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Depois da moção de censura da semana passada, Costa voltou ao Parlamento e a tentar concórdia sobre casos quentes para o Governo.
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Depois da moção de censura da semana passada, Costa voltou ao Parlamento e a tentar concórdia sobre casos quentes para o Governo.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Depois da moção de censura da semana passada, Costa voltou ao Parlamento e a tentar concórdia sobre casos quentes para o Governo.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Mais humildade, mais foco, mais obra. Como o PS se tenta reerguer do caos político

Socialistas acreditam que tom de Costa no Parlamento ajudou a serenar ânimos e trabalham para reabilitar imagem da maioria. Falta iniciativa política para passar a página das polémicas.

“Está tudo mais calmo”. “Ao menos já andamos com cabeça mais erguida e respiração mais normalizada.” “Hoje foi um dia bom, não houve nenhuma demissão”. Entre a ironia, o gracejo e o alívio, os socialistas querem acreditar que o turbilhão das últimas semanas passou e estão convencidos de que, no debate parlamentar desta quarta-feira, o primeiro-ministro “deu a volta” aos “casos e casinhos” com uma intervenção parlamentar em “registo sereno”. Um “registo” adotado enquanto PS e Governo põem em marcha a operação para recuperar da crise, tentando mostrar mais abertura à oposição e confiando em que as mexidas nos rendimentos de janeiro farão esquecer semanas de caos político.

“O PS está a sair a recuperar das semanas mais turbulentas da mesma forma que ganhou a sua maioria absoluta, com o maior ativo que o PS tem: o primeiro-ministro”, acredita um dirigente. “O ruído está a acalmar e os debates foram fundamentais para isso”, garante, convencido que a moção de censura da Iniciativa Liberal “foi um presente para o PS: correu-nos bem”. Isto é: mostrou um primeiro-ministro em forma e uma oposição que, para o PS, provou ainda não ter uma alternativa forte de governo para apresentar. E uma direita desorganizada.

Como Costa tentou baixar a temperatura política. Processo de suavização em curso?

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Apesar do suspiro de alívio, o partido ficou em estado de choque na última semana, quando saído de uma moção de censura chumbada conheceu, minutos depois, mais uma demissão no Governo. “Foram negligentes e não se pode repetir. Todos no PS e no Governo perceberam”, diz um outro alto responsável do partido.

“Temos a perspetiva de que temos de recuperar”, atira outro socialista, que considera que “o reconhecimento de que as últimas semanas não correram bem está feito, junto da arena parlamentar e das pessoas”, lembrando a frase de Costa que chegou a meio do debate desta semana, a “lamentar profundamente” o ocorrido nas últimas semanas — e até a admitir que as pessoas “censuram” polémicas destas no seio do Governo.

O primeiro-ministro, António Costa (C), ladeado pela ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes (E), e pela ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva (D), intervém no debate parlamentar sobre política geral, esta tarde na Assembleia da República, em Lisboa, 11 de janeiro de 2023. MIGUEL A. LOPES/LUSA

No debate desta quarta-feira, Costa virou as atenções para os casos de Rita Marques e Alexandra Reis, ambas já fora do Governo

MIGUEL A. LOPES/LUSA

“As pessoas apreciarão melhor um registo sereno”, acrescenta agora uma voz de topo no partido, confirmando que houve um limar de arestas no tom com que António Costa se tem dirigido ao Parlamento desde que tem maioria absoluta. E isso ficou patente ao longo do debate, com o primeiro-ministro a conceder em alguns pontos à oposição nos casos polémicos, apontando sobretudo aos pontos onde poderia haver alguma concórdia.

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Um escudo oferecido por Rita Marques. E um inquérito-surpresa

No PS até há quem considere que o caso da ex-secretária de Estado Rita Marques acabou por ajudar à narrativa. “É o tipo de coisas que há facilidade em condenar, sobretudo depois do exercício de funções e quando ninguém tem de se demitir”, aponta um socialista em conversa com o Observador, garantindo que o caso fez com que “o PS se sentisse traído”. E durante o debate esta semana, o primeiro-ministro não hesitou na condenação do caso, dizendo até que se André Ventura tinha 99% de certeza sobre a ilegalidade do cargo que Rita Marques estava para assumir, ele tinha mesmo 99,9% de certeza dessa mesma desconformidade com a lei.

Outros socialistas admitem que a “inteligência” — ou habilidade — política de Costa permitiu que o foco fosse virado para Rita Marques e até para outra secretária de Estado demitida em tempo recorde, Alexandra Reis: os ataques que Costa fez a ambas, e que fazem com que um socialista considere, ironicamente, “perigoso” ser-se ex-membro deste Governo, ocuparam os títulos dos jornais e as perguntas da oposição, que pouco falou nos nomes de Fernando Medina ou de Pedro Nuno Santos.

A primeira prova de abertura tinha chegado mesmo no dia anterior ao debate, ao final da manhã. Depois de vários dias hesitante, na terça-feira o PS alinhou a estratégia e do topo do partido surgiu a indicação para que o grupo parlamentar viabilizasse a comissão de inquérito proposta pelo Bloco de Esquerda à TAP e à gestão da empresa que permitiu uma indemnização de 500 mil euros brutos para a saída de uma gestora que se tornou, mais tarde, secretária de Estado. “Não se justificava dizer que não”, argumenta o mesmo alto dirigente socialista. Uma decisão que espantou, de resto, o próprio proponente, como o Observador constatou junto de fontes bloquistas.

Medina foi ao Parlamento numa audição imposta pelo PSD. Socialistas tinham rejeitado pedido

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Até porque o chumbo das audições pedidas pela oposição na semana anterior já tinha deixado algum PS desconfortável com uma eventual perceção pública de falta de transparência, num caso bicudo para o Governo e que envolveu dinheiro público. “Ninguém mais do que os socialistas ficou ofendido e sentido com o que aconteceu”, garante um dirigente ouvido pelo Observador.

Fernando Medina tinha sido ouvido dias antes e o PS depressa aproveitou para vir a terreiro argumentar que o ministro “confirmou que não havia nada de novo” a acrescentar sobre o caso, tentando com isto travar mais pedidos. Mas os partidos clamavam por Alexandra Reis, a CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener, o presidente do Conselho de Administração, Manuel Beja, e, claro, por ouvir também ex-ministro Pedro Nuno Santos. Este último estará disponível para esclarecimentos e o PS sabe disso, pelo que a sua audição será uma das que terá pernas para andar.

“Foi tomada essa decisão [de viabilizar o inquérito] para demonstrar que não temos nada a esconder”, considera um deputado. Mas isto só foi desbloqueado depois de avaliado pelo núcleo político de Costa de que não haveria “risco” em abrir esse capítulo. É pelo menos essa a convicção com que os socialistas partem para este inquérito, apostados em atirar sobretudo culpas para cima da administração da TAP e que nada na avaliação pedida (ainda por Pedro Nuno e Fernando Medina) à Inspeção-Geral de Finanças sobrará para o Governo.

“Sabendo que não havia nada de novo na audição de Medina e que esse chumbo de audições foi utilizado amplamente pela oposição, dissemos: não faltará um único instrumento de escrutínio”, resume um dirigente, focado em frisar a abertura do PS para corrigir os erros do passado — e reabilitar a imagem da maioria. A decisão de viabilizar a comissão de inquérito é, assim, vista como um “passo mais à frente” em relação à vontade do PS de mostrar transparência, tornando “inegável” a boa vontade em relação ao escrutínio parlamentar.

Caos encerrado? A política segue dentro de momentos

Viabilizada a comissão de inquérito à TAP e a audição à ministra da Agricultura, aprovado o novo circuito para escrutinar novos governantes e assumida a abertura para rever o modelo dos debates com o primeiro-ministro, a dúvida no PS prende-se agora com o próximo passo. Passada a tormenta (pelo menos é nisso que o partido quer acreditar), como é que o PS vai usar a sua maioria? Ou, nas palavras de um dirigente, “ok, encerrámos o capítulo. Mas qual é o próximo?”.

“É preciso mostrar foco e substância: se não mostrarmos iniciativa, as pessoas vão continuar a falar dos casos e casinhos”, argumenta o mesmo dirigente.

Por um lado, assegurando que no que mais dói à população — a dificuldade em pagar contas ao fim do mês e a constatação de que a inflação está a reduzir, em termos reais, os salários — os rendimentos aumentam, e para isso o PS está a contar com os aumentos já anunciados e previstos para este mês (do salário mínimo às prestações sociais, que subirão acima da taxa de inflação, arrastadas pelo indexante dos apoios sociais).

Mesmo que parte do partido já faça pressão para que haja novos pacotes de apoios, que não se limitem apenas aos mais carenciados: “O pacote Famílias Primeiro já foi em setembro, e onde é que setembro já vai…”. Isto a somar à pressão por novidades em temas delicados para o PS, como o funcionamento de serviços públicos como o SNS ou a crescente pressão no mercado da Habitação.

Por outro lado, é preciso obra: o Governo lançou o roteiro PRR, que Costa tem estado a percorrer para mostrar o efeito dos investimentos no terreno, e está consciente de que precisa de mostrar cada vez mais iniciativa política, controlando a narrativa sobre a sua própria maioria absoluta. O mais difícil, na ótica dos dirigentes socialistas, está feito: “Sintonizar o discurso do Governo com a consciência dos portugueses”, resume um dirigente. Faltará o resto.

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