Texto e fotografias do enviado especial do Observador à Ucrânia, João Porfírio
Praticamente já meio milhão de pessoas abandonou a Ucrânia. Umas de carro, algumas a pé e outras tantas de comboio. E é na estação de comboios de Lviv que mais pessoas partem em direção à Polónia, por ser uma das cidades ucranianas mais perto da fronteira.
Com os vidros do comboio completamente embaciados, aquela criança de quatro anos despedia-se do pai — impedido de sair do país devido à Lei Marcial que impede homens entre os 18 e os 60 anos de partir. A mulher falava com o marido ao telemóvel. O homem, parado a olhar para a janela, completamente imóvel, pedia para ninguém chorar.
Os passaportes eram controlados logo à entrada dos comboios para facilitar a entrada de todas aquelas pessoas na Polónia e houve quem não conseguisse entrar por não ter consigo todos os documentos necessários para o embarque.
Antes disso, o início do caos: ao contrário do que o Observador testemunhou nos primeiros dias, em que as pessoas começaram a optar pelo comboio para fugir de Lviv, desta vez, a confusão era muito maior. As pessoas não podiam simplesmente subir as escadas que dão acesso à plataforma. Essa entrada era controlada: só mulheres, crianças e homens com família poderiam passar — mas só até à plataforma; depois, ficavam para trás para, se necessário, lutar contra os invasores. Havia quem estivesse há 12 horas naquelas escadas para conseguir um lugar no comboio.
Ouça aqui o episódio de “A História do Dia” com o relato de João Porfírio sobre a situação na estação de Lviv
Por não ser possível dar nem um passo que fosse, mesmo quem tinha prioridade não conseguia subir e, por isso, muitos bebés foram entregues aos polícias pelas mãos dos pais para evitar estarem ali naquele aperto enlatado. Pelo menos dois carros de bebés foram também colocados na plataforma, passando por cima de todas aquelas cabeças.
A polícia era pouca para a quantidade de refugiados a querer sair da Ucrânia, o exército a mesma coisa. Houve quem tivesse desmaiado e não conseguisse ter qualquer assistência médica — valeu-lhes a ajuda de uma dezena de voluntários, de coletes amarelos refletores, ali presentes.
Veja as fotografias de um dia de caos para quem tenta fugir da guerra na Ucrânia.