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Feitos em Hollywood, na Europa e na Ásia, firmemente ancorados na realidade mas também abertos à especulação científica e à fantasia sob a forma da animação digital, ambientados nos EUA pós-II Guerra Mundial, na Turquia ou no Irão de hoje, nos confins do cosmos ou dentro do corpo humano, vários deles estão centrados na família, e apresentam-se estética, emocional, intelectual e cinematograficamente muito diversos. Eis os 10 filmes que selecionámos como os melhores da década.

“Era Uma Vez na Anatólia”

De Nuri Bilge Ceylan (2011)

Mestre do cinema contemplativo, interiorizado, dos silêncios e das correlações entre os estados de espírito, a paisagem e a meteorologia, e senhor de um superior sentido plástico da imagem, o turco Nuri Bilge Ceylan assina aqui um filme visual, narrativa e intelectualmente prodigioso. A busca, na região da Anatólia, do corpo de um homem assassinado, por uma equipa que se faz acompanhar dos dois suspeitos do crime, é o cabide narrativo onde o realizador pendura uma história de cansaço anímico e frustração existencial que cala fundo no espectador.

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“The Master — O Mentor”

De Paul Thomas Henderson (2012)

Joaquin Phoenix interpreta um marinheiro emocional e psicologicamente instável, sem eira nem beira, desmobilizado após a II Guerra Mundial, que cai sob a influência do carismático e mefistofélico líder de um culto (Philip Seymour Hoffman), a Causa. Muito mais que uma sátira à Cientologia fundada por L. Ron Hubbard, este filme de Paul Thomas Anderson é uma reflexão sobre as múltiplas relações que se podem estabelecer entre os homens: mestre e pupilo, líder e seguidor, dominador e dominado, senhor e escravo, tudo isto sintetizado nas duas personagens principais.

“Amor”

De Michael Haneke (2012)

Esta história de dois octogenários é um dos mais comoventes e devastadores filmes de amor de sempre, e o melhor de Michael Haneke. Jean-Louis Trintignant e Emmanuelle Riva interpretam Georges e Anne, um casal de professores de música parisienses reformados. Um dia, ela tem um AVC e a vida do par nunca mais volta a ser a mesma Anne começa a declinar física e mentalmente, enquanto Georges procura cuidar da mulher em casa, e tudo se vai desmoronando em volta. Chegará o momento em que ele terá que dar a derradeira e mais tremenda prova de amor à mulher.

“Boyhood: Momentos de uma Vida”

De Richard Linklater (2014)

Filmado no Texas ao longo de 12 anos, ao ritmo de uma semana por ano, registando a vida de um rapaz chamado Mason entre os 6 e os 18 anos, e da sua família, “Boyhood: Momentos de uma Vida” é um filme único. O seu tema é o tempo, a sua passagem e a forma como nos molda, modifica e transforma. À medida que Mason vai crescendo e mudando, física e interiormente, mudam também os adultos em seu redor e os próprios EUA. Desafio técnico e humano, “Boyhood: Momentos de uma Vida” é uma pequena epopeia da vida normalmente vivida, e do tempo que a leva consigo.

“Interstellar”

De Christopher Nolan (2014)

Eis uma autêntica raridade: uma superprodução de ficção científica (FC) original e visionária, baseada nos trabalhos de um físico, Kip Thorne, “Interstellar” é um filme muito mais Stephen Hawking do que Steven Spielberg, com uma história que, apesar de envolver mecânica quântica, viagens no tempo e manipulação do espaço-tempo, consegue entreter, emocionar e ser intelectualmente estimulante, cientificamente plausível e profundamente humana. Christopher Nolan rodou uma saga de FC “hard tech” que dá que pensar ao cérebro, que ver aos olhos e que sentir ao coração.

“Divertida-Mente”

De Pete Docter (2015)

A especialidade da Disney é humanizar os animais. Na longa-metragem animada digital “Divertida-Mente”, a Pixar propõe-se humanizar emoções. E consegue. O filme segue Riley uma menina, cuja família se muda do interior dos EUA para São Francisco, onde o pai tem um novo emprego; e as suas cinco emoções primordiais, que, na Sala de Controlo situada no interior do corpo de Riley, tentam ajudá-la a enfrentar uma nova cidade, uma nova casa e uma nova escola, enquanto se têm que ver umas com as outras. Um prodígio de inventividade, comédia e capacidade de figuração da vida interior do ser humano.

“Táxi”

De Jafar Panahi (2015)

Terceiro filme realizado pelo iraniano Jafar Panahi à revelia do governo que o condenou a prisão domiciliária e proibiu de filmar durante 20 anos, “Táxi” é inspirado em “Dez”, de Abbas Kiarostami, de quem o realizador foi assistente. Panahi meteu-se ao volante de um táxi, dissimulou três pequenas câmaras digitais no automóvel e saiu para as ruas de Teerão, para filmar situações encenadas e protagonizadas por anónimos, amigos e familiares, através das quais nos oferece um panorama da situação no seu país, abrangendo desde a pena de morte à dificuldade em se conseguirem ver filmes estrangeiros, passando pelos problemas das mulheres. E sempre sem perder o sentido de humor.

“Silêncio”

De Martin Scorsese (2016)

Martin Scorsese levou 25 anos a filmar o livro do escritor católico japonês Shusaku Endo, sobre dois jesuítas portugueses do século XVII que vão para o Japão, no auge das brutais purgas anti-cristãs neste país, para confirmarem que o seu mentor terá não só abjurado, como também convertido ao budismo e adotado os usos e costumes nipónicos. Silêncio é um fabuloso, carregado e dilacerado “thriller” espiritual, repleto de torturas e sofrimentos da carne e de dúvidas da fé, cuja história serve como uma luva nas preocupações e fixações religiosas e morais de Scorsese, ele mesmo um crente atormentado por interrogações e angústias.

“Shoplifters — Uma Família de Pequenos Ladrões”

De Hirokazu Kore-eda (2018)

O japonês Hirozaku Kore-eda elege aqui, e mais uma vez, a família como grande tema. Isto embora a família pobre deste filme, instalada nos subúrbios de Tóquio, e que se aguenta graças ao furto, ao pequeno delito, ao emprego precário e ao esquema, não seja aquilo que aparenta à primeira vista. Mas funciona a vários níveis, do emocional ao da sobrevivência prática, melhor e com mais harmonia do que muitas famílias convencionais. Ao mostrar como e porquê, Kore-eda atinge uma profunda, comovente e amarga verdade humana, com projeção universal.

“Parasitas”

De Bong Joon-Ho (2019)

O cinema sul-coreano é, por esta altura, um dos melhores, mais variados e de produção mais abundante do mundo, e Bong Joon- Ho um dos seus maiores e mais talentosos representantes. Em “Parasitas”, uma família pobre, semi-delinquente e oportunista de Seul, “infiltra” uma família abastada, fútil e ingénua, e a sua luxuosa vivenda, mas há uma enorme surpresa à espera de ambas. Drama de classes, sátira social, comédia negra, retrato sarcástico da natureza humana e exame ao Raio X dos problemas, desigualdades e tensões da sociedade sul-coreana contemporânea, “Parasitas” é um filme brilhantíssimo em todas estas declinações. E inclui a pirueta narrativa da década.