HIDALGO/EPA)

JUAN CARLOS HIDALGO/EPA

O líder dos socialistas espanhóis pediu a Mariano Rajoy que “restabelecesse o contacto e abrisse uma negociação de forma imediata como presidente da Generalitat, para estabelecer um diálogo que hoje é mais necessário do que nunca”. No comunicado que os socialistas emitiram na sequência daquela reunião, pode ler-se ainda que o PSOE está “à disposição para contribuir para resolver a crise institucional da Catalunha”. Porém, o comunicado não contempla soluções nem propostas para desatar o nó górdio da Catalunha.

O mesmo já não se pode dizer daquilo que foi a conversa entre Mariano Rajoy e Albert Rivera, dos Ciudadanos. Na conversa que teve com o Presidente do Governo, Rivera, ele próprio catalão, referiu que “estamos a 72 horas de ver como Carles Puigdemont vai declarar a independência”. Perante esta medida, à qual o Ciudadanos sempre apresentou a sua oposição, Albert Rivera disse que está a “estudar maneiras para parar esta declaração de independência que preocupa os espanhóis”.

Existe, porém, uma solução que Albert Rivera apresenta sem pejo: aplicar o artigo 155 da Constituição de Espanha, que prevê o poder de o Governo central retirar a autonomia a uma região. Este artigo seria usado para convocar eleições autonómicas antecipadas, o que, na prática, levaria à eleição de um novo parlamento regional da Catalunha. “Estamos no momento de dar voz ao povo da Catalunha, para ver se Puigdemont perde apoio após este golpe de Estado que deu ontem”, disse Albert Rivera, depois da sua consulta com Mariano Rajoy. Rivera sublinhou que essa responsabilidade “compete ao Senado e à maioria parlamentar do PP”. Porém, é certo que o Ciudadanos alinharia ao lado do PP nessa tomada de posição.

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O que diz a lei espanhola sobre tudo isto?

Neste caso, importa consultar a Constituição de Espanha, aprovada em referendo no ano de 1978. Nessa altura, 91,81% dos espanhóis disseram “Sim” aquele texto fundamental — e, entre os catalães, foram 90,46% os que o aprovaram e apenas 4,61% os que disseram “Não”.

É logo no Artigo 2 que reside o argumento central que leva o Governo espanhol, e também o Tribunal Constitucional, a declarar a ilegalidade do referendo catalão. Ora leia-se: “A Constituição fundamenta-se na indissolúvel unidade da Nação espanhola, pátria comum e indivisível de todos os espanhóis, e reconhece e garante o direito à autonomia das nacionalidades e regiões que a integram e a solidariedade entre todas elas”. Desta frase, há que reter as seguintes chaves: as regiões são autónomas, mas devem solidariedade umas às outras; a autonomia está longe de significar soberania ou independência; não é possível sair da “pátria comum e indivisível de todos os espanhóis”.

“A Constituição fundamenta-se na indissolúvel unidade da Nação espanhola, pátria comum e indivisível de todos os espanhóis, e reconhece e garante o direito à autonomia das nacionalidades e regiões que a integram e a solidariedade entre todas elas”
Artigo 2º da Constituição de Espanha

Do lado dos independentistas e dos defensores do referendo, há quem acene com o Artigo 92. Neste, é dito que as “decisões políticas de especial transcendência poderão ser submetidas a referendo consultivo de todos os cidadãos”. Acrescenta-se ainda que o “referendo será convocado pelo Rei, mediante proposta do Presidente do Governo, previamente autorizada pelo Congresso dos Deputados”. Os termos do referendo seriam ditados por uma lei orgânica.

Poderia isto levar a um referendo à independência da Catalunha? Em teoria, sim. Mas, para isso acontecer, era preciso que Espanha estivesse de pernas para o ar. Pois veja-se: muito dificilmente o Rei arriscaria a separação da Catalunha; seria preciso que o Governo fosse liderado por Pablo Iglesias, ou por alguém das fileiras do Podemos, para que o Presidente de Governo propusesse tal referendo; o parlamento teria de estar de acordo em relação a tudo isto. Além disso, a lei orgânica que neste momento regula o Artigo 92 não prevê referendos que sobre o território. E, para fechar, o Artigo 92 fala de um referendo consultivo (ou seja, o poder político não teria de cumpri-lo) onde votariam todos os espanhóis (ao contrário daquilo que os independentistas catalães acreditam).

Depois, há o Artigo 155. Aqui, é prevista a punição a ser aplicada às regiões autónomas “rebeldes”. “Se uma comunidade autónoma não cumprir as obrigações que a Constituição ou outras leis lhe imponham, ou atuar de forma que ponha em risco o interesse geral de Espanha, o Governo, com o prévio requerimento ao presidente da comunidade autónoma ou, no caso de não ter resposta, com a aprovação da maioria absoluta do Senado, poderá adotar as medidas necessárias para obrigar aquela ao cumprimento forçoso das ditas obrigações”, lê-se no texto. Acrescenta-se ainda que para efeitos da aplicação dessas obrigações, o Governo “pode dar ordens a todas as autoridades das comunidades autónomas”. Com isto, o Governo central pode, se conseguir, dar ordens às autoridades catalãs, anulando qualquer instrução ou decisão que parta do parlamento regional, cuja autoridade ficaria sem efeito.

Esta última opção foi defendida por Albert Rivera, dos Ciudadanos, para que sejam convocadas eleições autonómicas antecipadas na Catalunha. Para já, Mariano Rajoy não se pronunciou quanto a esta opção. Uma coisa é certa: é uma carta que tem no seu baralho.

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