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"O ensaio geral, que é o último, é sempre muito difícil para mim. É quando fico mais nervoso, porque tenho a sensação de que já devia estar tudo pronto e continuo a preocupar-me com pormenores. Sinto que estou a apagar fogos"
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"O ensaio geral, que é o último, é sempre muito difícil para mim. É quando fico mais nervoso, porque tenho a sensação de que já devia estar tudo pronto e continuo a preocupar-me com pormenores. Sinto que estou a apagar fogos"

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

"O ensaio geral, que é o último, é sempre muito difícil para mim. É quando fico mais nervoso, porque tenho a sensação de que já devia estar tudo pronto e continuo a preocupar-me com pormenores. Sinto que estou a apagar fogos"

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Hannu Lintu, o novo maestro titular da Gulbenkian: "Não nos podemos livrar de Bach ou Beethoven tanto quanto algumas pessoas gostariam"

O finlandês Hannu Lintu assume aos 56 anos o cargo de maestro titular da Orquestra da Gulbenkian. Em entrevista fala dos desafios e das ambições pessoais e de mudanças e tradições na música clássica.

É o oficializar de uma relação que já existia. Sem espaço para lua-de-mel e com o muito trabalho planeado para os próximos meses, o finlandês Hannu Lintu passa a ser o novo maestro titular da Orquestra Gulbenkian, sucedendo a Lorenzo Viotti. Tendo dirigido a orquestra por diversas ocasiões nos últimos anos como maestro convidado, Lintu passa agora a assumir mais responsabilidades, nomeadamente na gestão da orquestra que no ano passado celebrou 60 anos.

Entre Helsínquia e Lisboa, Hannu Lintu, que é também diretor da Ópera e Ballet Nacional da Finlândia, quer dar mais proeminência internacional à Orquestra da Gulbenkian, voltar às gravações e trazer artistas de renome até ao palco do grande auditório da fundação. Não adianta o tipo de som que pretende alcançar ou que mudanças estruturais terá de fazer porque, como explica, não é um poeta que se expressa por palavras, é antes um maestro que está ciente da importância dos gestos firmes e assertivos. Prefere, antes de tudo, assumir o seu carácter prático e sem preconceitos que, espera, se irá traduzir de igual forma na expressão musical da própria orquestra que agora dirige.

Inspirado pelo ambiente da fundação, onde as diversas artes se cruzam, Hannu Lintu defende ainda a criação de um festival que tenha a música clássica como modo de ligação e diálogo entre as diferentes formas de expressão artística. Num mundo em constante mudança, o maestro finlandês reconhece que é preciso devolver importância aos compositores esquecidos, em especial às mulheres compositoras, mas que acima de tudo se devem destacar os criadores vivos. Na história da música clássica, explica, há um cânone para ser conservado, mas também para ser questionado. Por outro lado, diz em entrevista ao Observador, é preciso apostar na educação musical e adotar num modelo de financiamento equilibrado entre apoios públicos e privados, numa altura em que muitas orquestras enfrentam grandes dificuldades financeiras.

Maestro titular deste o início da presente temporada, Hannu Lintu escolheu a 2.ª Sinfonia de Gustav Mahler e a peça Atmosphères, de György Ligeti, como forma de dar a conhecer a sua postura e também de que forma é que é possível inovar no domínio da construção sonoro. No fim de contas, explica, vê-se como um mensageiro entre a ideia do compositor e os músicos que vão interpretar. “O maestro está lá para impor essa mensagem e também para fazer uma espécie de mistura coerente de todos esses pensamentos e interpretações que os músicos têm individualmente”, sintetiza.

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[A segunda sinfonia de Mahler — o coro e a orquestra Gulbenkian na estreia de Hannu Lintu como maestro titular:]

https://www.youtube.com/watch?v=33mWtDlr968

Ao fim de todos estes anos, ainda se entusiasma com cada concerto e com o trabalho que cada um implica?
Sim, talvez de forma um pouco diferente de quando estava no início da minha carreira. Claro que, nessa altura, cada concerto parecia uma questão de vida ou de morte. Por vezes, tinha tendência para ser um pouco mais emotivo, mas quando damos centenas e centenas de concertos, apercebemo-nos de que isso pode ser bastante útil. A verdade é que não se pode ser demasiado emotivo porque não é exatamente disso que a orquestra precisa. A orquestra precisa de orientação prática. Mas depois, no concerto, é preciso ser-se capaz de trazer algo extra a esse lado. É preciso conseguir juntar as peças de alguma forma e equilibrar as coisas. É preciso transmitir a mensagem do compositor. Depois, é claro, também é preciso dar a entender a razão pela qual estou ali. Porque é que eu estou ali e não outra pessoa? Porque é que me convidaram a vir aqui? São sempre estas as minhas questões. E o que é que lhes vou dar? Sem quebrar a importância da música, tenho de ser claro e compreensível. Aprendi, espero eu, a controlar as minhas emoções para não me deixar levar pelo nervosismo ou pela excitação excessiva com a música. Ainda assim, diria que a música se tornou uma coisa mais prática para mim, embora recorde todos os concertos que fiz. De alguma forma, ocupam o seu próprio lugar no cérebro.

Mantém uma rotina rígida antes de cada concerto ou algum tipo de ritual?
Mais ou menos. Se há um ensaio de manhã, durmo a seguir. Porque o ensaio geral, que é o último, é sempre muito difícil para mim. É quando fico mais nervoso, porque tenho a sensação de que já devia estar tudo pronto e continuo a preocupar-me com pormenores. Sinto que estou a apagar fogos. E depois estou tão cansado que vou para o meu quarto e durmo, às vezes durante horas. Só depois é que recarrego as baterias para o concerto. Não estou muito nervoso antes do concerto, mas sinto uma espécie de entusiasmo nervoso. O facto de dormir ajuda. E depois temos de estar em forma e bem alimentados. É preciso fazer isso da mesma forma que os desportistas. Por vezes, dirigi grandes espetáculos de ópera durante 5 ou 6 horas e quase desmaiei por não me ter hidratado o suficiente ou por não ter comido bem. Não tenho mais rituais sem ser esses, nem rotinas. Não faço as coisas pela mesma ordem que as fazia antes. Gosto de me encontrar com pessoas antes do concerto. Toda a gente pode vir ao meu camarim e conversar, porque já não estou assim tão nervoso. Na verdade, até preciso dessa interação.

Mesmo com os músicos, para acertar alguns detalhes?
Eles não gostam de falar muito nessas alturas. Têm o seu próprio momento. Mas se alguém quiser conversar, não há problema, nem me incomoda. O problema é quando há outro concerto no dia seguinte, ou às vezes até três, quatro concertos na mesma semana, e não há tempo para tantos ensaios. São dias difíceis para mim, porque toda a adrenalina perde-se na noite anterior. Fico completamente vazio.

Nesses dias imagino que não queira ouvir música.
Não necessariamente, ou se ouço tem de ser outra coisa que não música clássica. Mas, de resto, não ouço muita música. Leio partituras e livros. Vou ao ginásio. Tento fazer exercício. Mas torna-se muito difícil encontrar a energia necessária para voltar a esse ponto de concentração. É com isso que estou sempre preocupado. Será que consigo mesmo recuperar a adrenalina? Mas, normalmente, o corpo e a mente funcionam de forma a saberem que algo especial se aproxima… e subitamente, por vezes apenas dez minutos antes do início do concerto, apercebemo-nos de que está lá novamente.

"Com a orquestra, temos de estar dos dois lados. Temos de estar à frente a dirigir e depois temos de estar na plateia sentados para sabermos como tudo deve soar."

Já tinha dirigido a Orquestra da Gulbenkian em diferentes ocasiões. Como é que recebeu este convite para ser o maestro titular?
Fiquei muito contente, porque adoro esta orquestra. Já a tinha dirigido, como diz, às vezes até mais do que uma vez por ano. Por isso, já tinha uma relação muito próxima com a estrutura. Este cargo é apenas uma forma de oficializar a relação. É bom que eu conheça os músicos bem e que eles me conheçam de igual forma, porque podemos começar a trabalhar de imediato. Não há qualquer tipo de lua de mel neste relacionamento. Não precisamos de passar alguns anos para descobrir como funcionamos juntos. Sabemos como reagir e podemos começar a trabalhar mais depressa.

Mas como maestro principal passa a ter mais responsabilidade.
Traz muito mais responsabilidades e, claro, possibilidades. Quando se trabalha nestes termos, começamos a reparar em coisas. Repara-se em coisas boas e, por vezes, repara-se em coisas que são menos boas. Só assim é que podemos ir corrigindo.

Obviamente que, como maestro titular, não está ali apenas para corrigir aspetos menos positivos?
Claro que não. Principalmente, estou ali para descobrir, de uma forma mais profunda, como é que este mecanismo funciona e como é que pode funcionar melhor. É tudo uma questão de química. Depois de se oficializar a relação, ganha-se um certo brilho que motiva ambas as partes – eu como maestro e os músicos que compõem a orquestra. A relação muda e passa a ter um pouco mais de química, apesar de, como disse, já nos conhecermos. Por outro lado, também há muitas expectativas da parte deles. Só tenho de descobrir quais são e continuar com a aprofundar esse processo de trabalho.

Tendo em conta esta oficialização, qual era o seu conhecimento sobre a história da Gulbenkian e da orquestra?
Esta é, evidentemente, uma forma muito especial de ter uma orquestra. Porque não é uma orquestra estatal. Não é a orquestra da cidade. É uma espécie de orquestra privada.

Num certo sentido é uma orquestra nacional.
De certa forma é. E é também, penso eu, o presente da Gulbenkian para Lisboa e para Portugal. E, claro, isso torna a coisa um pouco diferente para mim e para o diretor artístico, mesmo quando planeamos o programa, porque não somos uma orquestra estatal. O nosso dinheiro não vem dos contribuintes. O dinheiro advém da venda de bilhetes. Por isso, podemos ter um pouco mais de liberdade no planeamento. Claro que o nosso objetivo é vender todos os concertos e estamos a fazer isso muito bem. Na verdade, é bastante raro, porque já vi em algumas cidades que as pessoas ainda não voltaram a comprar bilhetes depois da pandemia. No caso da Gulbenkian parece-me muito promissor. Respondendo à questão, sinto um pouco mais de liberdade artística do que se se tratasse de uma organização financiada pelo estado ou pelo município.

Foi fácil conectar-se com a missão e as ideias da fundação?
É algo a que me sinto fortemente ligado. Gosto da ideia de que toda a arte está, de alguma forma, presente na fundação. Tudo o que eles têm e tudo aquilo com que contribuem. Tudo isto no mesmo edifício… Não me lembro de muitos sítios no mundo que tenham este tipo de sensação de santuário. É um templo. É também um belo edifício. E é assim que tudo ainda está organizado na prática. Na verdade, para um maestro, seria sempre um caso inspirador. Basta olhar para o edifício e perceber como é prático, bonito e artístico. Não se encontra nada assim no mundo. Até mesmo os jardins. Há grandes instituições, com algumas das melhores salas de concertos do mundo, mas no caso desta tudo o que a rodeia é excecional. Tenho a sensação, quando ando por lá, que toda a gente que trabalha naquele edifício, trabalha para a mesma causa, o que é bastante único.

"Não sou poeta, não consigo verbalizar o som. Portanto, o que tenho de fazer é comigo próprio, com as minhas mãos"

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Foi ouvir gravações antigas da orquestra ou olhou para o trabalho feito pelos seus antecessores?
Não muito e isso não me interessa propriamente porque, na verdade, a orquestra não gravou assim tanto recentemente. Não estou interessado em saber como é que eles tocavam há vinte anos. Não tenho tempo para me interessar por isso. Interessa-me ver como tocam esta semana e na próxima. O que costumo fazer com as minhas próprias orquestras, quando começo, é ouvir outras pessoas a dirigir. É por isso que peço sempre que me enviem uma gravação de um concerto se eu não puder estar presente. Prefiro poder ouvir e escutar diferentes maestros e o tipo de som que produzem com a mesma orquestra. E aprendo imenso a ouvir. Da mesma forma também aprendo sobre o auditório de concertos. Com a orquestra, temos de estar dos dois lados. Temos de estar à frente a dirigir e depois temos de estar na plateia sentados para sabermos como tudo deve soar.

Que tipo de orquestra pretende construir na Gulbenkian?
Não lho posso dizer. Se eu vos disser uma coisa, daqui a cinco anos vêm ter comigo e dizem que não aconteceu ou que aconteceu outra. Tenho ideias. Tenho um ideal sonoro que não consigo verbalizar porque sou maestro. Não sou poeta, não consigo verbalizar o som. Portanto, o que tenho de fazer é comigo próprio, com as minhas mãos. Não o digo, nem mesmo aos músicos. Eles demoram talvez um ano a perceber o que estou a tentar fazer, o que estou a tentar alcançar. Através do meu trabalho, das coisas que digo, de como quero as coisas que estamos a fazer juntos no concerto. Com o passar do tempo eles vão aperceber-se.

Mas é possível chegar a outro patamar diferente do que existe agora? Se diz que daqui por um ano os músicos vão começar a entender as suas ideias.
Bem, não. Num ano eles vão perceber. Mas isso não quer dizer que têm de mudar algo num ano. Por vezes, essa mudança requer dez anos. E é por isso que nunca verbalizo os meus objetivos. Posso verbalizar coisas como o facto de que gostaria que esta orquestra tivesse uma posição um pouco mais proeminente na Europa, que venham a ser feitas mais gravações e digressões e que trabalhemos com os artistas internacionais mais proeminentes. Mas isto são coisas práticas, mais uma vez.

De facto, num dos aspetos que refere, a orquestra não tem saído muito do país, por exemplo.
E é isto que estamos agora a analisar e também a questão das gravações. Vejamos: para mim um CD novo já não é grande novidade. Mas porque é que as orquestras ainda fazem CDs? O que se passa é que um disco é como um cartão de visita. É como dizer ‘isto somos nós e isto é como tocamos’. Gosto de fazer gravações, porque isso também é uma forma de fazer-se ouvir uma orquestra. De qualquer forma fazer gravações é um processo muito moroso. Demora muito tempo. É preciso fazer tudo de novo, por vezes dezenas vezes, e tentar acertar. Requer muita concentração, coragem e paciência. Diz muito sobre a orquestra, do ponto de vista psicológico. E penso realmente que, para a reputação internacional, estas duas coisas são muito importantes para a orquestra da Gulbenkian. Por outro lado, também gostaria de ter uma espécie de festival.

Durante anos, até ao princípio dos anos 70, a Gulbenkian manteve um importante festival, onde estiveram muitos compositores e maestros importantes à época.
Sim, e foi muito importante para o desenvolvimento e evolução da orquestra. Mas, se calhar, até preferia algo que fosse uma espécie de festival multidisciplinar, porque a Gulbenkian é isso mesmo. Tem muitos ângulos diferentes do que é a arte e construir uma espécie de festival, talvez primeiro com música e depois acrescentando algo mais, poderia ser relevante. Já foi uma questão abordada, mas provavelmente vai demorar algum tempo. Chegados a estes momentos, tudo tem a ver com dinheiro. Acredito que se formos capazes de dar às pessoas algo que elas queiram ouvir, e se elas realmente comprarem os bilhetes, não creio que possa ser então um problema económico.

Nesse contexto, pergunto-lhe se está satisfeito com o apoio orçamental que a orquestra tem?
Nunca estou satisfeito. Tem de haver sempre mais dinheiro. Mas sinto que há uma situação muito segura. Não se pode dizer o mesmo de muitas orquestras espalhadas pelo mundo, especialmente nos Estados Unidos. As grandes orquestras estão a sofrer, mesmos as de financiamento estatal. É algo que está a acontecer na Finlândia, que sempre foi um exemplo de como ter um sistema de apoios contributivos na cultura. As empresas de radiodifusão estão também com grandes dificuldades. Por isso, o financiamento das grandes orquestras está a tornar-se, a cada dia que passa, mais problemático. Precisamos de aprender alguma coisa com o modelo americano, onde muito dinheiro, de facto, vem de patrocinadores e mecenas privados.

"Já vi em algumas cidades que as pessoas ainda não voltaram a comprar bilhetes depois da pandemia. No caso da Gulbenkian parece-me muito promissor. Respondendo à questão, sinto um pouco mais de liberdade artística do que se se tratasse de uma organização financiada pelo estado ou pelo município."

Mas fez algum tipo de pedido relativamente a isso?
Não posso fazer esse tipo de exigências. Mas uma vez que também dirijo a Ópera e Ballet Nacional da Finlândia sei, por experiência, que precisamos de patrocinadores e mecenas. É um processo delicado. Não se pode exigir coisas. É preciso construir relações. Falar com as pessoas, explicar-lhes coisas, descobrir o que querem. Podemos exigir dinheiro ao governo, mas isso raramente ajuda. Por isso, temos de avançar não só para um modelo americano em que todo o dinheiro vem de fontes privadas, mas encontrar em simultâneo uma espécie de modelo híbrido, em que as coisas possam vir tanto do financiamento público como do financiamento privado. Dito isto, sinto que a Gulbenkian é, de certa forma, mais estável neste momento do que algumas outras orquestras. E, claro, é talvez menos dependente das mudanças na política e nos mercados. É a sua própria entidade gestora. Mas, claro, isso também não significa que possui uma quantidade infinita de dinheiro. Têm muito dinheiro, sim, mas o dinheiro é partilhado entre muitas áreas e com diferentes objetivos.

Neste momento, em termos de formação, a orquestra precisa de mais músicos?
Penso que não precisamos de dinheiro para artistas maiores porque temos um nível muito bom de solistas e maestros e podemos, basicamente, arranjar quem quisermos. O que está em causa é ter posições mais permanentes na secção de cordas da orquestra. E isto porque, basicamente, temos uma secção de sopros que é realmente estável e depois temos um grupo de músicos nas restantes secções que também é um estável, mas também temos um grupo de pessoas que não é permanente. Esse tipo de mudança constante, embora aconteça anualmente ou às vezes em períodos maiores, de alguma forma faz com que tenhamos uma orquestra um pouco diferente por causa disso.

Também é preciso ter em conta que atualmente as orquestras têm músicos de gerações diferentes e com visões distintas do que significa o seu trabalho.
Sim. Mas isso é, mais uma vez, uma tendência internacional. E essa é a bênção de todas estas coisas: temos todos os grupos etários a trabalhar na mesma organização e todos estão a aprender uns com os outros. Aprendi muito ao trabalhar com jovens músicos. É muito raro que os jovens estejam tão envolvidos com a geração mais velha. E esta mistura de experiência e inexperiência resulta realmente em algo especial, se as coisas forem bem tratadas. Mas penso que precisamos de mais lugares permanentes para as cordas. É um assunto que já foi discutido.  E o meu desejo, claro, é que se houver mais dinheiro envolvido nesta orquestra, que seja para estabilizar a secção de cordas.

É reconhecido pela sua exuberância e por gestos firmes. O que é essencial manter na comunicação com a orquestra que dirige?
Existem vários aspetos importantes. O meu professor, o maestro finlandês Jorma Panula, dizia sempre, e era por vezes irritante, o seu principal conselho que era “não digam nada, mostrem apenas com as vossas mãos”. E isso é basicamente verdade. Quer dizer, é preciso ter a presença em palco, através das mãos e dos olhos com que basicamente se transmite todas as nossas ideias à orquestra. Isso seria o ideal. Mas é claro que, por vezes, há momentos em que é preciso dizer algo, não se pode apenas mostrar. Não se pode manter apenas o equilíbrio apenas com as mãos. Por vezes, há articulações. É preciso explicar coisas práticas. Por isso, nós, maestros, temos tendência a ser muito práticos. Se falarmos, falamos de coisas muito simples e de forma assertiva.

"Posso dizer que mudei, mas essa mudança não foi resultado de um pensamento consciente ou ativo"

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

A linguagem corporal continua a ser essencial. É algo que tenha mudado em si ao longo dos anos?
Tenho a certeza. Observava-me muito quando estudava, porque o nosso método era gravar tudo em vídeo. Depois dos ensaios víamos essas cassetes e era muito doloroso. A certa altura pensamos que nos parecemos com o Karajan, que estamos dentro do espírito da música e que demos tudo. E depois vê-se e parecemos uma espécie de múmia, apenas a fazer algo em termos de gestos, mas sem expressar nada. Esse processo de auto-observação foi muito útil. Também para perceber que coisas técnicas funcionam e quais é que não funcionam. Depois de sair da academia apercebo-me que, por vezes, é uma maldição o facto de tudo ser filmado e transmitido. Habituei-me a isso porque era maestro principal de uma orquestra de rádio e criei a nossa presença na televisão. Mas detestava ativamente, porque tudo o que se faz em filme tona-se arquivo, que é provavelmente muito útil para as gerações vindouras. Mas, para mim, era irritante e atualmente faz parte do dia-a-dia de cada orquestra. Basta ver os clips de Instagram que fizeram destes concertos recentes.

As redes sociais também fazem parte deste sistema. A própria Gulbenkian transmite os concertos em direto nas suas redes.
Já tinha reparado nisso. E é claro que é o que a organização deve fazer. Sou totalmente a favor, mas por outro lado também detesto. Voltando à sua questão: há muitos anos que não me vejo a dirigir como maestro. E é claro que, por vezes, vejo acidentalmente certos momentos dos concertos. Posso dizer que mudei, mas essa mudança não foi resultado de um pensamento consciente ou ativo.

Vê-se como um mensageiro entre as ideias do compositor e aquilo que chega aos músicos?
Sim, mas não se deve esquecer que, se o compositor for bom, a mensagem revela-se automaticamente. Isto é, todos os músicos vão conseguir compreender. Se a partitura for suficientemente boa, é capaz de abrir os seus segredos mesmo sem o maestro. O maestro está lá provavelmente para tornar a experiência mais profunda. Por vezes, estudamos até meio ano antes de abrirmos a partitura e pensamos em diferentes aspetos da peça e depois o estudo intensifica-se na semana do concerto. Há este tipo de período mais longo de mergulho profundo na partitura e isso pode abrir alguns aspetos sobre os quais os músicos das orquestras não têm tempo para pensar. Mas continuo a pensar que, se a composição for boa, a mensagem básica é óbvia para toda a gente. O maestro está lá para impor essa mensagem e também para fazer uma espécie de mistura coerente de todos esses pensamentos e interpretações que os músicos têm individualmente.

Por vezes, existem músicos que tentam ser mais proeminentes em relação a outros. O seu trabalho também obriga a esse controlo de situações?
Depende de quem estão a tentar dominar. Há certamente dezenas de ideias musicais diferentes para a peça que estamos a tocar. E, claro, é dever do maestro descobrir essas ideias e depois escolher as que acha que se adequam à sua ideia. Mas para que se torne de alguma forma uma coisa lógica do princípio ao fim. Se alguém me desafiar realmente, estou preparado para ouvir. Mas, nesse caso, é melhor que seja algo bem pensado. Isto não quer dizer que não possa haver diálogo. Nem sempre posso saber tudo sobre todos os instrumentos. Com a minha própria visão, posso inclusive dificultar-lhes a execução.

Há um argumento conhecido entre o Bernstein e um músico que estava a tocar um triângulo e o maestro não estava satisfeito com o som que era produzido.
Por vezes, os maestros podem exigir coisas que são de facto impossíveis. E muitos compositores também fazem. Os músicos devem dizer que não é possível, e se não for de facto, o maestro, penso eu, deve acreditar.

"Com a música contemporânea, trata-se muito de tentar descobrir o que é aquela peça. É um tipo de estudo muito diferente. Abro uma partitura de Mahler como se fosse abraçar um velho amigo. Nas partituras de peças contemporâneas é como se estivesse a conhecer uma pessoa que me é desconhecida."

Mas não é, de certa forma, o trabalho de um maestro alcançar o impossível?
Sim, mas será que é possível? Podemos alargar as possibilidades. Quando o Stravinsky escreveu o início da Sagração da Primavera, com aquele fagote incrivelmente destacado, certamente todos os fagotistas do mundo disseram que era impossível. Agora toda a gente consegue tocá-lo. Mas, mesmo assim, acho que há limitações instrumentais.

Neste seu primeiro concerto como maestro principal, escolheu Mahler. Para muitos maestros, existe um antes e um depois de o tocarem. No caso da 2.ª Sinfonia, embora esteja escrito na partitura, teve de colocar músicos em diferentes locais do edifício da Gulbenkian para produzir o tal som que vem de longe. De certa forma, ainda é um desafio para se conseguir inovar na forma de criar som?
Sim, e até mesmo para pensar quantas portas é que se abrem para esse som entrar na sala. Foi preciso colocar um monitor de vídeo e um altifalante… é uma peça muito logística. Por vezes, algumas das melhores peças, como a Paixão segundo São Mateus, de Bach, são dominadas pela logística. Como ensaiar uma peça destas em que cada instrumento tem uma combinação diferente? Onde é que o coro entra? Onde é que se devem sentar? O próprio Mahler diz que deve haver uma longa pausa no fim do primeiro movimento. Quanto tempo deve ser? Há muitas aspetos em que temos de pensar para que no fim tudo possa funcionar.

Aprendeu muito com Mahler? Ou com outros compositores?
Não sei. Uma boa partitura é aquela em que se encontra sempre algo de novo. Ou seja, aprende-se sempre algo de novo. Claro que eu já sei o que é Mahler e quais as suas ideias. Mas, mesmo assim, tenho a certeza de que posso sempre fazer Mahler melhor. E depois, claro, encontro sempre algo de novo na partitura. Abro a partitura de uma peça, o que já fiz dezenas de vezes, e continuo a encontrar coisas novas de repente. Pode não ter significado para ninguém o facto de eu reparar nisso, mas convence-me sempre de que tenho de voltar a estudar essas peças.

Se for por exemplo uma partitura de Xenakis a relação com o maestro que a lê pode ser muito diferente.
É verdade, mas é claro que é um conceito diferente, porque se fizermos Xenakis ou outros compositores contemporâneos, não temos o mesmo tipo de relação com essas peças, que temos com Beethoven ou Sibelius, porque desde cedo estudamos muito este tipo de compositores. Especialmente eu, comecei por dirigir Sibelius. Não sei se alguma vez vou fazer uma peça de Xenakis, digamos, 25 vezes. Mas já fiz Beethoven mais vezes do que isso. Nunca estive numa situação em que abrisse uma partitura de Xenakis e esta me fosse tão familiar que a saudasse como um velho amigo. Com a música contemporânea, trata-se muito de tentar descobrir o que é aquela peça. É um tipo de estudo muito diferente. Abro uma partitura de Mahler como se fosse abraçar um velho amigo. Nas partituras de peças contemporâneas é como se estivesse a conhecer uma pessoa que me é desconhecida.

Sente que se mudou a forma como se olha para determinado repertório devido à digitalização? Já falou disso noutras circunstâncias, de como hoje se está a redescobrir compositores esquecidos, por causa da Internet.
Houve uma altura em que queria tocar compositores… não diria esquecidos, mas que não são muito tocados nem conhecidos. Acho que o mundo mudou um pouco e agrada-me essa sensação de que ainda podemos descobrir coisas novas no passado. Por exemplo, agora há uma tendência para se redescobrirem compositoras mulheres já falecidas. Já conhecia muitas delas pelo nome, mas agora sei mais sobre as mesmas porque somos levados a esse descobrir. Não as interpreto necessariamente, mas interesso-me e investigo. E, pelo menos, sei que elas estão lá e que me tornam, de certa forma, mais conhecedor da história da música.

"Esta é a minha primeira temporada, portanto ainda estou a analisar o que se passa à minha volta"

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Devem ser mais interpretadas?
Diria que se quisermos melhorar a posição das mulheres compositoras na música clássica não creio que o façamos tocando compositoras mortas. Penso que devemos tocar compositoras vivas. Não consigo acreditar que uma compositora francesa do início do século XIX se possa tornar num grande ídolo para uma jovem compositora que esteja atualmente no conservatório. Podemos aprender sobre as suas vidas, como foram tratadas e qual a sua posição na história, que só desta forma podemos dar a conhecer. Podemos mostrar às pessoas que vão ficar a saber. Mas se quero dar ao público algo de novo, prefiro dar-lhes um compositor vivo. E também acho que o público mais jovem está muito mais interessado na música contemporânea do que em compositores como Haydn… acredito que as pessoas querem ouvir as composições do seu próprio tempo.

Ainda assim, sente que há uma reflexão a fazer sobre a representatividade, por exemplo, de mulheres maestrinas, na música clássica?
Não nego que os músicos tomem a história da música clássica, e especialmente o cânone da história da música clássica, como uma espécie de bênção enviada por Deus, que se deve conservar. É compreensível, porque nesse dito cânone estão verdadeiros génios. Há pessoas como Bach, Beethoven, Monteverdi ou Wagner, que independentemente de gostarmos delas ou não, temos de reconhecer que a sua obra é algo de extraordinário e que irá continuar a ser extraordinária passados 100 ou 300 anos. Essa é provavelmente a razão pela qual tendemos a agir de forma um pouco estranha em termos do que é a história, do que é o futuro e do que é o nosso tempo. Neste momento, parece que estamos a tentar proteger um legado e a pensar que este está a ser atacado de alguma forma. Mas é falacioso, porque não se pode atacar essas pessoas. Não se pode atacar Bach ou Beethoven. Eles estão lá. Não nos podemos livrar deles tanto quanto algumas pessoas gostariam. Acredito mesmo na mudança. Por vezes, é preciso forçar as coisas. Por vezes, talvez seja necessário ter quotas. Uma certa percentagem de compositores tem de ser do sexo feminino, certo. Pode funcionar se a quota for definida de forma razoável, mas não pode ser 50-50, porque nem 10% dos compositores do mundo são mulheres. Ainda assim acho que devíamos tocar muito mais do que 10%.

Mesmo em termos de músicos representados nas orquestras?
Acho que isso está mais ou menos em ordem. Na Orquestra da Gulbenkian, embora não tenha contado, deve estar divida de forma bastante igualitária entre mulheres e homens. Também é composta por diferentes etnias. Na Finlândia estamos a ter esta discussão. É um dos países mais mono-étnicos do mundo, e depois estamos a meio de uma discussão sobre porque é que não temos muito músicos negros ou asiáticos nas orquestras. Temos muitos asiáticos na Finlândia. Mas isto não tem nada a ver com a música em si. A cor é uma questão importante na sociedade. É uma questão importante do ponto de vista da igualdade, mas não é uma discussão musical. Não muda a forma como a orquestra soa. Pode mudar um pouco a forma como essa orquestra se sente em relação à sua profissão ou ao tipo de ambiente de trabalho que vai ter. Mas nós, maestros, não estamos lá a viver nesse ambiente. O que está em causa é o ambiente de trabalho deles. Não me parece que seja realmente um assunto de maestros. Além disso, as audições continuam a ser cegas, ou seja, são feitas com um pano à frente. Não fazemos ideia de quem vem tocar.

Parece existir igualmente uma certa curiosidade recente sobre o papel dos compositores, mesmo na indústria cinematográfica. Concorda?
Bem, certamente que o Tár [2022] criou muitas discussões. Vi-o duas vezes e tive a sensação de estar a ver uma espécie de documentário, mais do que um drama ficcional. Têm saído mais filmes sobre a vida de maestros. Ainda sobre o Tár, acho que era inevitável que se fizesse um filme assim, porque embora seja demasiado dramático, e coloquem tudo no mesmo frasco, também é verdadeiro. Não que todos aqueles aspetos do dia-a-dia de uma orquestra se combinem no trabalho de um só maestro, mas o trabalho de base e a pesquisa está excecionalmente bem. Porque a maior parte desses aspetos reconheço-os de algum lado, de alguém, às vezes de mim próprio, outras vezes dos meus colegas, outras do mundo ao nosso redor. Claro, é um grande exagero juntá-las todas, e o filme criou muito interesse. Não deixa de ser um filme muito bem feito e que explica bem alguns aspetos da nossa profissão.

Ao contrário da Finlândia, Portugal não é um país onde a tradição da música clássica seja muito valorizada. A sua missão, como maestro da Gulbenkian, também passa por aproximar as pessoas desse domínio?
Deve ser. Tudo aqui é um pouco diferente para mim. Todos os países são diferentes. Estou a tentar descobrir o que é que aqui é diferente em relação à Finlândia. Esta é a minha primeira temporada, portanto ainda estou a analisar o que se passa à minha volta… O que me interessa mais neste momento é saber como aproximar mais a música das pessoas através de outras formas que não apenas o streaming ou a realização de concertos, porque esse é justamente o dever de todas as orquestras. O que estou interessado em descobrir primeiro, e sobre o qual não sei muito, é que tipo de educação musical têm e onde é que ela acontece. Quero encontrar compositores portugueses. Talvez toda a gente saiba quem são e onde estão, mas eu ainda não sei.

"As crianças devem aprender instrumentos, não porque queira que se tornem todos músicos de orquestra ou maestros. Quero que elas aprendam música porque isso lhe vais dar ferramentas importantes para a vida. Ficam muito mais concentradas e é muito bom para as capacidades cognitivas."

Conseguir audiências mais jovens também é parte desse trabalho?
Qualquer público é bom. É ótimo ter jovens e eles vêm quando vêm… quando veem algo interessante, eles vêm. Podemos direcioná-los de alguma forma. Podemos construir coisas especificamente para eles. Mas isso não pode acontecer à custa do público mais velho. Porque precisamos desse público. São pessoas que nos acompanham por terem um real interesse, muito deles fazem-no há anos. Podemos falar de públicos jovens, mas talvez muito deste público mais velho de que falo também só tenho conseguido acompanhar nos seus cinquenta anos. Temos de perceber melhor quem nos procura e por que razões o faz.

Vem de um país que, como diz, tem um sistema educativo em termos musicais bastante avançado. Teria algum conselho para um país como Portugal?
Tenho de compreender a vossa situação antes de poder dar qualquer conselho. É uma boa pergunta. E, claro, posso aconselhar todos os países e dizer que devem ter o mesmo sistema que temos na Finlândia. Escolas de música, conservatórios e depois a academia. É como uma pirâmide. Nenhum talento se pode perder nesta pirâmide… já não funciona tão bem porque tem cada vez menos dinheiro e temos de lutar por ele. As crianças devem aprender instrumentos, não porque queira que se tornem todos músicos de orquestra ou maestros. Quero que elas aprendam música porque isso lhe vais dar ferramentas importantes para a vida. Ficam muito mais concentradas e é muito bom para as capacidades cognitivas. O futebol provavelmente tem o mesmo efeito.

Por ambas serem universais no sentido de serem facilmente reconhecidas?
É certo que ambas, desporto e música, têm a mesma capacidade de unir as pessoas e de serem compreendidas em todo o lado.

Vai estar algumas semanas em Portugal nesta temporada, na próxima vai estar mais tempo. Pretende conhecer alguns aspetos da cultura portuguesa ou da cidade de Lisboa?
Claro, não quero ficar apenas no hotel. Já conheço a cidade muito bem. E tenho andado por aí e vejo que há muitas mudanças. Lembro-me que nos primeiros anos que vim, Lisboa era uma cidade meio fechado e mesmo o país. Agora é totalmente diferente. Lisboa é mais vibrante, mais internacional. E claro que se vou passar mais tempo preciso conhecer melhor a parte orgânica da cidade. Já encontrei coisas interessantes e espero continuar a encontrar.

 
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