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Assédio sexual, culturas de trabalho agressivas, discriminação, telemóveis que explodem ou que deixam de funcionar de propósito. O ano que termina este domingo foi pautado por vários falhanços no mundo da tecnologia. Horas depois do rebentar das polémicas: “pedimos desculpa” em formato comunicado, num email, em entrevistas ou no Twitter. Foi o que a Apple fez depois de admitir que quando lançava um iPhone novo tornava os antigos mais lentos propositadadmente. Para Tim Cook, a solução passou por pedir perdão. Mas não foi o único. Do fundador da Uber ao do Twitter e até a Mark Zuckeberg, criador do Facebook, ninguém escapou ao reconhecimento público dos erros que foram cometidos. Foram muitos e por razões que podiam ser evitadas? Sim. Mas a tática não é de longe antiga e houve até empresas que no passado poluíram oceanos e resolveram a situação com um “We’re sorry” (pedimos desculpa).
Uber: “Quero pedir desculpa pelos erros que cometemos”
Foi um dos maiores falhanços da comunidade tecnológica em 2017. Desde que o ano começou que a Uber não parou para descansar de polémicas. Polémicas atrás de polémicas, quase todos os meses. Começou em fevereiro, com Susan Fowler, ex-engenheira informática da empresa, a revelar várias situações de assédio sexual num blogue. As denúncias do ano “horripilante” que Susan passou na Uber levaram o Financial Times a escolhê-la como Figura do Ano. A primeira tomada de consciência teve a voz de Travis Kalanick, que pediu desculpa aos colaboradores por ter “falhado com a empresa”. Logo, no mês seguinte, novo pedido de desculpas, desta vez por causa do vídeo onde se vê Travis a discutir com um motorista. O “profundo pedido de desculpas” pela “forma desrespeitosa” com que tratou o motorista” não foi suficiente para evitar que Travis tivesse de abandonar a liderança da empresa.
CEO da Uber envolve-se em discussão com motorista da empresa
Quando Dara Khosrowshah assumiu a presidência da Uber não esperou muito para também ele ter de se desculpar pelas decisões tomadas por Travis Kalanick. Logo em setembro, na sequência da decisão do Tribunal de Londres (que concluiu não renovar a licença da Uber para operar na capital britânica) o novo presidente escreveu uma carta aberta para pedir desculpa e anunciar que quer uma gestão humilde, íntegra e apaixonada. “É verdade que enquanto revolucionávamos a forma como as pessoas se moviam nas cidades à volta do mundo, também fazíamos coisas erradas. Em nome de todas as pessoas que trabalham na Uber globalmente, quero pedir desculpa pelos erros que cometemos”, escreveu.
Novo presidente da Uber pede desculpa pelos erros que a empresa cometeu
Dave McClure: “Sou um imbecil. Peço desculpa”
O fundador e ex-líder de uma das principais incubadoras e fundos de investimento de Silicon Valley, a 500 Startups, foi acusado de assédio sexual em julho por Sarah Kunst, uma das duas dezenas de mulheres que contaram ao New York Times alguns dos crimes sexuais que rodeiam a cultura de Silicon Valley. A empreendedora alegou que McClure lhe enviou uma mensagem sexual bastante sugestiva no Facebook, enquanto estavam a discutir um possível contrato com a 500 Startups. A reportagem levou mais mulheres a acusar McClure de comportamentos inapropriados e o fundador da 500 Startups não teve outra opção se não demitir-se.
Numa mensagem que escreveu no Medium, McClure pediu “sinceras desculpas” e assumiu que teve um comportamento “inapropriado” com várias mulheres em situações que estavam relacionadas com trabalho. “Sou um imbecil. Peço desculpa” era o título do texto. “A todos aqueles que desiludi e especialmente a quem ofendi e magoei: lamento mesmo muito”, escreveu no texto em que anunciou que passava a gestão da 500 Startups para a também cofundadora Christine Tsai e que tinha começado a fazer psicoterapia. “Não espero que acreditem que vou mudar, mas estou a trabalhar nisso”, apontou.
500 Startups. Líder de grande incubadora de Silicon Valley acusado de assédio
Twitter: “Trump não seria presidente se não estivesse no Twitter, por isso, peço desculpa”
“Houve uma altura em que pensei que se qualquer pessoa pudesse falar abertamente, trocar informações e ideias, então o mundo seria automaticamente um mundo melhor. Estava enganado em relação a isso”. As frases são do cofundador do Twitter, Evan Williams, ao The New York Times, na entrevista em que pediu desculpa por ter ajudado a colocar Donald Trump na Casa Branca. Segundo o que o presidente norte-americano disse numa entrevista à FOX News, foi graças à sua atividade no Twitter que conseguiu a vitória nas eleições legislativas de 2016. “É mesmo muito mau. Se for verdade que ele não seria presidente se não fosse o Twitter, então sim, peço desculpa.”
Este não foi o único pedido de desculpas que os líderes da rede social dos 140 caracteres fizeram envolvendo Donald Trump. Logo no início do ano, o cofundador Jack Dorsey, pediu desculpa aos utilizadores por ter feito com que involuntariamente seguissem a conta do presidente dos Estados Unidos (a conta do POTUS), quando passou de Barack Obama para Donald Trump. Dorsey pediu desculpa e disse que tinha sido um “problema técnico”. Outro “problema técnico” levou o Twitter a desculpar-se em novembro por ter bloqueado a palavra “bissexual” do seu motor de pesquisa e a ter colocado incorretamente numa lista “desatualizada” de termos que aparecem junto a conteúdos para adultos.
Youtube: “Levo este assunto muito a sério e peço desculpa”
Matthew Brittin, responsável da Google (casa mãe do Youtube) para Europa, Médio Oriente e África, também teve de pedir desculpa em maio aos utilizadores do Youtube. Em causa estavam os anúncios de grandes empresas que apareceriam antes de vídeos de conteúdo extremista, de grupos antissemitas e outros grupos de ódio. A descoberta da Times fez com que marcas como a Marks and Spencer ou a Audi retirarem os anúncios do canal de vídeo. “Quero começar por pedir desculpa às marcas afetadas. Levo este assunto muito a sério e peço desculpa pelos momentos em que este tipo de situações possa ter acontecido”, disse Matthew Brittin, citado pelo The Guardian.
Em novembro, o youtube (e por sua vez, a Google) envolveu-se em nova polémica, desta vez relacionada com o conteúdo infantil. De acordo com o BuzzFeed, a função de autocomplete do motor de busca do Youtube estava a sugerir completar a busca por “como” com expressões de conteúdo sexual envolvendo crianças”. Logo nesse dia, a Google emitiu um comunicado no qual dizia “hoje, ao início do dia, as nossas equipas foram alertadas para estes resultados do autocomplete profundamente perturbadores e trabalhámos rapidamente para retirá-lo assim que tivemos conhecimento. Estivemos a investigar este assunto para determinar o que estava por detrás deste autocomplete“.
Equifax: “Peço sinceras desculpas”
Inicialmente, foram 143 milhões de americanos que ficaram com dados pessoais comprometidos. Depois descobriu-se que, afinal, havia “só” mais 2,5 milhões, fazendo um total de 145,5 milhões de pessoas que viram informação pessoal comprometida por hackers. Richard Smith, que pediu desculpas pelo “erro humano e falhas técnicas” na brecha de segurança do site da empresa de monitorização de crédito, não se conseguiu livrar de ter de se afastar do cargo de presidente executivo.
Piratas informáticos acederam a informação sobre 143 milhões de norte-americanos
Para uma empresa que trata de transações monetárias especialmente no espaço digital, nem o testemunho de oito páginas que Smith apresentou no congresso de americano a justificar-se foi suficiente para recuperar a confiança dos consumidores. Dados de cartão de crédito, informação de segurança social e números de contribuinte podem ter ficado na mão de piratas informáticos, mas a falta de prevenção de cibersegurança da Equifax ficou como o exemplo de como uma empresa não deve agir quando tem dados pessoais para proteger.
Samsung: “Nenhum de nós se vai esquecer do que aconteceu no ano passado”
É difícil superar quando a maior vendedora de smartphones do mundo vende um equipamento que explode, literalmente, na cara dos consumidores, quando está a anunciar um novo modelo. A notícia é de 2016, quando o Galaxy Note 7, que seria o modelo topo de gama no mercado dos smartphones, foi retirado do mercado por se incendiar. Em 2017, a 23 de agosto, Dj Koh, presidente executivo da Samsung, falou logo no elefante em chamas na sala quando anunciou o Galaxy Note 8. “Mesmo quando vos desiludimos, vocês ficaram connosco”, disse Koh logo ao minuto e meio da apresentação do topo de gama da marca sul coreana.
http://www.youtube.com/watch?v=DcosAcXl2kg&t=1m27s
O ano já tinha começado com um pedido de desculpas de 50 minutos a todos os “consumidores, operadoras, reatalhistas e parceiros de distribuição”. Ajudou o perdão a recuperar a confiança dos fãs da marca? Ao que parece, não chegou a afetá-los. No entanto, a empresa, em outubro, parecia estar numa “crise sem precendentes” segundo outro executivo demissionário.
Zuckerberg: “Peço perdão pela forma como o meu trabalho foi utilizado para dividir pessoas”
O fundador do Facebook pode ter utilizado o Dia do Perdão, uma tradição judaica, para publicamente pedir desculpas pela forma como o Facebook é usado para dividir a sociedade. No entanto, para aquela que é a maior rede social do mundo, foi um ano do perdão. De desculpas por “erros de moderação”, passando por desculpas de erros de tradução que fizeram com que uma pessoa fosse presa, até desculpas a alegados membros da máfia, a rede social de Zuckerberg pediu mais do que um gosto em vão, pediu perdão. “Peço perdão pela forma como o meu trabalho foi utilizado para dividir pessoas em vez de as aproximar”, escreveu o fundador da rede social.
https://www.facebook.com/zuck/posts/10104074437830721
Alguns erros foram piores que outros, como o erro na forma como o Facebook media quanto tempo os utilizadores passavam a ver vídeos. Pediu desculpa, mas mas num ano marcado por tantos pedidos de desculpa, não é caso para perguntar: não se evitavam mesmo?
Kaspersky: “Vamos ser mais transparentes”
A empresa de cibersegurança russa não teve um ano fácil. As acusações d governo norte-americano em julho — de que estaria a espiar cidadãos — levaram a que os seus produtos fossem banidos de lojas que vendiam produtos informáticos no país. O governo britânico também levantou suspeitas de que a empresa, através do software que vende, acederia a ficheiros dos computadores em que está instalado.
Kaspersky Lab lança iniciativa de transparência para rebater acusações de espionagem russa
A dúvida surgiu em outubro, com o Wall Street Journal a citar várias fontes que afirmavam que havia piratas informáticos russos a aceder a ficheiros de segurança nacional americana. Solução para resolver este impasse? “Desculpem” e “vamos ser mais transparentes”, disse o presidente executivo, Eugene Kaspersky, num vídeo partilhado pela Sky News, a 23 de outubro, alegando que a empresa não ajuda o governo russo em táticas de espionagem.
Bill Gates: “Desculpem por ter inventado o Ctrl-Alt-Delete”
Foi só a Apple que disponibilizou atualizações em 2017 que afetaram utilizadores? Não. Apesar de não ter sido tão grave como a situação que a empresa fundada por Steve Jobs ultrapassa agora, a Microsoft, eterna rival da Apple, também teve de pedir desculpa aos utilizadores este ano. Em causa estiveram versões de sistema de teste disponibilizadas sem estarem terminadas. Quem fazia a atualização no âmbito do programa Windows Insider foi afetado por este erro da empresa. “Pedimos desculpas”, diz o comunicado a explicar aos consumidores afetados que os dispositivos podiam estar estragados.
Atualizações de parte, até Bill Gates, fundador da empresa e o homem mais rico do mundo, aproveitou 2017 para pedir desculpa por algo que inventou: o “Ctrl-Alt-Delete”. Utilizado atualmente em situações de pânico quando um computador está bloqueado, no passado era utilizado para se entrar nos sistemas Windows. “Podíamos ter tido um só botão, mas o tipo que fez o teclado da IBM não nos queria dar um”, explicou o informático quanto ao “erro”.
Apple: “Sabemos que alguns de vocês sentem que a Apple vos desiludiu”
A Apple assumiu em dezembro que reduzia o desempenho dos iPhones mais antigos propositadamente, por causa de uma “funcionalidade” dos telefones e logo começaram a surgir os processos dos consumidores que se sentiam enganados. Uma semana depois, surgiu o pedido de desculpas: “Sabemos que alguns de vocês sentem que a Apple vos desiludiu. Pedimos desculpa”, diz o comunicado da tecnológica, que também anuncia a redução do preço de substituição da bateria em 50 dólares (42 euros). A empresa alega que “nunca faria nada para intencionalmente reduzir o tempo de vida de qualquer produto Apple”.
O pedido de desculpas surgiu após inúmeras críticas à forma como a Apple tem sido pouco transparente quanto ao facto de utilizar as atualizações do sistema operativo para reduzir o desempenho dos telefones, sem informar os utilizadores. A empresa assume esta “funcionalidade” faz com que os modelos de iPhones mais antigos — como o 6, o 6 Plus, o 6s, o 6s Plus e o SE — tenham um processador com menor desempenho, tornando-os mais lentos. Quanto mais antigo é o aparelho, mais é reduzido o desempenho. Ainda são desconhecidas quais as verdadeiras consequências, principalmente legais, que a empresa poderá enfrentar em 2018.