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Conotado com a imagem de "candidato dos ricos", Macron não desarma no seu propósito de reformar França

Getty Images

Conotado com a imagem de "candidato dos ricos", Macron não desarma no seu propósito de reformar França

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Emmanuel Macron. O "patrão" da França Lda. voltará a ser coroado Presidente-Rei?

Em 2017, surgiu como um fenómeno "do centro" e eclipsou os socialistas. Cinco anos depois, tentou liberalizar a economia francesa e destruiu o centro-direita. Mas o estilo de Júpiter pode derrubá-lo.

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Um homem sozinho, a caminhar lentamente na Praça do Louvre, ao som do Hino da Alegria. Foi assim que Emmanuel Macron chegou na noite eleitoral de 2017, quando foi eleito Presidente francês, antes de se dirigir ao púlpito para o discurso de vitória.

O cenário foi estudado milimetricamente, nenhum pormenor deixado ao acaso. O local foi escolhido por ser considerado mais “neutro”, face a locais como uma Praça da Concórdia “de direita” ou uma Bastilha associada à esquerda, como lembrava o Figaro. O Hino da Alegria trazia a marca europeísta das suas ideias. O facto de chegar sozinho ilustrava a ideia de concentração de poder na figura do Presidente — que, já dizia Macron dois anos antes, devia ocupar o “vazio emocional, imaginário, coletivo” deixado pela execução do Rei pelo Terror, em França.

Agora, em 2022, Macron já foi apelidado de homem-providencial de várias formas. Assumiu-se como uma lufada de ar fresco, um político de rutura, uma figura nem de esquerda nem de direita. Foi comparado a Napoleão e a Luís XIV. Ganhou a alcunha de Júpiter, líder dos deuses na mitologia greco-romana, depois de ter dito que o seu antecessor “não acreditava no Presidente jupiteriano” e que ele sim.

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Emmanuel Macron Celebrates His Presidential Election Victory At Le Louvre In Paris

Macron em frente ao Louvre na noite eleitoral de 2017

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Mas, à beira de uma possível reeleição, Emmanuel Macron enfrenta uma campanha eleitoral muito diferente da de 2017. À altura, “era um fenómeno completamente novo”, como diz ao Observador Luc Rouban, investigador da Sciences Po e autor do estudo Le Paradoxe du Macronisme (O paradoxo do macronismo), destacando a falta de passado político do candidato Macron. “Apresentou-se como o porta-voz da esquerda, mas de uma esquerda moderna, muito europeia, ligada às ideias da gestão e nada relacionada com o passado ou a história do Partido Socialista.” Agora, garante o investigador, “é tudo muito diferente”.

O “candidato sem campanha” que tenta convencer o eleitorado de Mélenchon

Macron e a sua equipa do En Marche! querem acreditar que cinco anos de presidência não terão causado desgaste suficiente para impedir a reeleição face a Marine Le Pen, da União Nacional (extrema-direita). Mas, apesar de Macron continuar à frente nas sondagens, nada está garantido. Das fileiras do En Marche! saem alguns desabafos: “Há pouco interesse na campanha, que carece de magia”, comenta uma fonte com o Télégramme. “Em 2017, já fomos atingidos pelo candidato sem programa. Desta vez, estamos a ser enganados pelo candidato sem campanha. É a mesma velha história”, comenta outro membro do partido com a Paris Match.

Enquanto Macron falava sobre o papel da Europa e apelava a um cessar-fogo na Ucrânia — deixando-se até fotografar em estilo descontraído a telefonar a Vladimir Putin —, Marine Le Pen ia fazendo uma campanha focada sobretudo no “aumento do custo de vida”, o que agradou a muitos eleitores na primeira volta.

Luc Rouban fala mesmo numa campanha “emperrada” quando comparada com a de 2017, com Macron a partir com atraso: “Durante muito tempo, ele manteve-se na arena internacional, usando a guerra da Ucrânia para criar um efeito de rally around the flag [união em torno da bandeira]. E é verdade que isso se traduziu nalgum apoio, porque ele é muito dinâmico a nível europeu e posiciona-se contra Vladimir Putin”, explica. “Macron arriscou, mas acabou por ser colocado fora de campo por Le Pen. Agora, está a tentar entrar outra vez, partindo em campanha para o interior do país, para as várias regiões.”

France's Presidential Election 2022

"Nous tous" é o novo slogan da campanha de Macron para a segunda volta

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Se na primeira volta foi uma campanha em banho-maria, a uma semana da segunda volta Macron parece ter acordado. Em poucos dias, já esteve no norte do país — território da Frente Nacional — e em Marselha. O sloganAvec vous” [Convosco] foi substituído por “Nous tous” [Nós todos], para tentar “reunir todas as sensibilidades”. A “solidariedade” e a “igualdade de oportunidades” serão marcos do novo mandato, garantiu.

O piscar de olho ao eleitorado de Jean-Luc Mélenchon, terceiro classificado na primeira volta, é claro: com alguns eleitores da França Insubmissa (extrema-esquerda) a anunciarem o voto agora em Le Pen, Macron precisa de convencer esta fatia do eleitorado, cavalgando a ideia de que é necessário construir uma “barragem” contra “a extrema-direita”. Mas, perante o discurso económico de Le Pen, até muitos dos eleitores mais à esquerda ponderam dar-lhe o seu voto. “Para muitos dos eleitores de Mélenchon, há uma lógica de protesto social, quase até de luta de classes”, resume o professor Rouban. “Le Pen já não é tanto a representante da extrema-direita, mas sim a representante da raiva da classe trabalhadora.”

"O posicionamento político de Macron movimentou-se para a direita. Ele já não é o candidato da esquerda moderna, é o candidato do centro-direita, da nova direita liberal.”
Luc Rouban, autor do estudo 'O Paradoxo do Macronismo'

Na noite eleitoral de 10 de abril, Mélenchon pediu aos seus eleitores que “não votem na senhora Le Pen”. Mas, mesmo assim, tal não significa que Macron possa contar com todos esses votos garantidamente. Na sondagem promovida pelo próprio França Insubmissa no passado fim-de-semana, mais eleitores disseram que iriam votar em branco ou invalidar o voto (37,7%) do que em Macron (33,4%). Embora, como note Rouban, muitos dos que se pronunciam na sondagem tenham um perfil mais ativista do que a maioria dos eleitores comuns de Mélenchon. “Não sabemos nada. Aquilo que temos é uma grande incerteza”, avisa o especialista.

Centrista e “nem de esquerda nem de direita”. O que é o “macronismo”, afinal?

Mas por que razão é tão difícil para muitos eleitores da extrema-esquerda darem o seu voto a Macron, um candidato que em 2017 surgiu para ocupar o vazio deixado por um Partido Socialista moribundo? Para Luc Rouban, a resposta é clara: “Porque o posicionamento político de Macron movimentou-se para a direita. Ele já não é o candidato da esquerda moderna, é o candidato do centro-direita, da nova direita liberal.”

Ao longo dos últimos cinco anos, Macron deixou claro que quer aplicar em França uma agenda económica mais liberal, tendo dito pouco depois de ser eleito que gostaria que o país se tornasse numa “Nação Start-Up”. Logo em 2017 apresentou uma reforma laboral, a que se seguiram tentativas de uniformizar o sistema de pensões nacional, ambas provocando manifestações intensas nas ruas do país. No ano seguinte, seguir-se-iam os protestos dos “Coletes Amarelos”: “Ele merecia que lhe cortassem a cabeça. Simbolicamente, é claro”, diria um dos manifestantes.

French Unions Take To The Streets Again In National Strike Effort

As reformas económicas de Macron provocaram vários protestos em França

Getty Images

Consigo na presidência, o desemprego tem vindo a cair, com exceção do período pós-Covid — tendo entretanto descido para os 7,4%, valor mais baixo da última década. Mas na memória de muitos eleitores perduram mais outros momentos, como o da troca de argumentos com um jovem desempregado, em 2018: “Sinceramente”, disse-lhe o Presidente. “Num hotel, café, restaurante: atravesso a rua e encontro-lhe [um trabalho]”

Ao mesmo tempo, Macron move-se para a direita também noutras matérias. Com declarações como a de que “o Islão político não tem lugar em França” e promovendo a sua “Carta de Princípios para o Islão”, tentou esvaziar a extrema-direita, mas acabou apenas por aniquilar o centro-direita tradicional dos Republicanos, de Nicolas Sarkozy. Para Rouban, tratou-se essencialmente de estratégia eleitoral: “A opinião pública francesa, em geral, ‘direitizou-se’, sobretudo na questão da imigração de África e do Islão”, resume. “A direita de Valérie Pécresse ficou completamente presa entre Macron e Le Pen. E aí, Macron interveio à esquerda, envolvendo o Estado no combate à crise económica da Covid-19, por exemplo, ao gastar 100 mil milhões de euros para ajudar as empresas.”

Nem de esquerda nem de direita, diz-se Macron. Será uma questão ideológica ou pragmática? Rouban acredita que a viragem do “macronismo” não é assim tão brusca — afinal, já em 2015 Macron dizia que a esquerda não podia fazer política “contra as empresas ou, pelo menos, sem elas”. “Ele não é um homem de esquerda, sempre foi um liberal”, é a convicção deste académico. “É liberal em termos culturais, em questões como a imigração, e é liberal em termos económicos.” E o “macronismo”, diz, “ainda é fiel a si mesmo”.

Alguns, como Rouban, consideram que Macron sempre foi economicamente à direita — o filósofo Philippe Raynaud chegou mesmo a escrever que o Presidente é como “o corno da aldeia: todos sabem que ele é de direita, menos ele”.

Emmanuel Macron, Candidate For France's La Republique En Marche Party, Campaigns For President

Macron em campanha em Marselha, uma das últimas paragens para tentar apelar a eleitores de Mélenchon

Getty Images

Outros consideram que essa é a visão míope de quem não entende que o “macronismo” representa uma transformação pragmática da sociedade, que já não cabe nos espartilhos tradicionais do eixo esquerda-direita: “Muitas vezes me perguntaram por que eu, classificado mais à direita, me coloquei ao lado de um candidato das fileiras socialistas em 2016”, refletiu o antigo conselheiro Sylvain Fort num artigo publicado na edição mais recente da Deux Mille Vingt-Deux. “A razão é simples: o Macronismo pareceu-me à altura uma tentativa histórica de reconstruir uma leitura política do mundo a partir da realidade, e não o contrário, e de fundamentar um método político nas necessidades cada vez mais óbvias da ação.”

O problema é que, independentemente da leitura que se faça, o projeto de Macron não convence muitos franceses. “Quando fazemos sondagens aprofundadas percebemos que uma grande parte do eleitorado partilha os valores de Marine Le Pen: pouco liberalismo cultural e liberalismo económico moderado. Ou seja, gostamos de empresas, mas também gostamos muito de serviços públicos”, resume Rouban. Talvez por isso, as propostas de Macron neste ano de 2022 incluem medidas como a obrigatoriedade de as empresas que têm lucros partilharem parte deles com os trabalhadores.

O estilo “like a boss” que “rompe, seduz e domina” — mas não todos

Mas Emmanuel Macron não desarma no seu propósito de reformar França. Semanas antes da primeira volta das eleições, anunciou a sua intenção de aumentar a idade da reforma dos 62 anos atuais para os 65, o que provocou a ira de grande parte do eleitorado e o fez recuar — fala agora nos 64 anos, numa medida “faseada” e com acordo com a concertação social.

A imagem de Macron como a do “candidato dos ricos” ou “das empresas”, porém, está-lhe colada à pele para muitos eleitores. A que se soma a questão do estilo que, em política, nunca pode ser ignorado. A ideia de Macron como “um alto-quadro, alguém ligado a uma cultura elitista” permanece, alerta Rouban. “Ele nunca teve uma carreira política e, por vezes, não tem os reflexos dos políticos, não tem o discurso habitual. E isso faz com que às vezes pareça brutal”.

Macron votes in the first round of the French presidential elections

O estilo de Emmanuel Macron é visto por muitos eleitores como elitista

Anadolu Agency via Getty Images

Para os “macronistas”, porém, essa é a marca de água de um homem diferente dos outros. O deputado Jean-Louis Bourlanges, eleito pelo MoDem que apoiou o En Marche! em 2017, resumiu a sua postura em três palavras: romper, seduzir, dominar. “Romper com o passado porque somos novos; seduzir porque ele é jovem e bonito; dominar porque ganhamos tudo e isso deve ser conhecido”, escreveu num ensaio publicado no L’Opinion.

Para o professor Luc Rouban, tudo se resume na “cultura de gestão aplicada à política” do “macronismo”, de liderar o país como se fosse uma empresa: a França Lda. “Macron gosta de liderar, like a boss”, diz o investigador francês, pedindo a expressão emprestada aos ingleses. “Gosta de se levantar em frente aos empregados e explicar a sua estratégia, mas sem um verdadeiro diálogo, com uma comunicação unilateral. ‘Eu falo, mas vocês ouvem, porque o patrão sou eu’”, aponta. Um estilo “pedagógico”, de “dar lições”, que não cai bem em algum eleitorado. “Sentem como se alguém distante, que pertence à elite, tivesse finalmente aceitado fazer campanha entre os trabalhadores franceses”, resume o professor. Como se Júpiter tivesse descido à terra para iluminar os comuns mortais.

“Qualquer pessoa que tenha apertado a mão a Macron é um voto perdido para a oposição: estão destinados a votar em Macron e a converte-ser ao macronismo.” Carrère, porém, aponta um problema gigante: “Não é possível apertar a mão a toda a gente do país.”

Mas o efeito de encanto sobre parte do eleitorado também existe, de facto. Isso mesmo descreveu o escritor francês Emmanuel Carrère, num ensaio publicado depois de passar algum tempo com Macron e a sua equipa: “Em qualquer evento, não importa se se pensa que a sua ascensão é um milagre político ou uma miragem destinada a desvanecer-se, todos concordam: ele é capaz de seduzir uma cadeira”, escreveu o autor. “Qualquer pessoa que tenha apertado a mão a Macron é um voto perdido para a oposição: estão destinados a votar em Macron e a converter-se ao macronismo.” Carrère, porém, aponta um problema gigante: “Não é possível apertar a mão a toda a gente do país.”

Perante este bicudo problema, num país de quase 70 milhões de habitantes, Emmanuel Macron aposta tudo na semana final da campanha. Encosta Le Pen cada vez mais à extrema-direita e a Putin, enquanto promete ouvir as vozes de todos e ter em conta o eleitor comum. A sua imagem messiânica é desincentivada, à medida que a fotógrafa oficial vai preenchendo as suas redes sociais com imagens de Macron a tirar selfies com adolescentes, a beijar crianças, a apertar a mão a idosos. Um homem comum, que abraça a mulher e descansa ao final do dia com a gravata desapertada — ou mesmo até com a camisa desabotoada. Chegará para convencer os desiludidos, os indecisos e os enojados com a extrema-direita de Le Pen? Este domingo, saberemos. Aí veremos se Macron voltará a caminhar sozinho e triunfante para voltar a ser coroado Presidente ou se os franceses optaram por lhe cortar, simbolicamente, a cabeça.

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