Os Açores são, neste momento, um arquipélago rodeado de ataques a Montenegro por todos os lados. Pedro Nuno Santos e André Ventura estão a apostar forte na região para desgastar o líder do PSD e expor as incoerências entre o PSD nacional e regional relativamente ao Chega: o líder do PS vai estar nos momentos mais importantes do encerramento da campanha do PS/A e o líder do Chega aterrou em Ponta Delgada esta segunda para ficar até domingo como se fosse ele o candidato. Já Montenegro não tem prevista (para já) uma ida aos Açores — o que contrasta com as eleições na Madeira para onde voou duas vezes nos quatro dias antes eleições. O PSD/Açores — de Bolieiro a Mota Amaral — agradece.
Aparecer ao lado de Bolieiro na mesma noite eleitoral em que o presidente do PSD/Açores pode anunciar o início de negociações com os partidos à direita (incluindo o Chega) para formar Governo seria um grande embaraço para o líder do PSD que tem defendido um “não é não” a acordos com o partido liderado por André Ventura. Do lado de Montenegro, lembra-se que esteve três vezes nos Açores nos últimos meses.
O próprio PSD/Açores não vê utilidade na ida de Luís Montenegro ao arquipélago. Sobre a presença de Luís Montenegro na campanha, José Manuel Bolieiro optou por falar no passado: “Já veio“. E até revelou, na mesma entrevista ao Observador, que disse ao líder do PSD que não queria “pôr-lhe este encargo“, até para não “prejudicar a gestão do seu calendário”. E acrescentou: “Eu valho por mim“.
O antigo presidente do governo regional dos Açores e presidente honorário do PSD/Açores criticou violentamente a ida de Luís Montenegro por ir à noite eleitoral da Madeira, acusando-o de ter um “momento penoso e particularmente infeliz” num “clima de vale tudo”. Mota Amaral aconselha agora, de uma forma mais polida em declarações ao Observador, Montenegro a ficar no continente: “Subscrevo o que disse o presidente do PSD/Açores. Já cá veio. Está resolvido“. Para evitar toda esta cacofonia e uma noite suada como a do Funchal, o mais provável neste momento Montenegro não se desloque aos Açores até domingo. A prometida ida às Flores e ao Corvo — a que não foi durante o Sentir Portugal devido ao mau tempo — poderá ficar para depois de dia 4 de fevereiro.
Pedro Nuno “usa” Açores contra Montenegro
Mesmo que Montenegro não volte aos Açores, vai estar, nas palavras dos adversários, omnipresente nesta fase final da campanha. Que se está, como é natural com a presença de líderes, a “nacionalizar“. Pedro Nuno Santos vai estar no comício de encerramento de Vasco Cordeiro na quinta-feira e ainda participará numa arruada no último dia de campanha. E só não vai dar uma força à Terceira — onde o PSD parece ir largamente à frente do PS — porque anda por um périplo internacional que começou em Madrid e termina em Bruxelas.
O PS nacional tem na cabeça que, ou José Manuel Bolieiro consegue maioria, ou os Açores tornam-se uma win-win situation para Pedro Nuno Santos: ou Vasco Cordeiro governa e o PS recupera a região ou José Manuel Bolieiro é forçado a negociar com o Chega e o PS pode acenar com o fantasma de que Montenegro fará o mesmo na República. É, precisamente, por este lado que Pedro Nuno Santos vai atacar.
Como atacou, aliás, na última visita à região. Pedro Nuno Santos foi aos Açores durante a campanha das diretas do PS. O diretor de campanha e atual cabeça de lista do PS na região às legislativas, Francisco César, deu um dossier com dados sobre a situação da região. Tenha ou não lido todos os dados, o então candidato a líder do PS já assumia que utilizava os Açores como arma de arremesso nacional: “Eu vou usando várias vezes os Açores, perdoem-me. Vou usando várias vezes a governação do PSD como exemplo do que não podia acontecer.” E acrescentou: “Desde logo, a promessa de que nunca governariam com o Chega. A promessa feita pelo líder do PSD/Açores até às vésperas das eleições, que jurou a pés juntos que nunca faria um acordo com o Chega. A primeira coisa fez foi, de facto, um acordo com o Chega.”
A estratégia de Pedro Nuno Santos — que agora se repetirá — é atirar a relação entre PSD e Chega nos Açores contra Montenegro. “Nós damos esse exemplo para dizer que, no plano nacional, também farão como fizeram nos Açores. Estão a prometer que nunca farão um acordo com Chega, mas farão exatamente aquilo que fizeram nos Açores”, atirou Pedro Nuno Santos.
Ao Observador, fonte do PS/Açores diz que os socialistas açorianos “adoraram o discurso” de Pedro Nuno Santos, que fez questão de falar também “na questão do representante da República e da Lei do Mar”. Daí que Vasco Cordeiro até agradeça a presença do líder nacional (de que discordam os autonomistas mais convictos). Pedro Nuno Santos terá, sim, excluído estar presente na noite eleitoral para, explica a mesma fonte, “não parecer, como o Montenegro, que se estava a aproveitar [de um eventual resultado positivo]”. Um pedronunista do PS/A diz ainda ao Observador que as relações “de Pedro Nuno Santos com o PS/Açores são mais próximas do que eram com Costa”.
Ventura atira “inteligente” Bolieiro como farpa ao PSD
A estratégia de “nacionalização” da campanha Açores de André Ventura é igual à de Pedro Nuno Santos: atirar contra Montenegro a relação (eventualmente de dependência) do PSD/Açores com o Chega/Açores. O líder do Chega não fez por menos: vai estar toda a última semana de campanha na região. Nas ruas, Ventura segue ao lado do candidato como também ele fosse a votos, sendo a estrela da comitiva. Não há outro líder nacional tão envolvido como ele.
José Manuel Bolieiro, em entrevista ao Observador, não fechou a porta a um acordo com o Chega e Ventura aproveitou a oportunidade para atacar o PSD nacional: “O PSD tem aqui um problema. O PSD a nível nacional optou por fazer o disparate enorme de dar aos socialistas esta via ver aberta que é: ou sozinho ou vou-me embora”, disse em declarações aos jornalistas após um encontro com o Sindicato Nacional de Polícia em Ponta Delgada.
Para o líder do Chega “é evidente que o eleitorado não cede a chantagens. Aconteceu com Montenegro. Aconteceu com Rui Rio.” Ventura diz, no entanto, que “Bolieiro já percebeu, é aparentemente um pouco mais inteligente, que as sondagens são o que são. E, portanto, inteligentemente já está a dizer que o povo é soberano, que é o mesmo que dizer: se o povo der essa força ao Chega, não sou eu que a vou retirar.” E ainda acrescenta, numa provocação ao líder nacional: “Em todo o caso, é uma atitude mais inteligente que a de Luís Montenegro, que devia ter aprendido alguma coisa com o José Manuel Bolieiro.”
Mortágua ataca PSD, IL e PAN, Rocha mais madeirense que açoriano
Tal como Pedro Nuno Santos e André Ventura, Mariana Mortágua lembrou o acordo do PSD com o Chega nos Açores, mas, à boleia, atirou também à Iniciativa Liberal e ao PAN. A líder do Bloco de Esquerda esteve num comício-almoço no domingo, no Cais da Sardinha, em Ponta Delgada para fazer um aviso: “Ninguém duvide que eles estariam dispostos a entenderem-se de novo uns com outros.”
Mariana Mortágua — perante um Bloco nos Açores que está a lutar por manter o grupo parlamentar de dpois deputados — acrescentou depois que “o PSD nunca faz alianças com o Chega, excepto quando precisa para uma maioria; a IL nunca faz alianças com o Chega, exceto quando o PSD a obriga; e o PAN faz acordos com todos, tanto nos Açores, como na Madeira.”
A líder bloquista protagonizou outra das mensagens do combate regional dos últimos dias: a “madeirização” da campanha. Mortágua tentou mesmo confundir as situações na Madeira e Açores: “É um triste espetáculo da direita nas regiões autónomas”.
Já Rui Rocha esteve nos Açores três dias durante a campanha, ao contrário do que aconteceu na Madeira, não voltará. A última semana de campanha nas regionais da Madeira foi um autêntico desfile de deputados liberais e Rocha fez questão até de voltar na noite eleitoral (que quase podia ser relevante para a IL). Agora, não. E há razões para o desconforto de Rui Rocha: o presidente da IL disse antes de ser eleito que “não teria feito acordo nos Açores” e deu garantias, em entrevista ao Observador, de que “não fará no futuro”. Quatro dias depois, o líder da IL/Açores mostrava abertura um novo acordo com o PSD mesmo que incluísse o Chega: “Não me choca”.
Já Paulo Raimundo optou por ir à região antes da campanha, numa legislatura em que o PCP não tem deputado regional. Ficou, até, atrás do PAN em 2020. A líder nacional, Inês Sousa Real, também não recebeu boas notícias do arquipélago: o candidato do PAN/Açores deixou claro que, numa situação como a da Madeira, não teria aceitado um acordo de incidência parlamentar. Foi uma crítica indireta à posição de Sousa Real e do PAN/Madeira.
Os líderes vão, assim, gerindo os desconfortos com a política regional. Coincidência: aqueles a quem dá jeito explorar uma leitura nacional do Governo de Bolieiro estão presentes; e aqueles a quem não convém, têm outras “prioridades de agenda” nesta última semana de campanha.