Quando o assunto é o french girl style (“estilo da rapariga francesa”, em tradução livre), Jane Birkin será sempre um dos seus símbolos inquestionáveis, a par de Brigitte Bardot, Catherine Deneuve e Françoise Hardy. Mas à nossa heroína são atribuídas virtudes que roçariam a divindade numa bíblia do estilo. Birkin foi a autora do seu próprio código de elegância paradoxal, tão simples e tão sofisticado, tão descomplicado e tão difícil de replicar. Morreu este domingo, aos 76 anos.
Nessa mesma bíblia, não haveria espaço suficiente num versículo para dedicar à Birkin da Hermès. Uma das mais famosas carteiras do mundo, a criação com estatuto de culto da casa de moda francesa nasceu de um encontro casual da musa inglesa com Jean-Louis Dumas, bisneto do fundador da Hermès, a bordo de um avião da Air France, em 1983. Neste artigo do Observador, contamos-lhe a origem da famosa peça.
Antes de inspirar a criação do objeto de luxo, a atriz carregava notoriamente no antebraço uma cesta de verga que comprou algures na década de 1960 em Castro Marim, no Algarve. É a epítome do estilo despretensioso de Birkin, que pegava nas coisas mais simples e lhes atribuía ares de sofisticação celestial. E teve um final digno de cinema quando o realizador Jacques Doillon, pai da terceira filha de Jane, o atropelou intencionalmente.
Nessa gloriosa bíblia de estilo, onde nos surge como deusa toda-poderosa, o que mais espanta os seus discípulos é a simplicidade de todas as coisas. Calças de ganga, vestidos curtos, camisas brancas, cabelo solto. Nada é inatingível — tudo é perfeitamente simples. O que fez sempre a diferença foi aquele ingrediente inqualificável que nasce com um punhado exclusivo de cidadãos a que chamam de it factor. E Birkin tinha-o de sobra.
Agora que a elevámos a um pódio divino, está na altura de desconstruirmos o estilo de Jane Birkin num guia em 5 pontos. Eis as peças — chamemos-lhes capítulos — na bíblia de estilo da musa do french girl style.
A cesta de verga
Pouco se fala sobre este detalhe, mas a cesta de verga que Jane Birkin transportava para todo o lado durante a década de 1970 foi comprada em Castro Marim, no Algarve. De Castro Marim para o mundo, a cesta tradicional dos pescadores ficou eternizada nas ruas de Paris, de Londres e até na passadeira vermelha do Festival de Cinema de Cannes de 1974, onde surgiu a fazer conjunto com um mini vestido de veludo cor-de-rosa. Cesta num braço e Serge Gainsbourg no outro.
Os minivestidos
Na estreia parisiense de “Slogan”, filme onde contracenou com Serge Gainsbourg, Jane Birkin queimou muitas retinas (no melhor sentido possível) ao aparecer na passadeira vermelha com um minivestido semitransparente, sem soutien e a segurar a saudosa cesta de Castro Marim e calçada com sapatos mary jane. O cabelo ia solto, como de costume. “Não sabia que [o vestido] era tão transparente. Foi o efeito do flash na câmara do fotógrafo”, disse uma com humor vez à Vogue francesa. “Se soubesse, não tinha posto cuecas.” É um dos exemplares mais icónicos de uma era em que os minivestidos foram uma das suas peças-chave.
As calças de ganga
A acompanhar T-shirts ou camisas brancas, o guarda-roupa de Birkin estava bem munido de calças de ganga de corte largo, muitas vezes com um cinto. A partir dos anos 80, os jeans masculinos tornaram-se uniforme para a artista, muitas vezes combinados com camisolas de caxemira e blazers comprados na secção de homem.
A franja “despenteada”
“As raparigas francesas ainda têm a cultura de Jane Birkin”, disse uma vez Emanuelle Alt, diretora da Vogue francesa. “Podes sair assim, sem maquilhagem, sem arranjar o cabelo.” Um dos cortes mais admirados no universo da beleza, falar sobre o estilo de Jane Birkin é, irremediavelmente, falar sobre a franja comprida e desempoeirada, quase a bater nas pestanas, que marcou as décadas de 1960 e 1970, a época áurea da sua influência na moda. Usava o cabelo solto e comprido, com ares de pouca manutenção, como quem sai de casa sem pegar num secador.
A camisa branca
A clássica camisa branca é uma das peças-chave no look de Jane Birkin, normalmente acompanhada pelas anteriormente mencionadas calças de ganga. No filme “La Piscine”, realizado por Alain Delon, vestiu uma das suas mais icónicas camisas brancas, semitransparente no caso, com os bolsos a servirem de como único escudo de modéstia.