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O ministro da Defesa russo, Sergei Shoigu, parecia, deste modo, confirmar o cenário que se estava a traçar há já alguns dias: a saída das forças da Rússia da cidade de Kherson
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O ministro da Defesa russo, Sergei Shoigu, parecia, deste modo, confirmar o cenário que se estava a traçar há já alguns dias: a saída das forças da Rússia da cidade de Kherson

Getty Images

O ministro da Defesa russo, Sergei Shoigu, parecia, deste modo, confirmar o cenário que se estava a traçar há já alguns dias: a saída das forças da Rússia da cidade de Kherson

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Depois de Kiev e Kharkiv, Kherson é a terceira "derrota tremenda" de Putin. Mas porque pede Zelensky contenção?

Rússia "não tomou uma decisão fácil" ao decidir retirar as tropas da cidade de Kherson. "Erro de cálculo clamoroso", diz o major-general Arnaut Moreira ao Observador. Kiev pede contenção.

K é a letra que une três dos principais momentos da guerra na Ucrânia. No final de março de 2022, os russos abandonaram Kiev. Seis meses depois, saíram de Kharkiv. Esta quarta-feira, ter-se-ão retirado da cidade de Kherson, mais concretamente na margem direita do rio Dnipro. Desde o início da invasão, estas foram as grandes derrotas militares do Kremlin, mas este último revés está a ser encarado como “a maior perda geopolítica desde o momento do colapso da União Soviética”.

“Comecem a retirar as tropas, tomem todas as medidas para assegurar a retirada segura do pessoal, dos veículos e das tropas para o outro lado do rio Dnipro”, disse, esta quarta-feira, o ministro da Defesa russo, Sergei Shoigu, parecendo, deste modo, confirmar o cenário que se estava a traçar há já alguns dias: a saída das forças da Rússia da cidade de Kherson, uma das principais conquistas de Moscovo desde que ocupou a Ucrânia em fevereiro.

Após uma “análise da atual situação no terreno”, a decisão da Rússia “não foi nada fácil”, reconheceu Sergei Surovikin, comandante-geral das tropas russas na Ucrânia, no vídeo do momento em que a retirada é anunciada. No entanto, o responsável militar destaca que a mesma permitirá “salvar a vida” das tropas russas e preservar a sua “prontidão para combate”. Para além disso, fará com que as tropas de Moscovo “sejam libertadas para atividades de natureza ofensiva em outras direções da operação militar especial”.

“Concordo com as suas conclusões”, anuiu Sergei Shoigu. “Assegure-se que toda a população civil sai”, ordenou igualmente o ministro da Defesa russo, algo que Sergei Surovikin se comprometeu a fazer.

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Esta decisão, transmitida na televisão e difundida nas redes sociais, significa a perda da cidade e do centro administrativo do oblast, que continua parcialmente sob controlo russo, à exceção da parte mais ocidental.

“Derrota tremenda” da Rússia — que do ponto de vista militar já se adivinhava

Kherson era a cidade que alguns dirigentes próximos de Vladimir Putin garantiam que iria integrar “para sempre” a Federação Russa. Por exemplo, o deputado do mesmo partido do Presidente russo (Rússia Unida), Andrey Turchak, assegurou que não deveria “haver qualquer dúvida” de que a Rússia ficaria para sempre na cidade. “Não haverá retorno ao passado”, assinalou em maio, acrescentando que os habitantes da cidade e os cidadãos russos viveriam “juntos” e desenvolveriam “a região, rica na sua herança histórica e rica pelo povo que vive aqui”.

Deputado do partido de Putin garante que russos ficarão “para sempre” no sul da Ucrânia

Em declarações ao Observador, o major-general Arnaut Moreira diz que “não deixa de ser surpreendente que uma cidade com a importância e simbologia para a Federação Russa como Kherson possa ser abandonada sem ter sido disparado um tiro para a sua defesa”. No entanto, salienta que foi uma surpresa mais “do ponto de vista político”, do que propriamente do “ponto de vista militar”. Aliás, assume, se a análise for efetuada na ótica do campo de batalha, “provavelmente seria uma saída expectável”.

“Kherson foi a primeira grande cidade a ser tomada no início da invasão russa e foi aquela onde mais depressa se fizeram sentir os programa de russificação”, recorda Arnaut Moreira, que também lembra a cerimónia de incorporação das quatro autoproclamadas repúblicas (Donetsk, Lugansk, Kherson e Zaporíjia) em Moscovo, no final de setembro.

epa10215685 Russian President Vladimir Putin (C) with Head of the Donetsk People's Republic Denis Pushilin (2nd-R), Head of the Luhansk People's Republic Leonid Pasechnik (R), Head of the Zaporozhye Region Yevhen Balitsky (2nd-L), Head of the Kherson Region Vladimir Saldo (L) celebrate during a ceremony to sign treaties on new territories' accession to Russia at the Grand Kremlin Palace in Moscow, Russia, 30 September 2022. From 23 to 27 September, residents of the self-proclaimed Luhansk and Donetsk People's Republics as well as the Russian-controlled areas of the Kherson and Zaporizhzhia regions of Ukraine voted in a so-called 'referendum' to join the Russian Federation.  EPA/MIKHAIL METZEL/SPUTNIK/KREMLIN POOL MANDATORY CREDIT

Cerimónia com os líderes separatistas

MIKHAIL METZEL/SPUTNIK/KREMLIN POOL/EPA

Assim sendo, o major-general vinca que não deixa de configurar uma reviravolta no desenrolar do conflito. “Passaram poucas semanas da cerimónia”, assinala Arnaut Moreira, que estranha que, durante uma reunião com o ministro da Defesa, seja “imediatamente aceite uma retirada de natureza militar”. “Do ponto de vista militar, nada disto faz sentido”, aponta, classificando estas movimentações da Rússia na Ucrânia como uma “derrota tremenda” e um “erro de cálculo clamoroso”.

Ainda assim, se politicamente pode ter sido um desastre, militarmente a situação no terreno já parecia adivinhar uma retirada russa. De acordo com Arnaut Moreira, o “anúncio da suspensão da retirada de civis de Kherson” foi uma movimentação que parecia confirmar esse cenário. Adicionalmente, “começaram a aumentar, desde o início desta semana, os trabalhos de organização militar no terreno na margem oriental. Isto seria natural se as forças russas tivessem uma dimensão humana de defesa em profundidade [na região] — coisa que não têm.”

O major-general traça um paralelismo para demonstrar que, mesmo pela abordagem militar, a Rússia tomou uma decisão que se pauta pela falta de organização. Recordando o que aconteceu na cidade de Severodonetsk (que a Rússia acabou por conquistar após um longo período de resistência ucraniano), Arnaut Moreira indica que Kiev conseguiu ganhar “várias semanas” e “tempo”, impedindo as forças russas de ocupar a cidade, ao contrário do que aconteceu em Kherson.

Severodonetsk é comparada com Kherson

SOPA Images/LightRocket via Gett

As circunstâncias em Kherson e Severodonetsk eram, aliás, idênticas. Havia um rio que separava as duas margens (num caso o Donets, noutro o Dnipro) e a estratégia parecia ser mesma: cercá-las, impedindo o fluxo comercial nas rotas de abastecimento de mantimentos e de armamento. “Não deixar de ser impressionante esta situação paralela. As forças russas estão disponíveis para abandonar Kherson sem disparar um tiro”, reforça o major-general, que sublinha que seria uma “vantagem de natureza militar” para Moscovo se Kherson não fosse tomada por Kiev até pelo menos ao final de inverno.

Cautela da Ucrânia? “Há uma diferença entre o anúncio e a retirada”

A deceção da Rússia parecia estar patente na conversa entre Sergei Surovikin e Sergei Shoigu e na de vários dirigentes russos. No entanto, do lado da Ucrânia, não houve a esperada euforia. Ainda que algumas vozes, como a do conselheiro do ministério do Interior ucraniano, Anton Gerashchenko, tenham dito que, “do ponto de visto político e público”, era uma “grande vitória ucraniana”, o gabinete de Volodymyr Zelensky foi mais cauteloso.

Primeiro, foi a reação do conselheiro do Presidente da Ucrânia. Mykhailo Podolyak salientou, na conta pessoal do Twitter, que as “ações falam mais alto do que as palavras”: “Não vemos nenhuns sinais de que a Rússia está a sair de Kherson sem combater. Uma parte de um grupo pró-russo permanece na cidade e reservistas foram trazidos para a região”. “A Ucrânia está a libertar territórios, baseando-se em dados dos serviços de informações e não em declarações encenadas televisivas.”

Mais tarde, Volodymyr Zelensky reconhecia que “havia muita alegria” nos meios de comunicação sociais e que era “claro” o motivo pela qual existia tal entusiasmo — Kherson. Porém, o chefe de Estado ucraniano ressalvou, no seu discurso diário, que “as emoções deviam ser contidas”. “Não vamos alimentar o inimigo com os detalhes das nossas operações seja no sul, no leste ou em algum local. Quando tivemos o resultado pretendido, todos o verão. Decerto.”

“Talvez não parece o que se espera agora”, prosseguiu Volodymyr Zelensky, para depois esclarecer que o “inimigo não traz prendas, nem faz ‘gestos de boa vontade’”. “Por isso, movemo-nos de forma cuidadosa, sem emoções, sem riscos desnecessários”, notou, acrescentando que será dessa maneira que “garantirá” a libertação não só de Kherson, como de outras localidades: “Sempre como resultado das nossas operações defensivas”.

Arnaut Moreira percebe o motivo pelo qual Volodymyr Zelensky não se mostrou particularmente efusivo. “Há uma diferença entre o anúncio e a retirada. Há que ter cautela nessa análise, porque não há manobra mais complicada na sua execução militar do que uma manobra de retirada sobre uma pressão militar”, apontou o major-general, destacando que as forças russas ainda continuam em Kherson.

"Há uma diferença entre o anúncio e a retirada. Há que ter cautela nessa análise, porque não há manobra mais complicada na sua execução militar do que uma manobra de retirada sobre uma pressão militar"
Major-general Arnaut mo

“A manobra de retirada pode ser feita de imensas maneiras. Para retirar algumas tropas e materiais, poderá haver combates frente a frente. Não será um caminhada triunfal em Kherson”, aclara o major-general, que, ainda assim, acredita que o destino da cidade está traçado: “Será ucraniana”. “A forma operacional de como o será é que tem de alvo das maiores cautelas e impedir baixas desnecessárias.”

Próximo alvo da Ucrânia? Melitopol

Após o que antevê ser uma “enorme alegria” para a Ucrânia e para o Ocidente, Arnaut Moreira considera que a Rússia poderá atacar a barragem de Nova Karkova— o que poderá “dificultar uma eventual tentativa de travessia de norte para sul das tropas ucranianas”. “Pode haver essa tentação” por parte dos homens de Vladimir Putin, mas não será para já. Como ainda não se retiraram por completo de Kherson, essa decisão, explica o major-general, “prejudicaria as forças russas”. 

Além disso, a destruição da barragem poderia trazer consequências menos positivas para a Crimeia, ocupada pela Rússia, já que abastece a península com água potável.

Do lado ucraniano, Arnaut Moreira preconiza que serão “libertadas imensas forças ucranianas”, que estiveram “concentradas” com “muitos meios” para conquistar Kherson, um “objetivo com fins políticos e algo alcançável a nível militar”. O major-general também crê que “não deverá haver ímpetos dos russos para passar o rio Dnipro” num futuro próximo.

Car bomb explosion near local TV station in Melitopol

Melitopol poderá ser o próximo alvo da Ucrânia

Anadolu Agency via Getty Images

Com as tropas de Kiev empregues “noutros pontos de território”, Arnaut Moreira considera que a Ucrânia vai concentrar-se na região de Donbass e em Zaporíjia, principalmente na cidade de Melitopol: “É um centro giratório das tropas da Federação Russa”, reforça o major-general, que também aponta para o facto de ser um dos pontos do “acesso terrestre” à Crimeia.

“Arriscaria dizer que a grande manobra operacional [da Ucrânia] passa por retirar forças que deixam de ser necessárias em Kherson e empregá-las em Melitopol, cortando todo o corredor terrestre que vem desde a Rússia até à Crimeia”, vaticina Arnaut Moreira. Resta saber é quando é que isso acontecerá — e se a Rússia não reagirá antes.

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