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Portugal starts inoculating security forces against COVID-19
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NurPhoto via Getty Images

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Portugal é o 19º país a suspender vacina da AstraZeneca. O que se passa e quão preocupado deve estar?

Na Europa, há casos de problemas sanguíneos graves após a administração da vacina da AstraZeneca, mas ninguém sabe se existe mesmo uma relação. Suspensão da vacina é só "precaução".

Portugal fez crescer, esta segunda-feira, a lista de países que suspenderam a administração da vacina da AstraZeneca/Universidade de Oxford após terem sido detetados casos de coagulação sanguínea em pacientes inoculados. São já 19 os países europeus que suspenderam temporariamente a vacinação com a ChAdOx1 S ou, pelo menos, de um lote do medicamento: além de Portugal, a Alemanha, Áustria, Bulgária, Chipre, Dinamarca, Eslovénia, Espanha, Estónia, França, Irlanda, Islândia, Itália, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Noruega, Países Baixos e Roménia tomaram a mesma decisão.

Um primeiro comunicado do Infarmed, publicado na quinta-feira passada, garantia que “os resultados preliminares sugerem não existir uma relação causal entre a administração desta vacina e estes eventos” e que “os benefícios da utilização da vacina contra a COVID-19 da AstraZeneca mantêm-se superiores ao risco”. No mesmo dia, o Infarmed insistiu que “não há indicação de que a vacinação esteja na origem destes eventos tromboembólicos”.

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Foi precisamente essa a mensagem que a Agência Europeia do Medicamento publicou também a 11 de março. Embora os casos de coagulação estejam em investigação, a agência defendeu que “os benefícios da vacina continuam a superar os seus riscos”, podendo continuar a ser administrada enquanto a investigação decorre. De resto, “o número de eventos tromboembólicos em pessoas vacinadas não é maior do que o número observado na população em geral”, tal como reiterou o Infarmed num comunicado no dia seguinte.

Dos 54.571 casos suspeitos de reações adversas à vacina da AstraZeneca notificados até agora, 1.180 estão relacionados com problemas do foro sanguíneo ou linfático. Em 17 milhões de pessoas vacinadas com o medicamento da AstraZeneca, apenas 40 reportaram uma formação de coágulos no sangue. Em Portugal, houve dois casos de tromboembolismo.

Mas já esta segunda-feira as autoridades de saúde deram um passo atrás. Vinte e quatro horas depois de ter comunicado aos jornalistas que a vacinação contra a Covid-19 com a AstraZeneca podia prosseguir com normalidade, Rui Ivo, presidente do Infarmed, anunciou em conferência de imprensa que a autoridade do medicamento e a Direção-Geral da Saúde (DGS) recomendaram a “interrupção temporária” do processo de vacinação com a vacina da AstraZeneca, seguindo o princípio da “precaução em saúde pública” perante os vários casos de reações adversas reportadas em vários países europeus.

Casos graves, mas raros

De acordo com a base de dados europeia, dos 54.571 casos suspeitos de reações adversas à vacina da AstraZeneca notificados até agora (202 dos quais em Portugal), 1.180 estão relacionados com problemas do foro sanguíneo ou linfático. Mas segundo Margarida Saraiva, presidente da Sociedade Portuguesa de Imunologia, em 17 milhões de pessoas vacinadas com o medicamento da AstraZeneca, apenas 40 reportaram uma formação de coágulos no sangue — uma proporção que, para os especialistas, indica que estes eventos são raros.

Em Portugal houve dois casos de tromboembolismo, confirmaram as autoridades de saúde, ressalvando que têm “características clínicas e laboratoriais distintas, de menor gravidade e complexidade” quando comparados com os quadros clínicos reportados noutros países. Sem entrar em detalhe, Rui Ivo indica que são casos “distintos dos que estamos a referir [a nível internacional] e que motivaram esta recomendação”, mas que já estão “em recuperação”.

Lá fora, os casos noticiados são “extremamente graves”, mas também “extremamente raros”, classificou Graça Freitas. E não causam estranheza a Álvaro Beleza, diretor do serviço de Imuno-Hematologia do Hospital Santa Maria. Em entrevista ao Observador, o médico coloca em cima da mesa a hipótese de a vacina da AstraZeneca, por ser composta pelo próprio vírus SARS-CoV-2 inativado, induzir em algumas pessoas — as que já sofrem com alergias graves — uma resposta semelhante à que se observa em alguns casos de Covid-19: a formação de microtrombos nos vasos. Por isso é que os internados com Covid-19 costumam receber anti-coagulantes, como a heparina. Mas tudo não passa de uma teoria porque os dados ainda estão a ser analisados.

Qualquer resposta inflamatória mal controlada pode levar a um aumento da coagulação, sobretudo em pessoas com tendência forte para esse tipo de quadros clínicos — como as pessoas com um sistema imunitário especialmente responsivo. Os medicamentos podem induzir esse tipo de resposta, mas também é possível que a vacina nada tenha a ver com estas mortes.

Ora, os microtrombos surgem quando há uma agregação de plaquetas, as células responsáveis por estancar sangramentos em vasos sanguíneos lesionados. “Há uma alteração das plaquetas e da resposta hepática. São quadros que acontecem frequentemente em doentes agudos de falência em cuidados intensivos”, explicou o hematologista ao Observador. Os coágulos podem viajar e obstruir os vasos sanguíneos nos pulmões, impedindo as trocas gasosas e provocando um quadro de embolia que pode ser fatal.

As três hipóteses em cima da mesa

Foi o que aconteceu a uma mulher de 60 anos na Dinamarca que morreu poucos dias depois de ter sido vacinada contra a Covid-19 com o medicamento da AstraZeneca. A Agência Dinamarquesa de Medicamentos confirmou que a vítima desenvolveu “sintomas incomuns”, nomeadamente um baixo número de plaquetas em circulação no sangue, coágulos em vasos sanguíneos e hemorragias. Em Itália, também um militar de 43 anos e um agente da polícia de 50 anos morreram pelo mesmo fenómenos após terem sido vacinados. Na Áustria, uma enfermeira de 49 anos morreu por “problemas graves de coagulação do sangue” dias depois de ter tomado a vacina.

Mas, pelo menos por enquanto, não se sabe explicar como poderia a vacina provocar essas mesmas reações. Pedro Madureira, imunologista e investigador do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3s), ressalva que qualquer resposta inflamatória mal controlada pode levar a um aumento da coagulação, sobretudo em pessoas com tendência forte para esse tipo de quadros clínicos — como as pessoas com um sistema imunitário especialmente responsivo. Os medicamentos podem induzir esse tipo de resposta — tanto vacinas como qualquer fármaco. Mas também é possível que a vacina nada tenha a ver com estas mortes.

De qualquer modo, a suspensão da vacina em Portugal e noutros países é a prova viva de que qualquer medicamento continua a ser monitorizado mesmo após receber luz verde para entrar no mercado — mais ainda quando essa introdução ocorre com uma autorização condicional: “Tudo isto faz parte do processo para vigiar a introdução da vacina na população. A vacina continua a ser observada mesmo após os ensaios clínicos. É quando começa a ser administrada a um número muito grande de pessoas que fenómenos deste tipo podem ser detetados”, explica o especialista.

Tanto Álvaro Beleza como Pedro Madureira explicam que ainda é cedo para se saber o que se passa: ainda não foi encontrada qualquer relação de causalidade entre os casos reportados e a toma da vacina, notou Rui Ivo na conferência de imprensa, e as conclusões da investigação da Agência Europeia do Medicamento só devem ser conhecidas durante esta semana.

Álvaro Beleza acredita que esta decisão faz sentido nos países onde já foram detetados casos de reação adversa inesperada. Mas "em milhões de vacinas que já foram administradas, os casos são poucos", argumenta o médico: "Há sempre problemas deste género com as vacinas, mas nunca estivemos tão atentos a nenhuma como agora".

Mas há três respostas possíveis: as pessoas que desenvolveram coágulos podem ter sido vacinadas com doses defeituosas; podem estar mais predispostas a desenvolver problemas desta natureza (as pessoas que têm mais tendência para alergias fortes podem estar mais sujeitas a desenvolver estes quadros, por exemplo) ou pode tudo não passar de uma mera coincidência.

Vacina tem enfrentado alguma rejeição

A Agência Europeia do Medicamento insiste que a vacina pode continuar a ser administrada enquanto a investigação decorre porque as evidências disponíveis não confirmam que esta vacina seja a causa dos eventos tromboembólicos registados após a vacinação. Esse também já foi o parecer do Infarmed. Mas como a falta de evidência científica sobre um determinado problema não é o mesmo que uma evidência da falta desse problema, muitos países seguiram o princípio da precaução e decidiram suspender a vacinação.

Álvaro Beleza acredita que esta decisão faz sentido nos países onde já foram detetados casos de reação adversa inesperada, como aconteceu em Portugal. No entanto, apesar de toda a cautela, não deve haver motivos para preocupações: “Em milhões de vacinas que já foram administradas, os casos são poucos”, argumenta o médico: “Há sempre problemas deste género com as vacinas, mas nunca estivemos tão atentos a nenhuma como agora. Compreendo que os países com casos pequem por excesso, é assim mesmo na medicina”.

A própria AstraZeneca garantiu esta segunda-feira que “a natureza da pandemia levou a uma maior atenção em casos individuais”, mas que a incidência de quadros de embolia nas pessoas vacinadas “é muito menor do que seria esperado que ocorresse naturalmente numa população geral deste tamanho e é semelhante em outras vacinas”. Até agora, uma revisão dos dados de segurança “não mostrou evidências de um risco aumentado de embolia pulmonar, trombose venosa profunda ou trombocitopenia em qualquer faixa etária, sexo, lote ou em qualquer país em particular”.

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Um técnico de laboratório supervisiona os testes para a produção em grande escala e fornecimento da vacina da AstraZeneca em Itália.

AFP via Getty Images

Estes argumentos podem não ser suficientes para tranquilizar muitos dos governos europeus, muito menos a população. Os dados mais recentes do Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC) dizem que já foram distribuídas 54,2 milhões de doses em 29 países do Espaço Económico Europeu, mas só 42,6 milhões delas tinham sido administradas. As quase 12 milhões de doses que estão por distribuir são maioritariamente da AstraZeneca — que até há pouco tempo não devia ser administrada a pessoas com mais de 65 anos e que agora foi suspensa.

Em Portugal, enquanto 98,6% das doses disponíveis da Pfizer/BioNTech já foram distribuídas, só 57,3% das doses da AstraZeneca foram administradas. Na Alemanha, onde só 15% das doses disponíveis da vacina da AstraZeneca foram administradas, é o presidente da Sociedade Alemã de Imunologia a admitir que há um preconceito em relação a esta farmacêutica: “As pessoas perguntam-se: ‘Porque é que vou receber uma vacina de segunda categoria se outras pessoas recebem a boa?’. Por isso, no dia em que deviam ser vacinadas, dizem: ‘Não, vou esperar’“, relatou Carsten Watzl à BBC.

Com poucas vacinas para os europeus, a UE exportou 34 milhões de doses em seis semanas. Porquê?

Segundo o vice-almirante Henrique Gouveia e Melo, que coordena a task force para a vacinação contra a Covid-19, já foram administradas 400 mil vacinas da AstraZeneca e há cerca de 200 mil em armazém. Na conferência de imprensa desta segunda-feira, o responsável confirmou que a decisão de suspender temporariamente a distribuição dos medicamentos vai ditar um atraso de duas semanas no processo de vacinação, uma vez que as vacinas das outras farmacêuticas vão ser aplicadas exclusivamente aos grupos mais prioritários.

Isto significa que a vacinação de professores e funcionários do pré-escolar e o primeiro ciclo, que estava prevista para o próximo fim de semana, também vai ser adiada: “Os planos que já estavam em execução foram postos em pausa a partir de hoje [segunda-feira] à tarde”, confirmou Henrique Gouveia e Melo, e será assim até que “as dúvidas deixem de existir”, explica.

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