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Lacerda Machado diz que nunca invocou o nome do "seu amigo António Costa" nem falou com o primeiro-ministro sobre o data center

Defesa quer anular caução de 150 mil de euros e proibição de sair do país por falta de indícios de crime de tráfico de influência. Lacerda diz que também esteve quatros anos sob escuta.

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A defesa de Diogo Lacerda Machado diz que não há provas nos autos da Operação Influencer que evidenciem que o “arguido tenha falado alguma vez com o primeiro-ministro sobre o projeto de construção e instalação do data center em Sines” idealizado pela empresa Start Campus”, nem “tão pouco com o seu amigo António Costa”. É o que se lê no recurso sobre as medidas de coação, ao qual o Observador teve acesso, e que será decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

Numa narrativa em que muitas vezes tenta separar o cargo de chefe de Governo do do “seu amigo António Costa”, Lacerda Machado nega ter invocado ambos. Garante que “jamais invocou o nome do primeiro-ministro, ou do seu amigo António Costa, em qualquer das muitas dezenas, ou mesmo centenas, de reuniões” que teve com a administração e colaboradores da Start Campus ou com “diferentes autoridades públicas”.

Lacerda Machado suspeito de exercer influência diretamente sobre Costa

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Aquele que António Costa considerou publicamente, em abril de 2016, como o seu “melhor amigo” quando o contratou para seu conselheiro, não só rejeita a prática de qualquer crime, como também a hipótese de qualquer perigo de fuga para a Guiné-Bissau (onde é chairman de um banco), para a China ou Estados Unidos (onde os seus dois filhos trabalham como diplomatas).

Sendo este um recurso sobre as medidas de coação impostas pelo juiz Nuno Dias Costa, a defesa de Lacerda Machado, a cargo do advogado Manuel Magalhães e Silva, requer assim a revogação das medidas de coação impostas pelo Tribunal Central de Instrução Criminal: a caução de 150 mil euros, entrega de passaporte e proibição de saída do país.

Lacerda admite reunião com Costa, mas para falar de problemas urbanísticos em Sines

Diogo Lacerda Machado foi detido no passado dia 7 de novembro, juntamente com outros arguidos, no âmbito da Operação Influencer. O Ministério Público imputava-lhe a alegada prática dos crimes de corrupção ativa, tráfico de influências e prevaricação por alegadamente ter pressionado vários decisores políticos no sentido de acelerar os diversos processos de licenciamento e apoio financeiro do data center que a empresa Start Campus queria construir em Sines.

Um dos decisores políticos é o primeiro-ministro António Costa com quem, segundo o despacho de indiciação do MP, Lacerda Machado terá tido vários encontros para debater o projeto do data center. Um desses encontros é mesmo um almoço no Palácio de São Bento, residência oficial do primeiro-ministro.

Lacerda Machado recusa no recurso apresentado que existam nos autos “qualquer indício de que o arguido tenha falado, alguma vez, com o primeiro-ministro sobre o projeto de construção e instalação do data center, em Sines, pela empresa Start Campus”, “tão pouco com o seu amigo António Costa”.

A defesa diz que Lacerda nunca invocou o nome de Costa com “autoridades públicas, nacionais e da União Europeia”, com o “conselho de administração e as equipas de colaboradores da Start Campus, com outras empresas, fornecedoras de bens e serviços para aquela”, lê-se no recurso.

Um dos indícios apresentados no Tribunal Central de Instrução Criminal pelo MP sobre a alegada influência “direta” e “regular” de Lacerda Machado junto do primeiro-ministro prendia-se com um almoço entre os dois que terá ocorrido em São Bento durante o verão de 2023 — além dos indícios que apontavam para a invocação do nome de Costa por parte de Lacerda Machado.

Além de voltar a negar que tal influência tenha ocorrido, Lacerda Machado afirma no seu recurso que tal almoço foi apenas sobre a necessidade de fazer uma nova Expo em Sines. Isto é, Lacerda terá chamado a atenção do primeiro-ministro para o “problema urbanístico que se iria colocar em Sines, perante a iminência de as grandes empresas aí instaladas, incluindo o Data Center, criarem, nos próximos cinco anos, mais de cinco mil postos de trabalho, com um acréscimo habitacional de 15 000 pessoas, atenta a realidade familiar dos trabalhadores.”

Lacerda Machado diz que a sua contratação deveu-se ao curriculum…

O MP alega no seu despacho de apresentação aos arguidos ao Tribunal Central de Instrução Criminal que Diogo Lacerda Machado só foi contratado devido à sua proximidade em relação a António Costa — aliás, publicitada pelo próprio primeiro-ministro em diversas declarações públicas.

No recurso apresentado na Relação de Lisboa, Lacerda Machado diz que “nada permite concluir que a Pioneer [acionista da Start Campus] e, posteriormente a própria Start Campus, tenha contratado o arguido por ser o melhor amigo do primeiro-ministro, logo, em posição de se aproveitar da relação para exercer pressão sobre os decisores públicos “, quando chamados a decidir sobre temas da empresa que queria investir em Sines.

O negócio de 500 milhões que liga Lacerda Machado e Vitor Escária a António Costa

Ou seja, o advogado Magalhães e Silva garante que o seu cliente foi contratado pela empresa que será detida por uma sociedade offshore no Caribe, segundo o jornal Eco, devido ao seu curriculum como “secretário de Estado da Justiça” do governo de António Guterres e devido ao seu trabalho, “com reconhecido e público apreço” pelo “sucesso da indemnização aos lesados do BES, à controvérsia BPI ou ao dossier TAP”, lê-se no texto do recurso.

Texto que realça que Lacerda demonstrou “enorme capacidade de negociação, servida por assinalável competência técnico-jurídica”, daí ter sido contratado por um dos acionistas da Start Campus.

… e garante que agiu como advogado, e não como lobista

Outro ponto importante da defesa apresentada por Diogo Lacerda Machado prende-se com o estatuto com que defendeu os interesses da Start Campus. O Ministério Público alega que agiu, na prática, como lobista — e não como advogado. Sendo certo que o juiz de instrução Nuno Dias Costa validou essa leitura do MP.

Lacerda Machado insiste junto do Tribunal da Relação de Lisboa que o seu enquadramento laboral correto é o de advogado. Alegando que a sua atividade como advogado da Start Campus cessou, “por sua iniciativa”, a “15 de novembro de 2023”, a defesa entende que a sua atividade e o contrato assinado como advogado e com a acionista da Start Campus respeita o Estatuto da Ordem de Advogados.

Além da “representação dos investidores e do projeto perante as possíveis contrapartes em Portugal, incluindo outras empresas, entidades reguladoras e demais autoridades públicas”, Lacerda Machado também fazia uma “avaliação e aconselhamento jurídicos e de riscos políticos.”

Além da "representação dos investidores e do Projeto perante as possíveis contrapartes em Portugal, incluindo outras empresas, entidades reguladoras e demais autoridades publicas", Lacerda Machado também fazia uma "avaliação e aconselhamento jurídicos e de riscos políticos."

Por esse trabalho de advogado recebeu uma remuneração de cerca de seis mil euros mensais, que considera modesta, porque era substancialmente inferior ao valor de 50 mil euros mensais que uma outra sociedade de advogados terá cobrado para trabalhos idênticos. “Mais: se o arguido trabalhasse 100 horas/mês, a sua remuneração seria de €60,00/hora, idêntica à de outro profissional liberal, o canalizador que, arranjado o autoclismo, cobra €60,00, com ou sem IVA!”, lê-se no recurso.

A defesa diz também que a “Equity Award Letter”, que lhe permitiria garantir uma participação acionista futura na empresa, respeita o Estatuto da Ordem dos Advogados. São cerca de 0,5% do capital social da Start Campus, que terão um valor de cerca de 15 milhões de euros.

Com efeito, “esta compensação, com valor incerto e necessariamente moderado, só era devida em função do resultado, era exatamente igual à que a Start Campus atribuiu a um conjunto de cerca de uma dezena de outros colaboradores chave (“key providers”), numa prática habitual no mundo empresarial moderno”, lê-se no texto do recurso apresentado.

Reuniões com Escária foram apenas três e para fazer ponto da situação do data center

Diogo Lacerda Machado alega ainda no seu recurso que apenas teve “três reuniões” com Vítor Escária na residência oficial do primeiro-ministro e que foram “formais”.

Tudo terá começado com uma apresentação pública do projeto da Start Campus, que foi alvo de um trabalho intenso de preparação entre o governo e a sociedade — e na qual participou o primeiro-ministro António Costa.

MP diz que António Costa e Lacerda Machado terão almoçado no verão deste ano para analisar o projeto do data center

A partir de tal apresentação, surgiu a necessidade de vir a ceder mais ao “gabinete do primeiro-ministro” para que este pudesse, a partir daí, “vir a ter alguma informação sobre o desenvolvimento do projeto, para poder acompanhar a evolução deste.”

Daí as três reuniões que, a partir de dezembro de 2022, vieram a ocorrer entre Vítor Escária e Diogo Lacerda Machado e outros responsáveis políticos.

Além do ponto de situação do projeto do data center, acrescenta a defesa de Lacerda Machado, também se destacavam “os diferentes estados de tramitação de procedimentos administrativos em curso com diferentes entidades públicas”, afirma.

A questão da influência sobre o ZEC — só reuniu com Escária sete meses após a questão ter sido resolvida

Um ponto relevante da indiciação do MP prende-se com as alegadas irregularidades e ilegalidades que terão sido praticadas ao nível da classificação de proteção de ZEC — Zona Especial de Conservação que terão abrangido os terrenos onde a Start Campus queria (e começou a) construir o data center.

Lacerda Machado alega que “não teve qualquer intervenção junto de qualquer entidade pública, fosse do [então] secretário de Estado João Galamba ou do presidente da Agência Portuguesa do Ambiente Nuno Lacasta, fosse do ministro Duarte Cordeiro ou mesmo do chefe de gabinete do primeiro-ministro, Vítor Escária”, lê-se no requerimento.

A sua defesa entende, por outro lado, que a solução encontrada para esse problema, “aliás absolutamente legal e lícita”, ter-se-á concretizado “entre agosto de 2021 e maio de 2022”.

Lacerda Machado alega que "não teve qualquer intervenção junto de qualquer entidade pública, fosse do Secretário de Estado João Galamba, ou do Presidente da Agência Portuguesa do Ambiente Nuno Lacasta, fosse do Ministro Duarte Cordeiro e mesmo do chefe de gabinete do primeiro-ministro, Vítor Escária", lê-se no requerimento.

Lacerda Machado diz que só se reuniu a “22 de dezembro de 2022, sete meses depois de encontrada a solução pelo Governo e pelas demais entidades públicas envolvidas”, para o problema da ZEC.

Além de assegurar que também nunca falou sobre este tema do data center com o “Secretário de Estado João Galamba, nem com o Presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta, ou com qualquer outra pessoa ligada à APA”, a defesa de Lacerda Machado insiste que não teve qualquer influência nesse dossiê por ” impossibilidade cronológica”.

Além do mais, a questão foi resolvida “rigorosamente dentro da lei e com respeito por ela.”

Logo, “sem indícios de crime, não há medidas de coação, excetuado o TIR [termo de identidade e residência], até ao arquivamento do processo. À cautela”, escreveu Manuel Magalhães e Silva.

Os quatro anos de escutas e o perigo de fuga

O último ponto do recurso de Lacerda Machado prende-se com o perigo de fuga que o juiz de instrução criminal deu como fortemente indiciado, daí que a caução de 150 mil euros e a proibição de viajar para o estrangeiro façam parte da decisão do Tribunal Central de Instrução Criminal.

Lacerda Machado alega que tentou explicar ao juiz de instrução que os dois filhos são diplomatas e encontram-se neste momento a residir na China e nos Estados Unidos. Sendo diplomatas, isso não significa que os filhos representem que não continue em Portugal. A defesa de Lacerda Machado coloca em causa o senso comum do Tribunal Central de Instrução Criminal que atesta que existe esse perigo de fuga para a China ou os Estados Unidos.

Lacerda Machado alega que tentou explicar ao juiz de instrução que os dois filhos são diplomatas e encontram-se neste momento a residir na China e nos Estados Unidos. Sendo diplomatas, isso não significa que os filhos representem um perigo para a continuidade em Portugal.

Por outro lado, Lacerda Machado contesta igualmente o alegado perigo de fuga para a Guiné-Bissau, país onde é chairman de um banco local.

“Aos 62 anos, delinquente primário, com um passado de serviços à República, toda a sua vida política, social e profissional radicada em Portugal há mais de seis décadas, mãe, filhos e netos, todos e desde sempre em Portugal, ia furtar-se à ação da justiça por um crime cuja moldura máxima são 5 anos, ainda por cima (in)indiciado após quatro anos de escutas?! E nesse “propósito” iria viver para a… Guiné, só porque preside a um banco aí sediado, exigindo, apenas, deslocações e curtas?!”, questiona Lacerda Machado no seu recurso apresentado no Tribunal da Relação de Lisboa.

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