Mais um passeio no parque para André Ventura. Apesar de toda a contestação interna que o líder do Chega foi sofrendo ao longo dos últimos anos, a verdade é que no Conselho Nacional, agendado para este fim de semana, a liderança do partido não terá, ao que tudo indica, sombra de oposição. Pelo menos, é essa a convicção do núcleo duro de Ventura: “Nuno Afonso não quer passar a vergonha de ter uma votação aprovada por 90% e ter só 1 ou 2% de contra ou em branco.”
Desde que Nuno Afonso foi afastado da liderança do gabinete parlamentar do Chega que a oposição tem um nome para fazer frente a André Ventura. Porém, na hora da verdade, os críticos vão ficar no sofá a assistir a mais uma consagração do presidente do Chega, o que dará legitimidade a Ventura para continuar a fazer a gestão do partido ao seu gosto.
Ao Observador, Nuno Afonso não deixa dúvidas sobre o porquê da ausência: “Não participo em farsas, gosto de estar na política de forma séria e o que se vai passar na Batalha é um circo, é algo que demonstra um líder inseguro que a qualquer contrariedade pede moções de confiança ou ameaça demitir-se.”
O fundador do Chega justifica-se com o facto de o partido querer calar quem não está de acordo com a direção e explica que Ventura “convoca um órgão em que suspende todos aqueles que o podiam ir contrariar”. Em causa estão os militantes que têm sido suspensos, nomeadamente três conselheiros desalinhados com a direção: Martim Mello Machado, José Dias, ex-vice-presidente, e Nelson Dias da Silva.
Tal como tem acontecido nos últimos meses, Nuno Afonso atira-se à falta de democracia interna para explicar que a direção consegue até controlar quem entra no lugar dos suspensos, frisando que “se sair alguém da lista que foi encabelada por Mónica Lopes [oposição a Ventura] pode entrar no Conselho Nacional uma pessoa da lista do André Ventura porque o entendimento do presidente da direção é que deve ser usado o método de Hond para substituir o conselheiro que falte ou esteja suspenso”.
O facto de o militante número dois do Chega não marcar presença na reunião que será aberta a todos os membros do partido pode ser considerado uma prova de força para André Ventura. Por outras palavras: o único adversário que se perfila para ocupar o lugar de líder do partido — por ter pertencido à fundação do Chega, por ter tido sempre um lugar de destaque e por ser o preferido dos críticos — falha uma reunião onde podia demonstrar que está a mobilizar parte considerável do partido.
Não estando presente naquilo a que chama uma “fantochada”, acaba por deixar todo o espaço mediático para o primeiro plano do partido. Não é algo que preocupe o fundador do partido, até porque considera que “mediante todas as condicionantes à participação, seria uma vergonha o André Ventura não ter 100% na moção de confiança”.
No final de agosto, o ex-chefe de gabinete do Chega, segundo revelou ao Observador num artigo sobre a oposição interna, considerou que é “praticamente impossível” fazer uma oposição construtiva com os “regulamentos que o partido tem atualmente, fechados ao ponto de inviabilizar qualquer candidatura contra o atual presidente”. Por essa razão, parece estar a afastar-se do confronto direto — algo que aconteceu no passado Conselho Nacional, onde foi alvo de um ‘roast’ da direção do Chega.
Todos vão ter direito a voto
O Chega marcou mais um Conselho Nacional, na sequência do desentendimento de Mithá Ribeiro, para que André Ventura voltasse a colocar à prova se o partido está ou não com o líder. Através de uma moção de confiança, o presidente do partido quis ouvir os militantes e perceber se ainda existe alinhamento.
Não é novidade: André Ventura já colocou o lugar à disposição por várias ocasiões, espoletando mesmo diversas eleições internas. Desta vez, com um Congresso realizado há menos de um ano, o presidente decidiu estrear uma modalidade dentro do partido e fazer votar uma moção de confiança à sua própria liderança.
As circunstâncias em que a votação vai acontecer também sofreram alterações ao longo das últimas semanas. Quando o Chega marcou o Conselho Nacional para votar a discussão, anunciou que a reunião iria ser transformada na I Assembleia Plenária do partido, o que permitia a todos os membros participarem, mas sem direito a voto.
Já no decorrer da semana do Conselho Nacional, foi uma proposta de André Ventura que levou as regras a mudarem: todos os militantes presentes vão poder votar na moção de confiança e não serão apenas os conselheiros com esse poder.
A culpa veio de dentro
André Ventura anunciou uma moção de confiança à sua liderança depois de mais um capítulo na vida interna do partido, desta vez com importância acrescida por ter acontecido dentro do seio do grupo parlamentar escolhido a dedo pelo próprio presidente do partido.
O caso teve vários capítulos, mas foi resolvido em poucos dias. Tudo começou com uma partilha de Mithá Ribeiro no Facebook — o deputado diz que sim, o líder do partido garante que não —, onde o parlamentar partilhou um artigo de Pedro Arroja que criticava o trabalho do Chega no Parlamento.
Não tardou a que chegassem as repercussões, com Mithá Ribeiro a ser afastado da coordenação do gabinete de estudos. O deputado sentiu-o como uma afronta e criticou duramente a forma de como Ventura é responsável pelo “adiamento de soluções internas que podem, a prazo, prejudicar seriamente” o partido.
As questões internas continuam a ser um dos grandes problemas do Chega, com André Ventura a tentar desvalorizar através dos votos dos militantes a força que continua a ter dentro do partido. Os resultados têm mostrando que, apesar das tentativas de imposição da oposição, o líder continua a ser praticamente incontestado.