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"Mudar o modelo de recrutamento" e "eliminar a precariedade" são os dois caminhos que o Governo quer seguir

Universal Images Group via Getty

"Mudar o modelo de recrutamento" e "eliminar a precariedade" são os dois caminhos que o Governo quer seguir

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"Aproximar, fixar, vincular." Com que propostas vai o Governo negociar com os professores?

Mais professores nos quadros, zonas geográficas mais pequenas, novas regras para o 5.º e 7.º escalão e entrada no quadro depois de acumular três anos de serviço. Estas são as propostas do Governo.

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À primeira vista parece que o Governo cedeu em tudo o que os professores queriam, mas a Fenprof, estrutura mais representativa de professores, não aplaudiu de pé as novidades. Pelo contrário, o seu secretário-geral, Mário Nogueira, não vai desconvocar nenhum dos protestos que tem agendados, como deixou claro em conferência de imprensa. Logo à cabeça, há uma exigência a que o ministro da Educação não cede: a recuperação integral do tempo de serviço congelado. Em contrapartida, promete que não voltará a congelar a carreira dos professores — uma garantia que já tinha dado em outubro, em entrevista ao Observador.

Esta quarta-feira, no meio de greves sem fim, de protestos diários e de uma manifestação de professores (no sábado) como não se via há muitos anos, o Ministério da Educação e os sindicatos voltaram a reunir-se, para a terceira ronda negocial de um processo que arrancou em setembro. Antes dos encontros, marcados para quarta e sexta-feira, o ministro João Costa explicou aos jornalistas os principais pontos daquilo que tem para oferecer e que estão assentes em três eixos: “Aproximar, fixar, vincular.”

Nesse bolo, enviado aos sindicatos antes de ser revelado à comunicação social, os ingredientes são todos da mesma família e passam por mudar a forma de colocar professores nas escolas.

Governo vai vincular 10 mil professores. Três anos de serviço, mesmo que não seguidos, vão permitir entrada para o quadro

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Minutos antes de o ministro falar, foi António Costa quem deixou um recado, pedindo aos representantes dos professores boa-fé e bom senso nas negociações. O primeiro-ministro também mostrou qual o caminho que o Governo pretende seguir e que passa por concretizar os objetivos definidos no seu programa: “Mudar o modelo de recrutamento” e “eliminar a precariedade”.

É à volta desses dois pontos que andam as propostas anunciadas por João Costa — que a lei obriga a negociar com os sindicatos —, e que o ministro resumiu da seguinte forma: “Aproximar, porque reduzimos as distâncias de deslocação dos professores. Fixar, porque estabilizamos os professores em escolas concretas e não em regiões dispersas. Vincular, porque temos mais professores efetivos nas escolas, mais depressa.”

"Com estas novas regras, vamos conseguir desprecarizar um grande número de professores, reposicionando-os na carreira, com consequente valorização salarial, e dando-lhes perspetivas de progressão."
João Costa, ministro da Educação

Quadros de Zona Pedagógica passam de 10 para 63

“Reduzimos a distância em que os professores são obrigados a deslocar-se, em alguns casos para distâncias cinco vezes menores do que atualmente.” João Costa

Os professores podem ficar colocados de duas formas: ou nos quadros das escolas ou nos quadros de zona pedagógica. Neste último caso, o professor pode ser colocado em qualquer escola do referido QZP: o Algarve inteiro, por exemplo, corresponde a um único quadro de zona. No novo modelo, a região fica dividida em cinco novos QZP.

“A redução das dimensões das áreas geográficas em que os professores são colocados é uma prioridade”, argumentou o ministro, explicando que, atualmente, os “professores de quadro de zona pedagógica são obrigados a deslocar-se em zonas que distam entre 157 km e 244 km”.

A proposta governamental vai no sentido de passar dos atuais 10 quadros de zona pedagógica para 63, “contidos nas fronteiras dos atualmente existentes”. Assim, os novos QZP afastam-se de eventuais fronteiras de municípios, para “pôr de lado a ideia” de que as câmaras irão contratar professores. “Esta alteração substancial permite uma colocação em zonas que terão, em 95% dos casos, distâncias máximas de 50 km”, garantiu o ministro.

Além disso, João Costa falou numa nova ferramenta, sem entrar em muitos detalhes, que permitirá trocas diretas entre professores. “Serão ainda agilizados e aumentados os mecanismos de permuta entre professores que desejem, por mútuo acordo, trocar os lugares de colocação, aumentando o potencial de aproximação à localidade onde pretendem trabalhar.”

Ultrapassagens serão resolvidas

“No concurso que se realizará em 2024, todos os professores poderão concorrer de acordo com a sua graduação profissional a todos os lugares de quadro entretanto criados.”

Quando se fala de ultrapassagens de professores, os sindicatos referem-se a casos em que um professor com menos tempo de profissão ultrapassa outro que ensina há mais tempo. Por exemplo, pode acontecer um professor com 10 anos de carreira estar no 1.º escalão, enquanto outro, com 9 anos, já está no 2.º escalão.

Segundo a Fenprof, há dois motivos para isso acontecer: regras diferentes para quem acedeu à carreira depois de 2010 — que, segundo a estrutura sindical, provocou a ultrapassagem de cerca de 56 mil colegas a partir de 2013 — e a recuperação dos dois anos, nove meses e 18 dias de tempo de serviço congelado.

No entanto, o ministro da Educação garante que as novas regras de recrutamento preveem a resolução deste problema que “tem causado grande insatisfação aos professores”. Assim, no concurso que se realizará em 2024, todos os professores poderão concorrer de acordo com a sua graduação profissional a todos os lugares de quadro entretanto criados.

Como se lê na proposta enviada aos sindicatos, a que o Observador teve acesso, o Governo quer “eliminar os fatores de injustiça, designadamente, ultrapassagens nas preferências por lugares de colocação disponíveis na mobilidade interna e em lugares de QZP exclusivamente disponíveis para o concurso externo”.

Colocação em quadro de escola será a preferencial

“A estabilidade implica também que as colocações sejam, na sua maioria, em quadro de escola. As escolas e os alunos precisam de previsibilidade nos seus quadros e de continuidade nas suas equipas. E os professores de estabilidade na sua vida.”

Uma das intenções avançadas pelo ministro da Educação foi ter mais professores a vincular em quadros de escola do que em QZP — uma reivindicação antiga dos sindicatos, que há muito defendem que os docentes deviam estar ligados a uma escola ou agrupamento e não a uma zona geográfica que pode ter mais de 200 km.

Assim, João Costa argumentou que pretende fixar mais professores a cada escola e menos a cada área geográfica: “Propomos que as escolas tenham os seus lugares providos com professores de quadro, reservando os quadros de zona pedagógica para substituições e para garantir as necessidades não permanentes das escolas.”

Se os lugares de quadro de zona pedagógica diminuem, os lugares de quadro de escola irão “aumentar exponencialmente”, prometeu o ministro.

O ministro da Educação, João Costa, fala aos jornalistas em conferência de imprensa a propósito das reuniões com os sindicatos dos professores, no Minitério da Educação, Lisboa, 18 de janeiro de 2023. INÁCIO ROSA/LUSA

Ministro João Costa diz que pretende "valorizar os professores"

Inácio Rosa/LUSA

Fim dos concursos de 4 em 4 anos

“Assim, a obrigatoriedade e ciclicidade é substituída por uma abertura dinâmica de possibilidade de concurso à medida que novas vagas surjam.”

Outra novidade prevê o fim dos concursos que acontecem a cada quatro anos, o chamado concurso interno. “A estabilidade prevê também que quem está bem no lugar onde está provido, após concurso, não se veja obrigado a concorrer ciclicamente”, defendeu o ministro que, por diversas vezes, frisou ser necessário dar mais estabilidade aos docentes.

“A fixação de professores tem de estar associada a uma boa fixação, no contexto da falta de professores”, acrescentou João Costa, explicando que haverá novos instrumentos de gestão dos recursos humanos. O objetivo? “Agregar necessidades e reduzir significativamente o número de horários incompletos”, enquanto se rentabiliza “professores já vinculados que têm insuficiência de horário”.

Estas necessidades serão desenhadas por diretores de escolas — um painel em cada QZP — que, garantiu o ministro, não irão contratar professores. Aos diretores cabe apenas agregar necessidades e nada mais.

Colocação será sempre feita pela lista de graduação

“Porque ouvimos os professores e o seu apelo à centralidade da graduação profissional como critério único para o recrutamento e vinculação, apesar das limitações que uma escolha pela antiguidade sempre encerra, a fixação de professores far-se-á pela graduação profissional.”

Era um verdadeiro braço de ferro entre professores e Governo. Os sindicatos não admitiam que os docentes fossem escolhidos de qualquer outra forma que não a tradicional: uma lista de graduação, onde os professores surgem colocados por nota (para a qual contribuem vários fatores, incluindo tempo de serviço e avaliação) e que determina quem fica com que vaga.

Agora, João Costa afasta qualquer outro cenário, mesmo que essa não fosse a sua ideia original, já que pretendia que uma percentagem de professores pudesse ser contratada pelos diretores de escola, de acordo com o perfil considerado necessário para o modelo pedagógico utilizado no estabelecimento de ensino. Conclusão: “A colocação será sempre feita pela graduação profissional, como os professores exigem.”

Governo vai contratar 10 mil professores

“A nossa intenção é vincular, já este ano, no mínimo mais 10 mil professores. Isto significa também que estes professores terão melhores salários.”

Além de mais lugares no quadro, o ministro da Educação também promete que essa espera será mais curta, lembrando que, atualmente, o tempo médio de entrada na carreira está nos 16 anos. “Vamos colocar mais professores em lugares de quadro e diminuir substancialmente o tempo que cada professor demora a ser vinculado. A nossa intenção é vincular, já este ano, no mínimo mais 10 mil professores. Isto significa também que estes professores terão melhores salários”, esclareceu João Costa.

O ministro argumentou que este é um reconhecimento de que muitos dos professores contratados são necessidades permanentes do sistema.

Será possível vincular ao fim de 1.095 dias

“Apresentamos como proposta que possam vincular, além da norma-travão, todos os professores que já acumularam 1.095 dias de serviço (ponderados em equivalente a tempo integral) e que, neste ano letivo, têm um horário completo.”

Todos os professores que nos últimos três anos tiveram horário completo vão vincular? “É melhor do que isso”, respondeu o ministro João Costa aos jornalistas. Bastará que os professores tenham somado esse tempo ao longo da sua carreira e que, neste ano letivo, estejam com horário completo.

Atualmente, os professores já podem contar com a norma-travão que obriga a que sejam vinculados ao fim de três anos consecutivos com contrato — inicialmente eram cinco anos, reduzidos na anterior legislatura para três.

“É preciso ir mais longe, pela dignificação destes trabalhadores e como garantia de que asseguramos que a escola pública tem profissionais para responder à falta de professores, com perspetivas de progressão e com uma carreira”, sublinhou o ministro. Bastará, portanto, ter 1.095 dias de serviço acumulado. Aos professores que não têm horário completo, “apresentamos um processo de vinculação dinâmica, podendo vincular à medida que obtêm um horário completo”, detalhou João Costa.

Professores desfilam durante a Marcha Nacional pela Escola Pública, convocada pelo S.TO.P. - Sindicato Todos os Professores, como forma de protesto contra as politicas de educação do Governo, Lisboa, 14 janeiro 2023.  ANTÓNIO COTRIM/LUSA

Professores desfilam durante a Marcha Nacional pela Escola Pública, convocada pelo S.TO.P., no sábado passado

ANTONIO COTRIM/LUSA

Professores contratados vão ter mais dois índices remuneratórios

“Introduzimos também mais dois índices remuneratórios para professores contratados.”

Para os professores contratados, João Costa anunciou que estes irão ter dois novos índices remuneratórios em função de há quanto tempo dão aulas — na prática, isto permitirá aos professores “ter melhores salários”. Assim, os contratados terão índices remuneratórios diferenciados em função do seu tempo de serviço, tal como já acontece aos professores que estão nos quadros.

Esta questão já esteve na mira de Bruxelas, que ameaçou processar Portugal. Em causa, segundo a Comissão Europeia, estava o incumprimento de uma diretiva desde 2001 e um tratamento considerado “discriminatório”, já que os professores contratados ganham sempre o mesmo, independentemente dos anos de serviço.

Excesso de burocracia vai acabar

“Apresentaremos aos sindicatos uma metodologia para o mapeamento exaustivo das tarefas burocráticas em cada escola, visando a eliminação de documentos e plataformas.”

É uma queixa recorrente de professores e diretores: há demasiada burocracia nas escolas. O ministro da Educação reconhece o problema e quer reduzir as tarefas burocráticas dos professores, “para que se possam concentrar no trabalho com os alunos”.

A solução, explicou, passa por criar uma metodologia para o mapeamento exaustivo das tarefas burocráticas em cada escola, “visando a eliminação de documentos e plataformas que não contribuem para a qualidade do processo ensino/aprendizagem”.

5.º e o 7.º escalão têm novas regras, mas quotas não desaparecem

“Reconhecendo os constrangimentos que os professores atualmente em funções enfrentaram no desenvolvimento da sua carreira, propomos aos sindicatos a fixação para a legislatura das condições que permitem o acesso anual aos 5.º e 7.º escalões (englobando quotas e vagas num total de 75% e 58%, respetivamente).”

A carreira dos professores tem dez escalões. Cada um deles tem uma permanência obrigatória mínima de quatro anos, exceto o 5.º escalão (tem dois anos) e o 10.º (não tem limite e chegado ao topo da carreira é naquele escalão que o professor fica até se reformar).

Esse tempo mínimo é apenas um dos critérios — há também a avaliação e a formação obrigatória. Mas há mais. Há escalões com critérios específicos. Para subir ao 3.º e ao 5.º, o professor tem de ser observado na aula. E para subir ao 5.º e ao 7.º é preciso que abram vagas nesses escalões, havendo sempre mais candidatos do que lugares disponíveis.

O que o ministro propõe não é acabar com o estrangulamento, mas antes torná-lo menos apertado. O objetivo é conseguir que até ao final da legislatura seja possível que, todos os anos, a maioria dos professores possa ter vagas nesses escalões — num total de 75% e 58% dos professores, respetivamente, nos 5.º e 7.º escalões.

“Procuramos, desta forma, responder aos problemas do sistema educativo, valorizando os professores, resolvendo dificuldades antigas, garantindo mais estabilidade, menos precariedade, melhores condições salariais para todos os que estão contratados e acelerar a progressão”, afirmou o ministro. No final, frisou que o Governo o faz “com responsabilidade orçamental” e na expectativa de obter acordos.

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