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NUNO VEIGA/LUSA

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Chover, choveu, mas a seca continua. 12 gráficos para perceber o problema

Precisávamos de uma tempestade como a Ana todas as semanas durante dois meses para podermos encher as albufeiras e sair da situação de seca extrema em que se encontra o país. O que fazer entretanto?

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A tempestade Ana veio e trouxe com ela chuvas intensas. Nesses dias, a chuva no norte e centro do país aproximou-se do que seria normal num mês inteiro de dezembro e pode até ter tornado um pouco menos grave a situação de seca nessas regiões. Mas, no Alentejo e no Algarve, a situação continua tão preocupante como antes. Pior mesmo é saber que pode não voltar a chover até ao final do ano.

Portugal encontra-se em seca meteorológica desde abril, ou seja, desde esse mês que chove abaixo da média. Novembro manteve esta tendência e foi classificado como um mês muito seco, tendo chovido, em média, cerca de 50% abaixo do que seria esperado em Portugal continental, indicou o Instituto Português do Mar e da Atmosfera no boletim mensal. Nalgumas regiões — grande parte da região Norte, nalguns locais do Centro, no distrito de Setúbal e no Algarve — a precipitação esteve mesmo abaixo de 25% da média entre 1971 e 2000.

Chove abaixo da média e muito abaixo do que seria ideal para manter a produção agrícola normal ou para assegurar a produção hidroelétrica em muitas barragens. Para as populações tem havido água, se não das fontes originais, pelo menos de fontes alternativas — a albufeira de Fagilde e as pequenas povoações cujo abastecimento se baseia em águas subterrâneas têm recebido água em auto-tanques. Mas a água para a agricultura escasseia e a produção hidroeléctrica está parada em algumas centrais.

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A solução para a seca seria a chuva, mas quanto a isso não há nada que se possa fazer. Neste momento, a melhor solução é gerir os recursos existentes o melhor possível e considerando o pior dos cenários. “Não sabemos quando vai chover. Toda a gestão deve ser feita considerando que 2018 também será um ano de seca”, disse ao Observador Francisco Ferreira, presidente da associação ambientalista Zero. “Se tivéssemos tido esta perspetiva em abril, agora não estaríamos tão aflitos.”

Se continuar sem chover, a reserva de água chega para ano e meio

O abastecimento para consumo humano é prioritário e a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) garante que há água disponível para cerca de ano e meio, mas enquanto se mantiver o período de seca os níveis de todas as bacias hidrográficas do país vão continuar a baixar. Em novembro de 2017, todas as bacias, exceto a do Arade, apresentavam níveis inferiores às médias de armazenamento nos meses de novembro entre 1990 e 2016.

“Nas origens de água superficiais para consumo humano são normalmente garantidas reservas que permitem ultrapassar períodos relativamente longos de seca, sendo normal reservas de cerca de ano e meio”, respondeu a APA ao Observador. Falta saber se, caso 2018 seja tão seco como 2017, a água continuará a chegar para ano e meio. “Caso não haja reposição dos volumes armazenados e os existentes forem sendo utilizados nos usos prioritários, é natural que as reservas vão baixando”, respondeu a APA.

Para que Portugal pudesse sair da situação de seca e para que as albufeiras pudessem encher seria preciso pelo menos um mês de chuva intensa e outro de precipitação normal para o mês em questão, disse ao Observador Vanda Pires, meteorologista no Instituto Português do Mar e da Atmosfera. “O ideal seria chover dois meses consecutivamente acima do normal.” Isto significa que teria de chover todos os dias ou, pelo menos, três ou quatro dias em cada semana.

Se numa semana chover tanto ou mais do que era suposto chover num mês e depois passarmos mais três ou quatro semanas sem chuva, não se vai amenizar a situação de seca extrema em que se encontra o país, esclareceu Vanda Pires. A meteorologista acrescentou que neste momento não tem indicação de precipitação até ao final do mês, mas também explicou que a situação meteorológica está muito instável e que pode mudar a qualquer momento.

O que fazer então? Ainda que o consumo urbano represente uma pequena percentagem do uso da água a nível nacional — cerca de 10% —, há margem para melhorar a utilização. As perdas na rede, que resultam sobretudo de ruturas, ainda representam cerca de 30% a nível nacional. Um maior investimento na renovação das infraestruturas de abastecimento e a diminuição da pressão na rede pode ajudar a compensar esta situação.

A Junta de Freguesia das Avenidas Novas disse ao Observador que “irá ser implementado na freguesia um sistema de ‘waterbeep’ que consiste num alerta quando ocorre uma fuga na via pública”. O “waterbeep” é um serviço disponibilizado pela EPAL (Empresa Portuguesa das Águas Livres) para fins domésticos, comerciais ou industriais. Algumas modalidades, como aquela a que aderiu a Junta de Freguesia da Misericórdia nos contadores de jardins e caldeiras, permitem monitorizar os consumos a cada 15 minutos e emitem alertas sempre que há um desvio do padrão de consumo ou um consumo excessivo.

Outro dos problemas é a utilização de água tratada para fins menos nobres, como a rega dos jardins, a lavagem das ruas ou de viaturas. Pelo que foi possível apurar dos dados da Entidade Reguladora dos Serviços de Água e Resíduos (ERSAR), referentes ao ano de 2016, cerca de 40% da água tratada era faturada a entidades que não famílias ou particulares, logo teriam um fim menos nobre do que o consumo humano.

Quase metade da água tratada para uso humano é gasta em regas ou para lavar carros e ruas

A água reciclada pode ser uma solução

Quando a água utilizada em contexto urbano não requer uma qualidade tão grande como aquela que é exigida para o consumo humano existe uma alternativa: a utilização de águas residuais tratadas. “Usamos pouco mais do 1% de águas residuais tratadas, quando a União Europeia recomenda 6%”, disse ao Observador Carla Graça, vice-presidente da associação ambientalista Zero. “A água está disponível, mas ainda não existe regulamento, o que pode justificar o receio.” A reutilização da água residual de origem urbana tratada é uma das medidas que o Governo prevê vir a implementar para combater os efeitos da seca.

Neste momento a Câmara Municipal de Lisboa (CML) já recorre a águas residuais tratadas com origem nas estações de tratamento de águas residuais (ETAR) de Alcântara e Chelas para as lavagens na cidade. Mas fonte do município disse ao Observador que não conhecia, nem a autarquia controlava as práticas das freguesias em relação ao uso da água, nomeadamente para lavagem das ruas. A Junta de Freguesia da Penha de França disse ao Observador que também faz uso de água reciclada. “A rega dos espaços verdes foi suspensa em outubro, tendo sido retomada – apenas nos locais onde é estritamente necessária – com água reciclada fornecida pela ETAR de Chelas.”

O Observador contactou as juntas de freguesia da cidade de Lisboa com o objetivo de perceber que água usam para a lavagem das ruas e para a rega e com que frequência o fazem. Regra geral, as freguesias fazem uso de água tratada, mas perante o cenário de seca muitas delas reduziram ou cancelaram a utilização de água para esses fins. A lavagem das ruas continua a ser feita sempre que seja necessário garantir a salubridade dos locais e as nas regas é usada a quantidade mínima de água para garantir a sobrevivência das plantas.

Fonte da Junta de Freguesia da Misericórdia, que inclui algumas das zonas mais turísticas e movimentadas da cidade, como o Bairro Alto, a Bica e o Cais do Sodré, disse ao Observador que as lavagens terão de se manter nestas zonas porque “é a única forma eficaz de eliminar a sujidade provocada pelos utilizadores dos restaurantes e bares”. Ainda assim, acedeu ao pedido dos moradores do Bairro Alto e acabou com a lavagem a meio da semana, mantendo a de domingo. Nos locais onde a sujidade é menor, a junta reforçou o serviço de varredura.

Outras juntas de freguesia falam não só na redução da frequência de lavagem, como também da utilização de fontes de água alternativas. “Estamos disponíveis, e já partilhámos essa disponibilidade com a Câmara Municipal, para integrar o projeto-piloto de utilização de águas recicladas da ETAR do Vale de Alcântara (que se situa na freguesia) injetando-as através da rede que alimenta as bocas de incêndio, quer para as lavagens das ruas quer para os sistemas de rega”, respondeu ao Observador a Junta de Freguesia de Campo de Ourique. A Junta de Freguesia de Benfica disse que também se quer “associar a este projeto mal esteja disponível”. A Junta de Freguesia das Avenidas Novas “está recetiva à utilização de água reciclada proveniente da ETAR, quer para rega quer para lavagem de pavimentos, pelo que tenciona, muito em breve, manifestar esse seu interesse à Câmara Municipal de Lisboa (CML) e ETAR”.

Há outras freguesias a procurar outras alternativas, como os furos. A Junta de Freguesia de Santa Clara disse estar “a proceder à abertura de poços para rega em três jardins de maior dimensão: Campo das Amoreiras, Maria Ponces de Carvalho e Jardim de Santa Clara”. Já para a Junta de Freguesia de Belém a queixa é a dificuldade em conseguir autorização da Câmara para esses furos. “A Junta de Freguesia de Belém está desde há quatro anos a aguardar que a CML colabore para identificação dos constrangimentos da perfuração do subsolo para se criarem furos hertzianos para estes fins. A CML na sua mais recente versão diz que prefere utilizar água reutilizada a furos, mas ficou de ponderar a questão.”

Algumas juntas de freguesia, além de reduzirem a rega e minimizarem as perdas neste processo, ponderam também outras alternativas para poupar água, como a utilização de plantas mais resistentes à seca. “Precavendo o futuro, estamos a mudar as plantas por espécies autóctones com menores necessidades hídricas e a automatizar os sistemas de rega, para que a utilização da água seja feita de forma mais sustentável e racional”, disse ao Observador a Junta de Freguesia de Benfica.

Na requalificação dos jardins da freguesia, a Junta de Freguesia da Penha de França apostou na renovação do sistema de rega para o tornar mais eficaz e económico. Já os novos espaços verdes foram pensados para consumirem menos água, com “o revestimento vegetal de prado sequeiro, a utilização de casca de carvalho, de estilha de madeira e de plantas mais resistentes”.

Com esta falta de água, o preço vai subir para o consumidor final?

A possibilidade de o preço da água aumentar, em resposta à seca, já foi admitida por responsáveis políticos, sobretudo a nível do Governo. O ministro do Ambiente, Matos Fernandes, admitiu esse cenário, não em consequência direta da seca, mas sim como uma forma de incentivar a eficiência hídrica. A “adequação dos sistemas tarifários com critérios que incentivem o uso eficiente da água” é uma das recomendações da campanha Feche a Torneira.

A decisão de aumentar a água pertence no essencial às câmaras. A Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) pode emitir recomendações sobre as tarifas da água e já o tem feito com a indicação genérica de que os preços cobrados devem cobrir os custos do serviço. Mas se isso já não acontecia em muitos dos municípios portugueses antes da seca — criando um défice tarifário na água —, agora ainda menos, sobretudo nas autarquias que têm de recorrer a autotanques para abastecer as populações.

Governo admite subida do preço da água

A agricultura é a atividade mais penalizada com a seca

A água para consumo humano pode ser o uso prioritário das albufeiras, mas é a agricultura que mais água consome — cerca de 75%, contra 10% para consumo humano e 15% para a produção de energia, segundo Carla Graça, vice-presidente da associação ambientalista Zero.

A seca deste ano já teve impacto nas culturas e é garantido que em 2018 haverá menos produção de cerejas, amêndoas e azeitonas. Mas se não chover o suficiente para abastecer as albufeiras, vai faltar o milho e o arroz agulha nacional. Se não houver água para assegurar a campanha agrícola completa, estes cereais não chegam sequer a ser semeados.

Os efeitos da seca: pinhões a 100 euros, Natal sem queijo da Serra e um verão sem cerejas

“Os agricultores são as principais vítimas da seca”, afirmou ao Observador Gonçalo Tristão, representante da Associação de Beneficiários do Lucefecit, que gere uma albufeira com o mesmo nome. “Mas também são os que melhor se adaptam.” Os agricultores dependentes da albufeira do Lucefecit já estão habituados a anos de escassez de água, como 2017. “Acontece a cada cinco ou seis anos não termos água suficiente.” Por isso, os agricultores já estão preparados para semear uma área menor ou para mudar o tipo de culturas — podem, por exemplo, apostar mais nas culturas de inverno, que requerem menos rega.

Carla Graça, vice-presidente da Zero, admitiu que os agricultores estão disponíveis para alterar as práticas e torná-las mais sustentáveis, mas para isso precisam de tecnologia, informação e incentivos. A reconversão dos sistemas agrícolas, a adaptação das culturas às condições meteorológicas e ambientais e a educação dos agricultores são os pontos-chave apontados pela ambientalista.

As associações que fazem a gestão das albufeiras para fins agrícolas não escondem o impacto que a falta de água terá para os agricultores, quer pela redução da produção, resultando em menores receitas, quer pelo aumento do custo da água ou dos custos de produção em geral.

“Os agricultores são as principais vítimas da seca. Mas também são os que melhor se adaptam.”
Gonçalo Tristão, representante da Associação de Beneficiários do Lucefecit

A falta de água nas albufeiras de Magos, Maranhão e Montargil, que serve concelhos dos distritos de Portalegre e Santarém, “tem impactos diretos sobre cerca de 19 mil hectares de culturas regadas, sobre duas importantes indústrias de transformação de tomate e graves danos ecológicos e ambientais”, disse ao Observador José Núncio, diretor delegado da Associação de Regantes e Beneficiários do Vale de Sorraia, que gere a água nestas albufeiras. Com os agricultores já a sofrerem os efeitos da seca e das perdas na produção, o diretor delegado disse que não se prevê que nesta campanha o custo da água sofra um aumento.

A possibilidade de as albufeiras poderem deixar de fornecer água aos agricultores deixa as associações muito preocupadas. “A impossibilidade de fornecer água para rega no perímetro seria um cenário catastrófico, na medida que inviabilizaria a realização de cerca de três mil hectares de culturas anuais e sete mil hectares de culturas permanentes”, disse Maria Amélia Sobral, em nome da Associação de Beneficiários da Obra de Rega de Odivelas (ABORO), cuja albufeira abastece Ferreira do Alentejo, Grândola e Alcácer do Sal. “As consequências serão devastadoras na economia e emprego da região, não só a curto, mas também a médio e longo prazo.”

Desde que chova minimamente este inverno, a albufeira de Idanha-a-Nova terá água suficiente para uma campanha de rega normal em 2018, disse Diogo Botelho, representante da Associação de Regantes e Beneficiários de Idanha-a-Nova, que gere a água naquela albufeira. Mas se o inverno for tão seco como tem sido o ano, a rega será limitada. Tudo o que Diogo Botelho pode prever é que se a atividade agrícola de regadio for reduzida quase a zeros, haverá “perdas consideráveis em culturas permanentes e um aumento de custos muito elevado para a produção animal”. Para uma região muito dependente da agricultura e pecuária, esta quebra de produção pode ter impacto nos empregos.

Das 27 albufeiras cujo uso principal são a irrigação com fins agrícolas, cinco estão abaixo dos 10% da capacidade total e apenas nove estão acima dos 45%. Aumentar a capacidade das albufeiras reterem a (pouca) água da chuva pode ser uma das formas de fazer frente aos períodos de seca no futuro, por isso algumas das medidas do Governo incluem: a construção de novas albufeiras e o aumento da capacidade de armazenamento das albufeiras existentes. Mas, mesmo com medidas adicionais, o Governo propõe-se definir “um plano de contingência e mapear as fontes alternativas de abastecimento de água em casos de emergência”, conforme noticiou o jornal Público.

Outra das medidas previstas pelo Governo é a interligação entre albufeiras, de forma a que as de maior capacidade possam fornecer água às que têm menor armazenamento ou cujos níveis se encontram mais baixos. Esta é uma das medidas que interessa à Associação de Beneficiários do Lucefecit. Como estão a apenas dois ou três quilómetros do lago do Alqueva, poderia existir uma ligação direta de abastecimento aos agricultores em caso de necessidade, referiu Gonçalo Tristão.

A compra de água à Empresa de Desenvolvimento e Infra-estruturas do Alqueva (EDIA), que gere a água desta albufeira, é uma das possibilidades para algumas associações de agricultores, como a ABORO. O problema é que o recurso à água da albufeira do Alqueva implica um grande aumento dos custos para os produtores, “podendo haver situações em que mais que duplica o preço”, disse Maria Amélia Sobral.

A albufeira do Alqueva já tem neste momento ligação a outras albufeiras, como as albufeiras da Vigia, Monte Novo, Alvito, Roxo e Enxoé. A EDIA, que gere a água da albufeira, assegurou ao Observador que o Alqueva tem “autonomia para mais três anos com precipitações idênticas às dos últimos três”. É por isso que, neste momento, nem sequer pensam na possibilidade de a albufeira deixar de ter água suficiente.

“O Alqueva é a maior reserva de água da Península Ibérica. Foi concebida para ser uma reserva estratégica de água, com autonomia para quatro anos consecutivos de seca extrema”, respondeu ao Observador a EDIA. “Se algum dia esse cenário vier a acontecer, fica a pergunta: como estará então o resto da Península Ibérica?”

As restantes albufeiras estão longe da capacidade ou autonomia da albufeira do Alqueva. A albufeira do Lucefecit, por exemplo, é uma barragem de regulação anual. Logo, precisa que chova todos os anos para assegurar o armazenamento de água suficiente para a campanha agrícola. A vantagem, segundo Gonçalo Tristão, é que, embora a albufeira seja pequena (pouca capacidade de armazenamento), tem uma boa bacia hidrográfica. Isto quer dizer que toda a água que caia e escorra pela Serra de Oça tem uma boa probabilidade de ir parar à albufeira. Em conclusão: precisa chover, mas não muito.

Já na albufeira de Minutos, por exemplo, a perspetiva é diferente: como a bacia hidrográfica (que recolhe água para a linha de água e albufeira) é muito pequena, precisa de chover muito para que a albufeira retome os níveis de armazenamento ideais. “Precisamos de, pelo menos, 10 milhões de metros cúbicos, que é aquilo que gastamos por campanha”, disse ao Observador João Mamede, técnico responsável pela Associação de Beneficiários da Barragem de Minutos.

A produção de energia nas barragens caiu 40%

Na lista das prioridades para a utilização das albufeiras, a produção de energia aparece em último lugar, depois do consumo humano e do uso para fins agrícolas. Esta gestão diferenciada nas albufeiras com utilização mista é feita pela EDP – Energias de Portugal, em articulação com a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), mesmo em anos com precipitação normal.

“A exploração das centrais hidroelétricas no período de verão já é condicionada pelos diversos usos, nomeadamente consumo humano e regadio. No entanto, devido às condições meteorológicas previstas para este ano, a EDP começou mais cedo, ainda no final da primavera, a efetuar uma gestão mais prudente das albufeiras, limitando a sua exploração de modo a manter reservas de água para outros usos e contribuindo para minimizar os efeitos da seca no país”, respondeu a EDP ao Observador.

Todas as albufeiras sob a gestão da EDP encontram-se com alguma forma de condicionamento. As limitações são mais significativas nas albufeiras de Guilhofrei, Carrapatelo e Aguieira, pelas necessidades para consumo humano. Estando as centrais hidroelétricas de Vilar-Tabuaço e Santa Luzia, que representam 1,2% da produção hidroeléctrica da empresa, totalmente paradas, pelo mesmo motivo. Para as albufeiras da Aguieira/Raiva e Belver, a EDP e a APA chegaram a acordo sobre a melhor forma de garantir o regadio nas zonas de influência destas albufeiras.

A produção de energia com base na água acumulada nas albufeiras caiu 20,8% no mês de novembro em relação ao mesmo período de 2016, segundo o site da REN (Rede Elétrica Nacional). Mas a quebra na produção de energia nas barragens de fio de água é ainda maior — menos 57,5% do que em novembro de 2016. Francisco Ferreira, presidente da Zero, justificou este resultado com os baixos níveis nos caudais, visto que as barragens de fio de água praticamente não têm armazenamento de água.

Com a diminuição na produção de energia neste tipo de barragem, a EDP tem recorrido às hidroelétricas com instalações de bombagem. Nestas barragens, a água que cai e produz energia é bombeada de volta à origem para voltar a ser usada na produção de energia, “reforçando a gestão da cota da albufeira”, segundo a EDP. “Esta característica representa uma clara mais-valia em momentos como o que o país vive atualmente, permitindo à EDP produzir eletricidade mesmo que não chova e garantindo a reutilização da água.” Segundo o site da REN, as hidroelétricas com esta capacidade produziram só no mês de novembro mais 26,5% do que em igual período no ano passado.

Ainda assim, a EDP disse ao Observador que a produção de energia pelas centrais hidroelétricas caiu quase 40% quando comparada com um período idêntico em 2016. Mas a quebra acumulada nos 11 meses de 2017, quando comparada com um período idêntico de 2016, é de 57,8%, segundo a REN. A associação Zero alertou, em comunicado, que a quebra de produção desta forma de energia renovável fez com que se aumentasse a produção de energia com recurso a combustíveis fósseis, como carvão e gás natural. A consequência imediata é um aumento da emissão de gases com efeito de estufa e consequente impacto nas alterações climáticas.

A produção hidroelétrica, ainda que de fonte renovável, não é, para Francisco Ferreira, a melhor aposta para a produção de energia, porque é suscetível aos problemas causados pela seca e alterações climáticas. “Se queremos um país todo renovável, não podemos ter esta ameaça.”

O presidente da Zero defende uma maior aposta noutras energias renováveis, sobretudo na energia solar que está ainda subaproveitada. A produção de energia com base na energia solar representa é a que tem mais potencial para crescer, mas para isso o Estado tem de facilitar e descentralizar este tipo de produção, disse Francisco Ferreira. Em relação à energia eólica, que já tem uma boa expressão na produção nacional, o ambientalista defende que as máquinas podem ser substituídas por outras mais eficientes.

Se as barragens estão a produzir menos energia, o preço da eletricidade vai aumentar?

A seca nunca é boa para os custos de produção de eletricidade. Mas custo não é necessariamente sinónimo de preço, sobretudo num mercado regulado e muito complexo como é o da eletricidade.

As energias renováveis, sobretudo as que dependem da água e do vento, recorrem a tecnologias que conseguem produzir a preços mais baixos porque não têm custos marginais, ou seja, não precisam de comprar combustível para produzir. Mas a queda acentuada das renováveis no mix de produção português, quase 60% até novembro, e considerando que Espanha vive condições climatéricas semelhantes, já provocou um aumento nos preços do mercado grossista da Península Ibérica. Segundo a EDP, até setembro deste ano, o preço do mercado diário espanhol subiu quase 50% e em dezembro o preço médio para Portugal já ultrapassou os 60 euros por megawatt por hora. Este é o mercado em que as elétricas vão vender e comprar a eletricidade que abastece o cliente final, mas não é onde se definem os preços de venda ao consumidor.

O impacto da seca e da subida dos custos de produção de eletricidade vai depender muito do tempo que esta situação se verificar, mas também das condições contratuais que fixam o preço de venda de cada central. Os produtores que funcionam em regime de mercado e têm capacidade para produzir, neste caso as centrais térmicas, vão ganhar mais, mas também vão ter mais custos.

Mas os produtores que têm uma remuneração ou receita garantida, vão ficar na mesma. Se ganharem mais em regime de mercado vão receber menos em subsídios e compensações financiadas pelas tarifas de eletricidade, porque o sobrecusto desta produção face às condições de mercado é menor. O presidente da EDP, António Mexia, já explicou que a empresa vai ter menos receitas e mais custos, mas sublinhou que isso não significa que os consumidores vão pagar mais.

Nos últimos dois meses, o regulador reviu em alta a estimativa dos preços para o mercado grossista por causa dos efeitos da seca, mas manteve a variação das tarifas para o próximo ano que vão descer 0,2%.

Quanta água gasta diariamente e quanto pode poupar?

Fechar a torneira sempre que a água não está a ser utilizada, usar equipamentos com menores consumos, reutilizar toda a água que puder ser reutilizada, são algumas das recomendações comuns em relação ao consumo doméstico. Mas quanto litros poupa se realmente respeitar as medidas recomendadas? O Observador compilou algumas recomendações da campanha Feche a Torneira na seguinte infografia.

Correção: Junta de Freguesia da Penha de França, em vez de Junta de Freguesia de Chelas.

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