O Ministério Público já tem indícios concretos de desvios de fundos da Futebol Clube Porto, Sociedade Anónima Desportiva (SAD) em 15 transferências que envolveram algumas das mais importantes transferências portistas desde 2012, como as dos jogadores Quaresma, Militão, Filipe ou Fábio Silva. O procurador Rosário Teixeira acredita ter indícios de que o empresário Pedro Pinho terá alegadamente cobrado comissões de cerca de 10,5 milhões de euros por intermediações fictícias que apenas serviam para desviar fundos da SAD do FC Porto para fazer regressar alegadamente uma parte desse dinheiro a Jorge Nuno Pinto da Costa e a outros dirigentes do clube.
Mas o MP também suspeita que uma parte desses 10,5 milhões de euros também terão servido para financiar a alegada manipulação de resultados desportivos de jogos do FC Porto, através da suposta prática de corrupção ativa de intervenientes com capacidade para influenciar a sorte dos jogos da I Liga.
Líder dos Super Dragões sob suspeita. Filho de Pinto da Costa terá recebido cerca de 650 mil euros
Uma pequena parte dos mesmos fundos também terão ainda sido entregues a dirigentes de claques desportivas afetas ao FC Porto, como Fernando Madureira, líder dos Super Dragões. As actividades desses dirigentes estão sob investigação, sendo que o semanário Sol já noticiou que Madureira terá recebido cerca de 100 mil euros de um alegado saco azul gerido por Pinto da Costa.
Tal como a CNN noticiou, o procurador Rosário Teixeira suspeita que o alegado esquema de desvio de fundos que terá sido acordado entre Jorge Nuno Pinto da Costa e o empresário Pedro Pinho ter-se-á iniciado em 2012.
Alexandre Pinto da Costa também fará alegadamente parte deste esquema (com alegado conhecimento e alegada aprovação do pai), existindo indícios de que terá cobrado através de um testa de ferro cerca de 650 mil euros em comissões de intermediação nas transferências dos jogadores sul americanos Renzo Saraiva e Marchesin e do espanhol Marcano.
Tal valor terá sido cobrado ao FC Porto por uma sociedade chamada Mupang Management Lda, detida pelo tal alegado testa de ferro do filho de Jorge Nuno Pinto da Costa.
No total, são cerca de 11 milhões de euros que terão sido desviados do FC Porto. O DCIAP confirmou no dia 22 de novembro, dia em que as autoridades realizaram buscas no Estádio do Dragão e às casas de Pinto da Costa, do seu filho Alexandre e do empresário Pedro Pinho, que estavam em causa “operações de pagamento de comissões de mais de 20 milhões de euros.”
O alegado esquema que terá beneficiado o alegado testa-de-ferro Pedro Pinho
Das 15 transferências que já geraram indícios concretos que levaram o procurador Rosário Teixeira a aprofundar a recolha de prova com as buscas realizadas na semana passada no Estádio do Dragão e nas residências pessoais e profissionais de Pinto da Costa, do seu filho Alexandre e do empresário Pedro Pinho, o procurador Rosário Teixeira entende ter indícios de factos comuns a quase todas:
- As sociedades de Pedro Pinho, nomeadamente a Energy Soccer, receberam quase sempre comissões do intermediário oficial de cada negócio feito com o FC Porto que correspondem a cerca de metade do valor pago;
- A Energy Soccer não terá prestado serviço algum. Ou seja, os seus serviços serão fictícios as as comissões que faturou aos intermediários oficiais dos negócios de compra e venda de jogadores deverão corresponder a cerca de metade do valor total pago pela FC Porto SAD. Daí que o MP suspeite que os valores das comissões pagas aos intermediários tenha sido inflacionado para acomodar os fundos que seriam transferidos para Pedro Pinho, dado como testa de ferro de Pinto da Costa.
Operação Cartão Azul. Pinto da Costa suspeito de desviar fundos da SAD do Porto
Das 15 transferências consideradas suspeitas, destacam-se os seguintes casos:
Brahimi (recompra de 30% de direitos a sociedade, 30 de junho de 2015)
- Brahimi foi confirmado à CMVM como reforço do FC Porto a 22 de junho de 2014, sendo contratado a 100% aos espanhóis do Granada. Nessa mesma altura, a SAD azul e branca celebrou um contrato de cedência de parte dos direitos económicos com a Doyen por 5 milhões de euros. Mais tarde, a 30 de junho, o FC Porto recomprou 30% do passe por 3,8 milhões de euros, ficando a deter 50% dos direitos económicos do extremo argelino. Nesta última operação, a Energy Soccer faturou uma comissão de 600 mil euros, tendo sido efetuados pagamentos de pelo menos 500 mil. Existe a suspeita de que a Energy Soccer não teve qualquer participação efetiva no negócio em causa.
Quaresma (contratação a custo zero, janeiro de 2014; venda ao Besiktas, julho de 2015)
- Depois de ter estado alguns meses no Al-Ahli, da Arábia Saudita, Ricardo Quaresma era um jogador livre e assinou com o FC Porto em janeiro de 2014 a custo zero. Os dragões pagaram uma comissão de 500 mil euros à DNN Sport Lda., sendo que a Energy Soccer faturou depois a essa empresa 250 mil euros.
- Mais tarde, no final da temporada de 2014/15, o FC Porto vendeu o internacional aos turcos do Besiktas por 1,2 milhões de euros. A Energy Soccer faturou 156 mil euros à SAD pela intermediação.
Casemiro (opção de compra exercida pelo Real Madrid, 30 de junho de 2015)
- Depois de ter estado um ano emprestado ao FC Porto, o Real Madrid decidiu acionar a cláusula de opção de compra que tinha ficado consagrada no contrato de cedência feito pelos dragões e pagou 7,5 milhões de euros para “resgatar” o internacional brasileiro. A Vela Management Limited cobrou uma comissão de 1,26 milhões de euros, repartindo depois 700 mil euros com a Energy Soccer. Existe a suspeita de que a Energy Soccer não teve qualquer participação efetiva no negócio em causa.
Felipe (compra ao Corinthians, junho de 2016; venda ao Atlético Madrid, maio de 2019)
- O FC Porto contratou Felipe em junho de 2016 ao Corinthians, pagando 6 milhões de euros por 75% dos direitos económicos. Três épocas depois, o FC Porto vendeu o jogador ao Atl. Madrid por 19,709 milhões de euros, pagando um custo de intermediação de 1,96 milhões de euros a uma sociedade de outro agente intermediário. De acordo com os registos oficiais da Federação Portuguesa de Futebol, o intermediário foi o agente Bruno Macedo. A PP Sports recebeu depois metade do montante, 960 mil euros.
Aboubakar (empréstimo ao Besiktas, agosto de 2016)
- O avançado camaronês foi cedido por empréstimo aos turcos do Besiktas no final da janela de mercado de 2016. O clube de Istambul pagou 2,5 milhões de euros pelo acordo e a Energy Soccer faturou 244.375 mil euros diretamente à SAD dos azuis e brancos pela intermediação do negócio.
Ricardo Pereira (venda ao Leicester, março/abril de 2018)
- O lateral português foi vendido em 2018 (formalizou o acordo na terceira semana de maio mas o mesmo pode ter sido alcançado antes) ao Leicester por 20 milhões de euros. Os custos de intermediação da operação com o clube inglês da Premier League foram de 3,242 milhões de euros, repartidos entre a Pacheco & Teixeira Lda. e a PP Sports, que recebeu uma comissão de 2,141 milhões de euros
- A empresa de Pedro Pinho terá repartido posteriormente 625 mil euros com a Full Sport Limited. Trata-se de uma sociedade irlandesa cujos titulares estão a ser investigados por via da reconstrução dos circuitos financeiros.
João Pedro (compra ao Palmeiras, junho de 2018)
- O FC Porto contratou o lateral direito João Pedro ao Palmeiras em junho de 2018 por 4 milhões de euros, pagando 400 mil euros pelos serviços de intermediação à sociedade de outro agente, que por sua vez teve a PP Sports a faturar metade do montante, no valor de 200 mil euros.
Éder Militão (compra ao São Paulo, agosto de 2018; venda ao Real Madrid, 2019)
- O FC Porto comprou em agosto de 2018 90% dos direitos económicos de Éder Militão ao São Paulo, pagando 7 milhões de euros mais 1,548 milhões de euros de intermediação. Três milhões de euros foram cedidos a um empresário, havendo suspeitas sobre os beneficiários finais desse montante. De acordo com os registos oficiais da Federação Portuguesa de Futebol, o intermediário foi Ulisses Souza Jorge, empresário do jogador. A PP Sports faturou 500 mil euros pela operação. Existe a suspeita de que a PP Sports não teve qualquer papel ou participação enquanto intermediário no negócio em causa;
- Após uma única temporada, o central internacional brasileiro foi vendido a título definitivo ao Real Madrid por 50 milhões de euros. Os dragões pagaram 7,4 milhões de euros de intermediação. De acordo com os registos oficiais da Federação Portuguesa de Futebol, o intermediário foi o agente Bruno Macedo. A PP Sports faturou 1,25 milhões de euros pela operação. Existe a suspeita de que a PP Sports não teve qualquer papel ou participação enquanto intermediário no negócio em causa.
Óliver Torres (venda ao Sevilha, julho de 2019)
- O médio espanhol Óliver Torres foi vendido pelo FC Porto ao Sevilha em julho de 2019 por um valor de 11 milhões de euros. A PP Sports faturou 500 mil euros a um outro agente, metade do que tinha sido pago pela intermediação do negócio. Existe a suspeita de que a PP Sports não teve qualquer papel ou participação enquanto intermediário no negócio em causa.
Mateus Uribe (compra ao América, agosto de 2019)
- O FC Porto comprou 85% dos direitos económicos de Uribe no início de agosto de 2019, pagando pelos mesmos 9,5 milhões de euros mais 1,582 milhões de euros de encargos adicionais com a operação. A intermediação foi assegurada pela Nomiblue Sports SA e pela da Go Pro Sport Management. A Nomiblue faturou 5% do valor total (475 mil euros) mas a Go Pro Sport Management acordou com os dragões o pagamento de uma comissão de 1,4 milhões de euros (14,7% do montante global). A N1 Gestão de Carreiras Desportivas faturou depois 466 mil euros à Go Pro Sport Management.
Fábio Silva (venda ao Wolverhampton, setembro de 2020)
- O FC Porto vendeu o avançado Fábio Silva ao Wolverhampton a título definitivo por 40 milhões de euros, a que acresceram encargos de mais 10 milhões repartidos por duas sociedades. A PP Sports e N1 Gestão de Carreiras Desportivas faturaram depois, em três faturas, 3,275 milhões de euros. Existe a suspeita de um aumento fictício a pagar a nível de comissões, 25% do negócio realizado.
Danilo Pereira (empréstimo ao PSG, outubro de 2020)
- O FC Porto chegou a acordo com o PSG para a cedência temporária de uma temporada do médio Danilo Pereira por 4 milhões de euros, com uma opção de compra obrigatória de 16 milhões de euros. A N1 Gestão de Carreiras Desportivas emitiu depois duas faturas no valor de 1,23 milhões de euros ao agente intermediário do negócio da saída do internacional português para Paris. De acordo com os registos oficiais da Federação Portuguesa de Futebol, o intermediário foi a Gestifute.
Recorde-se que este caso ainda não tem arguidos constituídos. Ou seja, o procurador Rosário Teixeira optou estrategicamente por não constituir Jorge Nuno Pinto da Costa, o seu filho e agente Alexandre e o empresário Pedro Pinho como arguidos.
O Observador confrontou Pinto da Costa, Pedro Pinho e a Futebol Clube do Porto SAD com todas as informações descritas neste trabalho, tendo os respetivos advogados optado por não prestar declarações. Foi o caso de Nuno Brandão, advogado de Pinto da Costa e da FC Porto, SAD.
Pedro Marinho Falcão, que representa Pedro Pinho, reafirmou declarações anteriores prestadas ao Observador sobre outros indícios que o MP recolheu neste caso. “Os esclarecimentos serão prestados perante as autoridades judiciárias, no tempo e local próprios”, enfatizou.