Pobre, mas rico. Humilde. Carinhoso. Trabalhador. Mas sobretudo “simples”. “Somos todos iguais. Sou Presidente, não Deus ou um monarca”, disse Jose Mujica quando lhe perguntaram porque vivia numa quinta rodeado de cães e galinhas e porque desprezava a pompa e circunstância presidencial. Este domingo, os uruguaios votaram para escolher o sucessor do carismático presidente. E o vencedor, que fica adiado para uma segunda volta, pode bem vir a ser o homem a quem Mujica sucedeu na cadeira presidencial em 2010, Tabaré Vázquez.
Jose Mujica ou “Pepe” é o verdadeiro presidente do povo, ou, como é descrito “o presidente mais pobre do mundo”. O antigo guerrilheiro vivia (e continuou a viver) numa quinta perto de Montevideu, sem luxos, com pouco dinheiro. Mas nem a quinta é propriedade do uruguaio, é da mulher, Lucía Topolansky, polaca do lado do pai e que fez parte, tal como Mujica do movimento guerrilheiro Tupamaros, do movimento pela libertação do Uruguai em ação nas décadas de 60 e 70.
Mujica ganha cerca de 10 mil euros por mês, mas 85% do ordenado é para instituições de caridade. Diz que não precisa de tanto para viver e que não precisa de luxos. É apenas proprietário de um ‘carocha’, de tratores que o ajudam no cultivo de plantas e flores na quinta e de vários cães, entre eles a cadela Manuela, de três patas.
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“Não é uma apologia da miséria. É uma apologia da simplicidade”, responde. Mujica destacou-se por ser defensor dos pobres e por viver como eles, mas recusa que seja original na maneira de o fazer: “Responde a uma maneira de ver o mundo. Não é uma invenção minha”, respondeu numa entrevista em 2012.
É uma invenção de quem? Para ele, de Séneca. “Pobre não é aquele que tem pouco, mas aquele que muito deseja”, citou. E porquê? “Porque passa a vida desejando e não vivendo”, acrescentou.
Mujica ficou, aliás, conhecido em todo o mundo, pelo estilo de vida e por desprezar a formalidades da política. E nem com uma das mulheres mais poderosas do mundo deixou de dar o ar da sua graça de homem que liga pouco ao protocolo. Num encontro com Angela Merkel, em 2011, enquanto esta falava, o presidente uruguaio chegou mesmo a atender o telemóvel.
O presidente uruguaio eleito pela esquerda esteve cinco anos à frente dos destinos do país, entrou em 2010 e só será substituído oficialmente em março de 2015. E aos 79 anos só não é recandidato por causa do limite aos mandatos no Uruguai.
Quando foi candidato, Vázquez até preferia outro candidato, mas Mujica acabou por ser o candidato escolhido e teve como slogan “Um governo honrado, um país de primeira”, uma vez que tinha como objetivo aprofundar a política muito popular do presidente que terminava o mandato.
Mas afinal o que fez Mujica a favor do Uruguai?
Além da imagem de humildade que passou, ganhando simpatia além-fronteiras, o pequeno país de 3,4 milhões de habitantes chegou a ser eleito pela Economist como o país do ano, o ano passado.
Mujica foi impulsionador de políticas progressistas que fizeram o país subir nos rankings económicos e destacou-se nas políticas sociais como com a legalização da canábis ou com a legalização do casamento entre homossexuais. Ou ainda na política a favor da despenalização do aborto.
Mas é também reconhecido pelas posições que toma e pelas frases que diz.
Troca de lugares
O homem que vai ficar sem cadeira a partir de março foi aliás o primeiro dos atores políticos do pequeno país da América do Sul a votar. Contam os jornais do país que eram oito horas em ponto quando saiu da quinta que tem perto de Montevideu com a mulher, Lucía Topolansky.
Para o lugar de Mujica, há quatro candidatos: Tabaré Vázquez, Luis Lacalle Pou, Pedro Bordaberry e Pablo Mieres. O mais provável é que o vencedor seja Tabaré Vázquez, exatamente o homem que foi presidente da república entre 2005 e 2010, antes de Jose Mujica, mas completamente diferente deste no estilo de vida, mas semelhante no carinho que os uruguaios guardam pelo presidente. Tabaré Vázquez é oncologista e, enquanto foi presidente do Uruguai, melhorou as condições de educação do país e reduziu a taxa de pobreza. Aliás, à data foi o presidente que terminou o mandato com maior taxa de aprovação 80%.
Mas para ser eleito presidente (outra vez) Tabaré tem de ganhar por mais de 50% dos votos e assim evitar a segunda volta com Luis Lacalle Pou, que permanece destacado em segundo lugar.