Marques Mendes já era a hipótese mais provável, mas passou a ser a escolha quase inevitável como candidato apoiado pelo PSD a Belém. Depois de um impulso pró-Mendes na semana em que Luís Montenegro definiu as características do candidato na moção de estratégia global, o primeiro-ministro foi mais longe e disse de forma clara que o comentador e antigo líder do PSD é dos “que melhor encaixa no perfil” que definiu para a Presidência da República. Apesar do grande passo dado por Luís Montenegro e dos sinais dados pelo próprio no verão, ao que o Observador apurou Marques Mendes só vai anunciar a decisão em 2025.

Marques Mendes, sabe o Observador, tem vários apoiantes — quer na direção no PSD, quer no núcleo duro do Governo — e alguns dos mais entusiastas, como é o caso do Ministro Adjunto Manuel Castro Almeida, já estão em modo pré-campanha em duas frentes: a defesa de Mendes e o ataque ao seu potencial adversário mais difícil, o almirante Gouveia e Melo.

Fontes da direção do PSD ouvidas pelo Observador acreditam que “Marques Mendes é, de todos, o que tem melhores hipóteses de vencer, por ser um candidato mais abrangente”. Um dirigente social-democrata diz mesmo que a ideia é que “Passos Coelho não quer avançar” e, mesmo que quisesse, “não teria tantas hipóteses caso haja uma segunda volta”. Quanto a Rui Rio, acredita um dos destacado montenegrista, “seria um candidato ainda mais sectário, que nem todo o partido mobilizaria, menos ainda o País”. Além disso, ao que o Observador apurou, nem Rui Rio nem Passos Coelho estão, pelo menos neste momento, disponíveis para o combate presidencial.

Manuel Castro Almeida — o ministro mais próximo de Marques Mendes e um mendista dos sete costados — não tem pudor em lançar já o ex-líder para Belém. O ministro Adjunto disse mesmo, em entrevista ao Diário de Notícias, que “veria com excelentes olhos [uma candidatura de Luís Marques Mendes]. Tem hoje uma imagem e um suporte que vai muito para lá do eleitorado do PSD. Tem dado sinais de grande independência e uma capacidade de análise que lhe dão apoio de muitas pessoas fora do partido originário.”

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Mas Castro Almeida não é o único entusiasta. Há menos de um ano, Pedro Duarte, então coordenador do Conselho Estratégico Nacional do PSD, sugeria a uma sala repleta de sociais-democratas que Marques Mendes — que ali tinha ido apresentar o seu livro Troika Nunca Mais — era uma “esperança” para uma futura  candidatura a Belém. Sem nunca se referir diretamente à Presidente da República, todos perceberam que era esse o fato que o agora ministro dos Assuntos Parlamentares vestia a Marques Mendes: “Quando o vejo no futuro, tenho uma esperança. Como diz o nosso bom povo: para bom entendedor, meia palavra basta“.

Quando o semanário Expresso fez manchete com um elogio de Hugo Soares (o dirigente próximo de Luís Montenegro) a Leonor Beleza como “excelente candidata presidencial” houve algumas dúvidas, até internamente, sobre se havia um novo caminho a ser explorado. Mas, como o Observador escreveu na altura, a frase não tinha sido premeditada nem previamente combinada com Luís Montenegro. O assunto ficaria arrumado na mesma Universidade de Verão com Leonor Beleza deixar na resposta por escrito a um aluno: “Não, obrigada, não pondero nem ponderarei tal candidatura.”

Marques Mendes está no terreno e é o mais bem posicionado para ter apoio do PSD a Belém

O próprio Hugo Soares, em entrevista ao programa Vichyssoise na Rádio Observador, há três semanas explicava que continua achar que “Leonor Beleza tinha condições para ser uma excelente Presidente da República”, mas logo acrescentou: “Como tem Luís Marques Mendes.” E o todo-poderoso secretário-geral e líder parlamentar deixou um elogio ao ex-líder do PSD que vai na linha dos mais entusiastas mendistas: “E até do ponto de vista eleitoral, Marques Mendes se calhar é mais forte do que Leonor Beleza, porque ocupa um espaço mediático muito mais conhecido, se calhar com outra experiência política”.

No núcleo duro de Luís Montenegro não é difícil encontrar outros apoiantes de Luís Marques Mendes, como é o caso de António Leitão Amaro, que é muito amigo do antigo líder do PSD e defensor, mesmo que nunca o tenha dito publicamente, da candidatura do comentador político.

Começou o tiro ao Almirante (e não só)

Um dos maiores apoiantes, nos bastidores, de uma candidatura de Marques Mendes é o atual Presidente da República. E, sempre à frente nos cálculos políticos, há meses que Marcelo Rebelo de Sousa admite — em conversas privadas com alguns dos seus mais próximos — que é necessário travar a candidatura do almirante Henrique Gouveia e Melo — o “anti-ssitémico”. Como o Observador avançou já em meados de setembro o Presidente estava preocupado com o facto de a não-aprovação do Orçamento poder “empurrar um anti-sistémico para Belém”.

“Sem Orçamento do Estado, um candidato que diz ser fora do sistema ganharia com isso. O candidato do Chega [André Ventura] não tem força para ganhar, mas há outro que tem e que pode ir buscar votos ao Chega, ser mais abrangente e ganhar”, dizia então fonte de Belém, numa alusão ao almirante Henrique Gouveia e Melo. Uma outra notícia, que sairia seis dias depois no semanário Expresso, dava mesmo conta que o chefe de Estado queria travar a candidatura de Gouveia e Melo e que a mesma poderia ser um tiro de morte” na candidatura do “preferido” Marques Mendes.

A animosidade que transparecia pelas fontes de Belém relativamente ao almirante ganhou dimensão, o que levou Marcelo Rebelo de Sousa a ter dizer em público que “o Presidente não apoia, não desapoia, não acelera, nem trava candidaturas”. E acrescentou: “A única intervenção que o Presidente tem em matéria presidencial é, daqui a um ano e um mês, marcar as eleições.” Mendes tem, no entanto, um aliado em Belém contra o almirante. O que pode ser útil.

Mas há quem o faça às claras. O ministro Manuel Castro Almeida, na mesma entrevista ao Diário de Notícias, classificou mesmo como uma “anormalidade” ter um militar em Belém: “Independentemente da pessoa em causa — e falo a título pessoal –, diria que seria estranho, na Europa do século XXI, um militar na Presidência. Não há exemplo na União Europeia e seria uma coisa anormal. Nós teríamos de explicar à Europa e ao mundo o que estava a acontecer, porque as pessoas iriam interrogar-se sobre o que aconteceu em Portugal para terem um militar como Presidente”.

O ataque de Castro Almeida ao almirante Henrique Gouveia foi tão intenso que — segundo fontes do PSD que até são entusiastas de Mendes — acabou por ser “exagerado e pouco rigoroso“. Isto porque, na República Checa, país com as mesmas características e com um sistema político similar ao português, tem como Presidente da República Petr Pavel, que não só foi militar como foi mesmo Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas Checas. Ou seja: é verdade que não há muitos casos, mas não é verdade que não haja nenhum exemplo na UE.

No preparar de terreno para Marques Mendes, Gouveia e Melo não é o único visado. Mário Centeno, apontado como o potencial candidato do PS, também já foi brindado com algumas farpas de um membro do Governo. O mesmo Pedro Duarte que há menos de um ano classificou Marques Mendes como uma “esperança” para Belém atacou recentemente, em pleno Parlamento, o legado de Mário Centeno: “Foram oito anos em que se sacrificou o verdadeiro interesse dos portugueses em benefício de cativações e brilharetes estatísticos que foram certamente muito relevantes para a carreira política do então ministro das Finanças, mas saíram caros aos portugueses”, atirou Pedro Duarte.

O ministro considerou mesmo que “o preço” de o país ter “a presidência do Eurogrupo, promovida pela frente de esquerda unida, foi muito alto, saiu muito caro aos portugueses”. Para o social-democrata, a gestão de Centeno nas Finanças “significou o travão a fundo no investimento público e na aceleração máxima dos serviços públicos”. Isso, sublinhou ainda, “prejudicou muito os portugueses.”

Os timings de Mendes: ex-líder não avança antes de 2025

O calendário de Marques Mendes está em marcha. O perfil de candidato, aquele onde o ex-líder é um dos que “encaixa melhor”, será aprovado a 20 de outubro. Marques Mendes, sabe o Observador, ainda não terá decidido se marcará presença no Congresso do PSD, mas como ainda por cima é no seu distrito (Braga) fonte do PSD disse ao Observador que é provável que apareça. Está afastada, no entanto, qualquer intervenção no púlpito de Luís Marques Mendes.

Em 2o14, como estava em conflito com Pedro Passos Coelho — que aprovou um perfil de candidato que excluía um “catavento” — Marcelo Rebelo de Sousa fez questão de fazer um discurso num Congresso que se realizou no Coliseu dos Recreios em Lisboa. O atual Presidente, ao estilo de uma autêntica pop star, mostrou a Passos e a quem não gostava dele que, com tanto apoio das bases (e até de barões), era impossível o PSD não apoiar o “seu” Marcelo. Marques Mendes não tem nenhum problema com o partido, logo está dispensado de ter que fazer um número idêntico. Pelo contrário, deverá optar por resguardar-se.

No final do mês de agosto, antes de discursar na Universidade de Verão do PSD, Marques Mendes tinha revelado que estava “mais próximo do que nunca” de decidir se seria ou não candidato presencial. Explicava então que a sua reflexão pessoal estava “mais adiantada do que há um ano” e que nos “próximos meses” divulgaria se está ou não na corrida para Belém. Apesar de Marques Mendes dizer que estava “mais próximo do que nunca” da decisão, mas o Observador apurou que o antigo líder do PSD nunca anunciará uma decisão sobre a candidatura antes de 2025.

Marques Mendes está no terreno e é o mais bem posicionado para ter apoio do PSD a Belém

Marques Mendes não deverá esperar tanto como Marcelo Rebelo de Sousa (que só o fez no mês de outubro de 2015 mesmo antes das eleições em janeiro de 2016), mas a decisão só será anunciada em 2025. Avançar já seria contribuir para um desgaste de imagem, além de que estaria sempre mais condicionado naquele que é o seu maior palco de notoriedade: o comentário de domingo em canal aberto.

Isso não significa, como o Observador já tinha escrito em agosto, que não esteja no terreno. Se Marcelo Rebelo de Sousa em 2014 e 2015, antes de oficializar a candidatura, andou pelo país com Matos Rosa a percorrer todas as estruturas do partido (sob o pretexto dos “40 anos do PSD”, mas de olho num apoio para Belém), Marques Mendes também responde agora a todas as solicitações. No verão, o ex-líder do PSD aproveitou a ida a Castelo de Vide para privar com alguns autarcas do Alentejo, como por exemplo o presidente da autarquia onde se realiza o evento do PSD, António Pita. Numa maratona partidária, Marques Mendes saiu do Alentejo direto para os Açores, onde participou num jantar conferência da Universidade de Verão da JSD Açores. Não é oficial, mas o caminho está a ser feito.

Quanto vale Mendes nas sondagens

O PSD não tem valorizado as sondagens, até porque são testados nomes que podem não vir a fazer parte das escolhas dos portugueses. Na última sondagem, por exemplo, Marques Mendes aparece em terceiro, mas em segundo lugar estava Pedro Passos Coelho, que pode mesmo não estar interessado em entrar na corrida. Uma boa parte dos dirigentes do PSD acredita que, em caso de segunda volta, dificilmente o ex-primeiro-ministro conseguiria os 50% mais um. Daí que Mendes seja uma escolha mais segura.

Há, no entanto, uma outra sondagem, anterior, que foi particularmente valorizada no partido, por meter candidatos da esquerda e da direita diretamente em confronto. O barómetro de julho para o Negócios, Correio da Manhã e CMTV dava Marques Mendes como o mais bem posicionado à direita e o único (além de Gouveia e Melo) que venceria Mário Centeno. O ex-ministro das Finanças do PS, segundo esta sondagem, ganharia a Passos, Leonor Beleza e Santana, mas não a Marques Mendes (48,4% contra 37,1%). Além de Centeno, o ex-líder do PSD e comentador político também venceria com facilidade Ana Gomes (55% contra 33,4% para a diplomata).

A mesma sondagem diz que Mendes perderia para Guterres (55,6% para o atual secretário-geral da ONU, contra apenas 34,9%), mas no PSD a convicção é de que é mais provável que o candidato dos socialistas seja Mário Centeno e que o antigo primeiro-ministro esteja “nem aí” para um regresso à política. O problema António Costa, que também tinha boas hipóteses contra Mendes, está resolvido com a ida para o Conselho Europeu.

Tudo isto indicaria que está tudo feito para Marques Mendes, mas ainda é cedo, como explica quem tem experiência nestas candidaturas. Em entrevista ao Observador em meados de julho, o antigo Presidente da República Cavaco Silva antecipava que vão “aparecer muitos candidatos” e que isso o leva a abrir uma outra possibilidade: “Às vezes imagino que irá acontecer uma segunda volta.”