“Estamos numa fase crítica”. O aviso foi ministro da Economia, no arranque de uma conferência de imprensa em que ia detalhar as novas medidas de apoio às empresas aprovadas em conselho de ministros, tinha duas mensagens. A primeira é a constatação do óbvio: o último trimestre do ano ficou mesmo marcado por uma segunda vaga da pandemia de Covid-19 penalizadora para a economia. A segunda é que, agora, o Governo já tem “alguma visibilidade sobre o fim desta crise” e uma “normalização da atividade económica”.
No entender de Siza Vieira, estas duas circunstâncias devem traduzir-se em novos apoios. “É preciso assegurar que as empresas conseguem passar os próximos meses”, ou seja, “é preciso renovar os apoios” que lhes são dados. Foi essa renovação dos apoios – temperada com algumas novidades – que o ministro da Economia apresentou esta quinta-feira em Lisboa, num novo pacote (já quase é preciso um guia para não perder o fio à meada) avaliado em 7,2 mil milhões de euros só para o primeiro semestre de 2021 (dos quais 1.400 milhões a fundo perdido).
Cinco áreas de intervenção: Emprego, Apoiar.pt, Rendas, Fiscalidade e Financiamento
Na área do Emprego, Siza Vieira anunciou que o apoio à retoma progressiva, o mecanismo que veio substituir o Layoff simplificado, vai ser estendido até ao final do primeiro semestre de 2021. E para as micro, pequenas e médias empresas, salientou o ministro, “mantém-se a redução de 50% sobre a TSU relativa à compensação retributiva”. Os trabalhadores abrangidos por este regime passam a poder receber a 100% o respetivo salário (até 3 salários mínimos) “sem esforço adicional das empresas”. Este regime também se estende aos sócios gerentes de empresas com trabalhadores permanentes, “com contribuições
sociais feitas na empresa”.
Ainda no Emprego, para as micro-empresas com quebras de faturação superiores a 25% o Governo vai renovar o regime – que já esteve em vigor – do pagamento de dois salários mínimos (1.330 euros) por cada posto de trabalho, pago em duas tranches no primeiro semestre do próximo ano. As empresas podem, assim, optar entre o regime de apoio à retoma progressiva (em que o Estado paga as horas não trabalhadas do funcionário) e os dois salários mínimos pagos por cada posto de trabalho. Mas há obrigações, um pouco como havia até aqui: as empresas estão proibidas de fazer despedimentos coletivos e de eliminar postos de trabalho até dois meses após o final do apoio.
O Apoiar.pt vai passar a incluir médias empresas. Ou seja, empresas com mais de 250 trabalhadores, mas menos de 50 milhões de euros de faturação vão poder receber apoios até 100 mil euros por empresa. O Apoiar foi também alargado a empresários em nome individual sem contabilidade organizada e com trabalhadores a cargo até 3 mil euros por empresa.
Nas condições de acesso ao Apoiar.pt reduz-se restrições em sede de capitais próprios “mediante apresentação de balanço intercalar que demonstre capitalização”. E aqui, nas condições de acesso, uma grande diferença: o Governo cede e possibilita a “aprovação de candidaturas de empresas com dívidas à Autoridade Tributária e Segurança Social, sujeita à condição de regularização”. Uma reivindicação desde a primeira hora do setor da restauração.
O ministro fez ainda um pequeno balanço do Apoiar.pt no que diz respeito aos 750 milhões de euros a fundo perdido. O programa — que paga 20% da faturação perdida nos nove primeiros meses deste ano, limitado a 7.500 euros nas micro empresas e 40.000 euros no caso das pequenas empresas, já recebeu mais de 35.800 candidaturas, com 339 milhões de euros aprovados. E só na restauração há 162 milhões de euros a fundo perdido já aprovados. Por outro lado, de 25 de novembro a 03 de dezembro, 10.416 empresas já receberam pagamentos no valor de 57,9 milhões de euros.
Rendas. Uma semi-novidade entre as medidas aprovadas. Já se sabia que o governo estava a estudar este tipo de apoio, dirigido especialmente ao setor da restauração, pequeno comércio e hotelaria. Nesta quinta-feira o Governo anunciou o formato da medida. Em primeiro lugar trata-se de um “pagamento a fundo perdido das rendas comercias”, que são um dos maiores custos fixos de muitas empresas.
No caso de empresas que registem uma quebra de faturação entre 25% a 40% em comparação com 2019 o apoio será de 30% do montante da renda até 1.200 por mês. Uma empresa com quebra de faturação superior a 40% terá apoio de 50% do valor da renda até 2.000 euros”, anunciou Siza Vieira.
O pagamento será feito em duas tranches durante o primeiro semestre de 2021. Por outro lado, será lançada uma linha de crédito – destinada a inquilinos e senhorios – sem restrição de acesso a quem já acedeu a outras linhas de crédito.
Na apresentação do ministro, consta ainda a referência à aprovação da proposta de lei para apoiar o arrendamento. Na prática, os contratos de arrendamento vão ficar blindados até 30 de junho.
“O regime proposto procura alargar o período de suspensão dos efeitos da cessação dos contratos de arrendamento, bem como introduzir-lhe alguns aperfeiçoamentos, sendo certo que o regime previsto não prejudica o regular pagamento das rendas”, indica a proposta de lei aprovada esta quinta-feira. Por outro lado, o diploma estabelece um regime dirigido aos “estabelecimentos que tenham sido encerrados, por medida legal ou administrativa, em março de 2020, e que, a 1 de janeiro de 2021, ainda permanecem encerrados”.
E o novo regime é: para os estabelecimentos encerrados desde março, fica diferido, para janeiro de 2022, o início do pagamento das rendas referentes a 2020. Fica diferido para a mesma data o pagamento das rendas de 2021. E o pagamento das mesmas poderá ser feito em 24 mensalidades.
Na Fiscalidade, todas as empresas do regime trimestral (incluindo empresários em nome individual) poderão diferir o IVA trimestral do primeiro semestre de 2021. O pagamento poderá ser feito em 3 ou 6 prestações e não haverá lugar ao pagamento de juros.
E as execuções fiscais e da Segurança Social estarão suspensas no primeiro trimestre de 2021, anunciou também o ministro da Economia.
O Financiamento, ou reforço do apoio à tesouraria das empresas, é o último pilar das medidas de apoio anunciadas esta quinta-feira por Siza Vieira. Para começar, o Governo “aprovou a constituição de um fundo de tesouraria para as micro e pequenas empresas”, disse o ministro. Trata-se de uma medida que consta do Orçamento do Estado para 2021, por proposta do partido Ecologistas Os Verdes. “É uma linha dotada de até 750 milhões de euros, com maturidade até cinco anos e período de carência de 18 meses”, disse.
Nas linhas de crédito, haverá 1.050 milhões de euros para as empresas exportadoras (ou seja, há um alargamento em 300 milhões de euros da linha anunciada), com 20% a fundo perdido (4.000 euros por cada posto de trabalho, dos quais 800 euros a fundo perdido). O setor dos eventos terá uma linha de crédito de 50 milhões de euros, igualmente com 20% a fundo perdido (4.000 euros por posto de trabalho e 800 euros a fundo perdido).
Outra novidade: as grandes empresas (com 250 ou mais pessoas ao serviço ou com um volume de negócios superior a 50 milhões de euros e ativo líquido superior a 43 milhões de euros) dos setores mais afetados vão ter uma linha de 750 milhões de euros (com um limite de 10 milhões por empresa). O microcrédito Turismo de Portugal vai ser alargado a pequenas empresas, que passam a poder aceder a 100 milhões de euros. E o apoio à qualificação Oferta Turística contará a partir de agora com 300 milhões de euros.
Como chegámos até aqui?
Siza Vieira fez questão de salientar que desde março até dezembro, as empresas portuguesas beneficiaram de quase 22 mil milhões de euros em apoios, dos quais 2.790 milhões a fundo perdido. O quadro abaixo detalha estes valores, sendo que a maior fatia são os 8,4 mil milhões de euros em linhas de crédito, seguido dos 6.100 milhões de euros em moratórias bancárias e os 3,9 mil milhões de alívios fiscais e contributivos. Ou seja, receita fiscal que o Estado não está a receber desde já (mas que espera vir a cobrar, em parte, no futuro).
“Estas medidas foram desenhadas com as associações representativas do setor em função dos problemas que nos manifestaram”, disse Siza Vieira, dando prioridade à proteção do emprego e a questão do pagamento das rendas comerciais no primeiro semestre de 2021, quando ainda haverá algum potencial para “volatilidade” da atividade económica e da crise pandémica.
“O que falta às empresas não é nada de muito especial: só precisam de clientes”, acrescentou o ministro da Economia. “A expectativa é que isto [a economia] recupere”.