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Operação Lex. As quatro promessas que colocaram Rui Rangel sob suspeita

Rui Rangel é suspeito de quatro crimes de tráfico de influência por alegadamente ter prometido influenciar resultado de processos. Vieira ter-lhe-á prometido um futuro cargo na universidade do Benfica

O juiz desembargador Rui Rangel está a ser investigado pela alegada prática de quatro crimes de tráfico de influência. Na investigação que corre termos no Supremo Tribunal de Justiça — sendo juiz desembargador, Rui Rangel tem de ser investigado pela secção criminal do tribunal que representa a cúpula do poder judicial –, é ainda suspeito da alegada prática de fraude fiscal, branqueamento de capitais e recebimento indevido de vantagem. Apesar de a Procuradoria-Geral da República ter confirmado a existência de suspeitas de crimes de corrupção, Rangel não é, para já, suspeito desse ilícito criminal.

A investigação, a cargo do procurador-geral adjunto Paulo Sousa, concentra-se, neste momento, nas alegadas promessas que Rui Rangel terá feito a diversos empresários de que poderia influenciar quatro decisões judiciais. Duas dessas decisões dizem respeito a casos que têm José Veiga como principal arguido — e que terá transferido cerca de 300 mil euros para contas bancárias do filho do advogado José Santos Martins, tido pela investigação como um alegado testa-de-ferro de Rui Rangel. Este, por seu lado, terá recebido grande parte daquele montante através de depósitos individuais de 10 mil euros.

Rui Rangel não é, nem nunca foi, um juiz muito popular entre os seus pares. Polémico, extrovertido e com grande notoriedade mediática, sempre foi o oposto da discrição que a esmagadora maioria da classe de magistrados judiciais está a obrigada a seguir. Este juiz é agora o principal protagonista da Operação Lex por causa de José Veiga — o ex-empresário de futebol igualmente pouco discreto que reapareceu há tempos no longínquo Congo Brazzaville à custa da indústria do petróleo que marca a vida daquele pequeno Estado africano. Como dizia o banqueiro Ricardo Salgado em 2014, poucos meses antes da derrocada do Grupo Espírito Santo (GES), “o Veiga não é um príncipe das Astúrias” mas tinha aquilo de que a família Espírito Santo precisava nos anos da troika: dinheiro, muito dinheiro (do Congo Brazzaville). É assim que começa a história da Operação Lex — um inquérito que já levou à constituição de 11 arguidos, estando neste grupo os cinco que foram detidos esta terça-feira.

[Os talões, o seguro e os emails a pedir dinheiro. Veja no vídeo alguns indícios contra Rui Rangel e as polémicas do juiz]

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O caso João Vieira Pinto

Nuno Correia/Getty Images

A primeira decisão investigada neste processo estará relacionada com o chamado caso João Vieira Pinto, onde Veiga, juntamente com os ex-dirigentes do Sporting Luís Duque e Rui Meireles, foram condenados em setembro de 2012 pela 6.ª Vara Criminal de Lisboa pela alegada prática de ilícitos criminais económico-financeiros durante a contratação daquele jogador de futebol pelo clube de Alvalade, tendo sido absolvidos em julho de 2013 pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

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José Veiga foi condenado em primeira instância por crimes de fraude fiscal e branqueamento de capitais, enquanto João Pinto, Luís Duque e Rui Meireles foram considerados culpados em primeira instância do crime de fraude fiscal. A sentença de Veiga implicava uma pena de prisão de 4 anos e 6 meses em cúmulo jurídico, enquanto que Duque e Meireles foram condenados a uma pena de 2 anos de prisão e João Pinto a uma pena de 1 ano e seis meses. Todos teriam ainda de pagar uma indemnização ao Estado de cerca de 169 mil euros, acrescidos de juros de mora, pelos impostos que o Estado não tinha conseguido cobrar.

Através de recursos apresentados na Relação de Lisboa, esta sentença veio a ser parcialmente revogada. Num acórdão da 3.ª Secção Criminal, o tribunal absolveu José Veiga, Luís Duque e Rui Meireles dos crimes a que tinham sido condenados e apenas manteve a sentença de João Pinto, que continuou condenado a 1 ano e 6 meses de prisão, podendo essa pena ser substituída pelo pagamento de uma indemnização ao Estado de cerca de 508 mil euros, acrescidos de juros de mora.

Rui Rangel é suspeito do um crime de tráfico de influências por alegadamente ter prometido a José Veiga que conseguiria influenciar o resultado dos recursos que foram apresentados.

Ao que o Observador apurou, Rui Rangel é suspeito do crime de tráfico de influências por alegadamente ter prometido a José Veiga que conseguiria influenciar o resultado dos recursos que foram apresentados. Não está em causa, sublinhe-se, a legalidade da decisão proferida pela 3.ª Secção Criminal da Relação de Lisboa. Está em causa, sim, uma promessa de influência que terá sido proferida por Rangel — que faz parte de uma secção criminal diferente, a 9.ª Secção Criminal. Se a promessa tivesse tido alguma relação causa/efeito com a decisão tomada, estaria em causa eventualmente um alegado crime de corrupção — o que, tendo em conta os indícios existentes neste momento, não é o caso.

A libertação da Rota do Atlântico

LUSA/MIGUEL A. LOPES

O segundo caso está relacionado com o processo que deu origem à Operação Lex: a Operação Rota do Atlântico, onde José Veiga é o principal arguido, juntamente com o seu ex-sócio Paulo Santana Lopes.

Veiga foi detido preventivamente em fevereiro de 2016 por decisão do juiz Carlos Alexandre, tendo a Relação de Lisboa decidido alterar a medida de coação para prisão domiciliária três meses depois. A defesa do ex-empresário de futebol, a cargo do advogado Rogério Alves, alegou que tinha existido uma aplicação desigual da lei. Isto porque Paulo Santana Lopes tinha sido ficado logo em prisão domiciliária após o primeiro interrogatório como arguido, se depositasse uma caução de 1 milhão de euros. Rogério Alves queria o mesmo para o seu cliente e os desembargadores da Relação de Lisboa que julgaram o recurso deram-lhe razão.

Carlos Alexandre, o juiz de instrução da Operação Rota do Atlântico, nem viria a colocar José Veiga em prisão domiciliária, libertando-o. O magistrado do Tribunal Central de Instrução Criminal entendeu que não tinha legitimidade para impor a prisão domiciliária com pulseira eletrónica por os desembargadores não terem decidido nesse sentido.

Mais uma vez, não está em causa a legitimidade ou legalidade de qualquer destas decisões — quer da Relação de Lisboa, quer do juiz Carlos Alexandre — mas sim uma alegada promessa de Rui Rangel para influenciar o resultado final da decisão, sendo que tal promessa é o que basta para a consumação do crime. Se essa influência tivesse sido, de facto, exercida, estaria em causa um alegado crime de corrupção.

O próprio José Veiga, quando foi interrogado após a sua detenção em fevereiro de 2016, teria admitido ao juiz Carlos Alexandre e à procuradora Susana Figueiredo, titular da investigação, que teria falado com Rui Rangel para "agilizar" a fazer andar o processo.

Nos autos da Operação Rota do Atlântico constam ainda indícios de que Rui Rangel terá alegadamente tentado influenciar um processo pendente no Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa que envolveria José Veiga. O próprio Veiga, quando foi interrogado após a sua detenção em fevereiro de 2016, teria admitido ao juiz Carlos Alexandre e à procuradora Susana Figueiredo, titular da investigação, que teria falado com Rangel para “agilizar” a fazer andar o processo — que se prendia com uma reclamação do próprio Veiga contra o Fisco — que estava parado há dois anos, noticiou a revista Visão, citando o depoimento do ex-empresário de futebol.

Paulo Santana Lopes, ex-sócio de Veiga e co-arguido da Rota do Atlântico, terá ido mais longe no seu depoimento: o desembargador Rui Rangel terá prometido a José Veiga, num encontro no Hotel Ritz no final de 2015, que o processo estaria resolvido até ao final desse ano, noticiou a mesma revista.

José Veiga e Paulo Santana Lopes são suspeitos dos alegados crimes de corrupção no comércio internacional, fraude fiscal qualificada, tráfico de influências e branqueamento de capitais nos autos da Operação Rota do Atlântico.

As transferências para o filho do amigo de Rangel

Vítor Rios / Global Imagens

O principal indício que o Ministério Público tem dos alegados crimes de tráfico de influências que imputa a Rui Rangel prende-se com os cerca de 300 mil euros que o juiz do Tribunal da Relação de Lisboa terá recebido de José Veiga por intermédio do advogado José Santos Martins.

Quando José Veiga foi detido em fevereiro de 2016, a procuradora Susana Figueiredo já sabia que uma empresa de Veiga com contas no estrangeiro tinha transferido elevadas somas de dinheiro para o filho de José Santos Martins. O ex-empresário de futebol não deu explicações convincentes sobre os serviços que teria contratualizado ou uma razão plausível para transferir 300 mil euros para aquele jovem, o que levou o Ministério Público e a PJ ao escritório de Santos Martins.

Foi no gabinete do advogado que foram encontrados talões de um número muito significativo de depósitos individuais sempre abaixo dos 10 mil euros, segundo noticiou o Correio de Manhã. Numa busca ao computador de Santos Martins, foram ainda encontrados e-mails de Rui Rangel a pedir repetidos depósitos de 5 mil euros.

Foi no gabinete do advogado que foram encontrados talões de um número muito significativo de depósitos individuais sempre abaixo dos 10 mil euros, segundo noticiou o Correio de Manhã. Numa busca ao computador de Santos Martins, foram ainda encontrados e-mails de Rui Rangel a pedir repetidos depósitos de 5 mil euros.

São estes indícios que levam o MP e a PJ a entenderem que têm fortes indícios de que o advogado Santos Martins é um alegado testa-de-ferro de Rui Rangel, como foram estes indícios que estiveram na origem da extração de certidão que foi ordenada pela procuradora Susana Figueiredo para o Ministério Público junto do Supremo Tribunal de Justiça.

Vieira e o cargo na futura Universidade do Benfica

MANUEL ARAÚJO/LUSA

O presidente do Benfica é outra personagem da Operação Lex. Como o Observador noticiou, Luís Filipe Vieira foi constituído arguido e sujeito à medida de coação mínima de termo de identidade e residência por suspeitas da alegada prática do crime de tráfico de influência. A investigação tem indícios de que Vieira terá prometido a Rui Rangel um cargo na futura Escola e Universidade do Benfica. A troco de quê? De acordo com a TVI, Rangel terá prometido usar da sua influência junto dos magistrados do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa que tinha em mãos processos fiscais relacionados com uma empresa de Tiago Vieira, filho do presidente do Benfica. Segundo o Jornal Económico, um deles estava relacionado com uma dívida de IRS superior a 1 milhão de euros.

Em declarações ao mesmo jornal, Tiago Vieira afirmou: “É completamente falso que tenha uma dívida de IRS superior a um milhão de euros. E acresce que também não tenho nenhuma dívida em qualquer entidade tributária, pelo que obviamente carece de fundamento ligar a minha atividade ao processo hoje vindo a público”.

A investigação tem indícios de que Vieira terá prometido a Rui Rangel um cargo na futura Escola e Universidade do Benfica. A troco de quê? De acordo com a TVI, Rangel terá prometido usar da sua influência junto dos magistrados do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa que tinha em mãos processos fiscais relacionados com empresas de Tiago Vieira, filho do presidente do Benfica.

A ambição de Luís Filipe Vieira em construir uma escola que inclua todos os ciclos de ensino até ao 12.º ano e uma universidade que tenha diversas licenciaturas ligadas ao desporto, e não só, foi publicitada nos jornais desportivos durante o último verão, mas como estando em estudo desde 2013.

Depois de uma primeira fase em que se demarcou da Operação Lex, referindo que o Benfica nada tem a ver com o processo, fonte oficial do clube da Luz desmentiu ao Observador que Vieira tivesse sido constituído arguido, classificando como “absurda” a informação de que o líder benfiquista tivesse sido sujeito a termo de identidade e residência. Mas, ao final desta terça-feira, a Procuradoria-Geral da República emitiu um comunicado onde clarificou que tinha sido constituído “um dirigente desportivo” como arguido. Trata-se de facto de Luís Filipe Vieira. O problema foi que inicialmente existiu uma recusa de Luís Filipe Vieira em assinar da notificação do mandado de busca judicial e dos restantes documentos entregues pelas autoridades judiciais — facto que não impede a sua constituição como arguido.

Fernando Tavares, vice-presidente do Benfica com a pasta das modalidades, também foi constituído arguido, de acordo com informação avançada pela TVI 24 e que foi confirmada pelo Observador. Tavares, que foi apoiante de Rui Rangel em 2012 quando o juiz se candidatou à liderança do Benfica contra Luís Filipe Vieira, será suspeito do mesmo crime do líder benfiquista: tráfico de influência.

O caso Patuleia que marcou os anos 90

Não é a primeira vez que Rui Rangel e Fátima Galante, sua ex-mulher que também foi constituída arguida na Operação Lex, aparecem associados a uma investigação criminal. Galante chegou mesmo a ser investigada no Supremo Tribunal de Justiça por suspeitas de corrupção no chamado caso Patuleia, mas o Ministério Público arquivou o inquérito.

Pior sorte teve o homem que deu o nome ao caso que ficou conhecido nas páginas do extinto semanário Independente através de diversos jornalistas, entre os quais Pedro Guerra — hoje conhecido comentador desportivo afecto ao Benfica. Hernâni Patuleia, assim se chamava o solicitador que está na origem do caso, foi acusado por dois advogados (Gouveia Gomes Fernandes e Freitas e Costa) de ter solicitado cerca de 15 mil contos em 1997 para obter uma sentença favorável da então juíza Fátima Galante das Varas Cíveis de Lisboa. Já com Galante ilibada no STJ, Patuleia foi julgado e condenado no antigo Tribunal da Boa Hora por corrupção ativa na forma tentada.

A juíza chegou a depor no julgamento de Hernâni Patuleia, entretanto falecido, tendo admitido vários almoços com o solicitador mas para tratar matérias relativas a dívidas de um cunhado. Ignorava, assegurou, que Patuleia tivesse pedido dinheiro aos advogados acusados.

A juíza chegou a depor no julgamento de Hernâni Patuleia, entretanto falecido, tendo admitido vários almoços com o solicitador, mas para tratar de matérias relativas a dívidas de um cunhado. Ignorava, assegurou, que Patuleia tivesse pedido dinheiro aos advogados acusados.

Foram condenado por difamação agravada da juíza o semanário O Independente e os dois advogados, por terem denunciado o caso. O jornal teve de pagar uma indemnização de 50 mil euros. Em 2011, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem condenou o Estado português a indemnizar em 41.500 euros os advogados Gouveia Gomes Fernandes e Freitas e Costa por violação da liberdade de imprensa.

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