Carlos Eduardo Reis é o coordenador do PSD na Comissão de Defesa Nacional e defende um aumento do investimento no setor, “que os portugueses entenderão porque perceberam a importância das forças armadas com a pandemia”. Mas em véspera de congresso do PSD, um dos “homens dos corredores” assume que não vai apresentar lista ao Conselho Nacional — como tem feito nos últimos congressos, reunindo uma rede de apoiantes que foi juntando ao longo dos anos e que lhe garantem uma forte influência no aparelho social-democrata.
O deputado, que foi diretor de campanha de Jorge Moreira da Silva, quer dar um sinal de unidade ao não se candidatar a nenhum órgão do PSD e assegura que o candidato derrotado “não vai colocar pedras no caminho” de Luís Montenegro.
Numa entrevista gravada antes da demissão do líder parlamentar do PSD, Paulo Mota Pinto, o deputado social-democrata entende que a decisão de mudar de líder da bancada era “legítima” e garantiu que ia qualquer que fosse a decisão — Montenegro acabou por dispensar Mota Pinto e escolher Joaquim Miranda Sarmento para liderar o grupo parlamentar.
Carlos Eduardo Reis, do PSD: “Não formarei lista ao Conselho Nacional”
Na cimeira da NATO em Madrid, António Costa confirmou que Portugal entra nas contas do reforço do posicionamento militar. O país tem condições para aumentar este esforço de presença militar no estrangeiro?
Se o Governo se comprometeu é porque à partida existem condições. O que resulta desta cimeira é um claro reforço a leste e Portugal tem que contribuir para esse contingente. Acredito que o Ministério da Defesa possa fazer esse esforço. E este é mesmo um esforço, porque as Forças Armadas estão depauperadas e com muitos trabalhos em mãos. É natural que não seja fácil manter todas as funções em Portugal e em missões internacionais. Esse reforço obriga a um esforço adicional.
Na questão financeira, António Costa tem-se queixado da incerteza dos fundos comunitários para o setor. Portugal não consegue aumentar o investimento sem fundos comunitários?
O PS tem muito essa lógica de estar permanentemente à espera de fundos comunitários para investir. O último Orçamento do Estado mostrou que não há uma aposta clara nas Forças Armadas. Depois de uma pandemia, agora num período de guerra convencional, o Orçamento ainda desceu face à proposta que foi inicialmente chumbada. O problema da falta de investimento não se resolve só com verbas europeias. O Governo tem que mostrar que aposta nos militares, porque provaram que são essenciais também na proteção civil.
E os portugueses entenderão esse aumento tendo em conta outros problemas que existem como o aumento do custo de vida?
Penso que entendem. No caso do PSD, a aposta é mais emprego e melhor emprego, não é reforçar a componente de equipamentos. Nós pedimos é que a execução dessas verbas não fique pela metade e foi por isso que aprovamos um pedido para chamar a ministra ao Parlamento e analisar a Lei da Programação Militar. O primeiro-ministro não pode é dizer que Portugal vai acompanhar os 2% de despesa no PIB até 2024 e hoje dizer uma coisa bastante diferente e admitir que não existem condições, por causa do quadro económico diferente. Os outros países também o têm e vão apostar na Segurança e Defesa. A pandemia restabeleceu a ligação dos portugueses com os militares, que mostraram ser essenciais.
Não só para a guerra.
Exatamente e é por isso que hoje há um clima que permite olhar para esse investimento de forma positiva. A prioridade do PSD é o recrutamento e a atratividade da carreira, não é diferente do que se passa noutras áreas. Temos que deixar a ideia de que investir em defesa é comprar mais armas.
A cimeira fica marcada pela abertura de portas à Finlândia e à Suécia. Este alargamento aumento o risco de um ataque da Rússia a um aliado da NATO?
A Finlândia e a Suécia tiveram uma atitude muito corajosa. Ao aderirem à NATO aumentam a capacidade de Defesa mas também o seu risco. Esta é uma iniciativa muito importante para o reforço da Aliança que atravessa um período muito complicado com esta guerra. Esta cimeira ficará na história, por se ter ultrapassado a situação com a Turquia, mas também por termos a ideia de que todos os países são diferentes e que os objetivos continuarão a ser diferentes. Ainda assim, a NATO mostra que há um sentimento coletivo que sai reforçado desta cimeira e a defesa acaba por contribuir para esta construção europeia e hoje os países da NATO na Europa estão mais preparados para uma eventual ofensiva.
E não é uma questão de provocação? Tendo em conta que o novo conceito estratégico aponta também a Rússia como o maior inimigo.
Não podemos entrar nessa conversa. A provocação é feita por Putin ao invadir um país soberano. Um país por ser maior ou por ter uma ambição imperialista não tem o direito de invadir outro, tentando redefinir fronteiras.
“Eu quero dar o meu contributo de unidade”
Em véspera do congresso do PSD, que sinal ou sinais de unidade é que espera de Luís Montenegro?
Os militantes não têm só direitos têm deveres. Enquanto dirigente e agora enquanto deputado sempre coloquei em mim essa exigência. Naturalmente que o presidente terá que dar esses sinais e terá pensado nisso. Eu quero dar o meu contributo de unidade, depois de ter apoiado Jorge Moreira da Silva [de quem foi diretor de campanha], e o que posso dar é que não encabeçarei nenhuma lista ao Conselho Nacional do PSD.
E porque é que toma essa decisão?
Por esse sinal de unidade. Se apresentasse lista também podia ser lido como contributo para o que acreditamos, não criando problemas para a direção. Ainda assim, acredito que com o quadro político difícil nos próximos dois anos, estar a tentar corporizar algum tipo de oposição dentro do Conselho Nacional não serve o partido. Para além disso, tenho inerência nesse órgão e sempre que pretender intervir assim o farei.
Não deixará de debater.
Não deixarei de discutir, mas não vou ocupar um espaço. Jorge Moreira da Silva já disse que não aceitará nenhum lugar e da forma como me envolvi na campanha, se agora voltasse a encabeçar uma lista ao Conselho Nacional, podia ser mal entendido pelos militantes e criar quase uma ideia de oposição. Não é isso que se pretende e dar este sinal é importante para o PSD e para nós, que nos sentimentos mais livres na defesa do que acreditamos.
Mas isso não o torna convidável para uma lista de Luís Montenegro? Não poderá ser o Carlos Eduardo Reis esse sinal de unidade?
Ao dizer que não encabeço a lista ao Conselho Nacional excluo-me de qualquer órgão. Darei o meu contributo no Parlamento e na Câmara de Barcelos [onde é vereador]. Entendo que a unidade se constrói todos os dias, este sinal é o de que é possível defender as nossas ideias sem materializar numa lista.
Essa saída de cena não pode dar o sinal contrário? Ao excluírem-se de convites.
Não podemos ser presos por ter cão e por não ter. Luís Montenegro venceu com uma margem expressiva que lhe deve dar espaço para constituir a equipa e pôr em prática o programa com que foi eleito. Até poderíamos eleger bastantes conselheiros nacionais mas estarmos já a fazer uma bolsa de oposição ou debate interno, entendo que não é o contributo que o partido precisa agora.
Mas se recebesse uma chamada de Montenegro para o convidar para o Conselho Nacional aceitaria?
Agradeceria o convite mas acho que não faz sentido. Há um conjunto alargado de pessoas que estiveram com Montenegro e que devem fazer parte desses órgãos. Acredito que Montenegro já fez alguns contactos para conseguir a unidade e esses sinais são importantes, mas não nos obrigam a estar num órgão. Não é por não estarmos num órgão que estamos a ser cínicos. No passado eu entendi que a unidade se construía todos os dias num congresso com Rio e Santana e apresentei uma lista ao Conselho Nacional. Aqui acho o mesmo, mas estar a alimentar…..
A questão é a materialização, que por norma se faz com o candidato vencedor a convidar o derrotado para algum lugar e podem existir nomes ligados a Jorge Moreira da Silva que foram convidados
Não faço ideia, isso tem que perguntar a Luís Montenegro. Eu e o Jorge Moreira da Silva se integrássemos uma lista de Montenegro e se na semana a seguir estivéssemos a conspirar contra ele, teríamos dado essa unidade durante o fim-de-semana e depois estaríamos a atrapalhar a vida durante o mandato. Não acredito nisso.
Essa opinião parte de experiências anteriores?
Parte. Um conjunto de militantes integraram listas de suposta unidade e depois não contribuíram nada para unir. Prefiro não integrar listas e contribuir com o trabalho diário.
É uma referência a Paulo Rangel?
De todo, não estou a pensar em ninguém em especial, mas isso aconteceu, é sabido que os mandatos de Rui Rio não foram pacíficos sob o ponto de vista interno. Eu quero que o meu ato seja entendido como um contributo para a unidade. Há muitos companheiros que não concordam com isto, que querem manter o seu espaço de intervenção
E algum deles poderá integrar essas listas de Luís Montenegro ou liderar uma nova lista?
Não falo por ninguém, mas penso que não vai acontecer. Eu não saio do Conselho Nacional para promover outras listas. É natural que os que confiam em nós de congresso para a congresso agora escolham outras opções mas isso nunca será promovido por mim e duvido que seja promovido pelo Jorge Moreira da Silva.
“São dois anos muito difíceis, seja qual for o líder”
Vai intervir no congresso?
Se a dinâmica do congresso merecer. Se entender que a explicação que tenho dado não chega, tentarei explicar que temos todos que dar um contributo para a unidade e que a direção do partido tem que ter condições para fazer estes dois anos. Estes anos vão ser muito difíceis, que culminam com umas eleições europeias que são um teste à liderança do partido.
Decisivo?
Em política, a dois anos de distância não podemos dizer que algo é decisivo. Vamos avaliando com o tempo as responsabilidades políticas que são sempre assacadas a quem está na direção. Quero é que o PSD ganhe as europeias, não quero estar a pensar num cenário que não seja positivo. São dois anos muito difíceis, seja qual for o líder
Já referiu que continuará a fazer o seu papel como deputado. No grupo parlamentar, Paulo Mota Pinto deve colocar o lugar à disposição ou é capaz de garantir essa unidade entre a bancada e a direção?
Não seria elegante estar a dar a minha opinião sobre a liderança. Acho que há momentos para tratar das situações e a seguir ao congresso, depois de ouvir o líder do partido, será o momento para tratar da liderança parlamentar. Os deputados são responsáveis, respeitam os resultados eleitorais e a liderança de Luis Montenegro, que tem um mandato para decidir se quer trabalhar com esta direção ou alterar alguma coisa, não vejo isso como um drama.
Tem essa legitimidade….
Acho que está legitimado para isso e Paulo Mota Pinto é uma pessoa de grande categoria, que tem uma confiança muito forte dos deputados e se entender continuar tem o meu apoio e se a liderança do partido entender apoiá-lo, ficarei contente.
Mas imagine que Montenegro queria dar um sinal de unidade utilizando a bancada e convidava o Carlos Eduardo Reis, que foi diretor de campanha de Moreira da Silva, para líder parlamentar
Não acho que se ponha essa questão. Não estava à espera disso. Há um conjunto de deputados com muita qualidade que podem fazer esse lugar com muita competência. Neste momento não tenho espaço político para o fazer. Sou vereador em Barcelos, coordeno aqui a área da defesa, estou também na CPLP, não me parece que seja a altura ideal para pensar numa coisa dessas. O grupo parlamentar tem presidente eleito, por uma grande maioria e estou certo de que o presidente fará a sua avaliação e os deputados entenderão a decisão que for tomada, que será sempre sensível.
Acha que existe essa abertura da bancada para essa unidade? As bancadas herdadas são tradicionalmente difíceis
Estou a dar o meu contributo. O Luís Montenegro teve apoio de muita gente da bancada e até por este sinal que estamos a dar de que este é um tempo de unidade e de construir o espaço para o presidente poder exercer o mandato.
Que capital é que Jorge Moreira da Silva tem depois desta vitória por larga margem de Montenegro?
Não sou um oráculo. O Jorge Moreira da Silva foi candidato com um programa muito consistente. O capital político de Moreira da Silva está no programa. Basta lê-lo para perceber. O maior elogio que posso fazer é que é alguém que está preparado para ser primeiro-ministro amanhã. Estou convencido que vai utilizar todo esse capital do seu programa também para ajudar Luís Montenegro a ser um presidente melhor e não deve ser interpretado de forma negativa não querer integrar nenhuma lista. Pelos princípios que o regem, ele não colocará pedras no caminho de Luís Montenegro. Nos sítios por onde Jorge Moreira da Silva passou, os militantes gostaram muito dele.
É o inicio de uma caminhada.
Eu tenho dificuldade em dizer no início da entrevista que não ia encabeçar uma lista ao Conselho Nacional, e que esse era o meu contributo para a unidade, e agora estar a alimentar uma narrativa de um caminho para a frente. Quero que Luís Montenegro tenha sucesso porque esse é o sucesso do PSD
Esteve na Vichysoisse antes das eleições. Na altura disse que Montenegro não estaria preparado para governar e que foi o autor de um ato de sabotagem interna. Acredita nesta liderança, pegando no mote de Montenegro?
Ao contrário de outros companheiros de partido eu respeito o resultado dos atos eleitorais. Respeitar esse resultado é respeitar os companheiros de partido. Montenegro estará preparado porque uma larga margem de pessoas que votaram entendem que ele está preparado. Tenho que dar o meu contributo para reforçar essa ideia. Em defesa da honra, posso afiança que sim.