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Pamela Anderson: "Sinto-me a começar. Agora sou atriz, não uma celebridade"

Foi salva-vidas para o mundo ver e partilhada na internet antes que a viralidade tivesse nome. Agora, Pamela Anderson é "The Last Showgirl e está nomeada para um Globo de Ouro. Falámos com ela.

Ao entrar para uma das salas reservadas à imprensa internacional no hotel Maria Cristina em San Sebastán, no País Basco, vemos uma mulher loira, sem maquilhagem, numa pose que muitos cinéfilos diriam “clássica”, com ou sem aspas. Ao lado dela está Gia Coppola — Palo Alto (2013) ou Mainstream (2020) — que foi até ao festival europeu para estrear o seu novo filme: The Last Showgirl, sobre o lado escondido de Las Vegas, terra de glamour e de casamento embriagados, de casinos, seus frequentadores e proprietários. A história da longa metragem é a de um grupo de mulheres obrigada a despedir-se do espectáculo que as fez nascer como estrelas da noite. O que fazer depois de tudo isto? A resposta é fácil, mas nem todas estão dispostas a aceitar.

Uma destas mulheres é Pamela Anderson, ícone dos anos 90 a partir dos EUA e com repercussão na cultura pop mundial. A canadiana foi protagonista de algumas das capas mais famosas da revista Playboy, é tão famosa como a série que protagonizou — Marés Vivas — e eternamente ligada ao primeiro caso de viralidade online na história da humanidade: a gravação de uma relação sexual com o então marido, com Tommy Lee, baterista dos Motley Crue, que se espalhou através da internet, depois do roubo de uma cassete VHS por parte de um funcionário da empresa que estava a fazer obras na morada do casal.

É a agora atriz e não a celebridade que está sentada, sem maquilhagem, à espera de jornalistas para promover aquele que já é visto como um dos — se não o — regressos de 2024, a apontar efeitos para 2025, depois de ter sido nomeada para o Globo de Ouro de Melhor Atriz e com a corrida aos Óscares já lançada (nomeações a serem divulgadas no dia 17 de janeiro). Questiona-se se será mesmo Pamela Anderson. Se a mulher de vestido rosa que se sentou no Kursal, a sala principal, serena e sem sobressalto, é a mesma que entrou pelos ecrãs de milhões de pessoas noutros tempos. É, não há dúvidas. O papel de playmate faz parte do passado. Não é que seja hipótese sequer negá-lo. Há, isso sim, uma nova pele para vestir. “Sinto que estou a começar agora”, diz.

[trailer do filme “The Last Showgirl”:]

De volta ao Le Razzle Dazzle: existe aqui um espectáculo de burlesco, à moda da Paris cliché na memória de quem nunca a viveu, cheio de penas, glitter e mulheres, que vai fechar portas. O que vende, como se vê na Las Vegas real, são espectáculos repletos de pirotecnia, que enchem o olho do público e os bolsos de quem manda, depois de uma refeição cheia e de umas quantas notas gastas a jogar póquer. Ruído e tecnologia em vez de corpos e tradição.

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A protagonista Shelly (Pamela Anderson) é a mais velha das bailarinas do Le Razzle Dazzle e é também a antagonista desta nova versão da cidade do Nevada que a viu nascer para o showbiz. Tem uma filha e um ex-namorado que é patrão (o sereno Dave Bautista). É curioso observar o percurso desta personagem, porque Shelly e Pamela Anderson estão a fazer trajetos diferentes, mas têm muito em comum: a primeira não consegue nem quer adaptar-se à nova realidade em que as mulheres têm de copiar a imagem dos artistas do Cirque du Soleil; a segunda abraçou o ano de 2024 como aquele em que colocou definitivamente para trás o passado, à procura de uma catapulta para a roda das grandes atrizes.

Ambas encontram cruzamento através da nostalgia de outros tempos. “É um filme sobre envelhecer, sobre o sacrifício de quem quer fazer brilhar tudo em Vegas. Durante o set, chorámos muito, o prazer foi esse, da mensagem do filme ter eco no público. Na verdade, fazer o The Last Showgirl foi um alívio, andei a suster a minha respiração durante anos. Deram-me esta oportunidade, de me aplicar verdadeiramente em algo. Senti muitas semelhanças com a Shelly, agora sou atriz e não uma celebridade”, garantiu Pamela Anderson.

"Nunca me tinham dado guiões como estes que leio agora, achei que iria ficar a passar o meu tempo na minha horta e estava bem com isso"

Se há pessoa que não tem tido a vida fácil é a canadiana. Uma infância difícil, relações abusivas, uma carreira como modelo da Playboy que começou por acaso, depois de aparecer numa câmara que filmava o público durante um jogo de futebol americano, na reta final dos anos 80. Rapidamente, tornou-se um ícone, uma figura que despertava interesses, sobretudo físicos, nem por isso artísticos. Uma mulher que deixou de ser mulher para ser uma capa. A série Marés Vivas, exibida entre 1992 e 1997, acabaria por lhe dar o apogeu mediático na televisão. E a famosa cassete sexual com o ex-marido — que ainda o ano passado deu aso a uma das séries mais badaladas do ano, Pam & Tommy — conseguiu efeito de popularidade semelhante, mas por outros motivos. Além disso, é hoje símbolo da divulgação de conteúdos explícitos sem consentimento através da internet, quando tal não acontecia como fenómeno tenebroso dos nossos dias.

Ainda em 2023, foi nesse ano que começou a construir uma nova identidade, ao subir ao palco durante semanas para interpretar Roxie Hart em Chicago, famoso espectáculo da Broadway. E foi também nesse período que o documentário Pamela Anderson, uma História de Amor (Netflix), que começou um outro percurso que, pelo menos até agora, já conseguiu uma nomeação para os Globos de Ouro. Para trás,  e com tanta exposição à mistura, fica o trabalho como ativista dos direitos dos animais. “O ativismo foi o que me deu significado durante todo este tempo, só que esta é uma nova fase. Nunca me tinham dado guiões como estes que leio agora, achei que iria ficar a passar o meu tempo na minha horta e estava bem com isso“, diz quem, com hesitação e ponderação nas respostas, faz sobressair, de forma ensaiada ou não, uma boa dose de timidez.

"Sou mais velha, tenho mais liberdade. O que existe neste momento é timing para contar histórias no feminino"

Mas em The Last Showgirl não é só Pamela Anderson que rouba a atenção. Gia Coppola muniu-se de um bom naipe de nomes da grande liga de Hollywood. Uma das estrelas em questão é Jamie Lee Curtis, vencedora do Óscar de Melhor Atriz Secundária em Tudo Em Todo o Lado ao Mesmo Tempo (2023), que agora faz de Annette, amiga de Shelly que não tem onde dormir e trabalha num casino como bartender. “Tive medo de a conhecer mas, na verdade, levou-me aos ombros. Diziam-me que tinha de estar focada neste projeto e não podia voltar para trás. Sinto que a conheço desde sempre”, referiu Pamela Anderson.

As duas, ainda que com nove anos de diferença, partilham algo em comum: as consequências de uma indústria de Hollywood que tem primado mais pela beleza das imagens (ou dos seus atores e atrizes que pululam entre campanhas de publicidade), do que pelo estatuto ou carreira. Ainda assim, hoje, nenhuma terá tantas razões para apontar o dedo como quando começaram a trabalhar. Reconstruiram-se com a possibilidade de chegar a voos mais altos. E não aparentam alimentar qualquer tipo de receio desta nova fase de vida. “Sou mais velha, tenho mais liberdade. O que existe neste momento é timing para contar histórias no feminino. Gostei de trabalhar nesse tom: se é para mudar, é agora, ou deixamos que as não-decisões nos persigam“, argumentou a atriz.

No mesmo encontro basco, conversámos com a realizadora Gia Coppola, que revelou que esta produção indie americana foi feita com “amigos e família” — e que família tem Gia, não é verdade? –, à semelhança do que fazem outros realizadores como Sean Baker, que tem levado Anora ao topo das listas de favoritos de 2024 e ameaça ser protagonista da temporada de prémios que agora começa. “Sempre fui fascinada com o que está por trás de Las Vegas, do dia a dia daquela cidade. A paisagem apresenta-se como um misto entre o velho e o novo, entre o encerramento de sítios como o Tropicana (fechado em 2024 depois de abrir em 1957) ou a abertura do Sphere (a grande arena esférica que está em tudo o que é rede social). Muitos destes espectáculos, como o que vemos no filme, tinham cenários tão grandes que precisavam depois de ser destruídos, eram feitas grandes despesas nestas operações. Gosto da tradição, por isso é que filmámos em película, mas também quero pensar em abraçar o novo. Porque cada geração tem de enfrentar a sua transição. A Shelly, por exemplo, não gosta do futuro, acha que é tudo de mau gosto. Do meu lado, prefiro encontrar um equilíbrio”, disse.

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Pamela Anderson com a realizadora de "The Last Showgirl" no festival de San Sebastián, onde o filme foi distinguido com o Prémio Especial do Júri

WireImage

A vulnerabilidade de mulheres obrigadas a estar felizes e energéticas: em The Last Showgirl é esta a grande nota de destaque, num filme que, apesar de tudo, não inventa culpados ou moralismos. Mostra, não diz para onde ir. “Gosto do nível de intimidade dos filmes do Sean Baker ou do Cassavettes, esse amor pelo trabalho. Os artistas têm uma voz insegura, achamos que somos fraudes, é preciso mudar essa estação de rádio. Foi por isso que criei esta pequena bolha para o filme, para que pudéssemos cuidar dele e alcançar o melhor resultado possível.”

Ainda não é certa a data de estreia de The Last Showgirl em Portugal (mas avancemos que em muitos países europeus o título aponta fevereiro como mês de chegada às salas). Em San Sebastián, o filme venceu o Prémio Especial de Júri para todo o elenco. A campanha para os Óscares já começou. Pamela Anderson terá de deixar a sua horta no Canadá e os dois filhos adultos durante uns tempos. Voltar à ribalta, às entrevistas, aos fotógrafos à sua volta porta. E à internet. “As redes sociais fazem com que achemos que somos alguém que não somos, há muita pressão. Só quero tirar camadas, não quero inspirar ninguém. Quero filmes como este: provocadores e que digam algo às pessoas.”

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