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André Ventura quer fiscalizar os apoios de 125 e 50 euros que estão a ser atribuídos pelo Estado para garantir que estes não podem servir para “whisky” (fala em “Jameson” ou “Grant’s”), “tabaco” ou “drogas”. Mas não diz como o conseguiria fazer, apesar de propor um reforço de 30 milhões de euros para fiscalizar esses apoios. Em entrevista ao programa Sob Escuta, da Rádio Observador, o presidente do Chega disse, no entanto, que prefere dar 125 euros a subsidiodependentes que “não trabalhem” para não abdicar de dar a quem precisa. E insiste que o apoio deve ser mensal ao longo de todo o ano de 2023.
O líder do Chega revela ainda que a relação com o PSD mudou com a nova liderança. Não há conversas formais, mas ainda esta segunda-feira falou com Luís Montenegro por telefone por causa de uma iniciativa do PSD. Acrescenta também que conhece o líder social-democrata e que mantém com ele uma “relação pessoal boa”.
Questionado sobre se o Chega admitiria apoiar Passos Coelho numa candidatura a Belém, André Ventura ficou alguns segundos em silêncio. Depois dessa pausa, disse que é “pouco provável” que isso aconteça, apesar de fazer uma ressalva de que “o contexto político muda”. Confessa ainda que tem uma melhor relação pessoal com Augusto Santos Silva, contra quem pediu um voto de condenação, do que tinha com Eduardo Ferro Rodrigues. Sobre a TAP, diz que é para manter pública e como “companhia de bandeira”. Além disso, afirma que o Tribunal Constitucional deve demitir três ministros por incompatibilidade.
[Veja aqui o vídeo da entrevista a André Ventura na íntegra:]
“O que nos distingue dos outros é votarmos a favor das propostas do PS”
No último Orçamento do Estado, o Chega foi o partido que mais aprovou propostas do PS na fase da especialidade. O Chega pretende voltar a ser o maior apoiante do PS neste Orçamento?
Não. O Chega pretende, sobretudo, continuar a ser crítico — e penso que temos sido os maiores críticos do PS, não obstante esse número. Mas, ao mesmo tempo, queremos ser capazes de avaliar as propostas independentemente de quem seja o seu proponente. Não queremos fazer aos outros o mesmo que nos fazem a nós. Se a proposta é de aumentar em 50 euros o subsídio de risco dos polícias ou dos bombeiros, ou aumentar o complemento de saúde dos funcionários públicos, mesmo que não seja a nossa proposta, damos um sinal positivo. É isso que nos tem distinguido dos outros partidos. Quando se olha para esses números, vê-se que muitas das propostas que aprovámos são de aumentos salariais, de aumentos de pensões — e aí distinguimo-nos da restante direita…
… e da esquerda também porque foram aqueles partidos que mais propostas do PS aprovou em termos absolutos.
Em relação à esquerda, o PCP e o BE têm a ideia de que se a proposta não for deles, não é boa. Isso não é correto. Vivemos num país que precisa de encontrar pontes para melhorar a vida das pessoas. Repare: o Chega defende um subsídio de risco dos polícias de 400 euros e o PS vota contra. Foi por isso que o Chega foi o único partido que não teve nenhuma proposta aprovada — é preciso dizer a outra face também.
Ouça aqui a entrevista em podcast.
Isso quer dizer que, na opinião do Chega, há muitas medidas apresentadas pelo PS que são boas para o país.
Não é que são boas — dão é um sinal. Às vezes queríamos ir muito mais além, mas não queremos boicotar nada à partida. Por exemplo: o PS ficou muito aquém do que devia dar aos bombeiros. Mas, naquilo que dá, devíamos votar contra por ser do PS? Não, porque os bombeiros querem é melhorar a vida deles. Tentamos sair do panorama político do quem deu a quem e ver o que é bom em cada momento.
O PS é um partido com o qual se pode falar ou negociar?
Isso não sei porque o Chega nunca negociou nada com o PS. Aliás, é o único partido que foi retirado das negociações com o PS, que se encontrou com todos os outros. Está no seu direito.
O Chega assina de cruz essas propostas, sem precisar de falar?
Nós avaliamos as propostas, não precisamos do PS para isso. Olhamos para as propostas e analisamos se vai ou não no sentido de que o país precisa e se são ou não um sinal positivo.
O Chega anunciou que vai propor que o apoio de 125 euros que foi dado pelo Governo se prolongue por todos os meses do próximo ano. Isso custaria cerca de 10 mil milhões de euros, quase tanto quanto o custo anual do SNS. Onde é que vai buscar o dinheiro?
Há duas medidas estruturantes que nós propomos. Uma é esse apoio contínuo dos 125 euros e outra é a não tributação dos subsídios de férias e de Natal.
Essa última proposta quanto é que custa?
Custa cerca de 1.900 milhões de euros. As duas propostas, em conjunto, custariam cerca de 11.900 milhões de euros. É um esforço muito grande do Orçamento do Estado, evidentemente. Mas este também é um momento atípico. Pelas nossas contas, a receita fiscal extraordinária deste ano vai situar-se em 20 mil milhões de euros.
De onde é que tirou esses dados?
São as contas que fizemos.
É que a previsão oficial não é essa. Em 2022, haverá mais 7,3 mil milhões de euros em comparação com 2021.
As contas do Chega são de que vamos ter uma receita de cerca de 20 mil milhões de euros.
A previsão oficial é menos de metade disso.
Tem que se verificar. Aqueles 11,9 mil milhões de euros seriam metade desta receita. Entendemos que, face ao momento que estamos a viver — em que, como ainda hoje vimos, empresas como a Galp têm lucros absolutamente pornográficos — devemos fazer um esforço adicional, com esta receita fiscal, para que as pessoas possam ter dinheiro verdadeiramente na mão. Todas as propostas do governo socialista vão noutro sentido, que é o dos apoios indiretos. Já aconteceu assim no gasóleo e na gasolina. Não querem dar aquilo que nós propomos, que é um desconto de 20 cêntimos por litro, querem antes dar vales: as pessoas têm que se registar, pôr o número de contribuinte… metade das pessoas não faz isso. Nas nossas contas — admitimos que possam ter que ser revistas — estes dois apoios, que são estruturantes e fundamentais para a economia, seriam cerca de metade da receita fiscal extraordinária que vamos ter. Mesmo admitindo que os números possam estar um pouco inflacionados, significaria cerca de dois terços desse valor, o que para nós, num momento como este, se justificaria.
Se necessário, aumentava o défice?
Podia não ser preciso, porque temos também propostas noutro sentido, que é o de combater o desperdício nas três áreas fundamentais da governação.
E chega?
Chegaria. Só na Saúde, temos mil milhões de desperdício todos os anos. Na Justiça e na Administração Interna, temos cerca de 900 milhões de euros.
Mas esses valores vêm de onde?
São números públicos. Há fraude e desperdício.
Se fosse muito fácil acabar com as fraudes, vivíamos num mundo muito melhor.
Mas com o PS, nem fácil nem difícil, com a fraude é que eles nunca querem acabar.
Entre as 350 propostas do Chega, há alguma coisa que signifique mais receita?
A do desperdício, evidentemente. E outra, para a qual queria chamar a atenção, até porque está em causa uma ilegalidade…
Mas só com duas medidas gasta 11.900 milhões de euros…
… com uma receita fiscal de 20 mil milhões…
… mas a receita não é essa, segundo os números oficiais.
São os números que tenho. No primeiro Orçamento em que participámos no Parlamento, aprovámos uma proposta que obrigava o Governo a divulgar os números dos valores atribuídos às fundações, aos institutos e aos observatórios. Foi, aliás, a única proposta do Chega aprovada. E onde é que estão esses números? Não os temos. Outra das nossas medidas de corte na despesa é o corte brutal, gigantesco, nestes observatórios, fundações e institutos. Combinamos isto com o corte no desperdício e na fraude e com a avaliação da receita fiscal para fazermos propostas que sejam credíveis. Estou certo de que, quando chegarmos ao fim da discussão deste Orçamento, o Chega voltará a ser o partido com mais propostas estudadas.
Uma das bandeiras do Chega é a crítica àquilo a que chama subsidiodependência. Dar 125 euros por mês não é alimentar essa subsidiodependência?
Ouvi isso do deputado Carlos Guimarães Pinto. Percebo que para a Iniciativa Liberal e para uma parte do PSD o mercado resolve tudo e cada um faz por si. Nós não entendemos isso. Temos um país altamente fragilizado nas suas estruturas de classe média, vivemos num país onde o salário médio anda nos 1200 euros brutos e onde a classe média, com o aumento dos combustíveis e da inflação, vive amplas dificuldades. Quando isto acontece — e está a acontecer não por força apenas das insuficiências económicas nacionais, mas da conjuntura externa — não há outra hipótese a não ser termos o Estado a fazer o que deve fazer. Dir-me-á: mas isto não é diferente da conceção de Estado que o Chega tem? É. Mas um Estado que cobra mais impostos do que qualquer outro país da Europa, tem o dever de retribuir. A subsidiodependência é de quem não faz nada, não é de quem se mata a trabalhar todos os dias. E esse é um conceito que os deputados da Iniciativa Liberal nunca vão compreender porque eles não percebem a diferença entre quem se mata a trabalhar e ao fim do mês tem de escolher entre medicamentos e comida, de quem não faz nada e recebe mil euros do Estado.
Mas, do seu ponto de vista, tanto uns como os outros receberão os 125 euros.
Qual é a outra solução? Seria dizermos que uns recebem e outros não. E isso aumentaria a clivagem social.
O André Ventura é que tem como uma das suas grandes bandeiras o combate àquilo que diz ser um excesso de atribuição de subsídios.
Não de atribuição de subsídios, mas de subsidiodependência. Acha que uma família em que trabalham os dois e em que recebem 600 euros cada um, se receberem mais 125 euros são subsidiodependentes?
Mas não é esse o ponto. A partir do momento em que vai dar a todos por igual, vai acabar por dar também às pessoas que diz serem subsidiodependentes.
Qual é a outra solução? É não darmos a ninguém. Entre isso e deixar todos na pobreza, prefiro dar a todos. Nós não deixamos os nossos compatriotas na miséria. Percebo que, para os outros partidos de direita, isso possa ser normal, mas nós achamos que, num momento destes, que é atípico, temos que ter medidas. Não há nenhuma incongruência. O Chega vai continuar a combater a subsidiodependência. Por isso, já pedimos explicações sobre os números que vimos ontem, segundo os quais o Rendimento Social de Inserção vai chegar aos 326 milhões de euros.
Presumo que não entenda que toda a gente que recebe o RSI é porque não quer trabalhar.
Claro que não. Por isso é que pedimos explicações. Para sabermos, destes números, quem é que tem condições para trabalhar, que nível de fiscalização está a existir e porque é que estes números vão aumentar. Mas entendemos que, num momento destes, os portugueses merecem ser ajudados. Não podemos ter a ladainha habitual de que só os mais coitadinhos é que recebem o apoio do Estado. Porque, neste momento, temos famílias da classe média que estão a ter aumentos de casa de 300 euros por mês, estão a ter aumentos de gasolina nos valores finais mensais, de 200 e 300 euros e o Estado não faz nada sobre isso.
Essa medida dos 125 euros não abrange os pensionistas. O Chega também deixaria de fora os reformados caso o apoio se prolongasse por todos os meses de 2023?
O Chega entende que o apoio que o Governo prometeu aos pensionistas é uma fraude.
Isso já percebemos. A questão é se o Chega manteria a opção do Governo ou se daria estes 125 euros também aos reformados.
O Chega faria uma atualização das pensões conforme estava prometido, de 9,1%.
Ou seja, não dava estes 125 euros?
É perfeitamente possível dar este suplemento também aos pensionistas.
Mas está nas propostas do Chega?
Ainda não finalizámos as propostas.
Portanto: atualizava as pensões à taxa de inflação e ainda dava aos reformados um suplemento de 125 euros por mês?
Claro. E tudo isso seria ainda menos de 20 mil milhões. Entendemos que temos pensionistas que ganham 300 euros por mês.
Mas, então, esse valor dos 10 mil milhões vai ter um grande salto.
Garanto-lhe que nunca chegaria aos 20 mil milhões, por isso o Estado e a Galp ainda nos ficavam a dever dinheiro. Num momento como este, temos que ser exigentes com o Estado porque o Estado foi exigente connosco nos últimos anos. No ano passado, Portugal bateu todos os recordes de cobrança fiscal.
Juntamente com os 125 euros, está a ser pago um apoio de 50 euros por cada filho. Também quer repetir esse apoio em todos os meses do próximo ano?
O que vamos propor para isso é um aumento da fiscalização. Entendemos que muita gente se vai apropriar destes valores para ficar com o dinheiro, mas não no sentido de apoiar os filhos. Já temos vários casos desses em Portugal.
A que é que se refere? Que famílias é que se aproveitam dos filhos?
Todas. Não quero referir os ciganos outra vez porque não é disso que vim aqui falar. Mas há muitas famílias de rendimentos mais baixos que, sabemos, até por força dos relatórios escolares — muitas vezes, nem à escola vão —, que ficam com esse dinheiro para eles, muitas vezes até para consumos impróprios, de tabaco e de álcool, e não o dão aos filhos, que era o suposto.
“Os 125 euros não podem ser para Jameson, tabaco e droga”
Mas os 50 euros foram atribuídos agora, como é que já sabe como foi aplicado esse dinheiro?
Estou a falar de todos os apoios em geral. Todos os apoios que são dados em função do agregado familiar geram estes problemas. Basta ver os relatórios escolares.
Então o Estado vai ver onde são gastos estes 50 euros? Se forem gastos em supermercado, vai ver se os filhos comeram aquela comida ou não?
Ninguém quer que os 50 euros do Estado sejam para garrafas de Jameson e de Grant’s.
Também ninguém quer ter o Estado a entrar na casa das pessoas para ver onde é que os 50 euros são gastos.
Eu também não quero. Mas os contribuintes têm direito a saber onde é que o seu dinheiro está a ser gasto. Portanto, dizer que os contribuintes estão a pagar whiskys e tabaco acho que não é muito aceitável.
Como é que vai saber se aqueles 50 euros em concreto são usados para comprar whisky ou latas de salsicha?
Da mesma forma que se sabe com o material escolar. Com relatórios, com trabalho de fiscalização.
Mas estes 50 euros não são para comprar material escolar. São para as pessoas se alimentarem, são para ajudar a comprar roupa para as crianças. Como é que vai saber como se aplica?
Estamos de acordo. Não é para droga, nem para tabaco, nem para álcool.
Como é que faz essa fiscalização?
Da mesma forma que fazemos todas as fiscalizações, criando mecanismos para saber se aquele dinheiro foi canalizado para os bens alimentares e para o cabaz alimentar ou se foi para bens supérfluos. Se foi para o cabaz alimentar, perfeitamente de acordo.
E os 125 euros já podem ser para whisky e outras coisas?
Se for, nós achamos que é mau e deve acabar.
Portanto, também vai fiscalizar os 125 euros.
Não é só whisky — é drogas e coisas desses género. Nós somos fiscalizadores. Acho que as famílias que estão em casa percebem que o esforço suplementar que estão a fazer para o Orçamento do Estado não pode ser gasto em droga, tabaco e álcool. Talvez ouçamos isto e pensemos: agora o Estado vai entrar em casa das pessoas? Mas o Estado está a dar dinheiro que é dos contribuintes todos.
Não percebemos é como é que vai saber que os 125 euros vão ser usados para comprar droga ou álcool.
Isso é outra questão: nós estamos a propor o que se deve fazer. Depois é uma questão de fiscalização e de como é que se deve fiscalizar. Se se sentem confortáveis que o dinheiro dos contribuintes seja gasto em drogas, isso já é outra coisa. Eu não sinto. Eu não acho bem.
Portanto, no próximo ano, pretende dar todos os meses 125 euros às pessoas que receberam agora esse valor, mais aos pensionistas, mais os 50 euros para cada filho?
Acha isso muito, com os lucros da Galp anunciados esta semana? Acha isso muito?
Só queremos perceber como vai pagar tudo isto.
É muito simples: com a receita fiscal extraordinária.
Já vimos que os 20 mil milhões de que fala não estão corretos.
Não podemos ter um país em que o Estado…
…isto já não se paga com 10 ou 12 mil milhões.
São 18 [mil milhões], mesmo assim abaixo disso. Com o PRR que estamos a receber da Europa, são mais 30 mil milhões. Quer esse dinheiro onde, nas contas de Armando Vara? Temos de ser sérios.
O que é que Armando Vara tem a ver com estes valores?
Tem a ver porque está a receber subvenções vitalícias do Estado. Está confortável com isso? Eu não estou.
Mas acha que é a subvenção vitalícia de Armando Vara que está a ficar com todo este dinheiro dos contribuintes?
Sim. Como o Carlos Melancia, que faleceu por acaso esta segunda-feira. E outros. Acho que temos de passar a cortar para dar. E a direita ou aprende isto ou acaba. Temos de passar a perceber que o Estado não pode viver à custa de privilégios amontoados para depois, quando chega a classe média, não haver nada para eles.
“Não queremos dar [apoio] a todos, queremos é fiscalizar”
André Ventura é que, no início desta entrevista, disse que esta não era a altura de olhar para a questão do cortar, era preferível dar a todos nesta fase. Afinal, não quer dar a todos.
Não queremos dar a todos, queremos é fiscalizar, que é uma coisa diferente. Temos de acabar com esta ideia de que quem trabalha é sempre o mais penalizado. Nós queremos que o Orçamento do Estado deste ano faça um esforço suplementar, porque tem uma cobrança fiscal também extraordinária e suplementar, devido a fatores que não são exógenos e não endógenos. Ou seja: o Estado não fez nada para receber este dinheiro. Foi fruto da conjuntura do aumento da energia e da inflação. Com isto, pergunto-lhe: achamos mal dar 125 euros todos os meses a pensionistas que recebem 300 euros? Achamos mal? Eu preferia gastar nisso do que nos milhares de milhões que já foram gastos em estudos do aeroporto e estamos iguais.
Mas vai dar esses 125 euros a todos os pensionistas: aos que ganham muito e aos que ganham pouco.
Mas neste momento todos estamos a fazer um esforço enorme. Temos de acabar com esta ladainha de que só os coitadinhos é que merecem o apoio do Estado. O que é ganhar muito quando falamos de um pensionista? Será que o pensionista que leva 800 euros por mês ganha muito? Ou mil? Será que esta pessoa consegue viver muito bem? Se o resto da direita não quer saber dele, eu quero. Por isso, nós dizemos: sim, queremos que tenha um apoio de 125 euros durante o próximo ano. E fizemos as contas: com a receita fiscal que tivemos, é possível. Temos é de acabar com esta ideia de que a direita é contra as pessoas e está sempre lá para os lucros das grandes empresas e para os lucros do Estado. Ao mesmo tempo, vamos pedir um reforço de 30 milhões de euros para os mecanismos de fiscalização do Estado para garantir que este dinheiro é usado de forma efetiva nas ajudas à família e não em desperdícios em álcool, em droga e em tabaco.
“Manuel Pizarro, Pedro Nuno Santos e Ana Abrunhosa têm de ser demitidos”
Disse recentemente que não se compreendia que, no momento da tomada de posse, o ministro da Saúde não tivesse ainda cessado funções na empresa de que era gerente. A notícia dessa incompatibilidade saiu 23 dias depois de o ministro tomar posse. Os políticos não precisam de tempo para porem a vida em ordem quando aceitam um cargo?
Ninguém foi mais atacado com a exclusividade do que eu. E acho agora graça que os mesmos que fizeram isso desapareceram do espaço público de debate, mas havia uma grande diferença: é que eu não estava em exclusividade, estava a cumprir a lei.
Mas estava a falhar uma promessa eleitoral.
Eu tinha dito que ia sair [da empresa onde prestava consultoria] e saí. Em junho desse ano, quando terminou o meu contrato.
Saiu ao fim de nove meses.
Quando terminou o meu contrato. Os contratos são para cumprir. Que eu saiba, Manuel Pizarro não tinha nenhum pacto com a sua sociedade e, se tivesse, devia tê-la acabado. Eu estava a cumprir a lei. Por isso é que no debate das incompatibilidades ninguém ousou levantar a cabeça sequer um bocado. Porque depois de ataques de dois anos cerrados à exclusividade, na verdade era o Ventura só que estava a cumprir a lei.
Estava a quebrar uma promessa eleitoral.
Não, não estava. Porque eu não disse que era no dia em que começasse, disse que era quando terminassem os meus contratos. Aliás, isso está numa entrevista ao jornal i. Isso não é verdade.
É verdade, sim. Nessa entrevista que deu, disse que iria exercer em exclusividade, depois, a seguir, é que começou a falar disso.
Eu até disse que ia manter-me na comunicação social.
Isso disse.
Não podemos só dizer metade. E eu mantive-me como comentador. Mas, quando estava como comentador, ao contrário das deputadas do Bloco de Esquerda, que fazem da moralidade o seu auto de fé, eu não estava em exclusividade porque entendia, como ainda entendo, que se alguém estiver a receber um cêntimo que seja fora do Parlamento, não deve estar em exclusividade.
Mas primeiro deixou a comunicação social e só depois a empresa.
Porque o meu contrato terminou em junho. Saí quando terminou o meu contrato. A CMTV terminou antes disso, abruptamente, mas também ia terminar em junho.
Portanto, nunca poderia estar em exclusividade no Parlamento porque tinha uma colaboração com a outra empresa. Ou seja, essa questão nem se colocava.
E a partir de junho ficaria em exclusividade sempre. A grande diferença é que, enquanto estava em não-exclusividade, não estava a receber dinheiro do Parlamento por estar em exclusividade. Portanto, estava a cumprir a lei. Coisa que Manuel Pizarro não estava. Ora, ele sabia que à data em que tomava posse não podia ser sócio-gerente de uma empresa. O que ele poderia ter dito, até como disse por exemplo Elvira Fortunato, era que, no momento em que tomou posse já tinha feito todas as diligências para deixar de ser sócio-gerente. Aliás, numa entrevista que deu, dois dias depois de sair o caso, afirmou que estava perfeitamente ciente da incompatibilidade. Quando estamos perante uma situação destas, objetiva, temos de nos perguntar: o que vai fazer o Tribunal Constitucional? É que aqui não há volta a dar. Repare que eu perguntei isto a Ana Catarina Mendes e não me soube responder. Foi ali no plenário. Tem um parecer, que não está homologado, aparentemente, mas isso até vamos deixar para outras calendas. No caso do ministro Manuel Pizarro não há parecer nenhum. Nem podia haver. Nem o jurista menos qualificado do mundo podia dizer que o ministro da Saúde pode ser sócio-gerente de uma empresa na área da saúde.
Ele tem 60 dias para entregar uma delcaração no Tribunal Constitucional. Esse tempo não é legítimo para terminar essas funções?
Não. Porque uma coisa são as obrigações declarativas, outra é a violação no momento constitutivo do ato.
Mas aparentemente já tinha pedido para sair.
Não tinha pedido nada. As incompatibilidades existem por um motivo.
O André Ventura, em março de 2020, após tomar posse em outubro como deputado, estava a falar no Parlamento sobre matéria fiscal e sobre fuga fiscal através de offshores e era consultor da Finpartner ao mesmo tempo.
Não sei a que offshores se está a referir, nunca trabalhei com offshores.
Era uma das atividades dessa empresa.
Eu não giro o dinheiro do Estado. Eu sou deputado, é completamente diferente de ser ministro.
Mas estava a falar sobre uma área fiscal, sobre a qual também trabalhava numa empresa. Não vê incompatibilidade aí?
Trabalhava onde?
Na Finpartner, como consultor.
Mas onde é que isso conflituava com o que quer que fosse? Eu geria o dinheiro do Estado? Eu fazia planeamento fiscal para o Estado? Temos de ser sérios nisto, senão isto nunca vai a lado nenhum. Se estão só à procura de coisas para meter aqui para lavar a imagem dos socialistas…
Estamos a perguntar se acha que é incompatível.
Não tem nada a ver, por isso é que a lei não o proíbe. Mas proíbe objetivamente que um ministro, que gere dinheiro público, seja ao mesmo tempo gerente de uma sociedade.
E não estamos a lavar a imagem de ninguém, noticiámos, aliás, aqui no Observador, casos de incompatibilidades do Governo.
São situações completamente diferentes. Não é por eu ser comentador do Benfica que estou impedido de estar no Parlamento a fazer um voto de louvor ao Benfica. Vamos lá ser objetivos e honestos. Agora, em relação a este ministro, não sei como é que isto vai acabar porque o Tribunal Constitucional vai agora avaliar esta situação e tenho dúvidas que possa sair disto. Sobre Pedro Nuno Santos, tenho a mesma posição: é objetivamente uma incompatibilidade. Admito que haja aqui casos em que tenho mais dúvidas, como o da secretária de Estado da conservação da natureza, em que o marido tem um contrato com o município de Leiria, por ser com um município e não com o Estado. Mas o município de Leiria fez o que o Parlamento devia ter feito: anulou o contrato. E porquê? Por suspeitas de ilegalidade. Ou seja: a câmara de Leiria já fez mais do que o Parlamento sobre esta matéria. Como é que nós, deputados, nos podemos sentir sobre isto, quando estamos a virar as costas e a cara a uma coisa que é evidente? Eu não sei o que o Tribunal Constitucional vai decidir, mas parece-me evidente que Manuel Pizarro, Pedro Nuno Santos e Ana Abrunhosa têm de ser demitidos. E se não o forem por eles próprios ou pelo primeiro-ministro, devem ser demitidos pelo Tribunal Constitucional.
“A TAP deve manter controlo público e ser companhia de bandeira”
Disse na última entrevista ao Observador que, na TAP, admitia tudo menos uma nacionalização. Mas depois essa nacionalização existiu mesmo. Como os privados não conseguiram acompanhar a injeção de dinheiro, havia alternativa?
É um dossier muito difícil, mas nós entendemos que a TAP mantenha algum controlo público. Mantém-se a nossa posição. A do PSD, não percebi ainda qual é. Talvez vocês, quando entrevistarem aqui Luís Montenegro, lhe possam perguntar. A da IL foi clara: é a favor da privatização. Isso é bom para o debate, porque fica claro o que cada um defende. E tem sido sempre assim. Aliás, a IL até nos acusou de estarmos próximos do PS neste dossier. E mantemos essa posição: deve haver algum controlo público na TAP. E já expliquei porquê: rotas estratégicas fundamentais, ligação atlântica, rotas com as comunidades emigrantes, companhia de bandeira. É fundamental.
De tudo o que disse nesta entrevista, o Chega é o partido mais estatizante a seguir ao PCP.
Não creio que seja.
Que mais quer o Estado metido em todo o lado.
Não quero o Estado metido em todo o lado, acho é que fica claro que nós temos que ter, a par de uma economia dinâmica, empresas e opções estratégicas públicas que sejam também elas marcantes. Não quer dizer que queira o Estado em tudo, por isso é que temos votado contra todas as nacionalizações que são pedidas pelo PCP e pelo BE. Por exemplo, nacionalização dos CTT — o Chega vota contra. Nacionalização das empresas estratégicas de energia — o Chega vota contra. Sobre a TAP, mantemos a mesma posição, mesmo sabendo que isto não é popular — o que as pessoas hoje querem é sair da TAP rapidamente. E eu percebo isso. Tenho ouvido muita gente dizer isso. Mas acho que é um erro ficarmos sem nenhuma opção pública que defenda os nossos emigrantes e as nossas rotas estratégicas.
“Falei com Luís Montenegro. Mas são coisas pontuais”
Disse recentemente que ainda não teve nenhum encontro formal com o presidente do PSD. Mas tem falado com Luís Montenegro por telefone? Trocaram mensagens?
Esta segunda-feira falei com ele. Sobre a questão do debate de urgência [em relação ao acordo com Espanha e França para o chamado corredor verde]. Mas são coisas pontuais. Falei com ele para dizer que o Chega estaria ao lado do PSD nisto. Mas são coisas pontuais. Não tive nenhum encontro com Luís Montenegro, nem acho que deva ter.
Diz que há uma relação nova entre os dois partidos, porque não fez questão de se encontrar com ele?
Porque, neste momento, estamos ainda no quadro de definição parlamentar pós-eleições. Está a haver muitas mudanças, houve mudanças na liderança do PSD na bancada parlamentar, vai haver mudanças na IL. Estamos num quadro de grande indefinição e, sinceramente, o Chega não tem muito para falar com o PSD. Temos tido até uma relação bastante tensa no Parlamento muitas vezes. Com acusações mútuas. Porque o Chega entende que o PSD tem sido o segundo grande suporte do PS, a seguir à geringonça. O PSD não tem gostado disto e tem-nos devolvido os ataques, o que é normal também no debate parlamentar. Portanto, a relação está tensa entre os partidos. Já conhecia Montenegro antes disto e mantenho com ele uma relação pessoal boa. O único contacto que tenho mantido é estritamente em coisas como o debate de urgência do PSD, no quadro de uma relação meramente institucional. Não acho que haja nada a definir porque não há eleições no horizonte. Na nossa perspetiva, o PSD não se tem comportado bem enquanto partido da oposição, por isso não acho que haja muito a falar.
Falaram da questão da vice-presidência da Assembleia da República?
Não falámos sobre isso.
Mas porquê? Acha que não é um tema suficientemente relevante para fazer um contacto com o líder do PSD?
Acho que não é um tema que preocupe Luís Montenegro saber se vamos ter ou não um vice-presidente da Assembleia da República. O agradecimento que fiz não foi porque tinha estado a falar com Luís Montenegro, foi porque acho que a atitude do PSD foi a correta, acho que a IL devia ter feito o mesmo e era o que o Chega faria se o João Cotrim Figueiredo ou outro qualquer da IL se candidatasse. É dizer que a Constituição fala de quatro vice-presidentes, a Assembleia não tem funcionado, já tiveram de ser interrompidos trabalhos e o PSD disse que isto é a normalidade democrática. Nas palavras de Joaquim Miranda Sarmento, não houve nenhum ato de aprovação do Chega nem de aproximação, houve uma normalização de relações. PSD e Chega têm a ganhar se normalizarem relações. O PSD tem de perceber que o Chega veio para ficar e que não é o PSD que o vai impedir de continuar a crescer nas sondagens — aliás, as sondagens têm mostrado que, ao contrário da IL, que desce quando o PSD sobe, o Chega tem subido a par do PSD. Isto mostra que são dois eleitorados diferentes, que não se intercetam, e é isto que nos deve levar a pensar que a relação entre os dois não tem de ser de destruição, mas também não pode ser de aproximação. Tem de ser de normalização.
“Não creio que tenha sido o racismo a afastar Mithá Ribeiro de vice da AR”
Mas qual é a sua interpretação para a rejeição dos candidatos do Chega? Gabriel Mithá Ribeiro, por exemplo, disse que a sua rejeição “tinha de ter uma interpretação racial”. Concorda que foi uma questão de racismo?
Não creio que tenha sido uma questão de racismo, mas Gabriel Mithá Ribeiro não disse bem isso, disse que não se conseguia dissociar do facto de ser negro.
Ele disse que a rejeição do nome dele “tinha de ter uma interpretação racial”.
Gabriel Mithá Ribeiro, Diogo Pacheco Amorim, Rui Paulo Sousa. Três nomes. O que há em comum entre estes nomes é que são do Chega.
Cotrim Figueiredo não é do Chega, houve mais gente além do Chega a ser chumbado.
Há uma grande diferença: João Cotrim Figueiredo ficou a seis votos de ser eleito e tivemos Eurico Brilhante Dias, na Assembleia, a desafiar João Cotrim Figueiredo a candidatar-se outra vez e que ia contar com os votos do PS. O país tem de interpretar isto: porque é que o PS quer a IL e não o Chega?
Gabriel Mithá Ribeiro interpretou mal o que se passou?
Não vou fazer comentários sobre isso, é a interpretação dele, é pessoal… Agora, Rui Paulo Sousa, o que é que tem a ver com Gabriel Mithá Ribeiro? Diogo Pacheco Amorim, o que é que tem a ver com Rui Paulo Sousa? Isto mostra que é um boicote ao Chega.
Isto está claro, não há ninguém que diga que é por causa dos nomes, é por causa do partido que representam.
Mas o regimento o que diz é que é um vice-presidente por partido. O que os portugueses têm de avaliar é se concordam com este boicote ao partido ou não.
“Ferro não falava comigo, às vezes ligo a Santos Silva”
Anunciou que vai apresentar um voto de condenação a Augusto Santos Silva. Como nunca o pediu para o antecessor de Santos Silva, podemos depreender que achava Ferro Rodrigues melhor presidente do Parlamento do que o atual?
Não, não achava. A luta com Augusto Santos Silva é totalmente política, não há nada de pessoal. Ferro Rodrigues não falava comigo, passava por mim e não falava comigo, não acho isto normal na casa da democracia. É verdade que alguns deputados do Bloco de Esquerda também não falam, mas Ferro Rodrigues é presidente da Assembleia da República. Isso nunca aconteceu com Santos Silva. Tem tido uma relação connosco, e comigo particularmente, de incompatibilidade política, mas de total cortesia pessoal e até de termos a capacidade de falar.
Santos Silva já está na luta pela corrida a Belém?
Acho que Augusto Santos Silva vai ser candidato.
E André Ventura também já decidiu ser candidato presidencial?
Ainda não decidi, mas vamos ter candidato.
Apoio do Chega a Passos a Presidente? “Não consigo dizer à distância, mas não é provável”
Há não muito tempo tinha no seu gabinete uma fotografia onde aparece ao lado de Passos Coelho e disse numa entrevista que gostava que ele voltasse à política e até admitia a hipótese de fazerem parte do mesmo Governo. Mas da última vez que falou sobre Passos Coelho foi para dizer que ele cometeu erros. Afinal, que avaliação faz do papel de Passos Coelho como primeiro-ministro?
Acho que as coisas não são incompatíveis. Passos Coelho foi primeiro-ministro numa altura extraordinariamente difícil, conseguiu recuperar a economia portuguesa e a nossa credibilidade junto das entidades internacionais, conseguiu recuperar o país num certo sentido, foi um político extremamente eficaz nesse aspeto. Cometeu erros que ainda hoje estamos a pagar? Sim. Pedro Passos Coelho só tem a ganhar se num eventual regresso começar por assumir as coisas em que errou. Os políticos têm de ter a capacidade de pedir desculpa e um dos erros flagrantes de Passos Coelho foram os pensionistas. Se estivesse no papel de Pedro Passos Coelho, que tenho dúvidas que queira voltar…
Se ele for candidato a Presidente o Chega tem na mesma um candidato a Belém?
Não consigo dizer a essa distância.
Mas admite que não venha a ter e possa apoiar Passos Coelho?
[Silêncio] Não me parece provável.
Esse silêncio mostrou menos determinação do que o habitual.
Não me parece provável que o Chega apoiasse Pedro Passos Coelho para a Presidência da República. O contexto político muda…
Numa segunda volta, onde não tivesse candidato do Chega…
Se fosse Pedro Passos Coelho ou Augusto Santos Silva não tinha dúvida nenhuma. Isso é como Lula e Bolsonaro…
E o almirante Gouveia e Melo?
Conheço pouco e acho que todos conhecemos pouco do pensamento político de Gouveia e Melo. Tem um percurso militar e é muito conhecido nessa esfera, depois tem um percurso político muito ligado à questão das vacinas e da luta contra a Covid-19, que no pós-pandemia foi perdendo importância. Estive com ele algumas vezes nas receções oficiais, mas o que é que pensa sobre a separação de poderes, a reforma da justiça, como vai garantir a independência entre Governo, Assembleia da República, justiça e Presidência? Não sabemos nada, era importante saber se se quer candidatar e começar a perceber o que pensa. É muito difícil um partido dizer o que pensa sobre Gouveia e Melo quando não sabemos nada do que pensa sobre questões fundamentais.
“Cotrim foi embora porque tem divisões na bancada que o Chega não tem”
Percebemos que seja difícil olhar para o futuro, mas há quem o tenha feito há poucos dias. O líder da Iniciativa Liberal sai porque, em 2026, já estará há sete anos no cargo e acha isso demasiado. Também André Ventura estará há sete anos na liderança do Chega quando forem as legislativas. Está agarrado ao cargo?
O número de vezes que já pus o meu cargo a votos dentro do partido mostra que sou provavelmente o líder com menos apego ao cargo que existe. Disse aos militantes que no dia em que votarem contra mim vou embora, não vão ouvir mais falar de mim.
João Cotrim Figueiredo disse que não se recandidatava. O que André Ventura fez foi ir várias vezes a votos consecutivamente.
É uma opção dele. Porque João Cotrim Figueiredo provavelmente tem conflitos no partido que o Chega não tem e tem divisões na bancada parlamentar que o Chega provavelmente não tem.
Acha que João Cotrim Figueiredo sai por problemas internos?
Acho que está muito ligado a isso.
O Chega expulsa mais militantes do que a IL.
Admito que sim, mas o Chega tem 40 vezes mais militantes do que a IL, é normal. João Cotrim Figueiredo diz que sai por causa do estilo, porque o estilo está muito popular e põe-se a jeito porque levou António Costa a dizer que agora querem ser todos como o Chega e que isso é lutar no lamaçal, etc.. Cotrim Figueiredo diz que têm tido um estilo pouco aguerrido, que precisam de um estilo mais aguerrido e popular e ouvimos dizer que há um candidato à presidência da IL que é apoiado por João Cotrim Figueiredo, que é Rui Rocha. É um deputado bastante simpático e trabalhador, mas do que conhecemos é o oposto do que Cotrim Figueiredo disse sobre ser aguerrido, popular, com estilo carismático. É o contrário. Percebe-se que aquilo não derivou de nenhuma opção de querer mudar o estilo da IL, nem de dar tempo a uma nova liderança. Isto já se vinha a notar com o apagamento de João Cotrim Figueiredo nos grandes debates, em que não está presente ou é substituído por Rodrigo Saraiva, Carlos Guimarães Pinto ou Rui Rocha.
Mas acha que toda a gente deve fazer o que o Chega faz e falar quase a uma só voz?
O Chega tem um presidente, não fala a uma só voz.
Certo, mas nos debates importantes é sempre André Ventura que toma a voz e fala pelo partido.
Temos tido bastante divisão…
Nos debates normais, mas nos debates de grande importância normalmente é sempre André Ventura.
Repare, as comissões orçamentais são todas feitas por deputados que não são André Ventura…
Obviamente, nem sequer tem lugar em todas.
Mas podia lá ir no Orçamento do Estado e estamos a ter vários deputados a participar. Em todos os debates, inclusive com o primeiro-ministro, ao contrário do PSD em que fala o líder parlamentar nas duas rondas, o Chega faz uma distribuição, falo na primeira ronda e na segunda ronda fala outro deputado. Acho que temos feito uma divisão de tarefas, muito me têm ajudado neste enorme trabalho. Agora, o Chega tem um presidente, o rosto para fora do partido é eleito pelos militantes e escolhido pelos militantes. Não temos neste momento oposição dentro do Chega e, enquanto o partido se mantiver pacificado e unido, serei essa voz. Quando os militantes ou eu acharmos que o tempo chegou ao fim, não vou estar a dar tretas de que é o estilo e o partido e tal. Acho que este não é o momento de eu sair e acho que ainda podemos chegar ao Governo em 2026.
Anunciou uma nova fase no Chega, o lançamento de uma federação sindical. Quem é que vai ficar à frente dessa federação?
Não sabemos ainda, mas o projeto é para avançar, o nome está registado, a estrutura jurídica está a ser montada e é um desafio de uma enorme exigência. O partido e o sindicato têm de ser absolutamente autónomos, ninguém da direção do partido pode estar na direção do sindicato, eu não posso ser presidente do sindicato. Vamos ter certamente um grande sindicato porque temos aproximação a muitas forças sindicais, relacionadas com áreas policiais, professores, profissionais de saúde, segurança e área de hotelaria e turismo. Queremos alargar, a penetração no âmbito do operariado está mais difícil, mas estamos a tentar fazê-lo nos bastiões do PCP e queremos lançar mesmo uma grande federação sindical e gostava que a prazo fosse a maior do país. Queremos combater lado a lado no sindicalismo com as outras forças e isto é uma mudança de paradigma.
Mas vai seguir o exemplo da CGTP, que muitas vezes funciona como uma espécie de correia de transmissão do PCP, ou da UGT, que tem alguma autonomia em relação ao PS?
Nenhuma das duas, mas a autonomia será um foco fundamental, caso contrário seria uma delegação do partido.
Ao ouvi-lo falar, parece.
Num projeto novo, com o impacto e a dimensão que isto vai ter, tinha de ser anunciado institucionalmente. Às vezes somos acusados de demasiada transparência, às vezes de menos, e queria que isto fosse transparente. Foi uma ideia do Chega.
E depois como é que vai ter autonomia? Admite que essa federação sindical tome decisões importantes contra a direção do partido?
Claro que admito. A autonomia é isso, a democracia é isso. Não queremos uma CGTP, que é a voz do PCP, para isso não valia a pena incentivarmos a formação de nenhum sindicato. O nosso eleitorado é muito diferente do do PSD e da IL. No sul do país temos um eleitorado muito sindicalizado e muito ligado ao trabalho na agricultura, hotelaria e turismo. E dizem-nos que são sindicalizados, que querem lutar pelos seus direitos, mas não querem estar nas mãos da CGTP ou da UGT por estarem ligados à esquerda. Começamos a estudar isto primeiro com o exemplo do Vox e queremos transportá-lo para aqui, mas com total autonomia. Provavelmente, vamos ter o Solidariedade a defender coisas que o Chega nem defende totalmente, não vou interferir nada na gestão do sindicato.
Só na criação.
No incentivo e no apoio à criação. Queremos um novo modelo sindical que não seja de luta de classes e de luta entre trabalhadores e empresários.
Isso serão os trabalhadores desse sindicato a decidir.
Evidente, vamos propor esse modelo, mas podem não aceitar. O que queremos é um novo modelo sindical em Portugal que aposte no crescimento, convívio e harmonia e não na luta permanente, nas greves que destroem e que atrasam o país ainda mais.