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Os 5 casos da face oculta de Sócrates na Justiça

José Sócrates nunca foi arguido em nenhum outro processo além da Operação Marquês, mas a Justiça conhece o seu nome desde os casos Cova da Beira, licenciatura, Freeport, Face Oculta e Monte Branco.

    Índice

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O caso Cova da Beira

Cartas anónimas e Carlos Santos Silva

José Sócrates sonhava ser ministro do Ambiente quando António Guterres venceu as eleições legislativas de 1995. Mas o primeiro-ministro achava que lhe faltava experiência e ofereceu-lhe apenas uma secretaria de Estado (a do Ambiente), dando a tutela a Elisa Ferreira. Sócrates nunca se entendeu com a ministra e esta acabou por lhe dar assuntos que, na altura, eram considerados menores: a defesa do consumidor e os resíduos.

Chegaram a chamá-lo “José Sobras” no Executivo, mas a área dos resíduos mexia com muitos interesses e estava longe de ser um dossier menor. De tal forma que deu lugar a uma investigação criminal. A primeira em que José Sócrates seria envolvido e que ficou conhecido como processo “Cova da Beira”. Não houve condenações, mas ficaram as suspeitas.

Tudo começou com quatro cartas anónimas enviadas para a Procuradoria-Geral da República (PGR) entre 1997 e 1998 e que denunciavam José Sócrates por ter alegadamente recebido “luvas” no valor de 150 mil contos (750 mil euros), relacionadas com a construção da Central de Tratamento de Resíduos Sólidos da Associação de Municípios da Cova da Beira, que incluía a Câmara da Covilhã — cidade onde Sócrates cresceu e começou a envolver-se nas lutas do aparelho socialista. As denúncias referiam que a alegada contrapartida para a corrupção passava pela nomeação de uma equipa técnica que escolheria o vencedor do concurso público — e que viria a ter entre os seus membros um nome que hoje não é estranho para a Opinião Pública: António José Morais.

O Ministério Público não saiu bem do caso. O processo demorou muito tempo e terminou com absolvições.

Uma das empresas interessadas no concurso tinha um sócio que, na altura, era desconhecido para a imprensa, mas que mais tarde ganharia especial relevo: Carlos Santos Silva. Era ele o principal acionista da Conegil, empresa que integrava o consórcio vencedor do aterro da Cova da Beira, mas nunca foi arguido neste processo. Já o seu sócio, Horácio Luís Carvalho, proprietário da HLC (outra das empresas que compunham o consórcio) — e quem, segundo as denúncias, teria pago a Sócrates — acabou por ser considerado suspeito.

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O Ministério Público (MP) não saiu bem do caso. O processo demorou muito tempo e terminou com absolvições. Em 2003, a Polícia Judiciária (PJ) quis fazer buscas em casa de Sócrates, mas o procurador titular dos autos não concordou por entender que não existiam indícios suficientemente fortes contra o ex-ministro do Ambiente. Os investigadores da PJ acreditavam então que “todo o processo de candidaturas da central de compostagem foi controlado por pessoas ligadas ao PS/Covilhã, ou seja, João Cristóvão, Jorge Pombo e José Sócrates”. O MP tinha outra visão e Sócrates nunca foi arguido, mas apenas testemunha do processo.

As acusações chegariam em 2007 para três pessoas:

  • Horácio Luís de Carvalho, o dono da empresa vencedora do concurso foi acusado de corrupção ativa;
  • António José Morais, que tinha sido o responsável pela análise das propostas a concurso, foi acusado de corrupção passiva;
  • Ana Simões, sócia e então mulher de António Morais, também foi acusada de corrupção passiva.

O MP considerou que tinha provas de que o casal António José Morais e Ana Simões tinha recebido 58 mil euros numa conta offshore, mas não conseguiu ligar o dinheiro ao processo. Os três acabaram absolvidos em janeiro de 2013, mas o processo evidenciou várias ligações ao antigo primeiro-ministro.

Puxando a fita atrás, essas ligações começam com a eleição de Guterres nas legislativas de 1995. Assim que Sócrates e Armando Vara chegam ao Governo, Vara torna-se secretário de Estado da Administração Interna e nomeia António Morais como seu adjunto. Pouco tempo depois, Morais é igualmente nomeado por Vara diretor do Gabinete de Estudos e Planeamento de Instalações do Ministério da Administração Interna (GEPI), passando por si todas as adjudicações das obras relacionadas com as forças de segurança. E mais: o GEPI acaba por ser o único cliente da Conegil, a empresa de Carlos Santos Silva que — como lembrou o Público em várias notícias ao longo dos anos — conseguiu ficar com 20% das adjudicações daquele organismo da Administração Interna entre 1996 e 1999. Isto, ao mesmo tempo, que a sociedade Santos Silva vai participando na construção do tal aterro da Cova da Beira.

No mesmo período, António José Morais é professor de José Sócrates em quatro das cinco cadeiras que o socialista fez na Universidade Independente. Uma licenciatura que seria, também ela, outro caso.

O caso da licenciatura

O teste de domingo combinado à mesa do Pap’Açorda

O caso da licenciatura começou em março de 2007, com um artigo no blogue Do Portugal Profundo (do então desconhecido professor António Balbino Caldeira), onde foram levantadas as primeiras dúvidas sobre o título académico de José Sócrates. Segue-se uma investigação do jornal Público e, o que até então não passava de rumores, transforma-se num caso sério na política nacional. A suspeita é de que a licenciatura em Engenharia Civil na Universidade Independente foi obtida de forma irregular.

José Sócrates tinha terminado o bacharelato em 1979 no Instituto Superior de Engenharia Civil de Coimbra, inscrevendo-se 15 anos depois no Instituto Superior de Engenharia de Lisboa — onde faz 10 cadeiras em 22. É, logo aí, aluno de António Morais. A derradeira tentativa de terminar a licenciatura dá-se então na Universidade Independente onde faz cinco cadeiras e obtém o grau académico de licenciado. Das cinco disciplinas, quatro são lecionadas por Morais, apesar deste só dar, à época, apenas quatro horas semanais na universidade.

A quinta cadeira, Inglês Técnico, ainda se tornaria mais polémica: foi dada pelo próprio reitor, que nunca tinha lecionado inglês. O método de avaliação foi discutido entre Sócrates e o reitor Luís Arouca num almoço realizado no Pap’Açorda — como conta Fernando Esteves no livro Cercado — “entre pastéis de bacalhau e arroz de tomate”. Já o exame foi feito em agosto, ao domingo, e enviado por fax já depois do diploma de licenciatura ter sido requerido.

As mesmas escutas demonstram que Sócrates atribuía o caso a uma campanha de difamação de uma "direita sem escrúpulos" e que estava convencido dos seus méritos escolares: "Sempre fui bom aluno. Nunca tive problemas."

Há também várias escutas entre Arouca e Sócrates que constavam de um processo-crime relacionado com a gestão da Universidade Independente, que acabaram por ser reveladas. Também no livro Cercado, é reproduzida uma das escutas em que Sócrates pede ao reitor para não divulgarem o nome dos professores — sabia que, além de Arouca, seria apenas António Morais:

José Sócrates: “Bom, há uma coisa que talvez fosse de evitar, e que é a seguinte: os nomes dos professores…”
Luís Arouca: “… Sim, mas não fazemos tenção de dar os nomes dos professores, a menos que você queira.”
José Sócrates: “Não, não, não, não… não há nomes de professores, nem o professor se lembra, nem tem, enfim… [pausa], e portanto era apenas as cadeiras que eu fiz no ISEL e no… [pausa].”

As mesmas escutas demonstram que Sócrates atribuía o caso a uma campanha de difamação de uma “direita sem escrúpulos” e que estava convencido dos seus méritos escolares: “Sempre fui bom aluno. Nunca tive problemas.

O caso acabou por se esbater até que, em 2009, o advogado José Maria Martins — que tinha ganho notoriedade por ter defendido Carlos Silvino, motorista da Casa Pia conhecido por “Bibi” e condenado por abuso sexual de menores — decidiu avançar com uma queixa na qual solicita ao MP que abra uma investigação criminal e promova a nulidade administrativa da licenciatura de José Sócrates. Duas semanas após a queixa — num prazo relâmpago — é arquivada a queixa.

As procuradoras Cândida Almeida, então diretora do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), e Carla Dias explicam que, “analisada e sopesada a prova produzida nos autos, conclui-se não ter havido qualquer tratamento de favor do aluno José Sócrates”. Que não só não é culpado, como é vítima, já que “como os restantes alunos em igualdade de circunstâncias” foi “vítima de uma publicidade agressiva e bem programada por parte da UNI – Universidade Independente.”

Ainda não era desta que o assunto ficava arrumado. Aquando do caso da licenciatura de Miguel Relvas, o antigo vice-reitor da Universidade Independente, Rui Verde, pediu a declaração da nulidade do curso de José Sócrates, alegando o “princípio da igualdade”. Se o MP avançara com um pedido para declarar nula a licenciatura de Relvas (o que acabaria por acontecer), deveria fazer o mesmo com José Sócrates. Mas não fez: os casos eram diferentes.

A decisão do Ministério Público chegou em dezembro de 2015, com o MP a considerar “ilegal” a conclusão do curso de Engenharia Civil na Universidade Independente (UnI), mas decidiu não avançar com uma ação administrativa para invalidar o diploma. Ou seja: Sócrates manteve-se licenciado.

O caso Freeport

O tio e o vídeo onde se fala em “luvas”

O caso Freeport assombrou José Sócrates praticamente durante todo o tempo em que foi primeiro-ministro. O inquérito foi aberto e tornou-se público durante a campanha eleitoral das legislativas de 2005 — que Sócrates venceria com maioria absoluta contra Santana Lopes. Em causa, estava a aprovação do Estudo de Impacto Ambiental do projeto que daria origem ao outlet Freeport, em Alcochete. O projeto — que previa a construção dentro de uma Zona de Proteção Especial ambiental — foi aprovado em 2o02, já no final do segundo Governo de António Guterres.

Durante muito tempo, a ligação a Sócrates ficava-se por uma nebulosa de suspeição. O socialista conseguiu passar a ideia de que se tratava de mais uma “campanha negra”, como outros casos empolados na campanha eleitoral. A denúncia, que (inicialmente) se julgava anónima, tinha partido de um assessor de Santana Lopes, Miguel Almeida, o que contribuía para a tese de que o envolvimento de Sócrates era mais um embuste dos seus adversários políticos.

O tio de Sócrates teria sido contactado por Charles Smith, que lhe transmitiu que um escritório de advogados estava disponível a oferecer 'luvas' de 4 milhões de euros para que o Governo socialista aprovasse o projeto.

Mas o caso Freeport ganha novas proporções quando a TVI emite uma reportagem sobre o assunto a 23 de janeiro de 2009. Tratava-se de uma antecipação de uma entrevista do tio de José Sócrates, Júlio Monteiro, ao semanário Sol, em que este revelava que foi o intermediário de uma reunião entre Sócrates e os representantes do Freeport.

O tio de Sócrates teria sido contactado por Charles Smith, que lhe transmitiu que um escritório de advogados estava disponível a oferecer ‘luvas’ de 4 milhões de euros para que o Governo socialista aprovasse o projeto. A denúncia dizia que Sócrates teria recebido 500 mil contos, o equivalente a 2,5 milhões de euros.

Mais tarde a TVI divulgou outro vídeo — que não pôde ser admitido como prova em Portugal por questões formais — de um processo paralelo que decorria no Reino Unido, em que o consultor inglês Charles Smith admitia ter pago luvas ao primeiro-ministro português por intermédio de um primo. O caso atingiu tal dimensão que a PGR decidiu transferir o processo do MP do Montijo para o DCIAP.

Pelo meio, houve imensas histórias rocambolescas que incluíam, por exemplo, o primo de Sócrates, filho de Júlio: Hugo Monteiro. Hugo tinha entretanto ido para a China estudar artes marciais, onde o Expresso o foi descobrir. Ao semanário, Hugo afirmou que Sócrates não o autorizou a utilizar o nome, mas revelou que lhe tinha contado que a sua empresa de marketing ia ficar com a conta do Freeport. No vídeo que não foi admitido como prova em Portugal, Charles Smith fala num primo de Sócrates a quem teria pago luvas, mas não seria Hugo Monteiro. Tratava-se, acreditavam os investigadores, de José Paulo Bernardo Pinto de Sousa, que era referido nos autos como “Bernardo” ou “O Gordo.”

Ao longo do processo, mantiveram-se como arguidos Charles Smith e Manuel Pedro, da consultora Smith e Pedro. Sem ter em conta o vídeo de Charles Smith, o MP seguiu outra linha de investigação e acusou os únicos arguidos do processo do crime de extorsão. Segundo essa tese, Smith e Pedro teriam inventado a ligação a Sócrates para conseguirem mais dinheiro dos donos do Freeport.

O inquérito terminou em julho de 2010, mas José Sócrates nunca foi arguido (nem sequer testemunha), constando do despacho final do Ministério Público um detalhe curioso: houve 27 perguntas que não foram feitas a Sócrates por falta de tempo. Mais tarde foi tornado público que os dois procuradores do processo, Vítor Magalhães e Paes de Faria, quiseram colocar as 27 perguntas ao então primeiro-ministro mas a diretora do DCIAP, Cândida Almeida, não autorizou.

A título de exemplo, duas dessas perguntas (a número 13 e a número 27) eram:

  • “No âmbito das suas funções partidárias no PS, alguma vez utilizou a conta de correio eletrónico com o endereço «josesocrates@ps.pt?
  • “Teve conhecimento, direto ou indireto, de pagamentos indevidos feitos pela Freeport a responsáveis oficiais, nomeadamente do Ministério do Ambiente, do ICN, da DRAOT e da Câmara Municipal de Alcochete e, em caso afirmativo, que pagamentos foram efetuados e a que entidades?”

Os únicos arguidos do processo, Charles Smith e Manuel Pedro, acabariam por ser absolvidos em 2012 do crime de extorsão.

Mas o Tribunal Judicial do Barreiro considerou que, da prova documental e dos testemunhos ouvidos durante o julgamento, “resultaram fortes indícios de que existiram pagamentos feitos pela Freeport Leisure PLC a pessoa ou pessoas com poder de decisão dentro do Governo e da Administração Pública, nomeadamente com poder de conceder ou negar a Declaração de Impacto Ambiental favorável”. E “é no contexto desses pagamentos feitos pela Freeport Leisure PLC para conseguir obter a declaração de impacto ambiental favorável e outras licenças posteriores que surgem as referências ao nome José Sócrates”. Daí a decisão do Tribunal de ordenar a extração de uma certidão para o MP investigar essas suspeitas. “Porque é insustentável manter por mais tempo uma situação em que recaem suspeitas e indícios da prática de um crime grave sobre pessoa que exerceu o cargo de primeiro-ministro de Portugal”, lê-se no acórdão do Tribunal do Barreiro. Os factos sob suspeita, contudo, estavam à beira da prescrição.

O caso Face Oculta

Dos robalos do sucateiro ao controlo dos media

O caso começou com a investigação a um desconhecido sucateiro da zona de Aveiro: Manuel Godinho. O processo designado de Face Oculta — nome partilhado com uma conhecida casa de alterne na Barra de Aveiro — envolvia suspeitas de corrupção e tráfico de influências do empresário Godinho, que alegadamente subornava políticos e gestores para ser favorecido em concursos públicos. Empresas públicas como a Refer – Rede Ferroviária Nacional, terão sido lesadas em milhares de euros.

Armando Vara, amigo de José Sócrates e vice-presidente do BCP, foi então apanhado nas escutas — como um dos alegados intermediários de Godinho — e constituído arguido no processo. Aquilo que o Ministério Público desconfiou que se tratava de “luvas”, num total de 25 mil euros, que tinham passado das mãos de Godinho para o ex-ministro socialista, foi justificado por Vara como sendo “robalos” e, mais tarde, “pão-de-ló de Ovar“. Acusado, juntamente com mais 34 arguidos, Armando Vara ficou “em choque” quando ouviu o juiz presidente Raul Cordeiro condená-lo a 5 de setembro de 2014 a uma pena de prisão efetiva de 5 anos pelo crime de tráfico de influências. Todos os arguidos foram condenados — 11 deles a pena de prisão efetiva.

Estavam em causa indícios que apontavam para diversas operações de controlo dos media por parte do Governo de José Sócrates. A equipa do MP nomeou o então primeiro-ministro, Armando Vara e Rui Pedro Soares (então administrador da PT) como os principais suspeitos a investigar.

A Relação do Porto, após um demorado processo de escolha do juiz desembargador que analisaria os recursos do ex-ministro do PS e da maioria dos arguidos, não aceitou as razões de Vara e decidiu a 5 de abril de 2017 manter a pena decretada em primeira instância. O advogado de Vara anunciou recurso para o Tribunal Constitucional.

Mas José Sócrates não estava diretamente ligado à parte da sucata. Com base em escutas que incluíam conversas entre o próprio Sócrates e Armando Vara — e deste último com Paulo Penedos (consultor jurídico da PT) — sobre a possível aquisição da TVI e de outros órgãos de comunicação social, o Departamento de Investigação e Ação Penal do Baixo Vouga enviou em junho de 2009 para a PGR uma certidão para a abertura de um inquérito-crime autónomo por suspeitas da prática do crime de atentado contra o Estado de Direito.

Estavam em causa indícios que apontavam para diversas operações de controlo dos media por parte do Governo de José Sócrates. A equipa liderada pelo procurador João Marques Vidal, irmão da atual procuradora-geral Joana Marques Vidal, nomeou o então primeiro-ministro, Armando Vara e Rui Pedro Soares (então administrador da PT) como os principais suspeitos a investigar.

A certidão que foi entregue em mão a Fernando Pinto Monteiro em Lisboa, continha 11 conversas entre Sócrates e Vara que nunca foram conhecidas. Tudo porque o procurador-geral entrou em choque com os investigadores do DIAP do Baixo Vouga, pois não via nas conversas escutadas qualquer indício criminal. Consequência: Pinto Monteiro promoveu a destruição das escutas junto de Noronha de Nascimento — presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) que, neste caso, assumia o papel de juiz de instrução criminal, visto que o suspeito exercia as funções de primeiro-ministro.

Noronha de Nascimento concordou com Pinto Monteiro (os dois eram velhos rivais no STJ e raramente tinham a mesma opinião) e ordenou a destruição das escutas — operação que o procurador-geral acompanhou pessoalmente quando os cd’s foram inutilizados à tesourada e queimados na sede da PGR.

Nos autos do Face Oculta ficaram, contudo, outras escutas de conversas entre Paulo Penedos e Rui Pedro Soares, homem de Sócrates na Comissão Executiva da PT e líder das negociações de compra da TVI em nome da PT, que sugeriam a tentativa de controlo da estação de televisão por parte do PS de Sócrates. Penedos e Soares falaram abertamente ao telefone sobre o negócio e o afastamento do então diretor de informação José Eduardo Moniz (e da sua mulher e pivot Manuela Moura Guedes). Nas escutas, ambos falam no “chefe maior” que estaria a controlar tudo e que o MP acreditava ser José Sócrates. Entre os spicy details, está a ida de Rui Pedro Soares a Madrid para finalizar o negócio. E um pedido de Penedos para ir ao seu e-mail cuja password era: socrates2009.

A TVI não foi vendida à PT, mas o Jornal de Sexta deixou de existir e Manuela Moura Guedes acabou afastada daquela estação de televisão, negociando a sua saída a troco de uma indemnização.

O caso seria definitivamente encerrado quando, em novembro de 2009, o procurador-geral da República emite um despacho em que diz preto no branco que as certidões extraídas pelo procurador João Marques Vidal não contém matéria com relevância criminal. Pinto Monteiro admite que “não se ignora que o Jornal Nacional de Sexta da TVI e o jornal Público foram objeto de viva contestação por parte de elementos do PS (e do próprio primeiro-ministro), sendo de admitir que estes meios de comunicação social terão, eventualmente, sido objeto de pressões no sentido de não adotarem uma linha editorial hostil ao Governo.” Mas o então procurador-geral não via na documentação enviada por Marques Vidal “elementos de facto que justifiquem a instauração de procedimento criminal contra o primeiro-ministro José Sócrates e/ou qualquer outro dos indivíduos mencionados nas certidões, pela prática do referido crime de atentado contra o Estado de Direito.”

Mais uma vez, José Sócrates é envolvido e até quase declarado culpado pela opinião pública, mas livra-se de prestar contas perante a justiça.

O caso Monte Branco

O primo, Bataglia e o “Chefe”

O caso Monte Branco é o que está mais ligado à Operação Marquês, onde José Sócrates é o principal arguido. Figuras como o banqueiro Ricardo Salgado ou o empresário luso-angolano Hélder Bataglia são, aliás, arguidos em ambos os processos.

Além disso, quatro primos de Sócrates estiveram sob escuta e foram alvo de buscas domiciliárias no âmbito deste caso por suspeita da prática dos crimes de fraude fiscal e de branqueamento de capitais. A Sábado noticiou que José Paulo Bernardo Pinto de Sousa era suspeito de estar envolvido em operações de branqueamento de mais de 2,9 milhões de euros entre 2005 e 2011. Boa parte desse montante (cerca de 2 milhões de euros) terá tido origem em contas de sociedades offshore tituladas por Helder Bataglia, casado com uma irmã de José Paulo (Maria Filomena).

Através destas transferências, o MP chegou a Carlos Santos Silva, o empresário amigo de José Sócrates, que também terá participado no alegado esquema de branqueamento de capitais imputado pelo MP através da sociedade offshore Giffard Finance. A Sábado contava ainda que o MP começou a suspeitar do envolvimento de Sócrates com Carlos Santos Silva e com o seu primo José Paulo Bernardo Pinto de Sousa quando este e o seu irmão António começaram, nas escutas intercetadas pela PJ, a utilizar códigos para falarem do “Chefe” (José Sócrates) e do “Viajante” (Hélder Bataglia).

Sócrates estava a ser investigado não no caso Monte Branco mas sim na Operação Marquês desde o dia 19 de julho de 2013 por suspeitas de corrupção, fraude fiscal e de branqueamento de capitais.

A mesma revista anunciou na capa da sua edição de 31 de julho de 2014 que o MP estava a investigar José Sócrates por suspeitas de fraude fiscal e branqueamento de capitais e preparava-se para detê-lo e constitui-lo como arguido no caso Monte Branco. Com o conforto de um comunicado da PGR, onde se lê que “José Sócrates não está a ser investigado nem se encontra entre os arguidos constituídos no Processo Monte Branco”, o ex-primeiro-ministro vai à RTP classificar a notícia como uma “canalhice” com “intenções criminosas”.

A verdade é que o comunicado da PGR estava correto: Sócrates estava a ser investigado não no caso Monte Branco mas sim na Operação Marquês desde o dia 19 de julho de 2013 por suspeitas de corrupção, fraude fiscal e de branqueamento de capitais. Aliás, no preciso momento em que Sócrates foi confrontado pelo jornalista da Sábado com a notícia que iria ser publicada, o ex-primeiro-ministro estava há meses sob escuta judicial e apertada vigilância da equipa liderada pelo procurador Rosário Teixeira.

Foi no âmbito da Operação Marquês que Hélder Bataglia, ligado ao Grupo Espírito Santo, admitiu num interrogatório feito em Angola em abril de 2016, a pedido do MP português, que emprestou 7 milhões de euros a José Paulo Bernardo Pinto de Sousa, primo de José Sócrates. O MP acredita que boa parte desse dinheiro (5,5 milhões de euros) foi parar às contas de Carlos Santos Silva. O primo de Sócrates para o qual Hélder Bataglia transferiu dinheiro é o mesmo “Bernardo” do caso Freeport.

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