O transporte marítimo é considerado o principal catalisador do comércio mundial. É responsável por 90% do comércio internacional e tem impacto em cerca de 3% das emissões de gases com efeito de estufa. Por outro lado, as metas para a descarbonização do transporte marítimo são ambiciosas: querem alinhar um setor robusto – e em crescimento -, com os objetivos globais do combate às mudanças climáticas.

É neste contexto que a Fundação Repsol, em parceria com a Associação dos Portos de Portugal e com o Observador como Media Partner, juntou os principais stakeholders do setor numa manhã de novembro, onde a tecnologia e a inovação foram os protagonistas, bem como os desafios e oportunidades desta missão.

“A transição energética e a descarbonização devem ser vistas como um objetivo global da sociedade e da economia, a nível mundial”, foi com as palavras de António Calçada de Sá, Diretor Geral da Fundação Repsol, que se deu início ao programa da manhã do dia 20. Os agradecimentos foram direcionados, os temas foram lançados e o Diretor aproveitou o momento para deixar a mensagem:

“É fundamental que deixemos de lado discursos genéricos e simplistas e comecemos a encarar a realidade de que estamos não apenas diante de uma transição energética, mas também de uma transição digital profunda. Este duplo desafio exige uma avaliação cuidadosa e estratégica, considerando não apenas o impacto da transformação energética, mas também o papel crescente da tecnologia digital em todo o processo. Precisamos pensar: como alavancar a inovação tecnológica em cada uma destas transições? E como planear as ações de forma estruturada, levando em consideração o curto, médio e longo prazo.”

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João Rui Ferreira, atual Secretário de Estado da Economia, marcou presença no evento e aproveitou o momento para reforçar que “investir em tecnologias limpas, digitalização e eficiência energética não é apenas uma necessidade”. Pelo contrário, esta aposta assume-me como uma oportunidade “para consolidar Portugal como um líder em inovação portuária e transporte marítimo sustentável”, acrescentou.

Já Carlos Correia ressalvou que existe a consciência de que é necessário tornar a atividade portuária mais sustentável e que vários esforços estão a ser reunidos nesse sentido. “Na estratégia para os portos nacionais é consensual que estes, além de serem plataformas logísticas e de transporte, devem evoluir no sentido de serem hubs energéticos e digitais. (…) Além do transbordo e da logística, o futuro dos portos nacionais reside no desenvolvimento do seu papel fundamental como polos de energia, para a economia circular, para a comunicação e para a indústria”, rematou Carlos Correia, Vogal do Conselho Fiscal da Associação dos Portos de Portugal e Presidente da Administração do Porto de Lisboa.

Dado o pontapé de partida, foi altura de assistir às apresentações: “O caminho da eletrificação na implementação de sistemas Onshore Power Supply”, dirigida por Daniel Maré Dias, Responsável do vertical dos Portos na Siemens, SA; e “Maritime Forecast to 2050 by DNV”, conduzida por António Gonçalves, Business Development Leader & Member of the Maritime Advisory Executive Team at DNV Maritime.

Depois destes dois momentos, foi altura de chamar ao palco os oradores do primeiro debate do dia, moderado por Carla Jorge de Carvalho, jornalista e host do Observador. Aqui o tema central foi a descarbonização das infraestruturas e as intervenções ficaram a cargo de Carlos Correia, Vogal do Conselho Fiscal da Associação dos Portos de Portugal – APP e Presidente da Administração do Porto de Lisboa – APL; Rui Raposo, Presidente da Associação de Armadores da Marinha de Comércio – AAMC; José Simão, Diretor-Geral da Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos – DGRM; Nuno Alentejano, Coordenador do núcleo da área naval do Seapower; e António Gonçalves, Business Development Leader & Member of the Maritime Advisory Executive Team at DNV Maritime.

Durante cerca de 40 minutos de conversa, o tema da descarbonização foi posto no centro do debate e foram discutidos os objetivos, as metas e os principais desafios desta que se quer uma realidade possível.

“Há uma perceção no mercado de que os navios não estão a fazer nada para participar nesta descarbonização”, começa por dizer Rui Raposo, acrescentando: “Entre 2008 e 2015, os navios reduziram as emissões de CO2 e melhoraram a chamada eficiência carbónica em 30%. As novas máquinas dos navios emitem menos CO2 do que há 10 anos. Desde 1 de janeiro de 2020, os navios passaram a usar o combustível com o teor de enxofre de 0,5 em vez do combustível de 3,5. Foi melhorado o desenho dos navios, o que também permitiu poupar 15% de combustível. E estão a utilizar-se, desde já, sistemas que analisam os dados das condições atmosféricas e o estado do mar para otimizar as viagens”.

A par com os feitos enumerados pelo colega de painel, Nuno Alentejano aproveitou a oportunidade para fazer a ressalva: o futuro parece complicado, mas existem soluções. “As ferramentas de financiamento são muito importantes. Prevê-se que, à partida, o Porto vai ter de se reinventar. Terá de passar a ser um produtor de energia. Os navios começam a transformar-se, mas o Porto tem de acompanhar. Se não existir um sistema de financiamentos para ajudar, isto falha tudo”. Para o Coordenador do núcleo da área naval do Seapower, o segredo serão “os combustíveis sintéticos, os combustíveis alternativos e os biocombustíveis”.

Ao longo de toda a conversa ficou claro que a descarbonização pode ser uma oportunidade de desenvolvimento e de fomento da competitividade e António Gonçalves explicou como: “A descarbonização é uma curva enorme no desenvolvimento da indústria e pode ser utilizado pela indústria portuguesa como uma oportunidade para aumentar a competitividade e ultrapassar alguma da concorrência. Temos algumas vantagens competitivas, por exemplo: a possibilidade de produzir combustíveis alternativos a preços bastante competitivos”.

“Combustíveis alternativos e a descarbonização” e “PRR Navegação Ecológica” foram as apresentações seguintes, conduzidas por Fernando Marcos, Diretor Comercial na MAN Energy e Professor Titular da Escola Técnica Superior de Engenheiros Navais na Universidade Politécnica de Madrid; e Hugo Loureiro, Naval Architect & Marine Engineer na Tecnoveritas, respetivamente.

Com a manhã a chegar ao fim, o último debate do dia – “Tecnologia para a descarbonização do transporte marítimo” – contou com a presença de José Monteiro, Responsável Indústria, Obras Públicas, Marinha e Ilhas da Repsol Portuguesa; Ricardo Bencatel, Cofounder & CTO na Mobyfly; Sandrina Pereira, Professora Adjunta da Escola Superior Náutica Infante D.Henrique – ENIDH; e Mário Pinho, Secretário-Geral da Associação das Indústrias Navais – AI Navais. Aqui, o tema das soluções e do futuro foi o destaque principal de toda a conversa, sendo possível chegar a alguns pontos de concordância.

O primeiro foi o de se perceber que, para o objetivo comum da descarbonização, não existe apenas um caminho possível. “Não há uma solução única. Quer a nível tecnológico, quer a nível de custos”, partilhou Sandrina, reforçando em seguida: “Estamos numa fase de transição e é uma transição que acarreta muitos custos e mudanças. Como académica, é óbvio que me foco mais na parte da energia, mas a parte dos custos é essencial também. Nada avança sem uma análise nesse sentido”.

Quanto ao futuro, e às mudanças que se querem ver concretizadas, Mário Pinho escolheu falar em: impacto. “Tudo isto vai ter impacto nos operadores, nos armadores, nos fabricantes de equipamento, fornecedores de combustível. Mas a curto/médio prazo, vai ser comandado por um aumento do preço dos bens, até certo ponto provocado pela decisão de ter como alvo o transporte marítimo. O transporte marítimo é responsável por muitas emissões de gases, mas não há alternativa mais limpa ao transporte marítimo. O impacto vai ser forte e todos os operadores e stakeholders precisam de apoio institucional”, remata.

Depois de uma manhã repleta de trocas de conhecimento, de ideias, de análise e partilha de soluções, foi com as palavras do Administrador Delegado da Repsol em Portugal, Armando Oliveira, que o balanço foi feito, deixando no ar a certeza de que há muito a fazer, mas também que muito tem sido feito para que este caminho se torne cada vez mais sustentável. É preciso olhar para o futuro, trabalhando o presente, com a certeza de que “a sustentabilidade e a descarbonização não são um obstáculo, mas um caminho que temos de fazer todos juntos”.