A Infraestruturas de Portugal (IP), a empresa pública que gere a rede ferroviária nacional, teve de celebrar um contrato de eletricidade por dois meses com a Endesa, depois de o concurso público lançado para o fornecimento por um ano e meio ter ficado deserto.

A IP é um dos maiores clientes de eletricidade em Portugal e tinha um contrato com a elétrica espanhola de seis meses que terminou em junho, no valor de 20 milhões de euros. Fonte oficial da IP confirmou ao Observador a contratação da Endesa por mais dois meses, com início em agosto e duração até setembro, e explicou que este fornecedor foi escolhido depois de uma consulta preliminar a todos os fornecedores registados pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), tendo a Endesa apresentado o melhor preço numa base fixa.

Fonte oficial da IP esclarece ainda que a decisão de realizar este contrato temporário foi tomada “face à instabilidade de preços e de modo a definir a estratégia que melhor salvaguarde os interesses da IP, o presente contrato, delimitado temporalmente”. O Observador sabe que a empresa está a avaliar a possibilidade de aderir à tarifa regulada, que pode ser aplicada aos grandes clientes de eletricidade em determinadas situações, nomeadamente em caso de concursos públicos desertos.

Foi a primeira vez que um concurso desta dimensão da IP ficou vazio e esse é um reflexo da dificuldade que os grandes consumidores , mas também as elétricas, estão a sentir em conseguir condições competitivas para fornecer os seus clientes, no contexto de escalada e incerteza de preços.

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O contrato ainda não foi disponibilizado no portal base e o seu valor não foi revelado pela empresa pública. Mas o pagamento das faturas poderá estar abrangido pelo despacho publicado esta terça-feira por António Costa, que condiciona a liquidação destas despesas por parte das entidades da administração pública direta e indireta à validação prévia do valor faturado por parte do secretário de Estado da Energia, João Galamba. O Observador questionou o Ministério da Ação Climática e o gabinete do primeiro-ministro sobre se esta medida abrangia empresas públicas, mas não obteve resposta até ao momento.

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O contrato entre a Endesa e a IP visa abastecer a rede ferroviária nas componentes de muito alta tensão (MAT) e alta tensão (AT), para alimentação da catenária (que alimenta os comboios movidos a eletricidade), bem como de média tensão (MT) e baixa tensão especial (BTE) para alimentação de estações, edifícios técnicos e administrativos.

Para ter uma ideia do aumento de preços em causa, a fatura da IP com o fornecimento de eletricidade em 2020 e 2021 variou entre 14 e 15 milhões de euros, mas só para o abastecimento dos primeiros seis meses do ano, a IP pagou à Endesa 20 milhões de euros, num contrato que terminou no final de junho.

O concurso lançado em abril tinha um valor base de 35 milhões de euros, estava dividido em quatro lotes e para um prazo de validade de um ano e meio. O preço era o principal critério de avaliação, tendo um peso de 95%.

O fornecimento na componente de baixa tensão da empresa já está todo no mercado regulado, ao abrigo da instabilidade dos preços e fornecimentos de mercado, tendo envolvido a migração automática de mais de mil contratos. As tarifas do mercado regulado são fixadas pela ERSE, sendo os fornecimentos garantidos através do CUR (comercializador do último recurso).

Os últimos dados sobre a evolução do mercado liberalizado disponibilizados pela ERSE indicam que o número de grandes clientes (muito alta tensão) na tarifa regulada passou de 2 para 5 no último ano. Não obstante, a quantidade de energia consumida por estes clientes caiu. Já o número de clientes industriais abastecidos pela tarifa regulada duplicou no último ano, sendo atualmente pouco mais de mil. Este aumento tem sido acompanhado pelo crescimento da quantidade de energia comercializada. Desde 2017 que é possível aos clientes do mercado liberalizado voltarem à tarifa regulada, mas este procedimento é mais limitado para as empresas.

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O contrato de seis meses da IP, que terminou em junho, é o maior em valor dos que foram celebrados entre a Endesa e várias entidades públicas, muitas das quais são autarquias. O despacho de António Costa condiciona à validação prévia do gabinete de João Galamba o pagamento da faturas à Endesa da administração direta e da administração indireta do Estado, o que à partida excluirá autarquias. Esta medida é tomada na sequência de declarações feitas pelo presidente executivo Nuno Ribeiro da Silva a admitir que os custos do mecanismo ibérico que limita os preços da eletricidade podem vir a trazer aumentos significativos aos consumidores, incluindo domésticos. O que o Governo refuta.

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No mesmo despacho, o primeiro-ministro dá instruções à empresa de serviços partilhados, a ESPAP, que cautelarmente inicie consultas de mercado, para a eventual necessidade de contratação de novos prestadores de serviço que mantenham práticas comerciais adequadas. Pela experiência da IP não será fácil encontrar alternativas a preços competitivos.

Por outro lado, há outros contratos com entidades públicas que vencem em breve, incluindo o da Carris, que tem um procedimento de 1,1 milhões de euros com a Endesa que termina em outubro, para além das autarquias de Cascais e Castelo Branco. Há ainda outros contratos de valor significativo que terminam no final do ano. Em 2022, a Endesa assinou um total de 69 contratos com empresas públicas, no valor de 97,2 milhões de euros.

A Endesa é a elétrica com maior quota de mercado no abastecimento aos grandes clientes de eletricidade e a segunda principal fornecedora ao mercado português a seguir à EDP. A empresa ganhou também concursos públicos recentes lançados pelo Governo para a exploração de energia renovável, nomeadamente a conversão da central a carvão no Pego e a instalação de painéis fotovoltaicos flutuantes na barragem do Alto Rabagão. E é responsável pela exploração da central a gás no Pego.

A empresa espanhola que é controlada pela italiana Enel não reagiu ao despacho do Governo que suscitou duras críticas na oposição.