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Péter Magyar está a consolidar-se como um dos principais opositores a Viktor Orbán
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Péter Magyar está a consolidar-se como um dos principais opositores a Viktor Orbán

Péter Magyar está a consolidar-se como um dos principais opositores a Viktor Orbán

"Estamos a ser governados por uma máfia". O novo rival de Orbán que quer construir "uma nova Hungria"

Péter Magyar é o novo rosto da oposição húngara. Foi casado com a ex-ministra da Justiça e afilhada política de Orbán, mas entrou em rota de colisão com o Fidesz e expôs um alegado caso de corrupção.

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De um político pouco conhecido a uma estrela em ascensão na política húngara. Há um ano, as funções de Péter Magyar eram eclipsadas pelas da ex-mulher, Judit Varga, que desempenhou o cargo de ministra da Justiça durante quatro anos. O casal fazia capas de revista cor de rosa, representando a imagem de uma família ideal, mas poucos anteviam que o antigo advogado, que trabalhou no Parlamento Europeu, se transformasse em alguém capaz de mobilizar milhares de pessoas para participarem em protestos contra o regime. Esta terça-feira, o homem de 43 anos foi o rosto mais visível de uma manifestação, em frente ao parlamento em Budapeste, que pedia a demissão do executivo liderado por Viktor Orbán — a quem chamou “líder de uma máfia”, assim como ao procurador-geral húngaro.

Num país em que o Fidesz — o partido que está no poder desde 2010 — domina quase por completo o panorama político húngaro (uma das exceções é a Câmara Municipal de Budapeste), Péter Magyar está a consolidar-se como um dos principais opositores a Viktor Orbán. Nas últimas eleições parlamentares de 2022, a oposição contra o primeiro-ministro tentou formar uma frente unida, que juntava partidos da direita à esquerda. No entanto, o resultado foi dececionante, com o Fidesz a aumentar o número de votos e de deputados.

Ora, Péter Magyar não é um típico nome da oposição e nem sempre esteve contra Viktor Orbán ao longo da sua trajetória política. Pelo contrário: o homem de 43 anos integrou o Fidesz (ainda que nunca tenha tido grande destaque) e desempenhou cargos nas instituições europeias em representação daquele partido. Foi durante anos casado com uma das afilhadas políticas do primeiro-ministro húngaro. Conhecia bem o sistema. Daí que o seu nome esteja associado a uma imagem de whistleblower — de alguém que ganhou coragem para enfrentar o regime no qual esteve inserido, expondo os seus podres.

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Péter Magyar na manifestação da passada terça-feira, em Budapeste

Getty Images

Prova disso foi o que motivou as manifestações desta terça-feira em Budapeste. Numa ação com grande mediatismo, o antigo advogado entrou na sede da procuradoria-geral da Hungria e entregou um áudio, tendo-o revelado igualmente nas redes sociais. O ficheiro mostrava que a sua ex-mulher, na altura ministra da Justiça, tinha combinado com o chefe da gabinete de Viktor Orbán, Antal Rogan, encobrir provas de um alegado processo de corrupção em que estavam envolvidos membros do governo, intercedendo junto do Ministério Público para esse efeito. “Mandaram riscar [os seus nomes dos documentos], propuseram aos procuradores o que deveriam apagar”, afirmou Judit Varga no áudio.

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O caso ganhou grande destaque, num governo que ainda tenta sarar as feridas de outro processo de corrupção, envolvendo precisamente Judit Varga e a ex-Presidente húngara, Katalin Novák. A antiga chefe de Estado amnistiou um homem que encobriu casos de abusos sexuais a menores, um duro golpe para um executivo conservador que tem adotado políticas a favor da natalidade e da “família tradicional”. Quem também se viu envolvida neste processo foi a antiga ministra da Justiça, que não bloqueou a iniciativa presidencial. Assim, a antiga mulher de Péter Magyar assumiu igualmente responsabilidade e demitiu-se.

Este escândalo tinha ficado limitado à presidência húngara e ao governo — e a popularidade de Viktor Orbán não saiu com grandes mazelas. No entanto, o áudio revelado, a ser verdade, mostra mais um alegado caso de corrupção no executivo, envolvendo diretamente o gabinete do primeiro-ministro. É neste contexto e perante todos estes episódios que Péter Magyar procura galvanizar a sociedade civil. O homem pede uma “investigação” sobre o que assume ser o “maior escândalo político e de corrupção nas últimas décadas”. “Queremos a demissão do governo e da procuradoria-geral.”

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Manifestação em Budapeste esta terça-feira
Getty Images
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Protestos contaram com milhares de pessoas
AFP via Getty Images
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Peter Mágyar com uma bandeira da Hungria na manifestação
Getty Images

No meio de todas estas polémicas, Judit Varga lamentou as atitudes do ex-marido e acusou Péter Magyar de “violência psicológica e física”. Em duas longas publicações nas redes sociais, a ex-ministra da Justiça, que Viktor Orbán queria que fosse cabeça de lista pelo Fidesz às eleições europeias marcadas para 9 de junho, denunciou os alegados maus-tratos: “Ele fez uma gravação secreta, na nossa antiga casa partilhada, e usou-a para atingir os seus objetivos políticos. Uma pessoa assim não merece confiança nenhuma. O homem a quem dei três filhos fez isso. O homem a quem dei inúmeras chances de recomeçar, após anos horríveis de abusos sexuais, fez isto comigo”.  

Quem é Péter Magyar? “Nem de esquerda, nem de direita”, mas mais alinhado com Bruxelas

Oriundo de uma família pertencente à elite política húngara, Péter Magyar nasceu em março de 1981 em Budapeste. O seu tio-avô é o antigo Presidente da Hungria, Ferenc Mádl, e o seu avô materno, Erőss Pál, foi juiz no Supremo Tribunal húngaro. Estudou Direito entre Hamburgo e a capital húngara e, quando acabou o curso, trabalhou numa grande consultora na área do Direito Internacional.

Casa com Judit Varga em 2006 e, três anos depois, o casal muda-se para Bruxelas, onde a ex-mulher foi conselheira de um eurodeputado húngaro. Nos anos que seguiram, Péter Magyar foi assumindo cargos no Parlamento Europeu, enquanto a antiga companheira apostava mais numa carreira política dentro da Hungria, principalmente no Fidesz. Nas eleições parlamentares húngaras de 2018, Viktor Orbán escolheu-a inicialmente como ministra para as Relações com a União Europeia e, um ano depois, Varga passou para ministra da Justiça.

epa09968293 Hungarian Minister of State for European Union Relations Judit Varga speaks to the press ahead of a General Affairs Council at the European Counci in Brussels, Belgium, 23 May 2022.  EPA/STEPHANIE LECOCQ

Judit Varga, a ex-mulher de Péter Magyar e antiga ministra da Justiça

STEPHANIE LECOCQ/EPA

Publicamente, nos anos em que se mantiveram juntos, Judit e Péter eram tidos como um power couple e um casal exemplar no seio da elite política húngara, fazendo manchetes nas revistas cor de rosa. Numa entrevista à publicação Kepmas, já como ministra da Justiça, a governante comentou que “não apenas aparentavam ser um casal forte de fora”, como também o eram “por dentro”. 

A dinâmica do casal — em que a mulher tinha um cargo mais elevado do que o homem —, era também alvo de comentários. Por conta das políticas conservadoras e de incentivo à natalidade adotadas por Viktor Orbán, Péter Magyar confessou, na entrevista, que às vezes era “gozado pelos amigos”, que lhe perguntavam “quem vestia as calças” na relação. A antiga ministra da Justiça elaborou a resposta, defendendo o ex-marido: “Eu sempre experimentei a maternidade e as tarefas que se atribuem tradicionalmente às mulheres. Estive numa gaiola com a porta aberta. Sei que se quisesse arriscar noutra área, podia sempre voar. O Péter nunca esperou que eu desistisse”.

Em 2023, o casal divorcia-se, sem detalhar os motivos. A separação, que não terá sido em termos amigáveis, tornou dois aliados políticos em rivais. O momento em que rebentou o escândalo de pedofilia foi o momento em que Péter Magyar se assume publicamente como uma voz crítica do regime, demitindo-se de todos os cargos que ocupara em empresas estatais. Reagindo à demissão da antiga Presidente e da ex-mulher, o homem de 43 anos afirmou, em fevereiro deste ano, que não queria mais fazer “parte de um regime em que as pessoas que mandam se escondem atrás de saias de mulheres”. 

"Não quero fazer parte de um regime em que as pessoas que mandam se escondem atrás de saias de mulheres"
Péter Magyar numa crítica à maneira como o governo húngaro lidou com o escândalo da pedofilia

Numa crítica à desresponsabilização dos governantes pelo caso de pedofilia, o antigo advogado mostrava a desilusão com os atuais políticos: “Durante muito tempo acreditei na ideia de uma Hungria nacional, soberana e civil e tentei contribuir [para isso] com meios modestos. Mas, ao longo dos anos, finalmente percebi que se tratava de um produto político que apenas serve dois propósitos: encobrir uma fábrica de poder e adquirir enormes quantidades de dinheiro”.

“Acredito que a Hungria é um país que não pertence a oligarcas e a algumas famílias influentes, mas é o país daqueles que lutaram pela liberdade em 1956 [ano da Revolução Húngara, abafada pelo Partido Comunista com a ajuda da União Soviética]”, prosseguiu Péter Magyar. Este argumento — de que existe uma “máfia” à frente dos desígnios de Budapeste — é o princípio que tem norteado as declarações públicas do novo opositor ao regime.

Nos protestos que convocou esta terça-feira, quando entregou o áudio que podia gerar outro escândalo à elite política e judiciária da Hungria, Péter Magyar deixou uma pergunta no ar, incentivando à mudança política: “O que é mais preciso para que olhos dos húngaros se abram para ver que a Hungria está a ser governada por um máfia?”

A par desta mensagem, há outra que o homem de 43 anos tem insistido: a de que é possível mudar a Hungria. “Tudo o que peço é que tenham esperança. Esperança de que um tipo diferente de Hungria é possível. Estou a pedir a vossa ajuda”, salientou, indicando que quer construir um “novo país para os nossos netos e os nossos filhos”. Prometendo aumentar a luta nas ruas, Péter Magyar marcou protestos para dia 6 de abril, no que prevê que seja a “maior manifestação dos últimos 14 anos” contra o regime.

Em termos concretos, Péter Magyar já admitiu que vai fundar um partido em breve, para poder enfrentar Viktor Orbán nas urnas. Ainda assim, o novo opositor nunca revelou quais são as ideias ou ideologia que estarão por trás de uma nova força política. Apenas se define como sendo “nem de esquerda, nem de direita” e tendo apenas um objetivo: “Recuperar a pátria e construir uma nova Hungria europeia, soberana, feliz e moderna”. 

A referência à uma “Hungria europeia” não é em vão — aliás, várias bandeiras da União Europeia foram vistas nos protestos desta terça-feira. Viktor Orbán tem estado em rota de colisão com as autoridades da UE e não poupa críticas à presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen. Ora, Péter Magyar, ainda que oriundo do Fidesz, parece adotar uma postura mais pró-europeia.

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Peter Mágyar com uma bandeira da União Europeia por trás nos protestos de terça-feira

NurPhoto via Getty Images

Em declarações ao The Guardian, Magyar revelou que entrou na vida política, após uma “longa luta interna”, destacando, ainda assim, que foi uma “decisão súbita e rápida”. “Não tinha planos para entrar na política. Vi-me obrigado a dizer publicamente a verdade sobre o governo e os oligarcas”, disse, sublinhando que “recebeu milhões de mensagens de encorajamento para entrar na política e organizar um terceiro partido político, que deve ser independente do governo e da oposição”.

Ao mesmo jornal, uma fonte do Parlamento Europeu comentou que Péter Magyar representaria o “centro-direita clássico”, ideologia da qual o Fidesz se foi afastando ao longo dos anos. Defensor da soberania húngara, o homem de 43 anos quer, no entanto, apostar numa política externa de boas relações com Bruxelas e a NATO.

Um “fenómeno de três dias” ou algo que veio para ficar? As chances de Péter Magyar

“Um homem mau com um grave transtorno de personalidade narcisista.” Em duas publicações nas redes sociais, a ex-ministra da Justiça deixa duras crítica a Péter Magyar. Judit Varga alega que o ex-marido a “chantageava há muito tempo” e que a divulgação do áudio foi uma vingança. “Ele não tem alma e coração”, ataca a antiga governante, falando numa “raiva e vingança narcisistas, destrutivas e impiedosas” que não “poupam filhos ou amigos”.

"Um homem mau com um grave transtorno de personalidade narcisista. Ele não tem alma e coração"
Judit Varga sobre o ex-marido

Estas acusações são “repugnantes”, ripostou Péter Magyar no Facebook, falando numa “tentativa de assassínio de carácter”. Mas não responsabilizou a ex-mulher diretamente; em vez disso, culpou o “governo da máfia” que a está a “chantagear” para o “descredibilizar” perante os húngaros. “Não vou travar uma guerra pública, porque sei exatamente que ela é apenas um instrumento nas mãos do poder corrompido”, garantiu.

Independentemente do que seja ou não verdade, certo é que as acusações de violência doméstica contra Péter Magyar poderão ser prejudiciais para uma futura carreira política. E poderão mesmo ser um trunfo para Viktor Orbán, que o poderá usar para descredibilizar o futuro adversário e para lhe apontar comportamentos desviantes.

Neste sentido, fonte do governo húngaro disse ao The Guardian que Péter Magyar “quer vingar-se” do executivo, porque Judit Varga o deixou e perdeu “todos os empregos no Estado”. “As suas alegações não têm fundamento. Tudo o que ele diz é conversa fiada”, atira o executivo, desvalorizando as suas ações, incluindo as manifestações.

epa10882416 Hungarian Prime Minister Viktor Orban delivers his address on the first day of the parliament's autumn session in Budapest, Hungary, 25 September 2023.  EPA/Zoltan Mathe HUNGARY OUT

Governo de Viktor Orbán acredita que Peter Mágyar está a gerir por vingança

Zoltan Mathe/EPA

Em relação às suas chances políticas, ainda não são completamente claras, dado que passou cerca de um mês e meio desde que assumiu as suas ambições. Fonte do Fidesz considera ao The Guardian que é um “fenómeno de três dias”, por ser um recém-chegado à política, sem grande experiência. De acordo com uma sondagem publicada no início de março, 13% dos húngaros disseram que votariam em Péter Magyar. Este estudo de opinião não teve em consideração, ainda assim, a divulgação do áudio e os novos protestos.

Para Sámuel Ágoston Mráz, analista político húngaro e diretor do Instituto estatal Nézőpont, destinado a estudar a opinião pública, Péter Magyar não é um fenómeno de one-man show e haverá pessoas nos bastidores, que ainda não divulgaram a sua identidade, a ajudá-lo politicamente. Em declarações ao jornal index, o especialista assinala que o homem de 43 anos traz, de facto, problemas ao Fidesz, mas também à oposição, dado que o rosto do antigo advogado é único visível nos meios de comunicação social, sendo igualmente capaz de gerar um grande mediatismo por conta das polémicas com a ex-mulher.

Adicionalmente, o mesmo analista considera que o sucesso de Péter Magyar dependerá de quantas pessoas conseguirá motivar na base eleitoral do Fidesz, que também pode aproveitar para cerrar fileiras e dirigir o alvo contra aquele ex-membro, apresentando-o como um traidor.

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Peter Mágyar é um fenómeno na política húngara, mas conseguirá manter o momentum?

AFP via Getty Images

No entender do cientista político Andras Biro-Nagy, o sucesso do ex-marido da antiga ministra da Justiça dependerá de ser “capaz de continuar” o ímpeto que tem tido nos últimos tempos, assim como a “atenção” que tem recebido da imprensa húngara. A manifestação de 6 de abril, que promete ser uma das “maiores de sempre”, poderá ser uma oportunidade para isso. Contudo, à Deutsche Welle, aquele especialista nota uma desvantagem para Péter Magyar: “Existem grandes expectativas. São tão altas, nomeadamente a de que poderá derrubar o governo, que poderá desiludir muitos”.

Tal como apontou Sámuel Ágoston Mráz, o fenómeno de Péter Magyar na política húngara pode originar uma canibalização da oposição por parte do antigo advogado. A menos de três meses das eleições europeias e municipais, terá de haver um maior esforço para que outros partidos e outras vezes se consigam afirmar.

Mas nem tudo é mau para a oposição. Katalin Cseh, eurodeputada do partido liberal Momentum, disse ao jornal Politico que Péter Magyar pode ter dado um sinal importante a outros membros do Fidesz desagradados com o rumo do partido. “Espero que outros antigos membros do governo falem e aceitem que existe vida fora do sistema. Há uma grande necessidade que corram esse risco”, sinaliza.

"Espero que outros antigos membros do governo falem e aceitem que existe vida fora do sistema. Há uma grande necessidade que corram esse risco"
Katalin Cseh, eurodeputado pertencente a um partido da oposição

“Muitas pessoas estão a começar a pensar que algo se está a desmoronar dentro do sistema”, aponta ainda Katalin Cseh. Mesmo que até seja um fenómeno passageiro na política húngara, certo é que Péter Magyar veio agitar as águas e mostrar que, por muito que Viktor Orbán tente controlar o regime colocando à sua volta pessoas da sua confiança, pode haver surpresas.

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