Índice

    Índice

Os vencedores

Pedro Sánchez (PSOE)

.

Vencedor claro em número de votos (quase 7,5 milhões de espanhóis escolheram o PSOE este domingo); vencedor claro em número de deputados (123, quando em 2016 tinha obtido o pior resultado da história do partido, com 85); vencedor em toda a linha, legitimando nas urnas o “Governo Frankenstein” que formou em 2018, com o apoio do Podemos, dos nacionalistas bascos e dos independentistas catalães para afastar o PP de Mariano Rajoy. Pedro Sánchez, o resiliente, o sobrevivente, passou de besta a bestial em menos de quatro anos: dobrou à sua vontade a oposição interna dos “barões socialistas” (com a andaluza Susana Díaz à cabeça), manobrou com o emergente Podemos e eliminou o risco — que chegou a ser real — de o PSOE cair na irrelevância política; afastou a direita e este domingo, depois das derrotas de 2015 e 2016, venceu, finalmente, umas eleições gerais espanholas. E venceu porque percebeu que os espanhóis iriam votar não entre o PSOE e os outros projetos políticos, mas sim entre os que queriam e os que não queriam correr com ele do poder — apesar dos bons números no crescimento económico e no desemprego. Colou a ameaça — real — da extrema-direita aos que o queriam afastar e ganhou a partida. Vai agora formar um governo de “geringonça” com um Podemos em quebra, perante uma oposição de direita fragmentada. Uma noite em cheio.

Albert Rivera (Ciudadanos)

.

Albert Rivera começou por ganhar destaque na política espanhola devido a um cartaz de campanha (na altura pela versão catalã do Ciudadanos, o Ciutadans) em que aparecia nu. Este domingo, o advogado de Barcelona pôs em pelota o PP de Pablo Casado, assumindo-se como o homem que pode liderar a direita espanhola nos próximos anos. Rivera entrou para o congresso dos deputados em 2015 com estrondo, com 40 assentos e ultrapassou, com perdas, o embate das negociações falhadas para formação de governo (baixando para 32 deputados nas eleições de repetição de 2016). Com o PSOE numa relação com o Podemos (e com os independentistas catalães) e com a ascensão da ultra-direita do Vox, Rivera percebeu que os votos de que precisava estavam no PP. Não só nos moderados que rejeitavam a geringonça de esquerda e os casos de corrupção, como nos que receavam os extremistas de direita. Por isso abandonou progressivamente a postura centro-direita liberal e começou a moldar o Ciudadanos num discurso de direita mais agressivo, criticando fortemente a política económica do PSOE de Sánchez e criticando as concessões face aos independentistas catalães. Na noite de domingo conquistou 57 assentos (apenas menos 9 do que o PP), assumiu que “quer ser o partido líder da oposição” e fez uma jura aos apoiantes: “Prometo-vos que vamos governar a Espanha”. E quando o diz, não se refere uma coligação com o PSOE (já descartada, de resto). Está mesmo a falar de ser a nova força na direita, substituindo o PP. E pode ter razão em fazê-lo.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Vencidos ou vencedores? Depende do ponto de vista

Santiago Abascal (Vox)

.

O que dizer de um partido que entra no Congresso dos Deputados logo com 24 assentos? É uma vitória? Sim. Mas é retumbante? Ehhh, nem por isso. Certo, o Vox conquistou 47 mil votos nas eleições gerais de 2016 e este domingo fechou a noite com 2,67 milhões de cruzinhas nos boletins. É um aumento brutal, mas vamos a comparações: o Podemos (extrema-esquerda radical) estreou-se no parlamento espanhol em 2015, logo com 42 deputados, aos quais se juntavam os deputados das suas confluências regionais, o En Comú Podem (Catalunha), o Compromís (Valência) ou En Marea (Galiza), num total de quase 70 assentos. O Ciudadanos entrou no parlamento espanhol, também em 2015, com 40 deputados. Portanto o bom resultado do Vox deste domingo é relativo. Ainda para mais porque as sondagens davam a possibilidade de o partido de Santiago Abascal vir a obter mais de 35 deputados. Abascal vinha lançado de um grande resultado na Andaluzia, mas essa votação pode ter servido como “uma vacina” para as eleições deste domingo, que — se calhar mesmo por causa disso — teve uma participação histórica. Mas se pensarmos que na legislatura passada, os catalães da Esquerra Republicana Catalana (então com 9 deputados) dominaram várias vezes as atenções nos debates, marcando a atualidade política, só podemos imaginar o que o Vox fará com 24. E Santiago Abascal — que durante a campanha se queixou de tratamento desigual face aos outros candidatos — deixou uma promessa após a contagem dos votos: fazer a oposição ao PSOE e ao Podemos que a “direitita cobarde” nunca quis fazer. Se for mesmo assim, o ambiente no Congresso vai aquecer e de que maneira.

Alberto Núnez Feijóo (PP)

.

Eterno candidato a líder do PP, o presidente dos populares na Galiza, Alberto Nuñez Feijóo, esteve ao lado de Pablo Casado no último comício de campanha para as eleições deste domingo. Ao fazê-lo dava o seu apoio, mostrava união em torno do líder e punha fim aos rumores que sempre o rodeiam: “Afinal quando é que avança para a liderança do PP?”. Ao fazê-lo também se colou à “debacle” do PP desta noite, que conseguiu eleger apenas 66 deputados (menos de metade do que em 2016 e apenas mais nove  do que o Ciudadanos de Rivera). Desse ponto de vista seria, portanto, um dos vencidos (tal como o resto dos dirigentes populares, forçados agora a uma intensa reflexão sobre o que querem da vida). Mas é precisamente essa reflexão que pode transformar o ponto de vista: Feijóo, o homem que nunca quis avançar (talvez por não querer submeter-se a umas primárias contra Casado, Soraya Saénz de Santamaria ou Maria Dolores de Cospedal), pode ver agora o partido cair-lhe no colo. Como? Teremos de esperar pelos resultados das europeias, municipais e das autonómicas de 26 de maio (em Espanha vai votar-se tudo em conjunto), mas um avolumar dos maus resultados de Casado deverão obrigar a mudanças na cúpula do partido. E, já se sabe, nesses casos muita gente se vira para a Galiza e para Feijóo. Depois resta saber se é desta que ele avança. Costuma dizer-se que só pode ganhar quem vai a jogo. Se é assim mesmo, só Feijóo vai poder decidir se na noite de 28 de maio de 2019 decidiu que queria ser um vencedor ou um vencido.

Os vencidos

Pablo Casado (PP) 

.

O grande derrotado da noite. Mesmo. Sem rodeios. O PP de Pablo Casado fez o pior resultado numas eleições gerais desde os anos da Transição. Nunca o PP tinha eleito menos de 100 deputados (a linha vermelha na Calle Génova para um mau resultado) e neste domingo ficou-se pelos 66. Zero deputados eleitos, repito zero eleitos, no País Basco. Dois na Catalunha. E o número 3 do partido, o omni-influente Javier Maroto, vai ficar de fora do Congresso dos Deputados na próxima legislatura, porque não conseguiu ser eleito por Álava (País Basco). O Partido Popular perdeu quase 3,6 milhões de votos em três anos (desde as eleições de junho de 2016) e nem tudo se explica com os casos de corrupção, o fraco carisma de Mariano Rajoy, os anos de crise económica durante o resgate aos bancos, o movimento independentista na Catalunha ou a ascenção do Vox e do Ciudadanos na ala direita do espectro político. Se calhar é o contrário: talvez muitos destes fenómenos se expliquem pela fraqueza de um partido que tem dificuldade em definir-se como projeto de poder em Espanha, em que também é preciso fazer um esforço para percebermos quem é que pode pegar nas rédeas que Casado forçosamente, mais cedo ou mais tarde, terá de largar. Soraya Saénz de Santa Maria, a antiga número dois de Rajoy? O barão galego Nuñez Feijóo? Alguma figura herdeira do Aznarismo? É difícil perceber, sobretudo porque a 26 de maio há eleições municipais, autonómicas e europeias em Espanha. No discurso a assumir a derrota, Casado — muito apagado durante a campanha — foi mais do mesmo. “A parte positiva deste dia é que este partido continua a ser o líder da oposição e do centro-direita”. Só mesmo isso, o que é muito pouco para quem lidera um partido como o PP. Ah, e com o Ciudadanos de um lado e o Vox do outro, vamos ver por quanto tempo é que continua a liderar a oposição e o centro-direita.

Pablo Iglesias (Podemos)

.

Tal como Pedro Sánchez no PSOE, Pablo Iglesias não teve uns últimos anos muito tranquilos no Podemos. Teve de solidificar a sua liderança — pondo na ordem as derivas dos co-fundadores Juan Carlos Monedero e Íñigo Errejón — e, sobretudo, teve de decidir o que queria para o partido: manter as premissas iniciais — combater as instituições da Europa e o euro, materializar a Revolução Bolivariana na Europa, prosseguir no parlamento o movimento popular do 15 de Maio e combater a “casta” do PSOE e do PP — ou tornar-se numa força política mais moderada, capaz de vir a integrar ou apoiar um futuro governo de esquerda, mesmo que fosse só à imagem da “geringonça” em Portugal. Iglesias, um homem que parece mais mastigado pelo sistema político espanhol do que o contrário, deixou claro em 2015, quando liderada uma força de cerca de 70 deputados no Congresso: o caminho seria integrar um governo, pôr homens e mulheres do Podemos nos ministérios. Para si, estaria reservada a vice-presidência do Governo. Teve mais olhos do que barriga e, na altura, Sánchez disse que não. Na campanha para as eleições deste domingo, Iglesias insistiu que queria ir para a Moncloa, num primeiro governo de coligação da história da democracia espanhola. Problema: desta vez teve mais barriga do que olhos. Os 71 deputados que Iglesias tinha em 2016 reduziram-se nesta votação para 42. Muitos deles passaram diretamente para o PSOE de Sánchez, que continua a poder ser eleito (no Congresso), mas sem que Iglesias seja tão decisivo quanto ao caminho a seguir. “É evidente que gostaríamos que os resultados fossem melhores”, mas “conseguimos um resultado suficiente” para dois objetivos: “Travar a direita e a extrema-direita e formar governo de coligação com a esquerda”. A tónica nesta frase está no adjetivo “suficiente”.

Carles Puigdemont

.

Neste tipo de textos há sempre um “joker”. Neste caso tocou ao antigo presidente da Generalitat (governo regional catalão) que declarou a independência da região em outubro de 2017 e, face à resposta do Governo central em Madrid, fugiu para a Bélgica para não ser preso. A partir “da Europa” — como costuma dizer — Puigdemont continuou a travar uma guerra mediática contra o Estado espanhol, que chegou a tentar a sua extradição a partir da Alemanha. Mas por que razão está Puigdemont entre os vencidos destas eleições? Simples: os catalães foram em massa às urnas neste domingo e, pelo seu voto, deram a vitória na região à ERC (Esquerda Republicana Catalana), o partido de Oriol Junqueras, o número dois de Puigdemont, que não fugiu de Espanha após a declaração de independência de 2017 e que continua preso por “rebelião e sedição”. O partido de Puigdemont, o Junts pel Catalunya (JxCat) manteve o mesmo número de deputados (sete), mas a ERC passou de 9 para 15 deputados, o que lhe dará uma força inédita no parlamento em Madrid. A Puigdemont, que afirma estar em “exílio”, resta-lhe assim uma última oportunidade de manter a relevância política: as eleições europeias de 26 de maio, na qual lidera a lista da JxCat. Mas os catalães já terão dito este domingo, nas urnas, o que pensam da sua fuga. E isso faz dele um dos vencidos da noite.