A mulher de Jorge Moreira da Silva, Mariana, já lhe tinha feito a pergunta: “Estás preparado para perder?” E estava. Sempre esteve. É por isso que, na noite da derrota, não houve drama na sede de campanha apesar da vitória esmagadora de Luís Montenegro nas diretas do PSD. Os cerca de 28% (contra 72%) são a maior distância de sempre em diretas entre primeiro e segundo, mas não envergonham e há sempre o copo meio cheio: “É quase o triplo do Pinto Luz“, regista um apoiante. Um dos objetivos de Moreira da Silva foi cumprido e estava anunciado no slogan “Direito ao Futuro”. Foi isso que sempre quis: perder, mas tirar bilhete para um segundo round daqui a dois ou quatro anos.
Todo o discurso de derrota de Jorge Moreira da Silva teve um sentido: encontrar atenuantes e álibis para o mau resultado e fazer a sua versão do vou-andar-por-aí em vários atos. No PSD há vários exemplos de militantes que perderam eleições (em Congresso e diretas) e vieram a ser líderes mais tarde: aconteceu com Santana Lopes, Marques Mendes ou, mais recentemente, com Passos Coelho. É uma espécie de bilhete que todos tiram e que Miguel Pinto Luz testou em 2020. Apesar da derrota, o ex-líder da JSD acredita que já o tem na mão.
Jorge Moreira da Silva nem disfarça que alimenta o sonho de tentar uma segunda vez: “Não me peça para dizer, quando tenho 51 anos que nunca mais vou apresentar-me a uma eleição. Isso seria, obviamente, um disparate.” Isto depois de já ter dito segundos antes: “Não perdi nenhum direito como militante”. E ainda disse uma outra outra vez, não excluindo nova candidatura: “Acabei de perder uma eleição não vai querer que eu diga o que vou fazer daqui a dois, quatro, oito ou a 10 anos. Não abdicarei de lutar pelo meu país.”
De uma forma mais despudorada ainda, Jorge Moreira da Silva confessa: “Os apoiantes de Luís Montenegro disseram-me: ‘O seu tempo não é agora, é daqui a dois anos. Se até os apoiantes de Montenegro esperam que continue a apresentar ideias, quem sou eu…”.
Jorge Moreira da Silva promete contribuir para a “unidade” do partido, mas, mesmo assim, não se quer colar a Montenegro. “Fazendo uma analogia para o ciclismo, Luís Montenegro cruzou a meta à minha frente, mas o meu objetivo nunca foi saltar para a bicicleta dele”. Mesmo que esteja desempregado a partir de segunda-feira, Jorge Moreira da Silva avisa que “não faz sentido” ocupar um cargo “executivo” na direção de Montenegro com quem tem “divergências profundas“. Mais uma vez: o objetivo é ficar longe o suficiente para poder ir à luta de novo se tiver condições para isso.
Transformar a derrota em meia-vitória
Outro dos grandes objetivos de Jorge Moreira da Silva foi transformar a derrota em meia vitória, procurando justificar o resultado que teve. Desde logo, utilizou como argumento ter tido menos tempo do que o adversário: “Esta candidatura fez-se em menos de cinco semanas, a outra candidatura estava no terreno há três anos”.
Jorge Moreira da Silva atirou-se ainda à participação eleitoral. A abstenção ficou perto dos 40% e houve cerca de 27 mil militantes a votar, o que representa cerca de menos de nove mil militantes do que nas eleições que opuseram Rio a Rangel em novembro. O candidato derrotado coloca as culpas em Montenegro: “Fiz tudo, fiz mesmo tudo para que os militantes pudessem comparar projetos. Lamento a reiterada indisponibilidade da outra candidatura para os debates, que contribuiu para a desmobilização“.
O candidato voltou também enfatizar que não teve o “apoio de uma única distrital” e que, mesmo assim, conseguiu 7.300 votos. “Se não houvesse voto livre, quantos teria? Zero!” Ou seja: apesar da derrota esmagadora, Moreira da Silva auto-coroou-se novo rei do voto livre. O problema é que, na frieza dos números, o seu adversário teve mais de 70% e venceu em todas as distritais do PSD. Levou, por exemplo, um já esperado bailinho na Madeira.
Os problemas de quem quer ter direito (a ser candidato) no futuro
Jorge Moreira da Silva até se pode ter posicionado como futuro candidato à liderança do PSD, mas não basta ter perto de 30%. Isto porque Moreira da Silva teve parte da máquina de Rui Rio (João Montenegro, na volta, Carlos Eduardo Reis a diretor de campanha) e ainda Salvador Malheiro alegadamente na sombra. Alegadamente, porque não foi a mesma coisa. Em Ovar, terra de Malheiro, Moreira da Silva até ganhou por 91 votos, mas Rui Rio costumava ali vencer por 400 votos de diferença. A mobilização não foi — nem de perto, nem de longe — a mesma.
Não terá sido o voto livre, mas uma parte da rede de Rio a contribuir para um resultado “honroso” de Moreira da Silva. A questão é saber se essa rede, daqui a dois ou quatro anos, quer continuar a apostar no mesmo candidato. Nas hostes de Rio, fala-se que o preferido para ocupar o espaço deixado órfão por Rio pode ser Paulo Mota Pinto. Todas essas variáveis — para não falar um eventual sucesso de Luís Montenegro — podem limitar uma segunda oportunidade para Moreira da Silva. Até porque há rioistas e montenegristas, mas não há “moreiristas”.
Além disso, mesmo que Paulo Rangel já tenha aparentemente desistido dessas guerras, Miguel Pinto Luz será sempre um potencial concorrente. Pior: há ainda Carlos Moedas, a nova coqueluche do partido que, se tiver sucesso em Lisboa, pode dinamitar qualquer candidato que se apresente à liderança do PSD.
Na sede de campanha, perante o pouco entusiasmo com os resultados, foi retirada a imagem do candidato no ecrã gigante, tendo sido trocada pela final da Liga dos Campeões. Na sede só passou, no entanto, a primeira parte do jogo. Na política foi isso, no fim do dia, que Moreira da Silva quis provar: que só disputou a primeira parte e que ainda está no intervalo.