É um dos bolos menos consensuais e há quem jure que, apesar de todos os anos o colocar na mesa, nunca comeu uma única fatia. Anualmente há concursos para o prémio do “melhor bolo rei” e cada um tem o seu segredo, mas desta vez não é a receita que está em causa, mas sim a despesa. De norte a sul, os autarcas portugueses gastam milhares de euros a comprar bolos reis para distribuir nos municípios. Este ano e de acordo com os contratos já publicados no Portal BASE três autarquias já fecharam contratos em cerca de 30 mil euros para comprar bolos reis para oferecer. Desde 2008, o valor chega quase aos 600 mil euros.
Dos 30 mil euros já gastos, quase 20 mil (dois terços) dizem respeito ao município de Oeiras. Sobram depois mais cerca de oito mil em Loures e dois mil na Trofa. Mas este tipo de ofertas está longe de ser inédito.
Tanto quanto é possível recuar no tempo — dado que o Portal BASE foi criado apenas em 2008 — já nessa altura as autarquias investiam nesse tipo de ofertas durante a quadra natalícia. Em Cascais, por exemplo, em 2008 foram comprados 2.200 bolos reis à pastelaria Sacolinha por 21.445,20 euros (uma média de quase 10 euros por cada bolo reis), em Oeiras a autarquia pagou em 2008 6.375 euros por 750 bolos reis (8,50 euros por cada unidade) ao Café e Pastelaria Oceânia e assinou mais dois contratos num total de 10.875 euros (5.437,50 euros cada um) com a empresa Bugifarol para a “aquisição de serviços para a produção de bolos reis para o Cabaz de Natal”. Também no Seixal a autarquia pagou 8.100 euros à pastelaria Açucena por bolos reis nesse ano.
22 autarquias gastaram 574 mil euros em bolos reis nos últimos anos
Em 56 contratos — relacionados com bolos reis — e celebrados entre 2008 e este ano as autarquias gastaram quase 600 mil euros. Foram 22 autarquias a comprar bolos reis num total de 573.097,12 euros entre 2008 e 2021 (faltando ainda parte dos contratos deste ano, já que muitos dos contratos habitualmente são publicados no portal BASE no mês seguinte à assinatura e execução).
A autarquia de Oeiras é aquela que até agora assinou, este ano, o contrato com o valor mais elevado. Foram 19.967 euros pagos à empresa Bugifarol para a “aquisição de bolos reis”. Ao Observador a autarquia esclarece que o contrato foi realizado para a aquisição de “4.100 bolos reis” que serão oferecidos nos cabazes de Natal “aos idosos funcionários e algumas instituições do município”.
“Este ano, à semelhança do ano passado, e no atual contexto pandémico, o Município de Oeiras entendeu cancelar todos os eventos de Natal, como o almoço dos idosos, o almoço dos funcionários e festa para os filhos dos funcionários. Os eventos foram cancelados, mas as ofertas não”, acrescenta a autarquia em resposta ao Observador.
De facto, desde 2008 de acordo com levantamento feito pelo Observador no Portal BASE o município de Oeiras apenas em 2017 não assinou qualquer contrato para a compra de bolos reis. Desde 2008 tem alternado entre os fornecedores de bolo rei entre a empresa Bugifarol, Café e Pastelaria Oceânica, a Sacolina, Bentos & Santos, Aliança Panificadora de Algés e, mais recentemente, a Calda Doce. O valor mais alto foi pago em 2010, à Sacolinha. Nesse ano o município pagou 33 mil euros por 4 mil bolos reis, um valor substancialmente mais elevado que o pago este ano.
A 6 de dezembro o município fechou contrato por uma maior quantidade de bolos reis (4.100) e um preço inferior (19.957 euros). Diz a autarquia que cada bolo rei teve um custo de “4,85 euros por quilo”, um valor que considera ser “bastante abaixo do praticado no mercado tradicional”.
A iniciativa de distribuição dos cabazes de Natal foi divulgada pelo município nas redes sociais onde é possível ver além dos bolos rei, também a indicação de oferta de “vinhos Villa Oeiras, Palitos do Marquês, Chocolate Quente e Estrelas de Natal”.
Para as ofertas nesta quadra, é possível saber já — através dos contratos publicados — que só nos sacos de juta utilizados para a distribuição a autarquia pagou quase tanto como em bolos reis: 16.817,50 euros à empresa IFS Publicidade e Promoções. Foram 7.750 sacos de juta que, segundo a autarquia, “correspondem aos cabazes que serão entregues”.
No que diz respeito aos cabazes de Natal — com bolo rei — Oeiras está também longe de ser caso isolado. Basta olhar, por exemplo, para o município de Baião, que no ano passado decidiu investir 31.440 euros em bolo rei e Vinho do Porto que ofereceu “às famílias mais idosas que atravessam de momento um período de isolamento e solidão particularmente difícil”. A empresa Confeitaria e Padaria Canastra Doce foi escolhida em resultado de uma consulta prévia feita também à Padaria da Avenida, tendo o contrato sido assinado a 17 de dezembro de 2020.
Ação semelhante teve o município de Vila Nova de Gaia que comprou à empresa Blendedwords cinco mil bolos reis “para oferta à população sénior do concelho”. A iniciativa custou aos cofres da autarquia 17.800 euros e foi realizada por ajuste direto.
Já o município de Sines optou por, no ano passado, investir 5.225 euros em bolos reis “para oferta aos trabalhadores da autarquia”. Ainda nos contratos já publicados para este ano — sem mais detalhes — o município da Trofa pagou 2.080 euros à Panike por fornecimento de bolos reis no final de novembro e com um prazo de execução de dois dias e em Loures a autarquia socialista contratou a Just Baked para fornecer o mesmo tipo de bolo por 8.127,90 euros.