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Desconfinamento — parte 2. Depois de os portugueses terem confinado (pela segunda vez), chegou a altura de planear como vão desconfiar (pela segunda vez). A três dias de o Governo apresentar o plano de desconfinamento, os especialistas deixaram aos políticos indicações sobre como e quando fazê-lo, durante a reunião desta segunda-feira no Infarmed.
Uma equipa de peritos, liderada pelo investigador Óscar Felgueiras e pela pneumologista Raquel Duarte, da Administração Regional de Saúde do Norte, apresentou um plano bem diferente do que foi aplicado em maio do ano passado: em vez de um calendário definido em função da data, os especialistas focaram-se em critérios de saúde pública que terão de ser cumpridos para desbloquear a fase de desconfinamento seguinte — ou, em contrapartida, recuar para medidas mais apertadas.
É um plano de cinco níveis de risco, com as respetivas medidas que devem ser implementadas em cada um. O plano prevê que, numa fase inicial, independentemente do nível de risco, todos os concelhos abram no nível quatro. Isto é, quando o Governo decidir começar a abrir o país, “toda a gente abre no nível 4”, nas palavras de Raquel Duarte. Depois, é feita uma avaliação a cada duas semanas a nível nacional, mas também concelhio, que vai determinar a subida para níveis menos restritivos — ou, num pior cenário, a aplicação de mais medidas.
As linhas vermelhas para recuar no desconfinamento se a epidemia se descontrolar outra vez
Que níveis são esses e que medidas prevê cada um deles?
Nível 5. Escolas fechadas, teletrabalho, restaurantes encerrados e restrição de horários
Escolas. Atividades suspensas.
Trabalho. Teletrabalho sempre que possível, trabalho isolado e abertos apenas os serviços essenciais.
Horários dos estabelecimentos. Restrição de horário de funcionamento, com as atividades a funcionar de segunda a sexta-feira até às 21h00 e aos sábados até às 13h00.
Transportes públicos, táxis e TVDE. Devem ser utilizados apenas para situações emergentes e justificadas.
Comércio e retalho. Atividades suspensas, exceto para serviços essenciais e com restrição de horários.
Restauração. Restaurantes fechados, mantendo-se o take-away e as entregas ao domicílio.
Convívio familiar. Limitado ao agregado familiar.
Nível 4. Pré-escolar e creches abrem, venda ao postigo retoma, mas restaurantes continuam fechados
Escolas. Abertura do pré-escolar e creches.
Trabalho. Permitido o trabalho em locais comuns sem contacto com o público.
Horários dos estabelecimentos. Medidas mantêm-se iguais: restrição de horário de funcionamento, com as atividades a funcionar de segunda a sexta-feira até 21h00 e aos sábados até às 13h00.
Transportes públicos, táxis e TVDE. Metro e autocarros com 25% da ocupação total. Táxis e TVDE com lotação limitada a 2/3 da capacidade, sendo que os bancos dianteiros devem ser utilizados apenas pelo motorista.
Comércio e retalho. Permite-se a venda ao postigo com a restrição de horário.
Restauração. Medidas mantêm-se iguais: restaurantes permanecem fechados, mantendo-se o take-away e as entregas ao domicílio.
Convívio familiar. Limitado ao agregado familiar.
Nível 3. Primeiro e segundo ciclo retomam, comércio abre e já é possível almoçar numa esplanada
Escolas. Abertura do primeiro ciclo (escola primária) e segundo ciclo (5.º e 6.º ano).
Trabalho. Permitido o trabalho em locais comuns com contacto com o público, mas sem contacto físico, garantindo o distanciamento.
Horários dos estabelecimentos. Medidas mantêm-se iguais: restrição de horário de funcionamento, com as atividades a funcionar de segunda a sexta-feira até 21h00 e aos sábados até às 13h00.
Transportes públicos, táxis e TVDE. Medidas mantêm-se iguais: metro e autocarros com 25% da ocupação total. Táxis e TVDE com lotação limitada a 2/3 da capacidade, sendo que os bancos dianteiros devem ser utilizados apenas pelo motorista.
Comércio e retalho. Abertura com cumprimento das medidas de distanciamento, definição das pessoas por metro quadrado e restrição de horário.
Restauração. Permitido o serviço de esplanada, desde que seja cumprido o distanciamento e o uso de máscara, exceto no momento da refeição, com limite máximo de 4 pessoas em cada mesa.
Convívio familiar. Possível a associação do agregado a outras 6 pessoas, mas do seu conjunto sociofamiliar, com aposta num “conceito de bolha”, mantendo distanciamento e uso de máscara.
Nível 2. Restaurantes abrem com limite de pessoas, terceiro ciclo e ensino secundário retomam
Escolas. Abertura do terceiro ciclo (do 7.º ao 9.º ano), do ensino secundário. Também será retomada a atividade presencial do ensino superior, mas apenas nos casos em que a presença física é exigida.
Trabalho. Permitido o trabalho em locais com contacto com o público e contacto físico e individual.
Horários dos estabelecimentos. Não existem restrições aos horários de funcionamento.
Transportes públicos, táxis e TVDE. Metro e autocarros com 50% da ocupação total. Táxis e TVDE com lotação limitada a 2/3 da capacidade, sendo que os bancos dianteiros devem ser utilizados apenas pelo motorista.
Comércio e retalho. Abertura com cumprimento das medidas de distanciamento e definição das pessoas por metro quadrado — já sem restrição de horário.
Restauração. Aberta com medidas restritivas e diminuição de lotação, desde que seja cumprido o distanciamento e uso de máscara, exceto no momento da refeição, com limite máximo de quatro pessoas em cada mesa. O uso da esplanada, caso haja, deve ser priorizada, com o máximo de seis pessoas por mesa.
Convívio familiar. Mantêm-se as medidas: possível a associação do agregado a outras 6 pessoas, mas do seu conjunto sociofamiliar, com aposta num “conceito de bolha”, mantendo distanciamento e uso de máscara.
Nível 1. Ensino superior retoma por completo, máximo de seis pessoas numa mesa de um restaurante
Escolas. Abertura do ensino superior.
Trabalho. Permitido o trabalho em todas as áreas laborais, com cumprimento das medidas gerais.
Horários dos estabelecimentos. Não existem restrições aos horários de funcionamento.
Transportes públicos, táxis e TVDE. Medidas mantêm-se iguais às do nível 2: metro e autocarros com 50% da ocupação total. Táxis e TVDE com lotação limitada a 2/3 da capacidade, sendo que os bancos dianteiros devem ser utilizados apenas pelo motorista.
Comércio e retalho. Abertura com cumprimento das medidas de distanciamento e definição das pessoas por metro quadrado.
Restauração. Aberta com medidas restritivas e diminuição de lotação, desde que seja cumprido o distanciamento e uso de máscara, exceto no momento da refeição, com limite máximo de seis pessoas em cada mesa. O uso da esplanada, caso haja, deve ser priorizada, com o máximo de 10 pessoas por mesa.
Convívio familiar. Possível a associação do agregado a outras 10 pessoas, mas do seu conjunto sociofamiliar, com aposta num “conceito de bolha”, mantendo distanciamento e uso de máscara.
As regras a cumprir seja qual for o o nível
Do nível 5 ao 1, o plano prevê regras que devem ser cumpridas em todos eles, independentemente do risco em que cada concelho ou o país se encontre:
Escolas. Cumprimento de distanciamento físico, com definição das pessoas por metro quadrado, uso obrigatório de máscara e promoção do desfasamento de horários e higienização dos espaços e superfícies.
Trabalho. O teletrabalho deve ser mantido sempre que possível, o trabalho presencial deve garantir o distanciamento físico — com a diminuição da lotação, se necessário —, deve ser promovida a testagem de funcionários que não possam trabalhar remotamente e que não façam parte dos grupos prioritários de vacinação e devem ser promovidos os horários desfasados.
Comércio, retalho, restauração e outras atividades. Cumprimento de distanciamento físico, utilização de máscara, desfasamento de horários, regras de higienização, bom sistema de ventilação, arejamento, promoção das atividades no exterior ou remotamente sempre que possível, promoção de conjuntos sociofamiliares restritos.
Depois do nível 4, quando é que passaríamos para o nível 3?
A avaliação é feita de 15 em 15 dias, a nível nacional e concelhio. Se ao fim de duas semanas o nível de risco se mantiver igual (4) ou for inferior (3), implementam-se as medidas do nível seguinte, o nível 3. O mesmo com o nível 2. No entanto, as condições para aplicar as medidas do nível 1 são mais apertadas: são precisas duas avaliações sucessivas em que o nível se mantém no 2 ou passa para o 1, ou seja, 30 dias.
A nível concelhio, a avaliação também é feita de 15 em 15 dias. As medidas passarão para o nível imediatamente inferior — de 4 para 3, de 3 para 2 ou de 2 para 1 — sempre que o nível de risco for inferior ao nível das medidas. Caso haja um agravamento do risco, devem ser analisadas as causas e mantida a vigilância durante as duas semanas seguintes. Só ao fim desta duas semanas, se nível de risco voltar a aumentar, é que se apertam as medidas restritivas. “Só o agravamento de dois níveis é que pode permitir que haja um retrocesso na implementação das medidas“, resume a epidemiologista Raquel Duarte.
Quando é que poderemos começar a desconfinar?
A data chave é 15 de março — não é uma data prevista no plano de Raquel Duarte e Óscar Felgueiras, nem tão pouco definida pelo Governo. Foi apenas uma data referida durante a reunião desta segunda-feira. Os peritos preveem que será esse o dia em que os valores da Covid-19 em Portugal irão atingir níveis que já permitam um desconfinamento. O epidemiologista Baltazar Nunes prevê que “provavelmente” o país vai estar “numa situação muito perto dos 60 casos por 100 mil habitantes e da taxa de ocupação desejada” para as unidades de cuidados intensivos.
Das escolas fechadas às reuniões com mais de 50 pessoas. As medidas de Henrique de Barros
Henrique de Barros, do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, também esteve na reunião e fez uma propostas de medidas divididas em cinco grupos:
- 0: sem medidas (apenas medidas individuais não farmacológicas);
- 1: não autorizar reuniões com mais de 50 pessoas;
- 2: fechar cafés, restaurantes e comércios;
- 3: interromper atividades de ensino presencial no secundário e superior;
- 4: interromper atividades de ensino presencial no básico e encerrar creches.
Henrique de Barros explicou que a proposta é feita com base na “experiência acumulada” e que resulta da análise das respostas nacionais quando havia menos informação, menos testes, menos imunes e não havia vacinação. O plano “é capaz de antecipar a resposta ao nível nacional e regional” e dá “espaço para ponderação”, “sem limites rígidos”. “E acomoda possível efeito de variantes víricas”, disse. A proposta passa por cinco grandes grupos de medidas, que jogam com incidência a 15 dias, desde as medidas individuais até às medidas mais gravosas, para períodos de mais pressão. Mas exigem “monitorização e avaliação continuada”.
Ainda assim, este plano e todas as sugestões dadas durante a reunião não são definitivas. Agora, os partidos serão ouvidos sobre os dados partilhados na reunião do Infarmed e o Conselho de Ministros irá anunciar e comunicar as decisões para o desconfinamento na quinta-feira.