Aprovado que está o orçamento e a garantia de que não haverá eleições até ao verão de 2026, o PSD vira agora a sua agulha para o ciclo autárquico. O objetivo de Luís Montenegro é conseguir mais uma câmara do que o PS e recuperar a liderança da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), mas como disse o secretário-geral do PSD, Hugo Soares, ao Observador no Congresso a “prioridade é manter” as câmaras já conquistadas. Assim, se encurtar a distância para o PS em número de autarquias, mantiver Lisboa, aguentar a liderança de autarquias médias-grandes (como Braga ou Coimbra) e reconquistar o Porto, o PSD já poderá clamar vitória.
O limite de mandatos vai obrigar a AD a ter de apresentar 31 novos candidatos às autarquias, o que mesmo assim é inferior ao desafio que os socialistas têm de enfrentar: 54. O segredo mais mal guardado da recandidatura de Moedas, a possibilidade de um ministro sair para a segunda maior câmara do país, o joker Santana Lopes que é pensado para duas câmaras, o desafio do crescimento do Chega e a aliança com a IL são algumas das áreas prioritárias de atuação da preparação autárquica do PSD. A equipa de Montenegro já está no terreno, com um trabalho de formiga, para tentar fazer ainda melhor que Rio em 2021 — que teve um bom resultado autárquico (ao contrário do que os montenegristas disseram, em uníssono, no dia seguinte ao escrutínio).
Lisboa, Lisboa, Lisboa: o inevitável Moedas
Carlos Moedas vai alimentando o tabu, mas no PSD, quer distrital quer nacional, sobram poucas dúvidas: o atual presidente de câmara vai ser recandidato. Apesar de notícias de que havia um caminho presidencial, o atual autarca da capital: “É um cenário que não equaciono.” Fonte do PSD que acompanha o processo autárquico diz ao Observador que seria “uma loucura” a “um ano das eleições” ter outro candidato que não Moedas. “Era o primeiro passo para colocar a câmara em risco”, atira a mesma fonte.
Hugo Soares disse, aliás, na Rádio Observador que a “prioridade é mantermos as câmaras municipais que temos, desde logo a capital“. Paulo Rangel, igualmente em entrevista à Rádio Observador, alertou para a importância de reforçar a força na autarquia e identificou o inevitável protagonista da candidatura do PSD: “Em Lisboa não temos maioria absoluta e temos condições de vir a ter. Carlos Moedas tem o desafio de ganhar. Não é fácil, mas é objetivo atingível.”
O tabu de Carlos Moedas é, por isso, mera tática política. O presidente da câmara de Lisboa deve, ainda no primeiro trimestre de 2025, apresentar a recandidatura à câmara de Lisboa. Nos bastidores, Luís Montenegro também se tem envolvido pessoalmente para que o PSD mantenha a câmara. Os contactos com Rui Rocha, da Iniciativa Liberal, estão bem encaminhados para que a IL venha a fazer parte de coligação pré-eleitoral encabeçada por Carlos Moedas, embora os partidos só venham a conversar melhor sobre as condições dessa “sinergia” depois da Convenção Liberal de janeiro.
Como nas autarquias lidera quem tem mais um voto (e não quem tem a maioria de vereadores), todos os votos que Moedas consiga amealhar são importantes para vencer. O PCP estar fora de uma coligação pré-eleitoral à esquerda é uma boa notícia para o PSD, mas se Livre e Bloco se unirem ao PS, o apoio liberal pode ser fundamental para a reeleição de Moedas.
Porto “ministeriável” e para ganhar
Reconquistar o Porto ao fim de 12 anos é outro dos grandes objetivos do PSD em 2025. O ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte — que sempre teve ligações às estruturas do PSD na invicta — deu recentemente um grande passo em frente em termos de aparelho: é o novo líder da sempre complexa distrital do Porto. Mesmo que o ministro diga que não foi com esse “intuito” que assumiu o cargo, no PSD muitos veem a jogada como uma etapa preparatória de uma futura candidatura à câmara municipal Porto. O próprio disse, em entrevista ao Observador, que essa análise não é absurda: “Admito que possa ser feita essa interpretação”.
Pedro Duarte disse igualmente ao Observador que é, de facto, a sua missão como líder distrital encontrar “não só um bom candidato, como um bom presidente de câmara” e tenta não afunilar a candidatura em si: “Tenho uma mão-cheia de nomes na minha cabeça”. O ministro vai dizendo que está “absolutamente focado” na governação, mas não rejeita a possibilidade e atira: “Seria com certeza um desafio muito honroso, particularmente para mim que sou do Porto e gosto muito da minha cidade“.
O seu colega de Governo, Paulo Rangel, que em tempos também foi apontado para esse candidatura, disse ao Observador que “há um momento em que é preciso apresentar os candidatos”, mas atualmente ainda se está no “domínio de dizer se os candidatos a candidatos têm perfil. E esse [Pedro Duarte] tem.” Hugo Soares está em sintonia, embora mantenha outras possiblidades em aberto: “Perguntou-me se Pedro Duarte era um bom candidato. Pedro Duarte, como muitos outros, serão excelentes candidatos ao Porto”.
Questionado sobre se um ministro deve sair do Governo para se candidatar uma câmara como a do Porto (como fez Costa com Lisboa em 2007), Rangel diz que “a câmara do Porto até é mais importante que a câmara de Lisboa”. E que não o chocaria um ministro sair para tentar conquistar a autarquia portuense: “Não há hierarquia entre estes postos. A câmara do Porto é um desafio importantíssimo (…) o mais alto perfil do PSD está sempre em condições de ser candidato à câmara do Porto.”
Sobre esse ser um objetivo, Paulo Rangel disse na mesma entrevista ao Observador que o “objetivo tem de ser ganhar a ANMP, mas sem dúvida que Lisboa e Porto são batalhas muito importantes e muito relevantes. Não há como dizer que não.”
Rangel lembra que as “relações com Rui Moreira têm sido cordiais, porque há uma comunhão de visão política, mas obviamente que não é uma autarquia do PSD e do CDS e por isso esse é um objetivo importante.” A relação com Rui Moreira e o seu movimento faz, aliás, parte da estratégia do PSD para reconquistar a autarquia. Luís Montenegro quererá evitar que o movimento tenha uma candidatura própria, pois sabe que as hipóteses de o PSD recuperar a autarquia são maiores se conseguir reconquistar o eleitorado que fugiu para o independente Rui Moreira. O processo das Europeias, em que o líder do PSD acabou por escolher Sebastião Bugalho para cabeça de lista, deixou algumas marcas, mas, entretanto, já foi feito um caminho de reaproximação. “O Rui Moreira não é dono dos votos, mas claro ajuda se estiver envolvido e ao lado do candidato do PSD”, diz ao Observador uma fonte da distrital do PSD do Porto. É por aqui que passa a estratégia do PSD: apresentar um candidato forte, com notoriedade qb e recuperar os votos que fugiram para Moreira. Pedro Duarte, como diz Rangel, encaixa no perfil.
Santana é joker para recuperar Figueira (ou Sintra)
Santana Lopes, como escreveu o Observador, ainda não desistiu completamente de uma candidatura à Presidência da República. Porém, faz depender essa candidatura de boas sondagens — o que, até agora, não tem. Isso torna mais provável que continue nos desafios autárquicas.
Numa entrevista no início do mês à Rádio Observador, o atual autarca da Figueira dizia que “o mais natural” era ser recandidato pela Figueira da Foz. Mas o Observador sabe que há outras hipóteses em cima da mesa, mesmo no plano autárquico. Luís Montenegro, sabe o Observador, não afasta a possibilidade de Santana Lopes poder ser candidato a Sintra, uma autarquia nas mãos do PS, mas com Basílio Horta em final de mandato. Um nome forte, daria ao PSD possibilidades de vencer.
Quando o antigo primeiro-ministro admitiu no Congresso do PSD que “há conversas” sobre autárquicas com Montenegro, não afunilou o assunto na Figueira. Até a câmara de Cascais já foi falada nos bastidores como uma boa opção para Santana. Ainda assim, sabe o Observador, Sintra é neste momento uma hipótese mais provável. Santana Lopes não esconde a ligação afetiva à Figueira, mas com a vida familiar em Lisboa, o mandato autárquico obriga o autarca a fazer esticões — quase sempre a conduzir o próprio carro — entre a capital e a zona centro. Se fosse autarca em Sintra ficava mais perto dos filhos e dos netos — o que valoriza.
Esta nem é a primeira vez que uma candidatura a Sintra é apontada ao ex-primeiro-ministro. Marcelo, quando era líder, convidou Santana Lopes para ser candidato autárquico, dando-lhe a oportunidade de escolher entre Sintra, Torres Vedras, Arganil e Figueira da Foz. Santana preferia Sintra, mas Pacheco Pereira chumba o nome na distrital de Lisboa. Durão Barroso, a partir dos Estados Unidos, avisara Marcelo: “Vocês são loucos. Deixam-no candidatar-se e ele ganha”. Tinha razão. A candidatura acabaria por ser à Figueira da Foz e Santana Lopes ganha com maioria, algo que o partido nunca conseguira naquele concelho. Nascia aí o Santana autarca, que voltaria ao lugar onde foi feliz em 2021 e onde se mantém até hoje.
Aveiro e Braga. Mudanças forçadas são risco
Entre os 31 autarcas que não se podem recandidatar por ter atingido o limite de mandatos estão grandes autarquias atualmente nas mãos do PSD, como são exemplo Aveiro e Braga. O PSD ainda chegou a pensar em Miguel Macedo, mas este não quer voltar à vida política. Apesar ter aceitado presidir à Assembleia distrital do PSD Braga nas listas de Paulo Cunha, Miguel Macedo avisava no programa onde participa semanalmente, “O Princípio da Incerteza”, na CNN: “Não estou em mais nada nem tenciono estar (…) Já dei o meu contributo e não tenho grande disponibilidade neste momento para ocupar outras atividades.” E acrescentou: “É preciso dar lugar aos novos“.
Quinze dias depois, era para aí que seguiria o partido, que escolheu João Rodrigues, de 36 anos. A escolha não foi propriamente pacífica, já que a concelhia (liderada por João Granja, muito próximo de Hugo Soares) submeteu dois candidatos a votação que eram vereadores em funções do executivo de Ricardo Rio. João Rodrigues contou com 12 votos e Olga Pereira apenas com 3, tendo o vereador do urbanismo sido oficializado como candidato. A vereadora, em declarações à Rádio Universidade do Minho, acabou por acusar o presidente da concelhia de “falta de atitude conciliadora”.
João Granja fez tudo coordenado com Hugo Soares e o secretário-geral do PSD, que é naturalmente uma espécie de arcebispo do partido no distrito, fez questão de dar a sua bênção a João Rodrigues no Congresso. De acordo com o Diário do Minho, Hugo Soares disse em uníssono com o presidente da distrital Paulo Cunha que “João Rodrigues é o melhor candidato para o PSD continuar a desenvolver Braga”. Com a influência que Hugo Soares tem a nível nacional e a confiança que Luís Montenegro deposita nele torna praticamente impossível qualquer surpresa — o que significa que será João Rodrigues (que foi presidente da distrital da JSD Braga logo após a liderança de Hugo Soares) a suceder a Ricardo Rio como candidato.
Em Aveiro, o PSD também enfrenta a saída de um líder carismático. Ribau Esteves — depois de anos à frente da câmara de Ílhavo — mudou-se para Aveiro e foi sempre vitorioso. Agora atinge o limite de mandatos. Tanto o atual autarca como o líder da concelhia — que é o seu braço-direito, Simão Santana — defendem uma solução de continuidade. Ou seja: alguém que já esteja no atual executivo. Aí, ganha força a possibilidade de o candidato ser o vice-presidente da autarquia, Rogério Carlos.
Têm surgido, no entanto, a possibilidade de serem nomes mais próximos de Luís Montenegro e que sempre fizeram política ao lado do atual líder do partido — o que pode ser uma vantagem. Isto porque, em capitais de distrito, o presidente do partido tem uma palavra decisiva. Silvério Regalado, montenegrista e antigo presidente da câmara de Vagos é uma das hipóteses. Jorge Ratola, membro do atual gabinete do primeiro-ministro e antigo vice-presidente da autarquia, é outra das possibilidades. Neste caso há uma desvantagem: se escolher um dos “seus”, Montenegro vai encontrar resistência da estrutura local.
Cascais e Oeiras. A sucessão e a bela localidade em que ganhar é não perder para o PS
Carlos Carreiras vai atingir o limite de mandatos e a mudança é sempre um risco. Cascais durante anos houve um número dois que, muitas vezes, até assumiu um protagonismo superior ao próprio presidente. Miguel Pinto Luz ia dizendo que não queria a autarquia, mas poucos acreditavam. Quando se abriu a possibilidade de poder suceder a Carreiras preferiu colocar as fichas no regresso do PSD ao poder para fazer o que gostaria mais: ser ministro. E conseguiu.
A solução passou a ser o atual número dois da autarquia, Nuno Piteira Lopes. Carlos Carreiras disse em entrevista à Rádio Renascença que essa foi a escolha da concelhia que agora irá propor o nome do vice-presidente “à distrital que irá submeter à Comissão Política Nacional”. E acrescentou: “Não antevejo qualquer outra solução que não seja essa.” Disse ainda que “Nuno Piteira Lopes é certamente, desde que há eleições autárquicas livres, aquele que se apresenta mais preparado a eleições autárquicas.”
Para Nuno Piteira Lopes não ser a escolha teria de haver uma intervenção direta da direção nacional, o que podia perturbar uma eleição aparentemente fácil. Outra questão importante para garantir que o PSD não perde a autarquia em mudança de ciclo é a coligação com o CDS. Os centristas são uma força importante no concelho e têm até a presidência da junta de freguesia de Cascais e Estoril. Além disso, há um potencial candidato que vai tentar fazer mossa, em particular no voto jovem, que é o comentador e consultor político João Maria Jonet — que pondera ir como independente, mas ainda pode potenciar a votação se tiver o apoio da Iniciativa Liberal.
Já no concelho vizinho, em Oeiras, o grande objetivo do PSD é posicionar-se para 2031, quando Isaltino Morais atinge o limite de mandatos. O atual presidente da câmara nem se importaria de ter o apoio do PSD, mas uma decisão como essa da atual direção podia deixar Luís Montenegro debaixo de fogo (por Isaltino ter sido condenado no passado). Esse é um dilema da atual direção: ou apoia Isaltino ou avança com um candidato que será facilmente batível (todos são contra o atual presidente). Para o Oeiras, mais do que ganhar com um candidato próprio, o grande objetivo é que a câmara não passe para as mãos do PS, já que uma parte dos eleitores de Isaltino podem ser herdados quatro anos depois. Na verdade em 2017 e 2021, o PSD fez um bocado isso: apresentou candidatos com pouca notoriedade (Ângelo Pereira e Alexandre Poço, com as caricaturais campanhas do “boneco” e das “meias”, respetivamente), o que até ajudou Isaltino Morais. É portanto um cálculo difícil aquele que o PSD tem de fazer em Oeiras.
De Funchal a Faro. Situações resolvidas e por resolver
Nas capitais sede de distrito há outros problemas a resolver. Em Faro, Rogério Bacalhau atinge o limite de mandatos e ainda não existe um candidato claro. O líder da distrital do PSD/Algarve, Cristóvão Norte, disse ao Observador que ainda não sabe quem será, mas garante que será “um candidato forte”. Descarta a hipótese de ser ele próprio o candidato e também disse que não está disponível para “convencer ninguém”, após Macário Correia ter descartado uma candidatura, alegando que está focado na agricultura e num turismo rural.
Sobre a hipótese de ser alguém com notoriedade, Cristóvão Norte lembra ao Observador que tem de ser “alguém conhecido em Faro”, já que o que tem é de “ganhar eleições em Faro, não tem que ser conhecido em Lisboa, no Porto ou em Braga.” O presidente da concelhia de Faro e presidente da junta, Bruno Lage, é uma das hipóteses e também se fala da antiga vereadora de Macário Correia, Alexandra Gonçalves.
Em Coimbra, seguindo o princípio de que todos os atuais presidentes de câmara são convidados, José Manuel Silva, que é independente, deverá ser o candidato de uma nova grande coligação anti-PS. O PS terá, no entanto, nas suas mãos sondagens que dão a ex-ministra Ana Abrunhosa com possibilidades de recuperar a autarquia. No Funchal, também se sabe que o candidato não será quem venceu as eleições em 2021, depois de dois mandatos em que a autarquia esteve nas mãos de uma grande coligação liderada pelo PS. Com Pedro Calado afastado na sequência do processo judicial que levou à sua detenção durante 21 dias, a autarquia foi assumida por Cristina Pedro. No caso de Santarém, foi seguido a antiga prática de o presidente eleito se afastar um ano antes para o sucessor ganhar notoriedade: Ricardo Gonçalves, que ia atingir o limite de mandatos, deu o lugar a João Leite, que será o candidato em 2025.