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Valentina foi encontrada morta este domingo, num eucaliptal. A PJ deteve o seu pai e a madrasta, por suspeita de homicídio.
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Valentina foi encontrada morta este domingo, num eucaliptal. A PJ deteve o seu pai e a madrasta, por suspeita de homicídio.

Valentina foi encontrada morta este domingo, num eucaliptal. A PJ deteve o seu pai e a madrasta, por suspeita de homicídio.

Maria João, Daniel, Joana, Vanessa. Eram crianças quando a família com quem viviam lhes roubou a vida

Além de Valentina, há muitas outras crianças mortas por quem devia cuidar delas. E que contaram versões que acabaram desmontadas pela PJ, como em Peniche. Psicólogos alertam para saúde mental.

Não foi apenas uma vez que a Polícia Judiciária perguntou ao pai e à madrasta de Valentina, de nove anos, como tinham sido as últimas horas da sua presença em casa, na Atouguia da Baleia, em Peniche. Foi na quinta-feira, pelas 8h30, que o pai da criança disse à GNR que a menina estava desaparecida e poderia ter fugido de casa, como, aliás, já fizera uma vez. A última vez que a vira tinha sido perto da 1h00, para lhe aconchegar os cobertores. E pelas 8h00, ao acordar, percebeu que a cama estava vazia. Foi nesse momento do aconchego dos cobertores que a Judiciária terá começado por focar-se, procurando perceber pormenores como: na noite em causa estava frio ou calor? Ou o que o teria motivado a ir ao quarto. O pai de Valentina terá escorregado nessa resposta, sem saber o que responder, para depois trazer outros elementos à história. Não terá confessado que matou  a própria filha, mas acabou por conduzir a polícia ao local onde a terá abandonado, a uns quilómetros de casa.

A Polícia Judiciária, que este domingo comunicou a detenção de Sandro Bernardo e de Márcia Bernardo por suspeitas de homicídio, acredita que a morte de Valentina ocorreu dentro de casa e que não terá sido acidental. Ambos terão responsabilidade em “graus diferentes”, como disse uma fonte ao Observador, mas a autópsia ao corpo poderá revelar mais do que se passou. A história que ambos contaram às autoridades não foi logo considerada suspeita. Só esta manhã acabou por culminar na recuperação do corpo, que era já procurado há três dias por 600 elementos da Proteção Civil, GNR, com o apoio da PJ, e por muitos populares. Aliás, ainda nesta manhã de domingo a própria junta de freguesia publicava no Facebook um apelo para que todos confirmassem nos seus terrenos e em possíveis poços se davam pela presença da criança.

Valentina quando era mais criança ao colo do pai

A menina Joana, de oito anos

Se recuarmos 16 anos, foi assim na aldeia de Figueira, em Portimão, com uma menina quase da mesma idade de Valentina: a Joana, de oito anos. Quando a fotografia da pequena Joana começou a ser divulgada por televisões e jornais dando conta do seu desaparecimento, a mãe desdobrou-se em entrevistas para explicar como a filha tinha ido buscar leite e conservas ao café da aldeia e não tinha regressado a casa. A polícia investigou várias teses e recebeu diversos contactos de pessoas que garantiam ter visto a criança, cavou-se a tese do rapto até ao volte face no caso: Joana teria, afinal, regressado a casa e teria sido morta às mãos da própria mãe e do tio, irmão da mãe. O que diziam não era verdade e a polícia percebeu-o, corroborando a tese com as provas recolhidas em casa.

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Quando foi lida a sentença, o tribunal deu como provado que Leonor Cipriano e o irmão “agiram com plena consciência das consequências dos seus atos ao espancarem violentamente a pequena Joana”, concluindo que ambos usaram a “sua força desproporcional relativamente à de uma criança de oito anos só parando (de bater) quando a mataram, apesar de ela sangrar pelo nariz, boca e têmpora”.

Leonor Cipriano, mãe de Joana, foi libertada há pouco mais de um ano

LUIS FORRA/LUSA

Os dois irmãos foram condenados, ela a 20 anos e quatro meses de prisão e ele a 19 anos e dois meses. O Supremo Tribunal de Justiça, até onde recorreram, reduziu a pena para de 16 anos e oito meses de prisão.

Este processo teve, no entanto, uma particularidade: o cadáver de Joana nunca foi encontrado. E foi também uma fraqueza na tese apresentada por Leonor e pelo irmão, quando disseram que a criança não teria regressado a casa, que fez com que a PJ apontasse as suspeitas contra eles. As autoridades acabaram por concluir que ambos esquartejaram o corpo, colocando-o em três sacos que tentaram por no congelador, onde foi encontrado sangue humano. Fizeram-no depois de terem avisado o padrasto para o desaparecimento, pondo-o a procurar a menina. Ela nunca assumiu o crime. Ele acabou por responsabilizar a própria irmã. Os dois ouviram a sentença sem expressar um pingo de emoção.

Por esclarecer ficou sempre a motivação do crime. O Ministério Público chegou a justificar que os dois irmãos tinham sido encontrado em atos sexuais pela menina, mas o tribunal não deu essa acusação como provada. Quando leu a sentença, a juíza-presidente disse: “Dificilmente se encontrará um caso mais grave de homicídio”, disse a juíza-presidente, durante a leitura da decisão. Mas não teria razão.

Maria João, sete anos, foi morta pelo pai

Para o psicólogo criminal Carlos Poiares, os últimos anos têm sido uma grande aprendizagem para todos. “Temos visto mães que se atiram ao mar com os filhos. Na altura de crise recordo-me de uma mãe que se atirou de uma janela com os filhos. E, além da questão económica, há a questão da raiva.  Porque quando uma separação conjugal está mal feita, há a fase da agressividade, tanto da parte do pai  como da mãe. É uma altura em que se joga pingue pongue e em que se joga com a criança”, disse, lembrando o caso de uma criança que, num contexto destes, foi asfixiada pelo próprio pai, que para tal usou o cinto do robe.

Poiares referia-se a Maria João, uma menina de sete anos morta em maio de 2009 pelo próprio pai. João Pinto, depois de a estrangular, abriu o sofá-cama e deitou a menina, coberta com um lençol, como se estivesse a dormir. À autoridades o homicida acabou por dizer que, na verdade, queria suicidar-se e decidiu levá-la com ele para que não sofresse com a sua ausência.

O crime foi, segundo o Ministério Público, premeditado. Separado há dois anos da mulher, pediu-lhe que levasse a filha de ambos a jantar porque iria trabalhar para o Algarve. Foi buscá-la à escola, levou-a ao parque e depois para casa. Horas depois de cometer o homicídio telefonou ao INEM a confessar o crime, mas acabaria por ser localizado já fora de casa. Acabou condenado a 16 anos de cadeia.

O criminologista Carlos Poiares defende que todos os Tribunais de Família e Menores quando decidem a quem atribuir a guarda da criança deviam fazer exames psicológicos ao pais à mãe e às crianças antes de tomar qualquer decisão

Pai escondeu corpo de Valentina, mas não o enterrou

Poiares reitera que a lição a reter é que “a família é o pior lugar do mundo: onde acontecem todas as violências, todos os abusos, todos os homicídios. É no contexto familiar que uma criança morre às mãos de pessoas que deviam ter obrigação e cuidado”, diz. Foi por isso que quando soube pelas notícias que Valentina tinha desaparecido lhe veio à memória tantos outros casos. Até o de Maddie, a menina britânica de quatro anos desaparecida do apartamento onde passava férias com os pais na aldeia da Luz no Algarve, cujo caso chegou a ter os pais como arguidos, suspeitos de homicídio da criança, mas que acabou arquivado e sem uma explicação para o que aconteceu.

No caso de Valentina, o pai poderá alegar ter-se tratado de um acidente. Mas para Carlos Poiares nunca um homicídio negligente pode terminar com o “transporte da criança para camuflá-la a alguns quilómetros de casa”, considera. “O mais normal seria chamar o 112”, afirma.

Por outro lado, o principal suspeito da morte de Valentina não enterrou o corpo, escondeu-o apenas nas folhagens. “Não houve uma intenção de encobrir o crime, ou porque achou que iria ser descoberto ou não queria que ficasse esquecido”, analisa.

Mas se Valentina tem nove anos e era já uma criança que se exprimia e que podia até dizer palavras que podiam eventualmente ferir o pai e a madrasta, como constata Carlos Poiares, casos há de crianças mais pequenas mortas às mãos dos pais que nem sequer sabem ainda falar.

Bebé de três meses morto à facada

Como o caso do bebé de apenas três meses esfaqueado mortalmente pelo pai em Linda-a-Velha, Oeiras, em abril de 2015. O Ministério Público concluiu que o fez em retaliação contra a sua ex-companheira, mãe do bebé, que lhe teria dito que queria pôr fim à relação entre ambos, após descobrir que o suspeito mantinha o consumo de álcool.

“A vítima estava, nesse dia, a cargo do arguido, que executou os factos mantendo o contacto por telefone com a mãe do bebé. Depois de esfaquear a vítima, e deixando-a assim em casa, abriu os bicos de gás do esquentador e do fogão da casa e saiu”, relata a acusação.

Um ano depois João Barata, 34 anos, era condenado a 25 anos de prisão, no Tribunal de Cascais,  por um tribunal do júri, composto por quatro cidadãos previamente selecionados e quatro suplentes. O arguido alegou sempre não se lembrar de ter cometido o crime.

Carlos Poiares lembra que em todos estes casos coloca-se uma outra questão: a da saúde mental. O criminologista defende que todos os Tribunais de Família e Menores quando decidem a quem atribuir a guarda da criança deviam fazer exames psicológicos ao pai, à mãe e às crianças antes de tomar qualquer decisão. E, voltando ao caso de Valentina, e numa altura de confinamento — em que a própria PJ tem registado um aumento de tentativas de homicídio e de crimes contras as pessoas — o estado psicológico de cada um pode agravar. “Vamos continuar a ter crianças à guarda de pessoas e que podem correr em riscos. A pandemia, os medos, e o confinamento, uma situação inesperada. De repente, as pessoas que estão habituadas a sair para trabalhar veem-se com os filhos 24 sob 24 horas num espaço limitado e estão ali a olhar uns para os outros. Começa a embirração e o descontrolo emocional e começam comportamentos desviantes”, explica. “Pode haver já muitas crianças magoadas psicologicamente e fisicamente”, insiste.

Valentina foi procurada ao longo de três dias até que o pai indicou à PJ onde estava o seu corpo

CARLOS BARROSO/LUSA

Vanessa foi queimada pela avó numa banheira de água quente. Pai e tia compactuaram

Em 2005 o corpo de Vanessa, de cinco anos, foi encontrado a flutuar e a autópsia viria a revelar as sevícias que foi sujeita: foi queimada, veio a saber-se depois, numa banheira com água quente. O seu corpo apresentava também queimaduras de cigarros. Vanessa estava entregue aos cuidados da avó Aurora, de 49 anos, da tia Sandra, 19, e do pai, no bairro do Aleixo, no Porto. Segundo o Ministério Público, Vanessa foi submetida a uma sucessão de maus tratos durante os cinco meses em que esteve à guarda do pai e da avó.

Os três familiares foram julgados por homicídio qualificado, profanação e ocultação de cadáver. A avó e o pai da menina vão ainda enfrentar acusações de maus tratos. No acórdão da sentença os juízes destacam que ficou com 30% do corpo queimado, que depois disso deixou de comer e mal andava. A avó Aurora foi condenada a 18 anos, o pai a 14 anos e nove meses de prisão e a tia a uma pena de 10 meses, por omissão de auxílio, suspensa por dois anos.

Daniel, seis anos, foi abusado até à morte

Em dezembro de 2005 outra investigação com contornos igualmente violentos eram alvo de uma investigação então concluída pela PJ. Daniel, um menino surdo-mudo e com atraso mental, de apenas seis anos, que vivia em Caxias com a mãe o namorado dela, teria sido sujeito a sevícias sexuais graves, morrendo na sequência da perfuração de vários órgãos internos. O padrasto da criança, um rapaz com apenas 16 anos, acabou por confessar o crime e ser condenado a 12 anos de cadeia.

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