A compra de imóveis por parte de russos pode vir a ser proibida no âmbito do sexto pacote de sanções aplicado pela União Europeia. A notícia foi avançada pela Bloomberg esta quarta-feira, dizendo que está em cima da mesa a proibição de “venda ou transferência, direta ou indiretamente, de direitos de propriedade sobre bens imóveis localizados no território da União Europeia ou unidades de participação em fundos de investimento que ofereçam exposição a tais bens imóveis”.
Esta medida caberia no sexto pacote de sanções da UE, esperado para breve, que vai incluir a proibição de compras de petróleo à Rússia e colocar um dos maiores bancos russos, o Sberbank, fora do sistema de transações internacionais Swift.
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No caso dos imóveis, a proibição aplicar-se-á a russos que não tenham cidadania de um país comunitário e que não tenham permissão de residência em algum Estado-membro. Estão previstas exclusões para cidadãos com visto de residência em qualquer um dos Estados-membros da União Europeia, mais a Islândia, o Liechtenstein, a Noruega e a Suíça.
Ao Observador, as empresas imobiliárias desvalorizam esta pretensão da União Europeia, já que os russos não têm sido dos maiores compradores de imóveis em Portugal. Ainda assim, pedem para as sanções não serem subestimadas.
“Acreditamos que estas sanções terão um impacto limitado no nosso mercado, ainda que não devam claramente ser subestimadas”, comenta, por escrito, ao Observador Alexandra Gomes, head of research da Savills Portugal, explicando que “a Rússia não constitui a nacionalidade com maior peso no volume de investimento residencial em Portugal”.
Também Miguel Poisson, CEO da Sotheby’s Realty Portugal, afina pelo mesmo tom.
Considero que as sanções impostas, nomeadamente essa de proibir russos de comprar imóveis na União Europeia, não terão um grande impacto no mercado imobiliário português, uma vez que existem clientes de outras nacionalidades, como os norte-americanos, os ingleses e os franceses, com maior peso no investimento e aquisição de imóveis”, diz, em declarações escritas, ao Observador.
Este responsável garante mesmo que os russos “não estão entre as nacionalidades dos nossos clientes internacionais que mais compraram imóveis em Portugal nos últimos anos, nem nunca fizeram parte do top 3 a nível de nacionalidade dos nossos clientes”. Sem revelar o valor comercializado por cada uma das nacionalidades, a Sotheby’s Realty Portugal revela, no entanto, que nos últimos cinco anos os principais compradores estrangeiros chegaram do Reino Unido, Estados Unidos da América, Alemanha, Brasil, Bélgica e França.
Já a Vanguard Properties, empresa que ficou com a Herdade da Comporta, tinha dito, em entrevista ao Observador, em março, que tem “muito poucos” clientes russos – e “são pessoas normais, não são oligarcas”. José Cardoso Botelho lembrava, então, que “a comunidade russa nunca foi muito relevante em Portugal porque os russos gostam de três ou quatro horas de viagem, no máximo. E Lisboa está a cinco horas e meia ou seis horas de avião”. Além disso, acrescentava, “curiosamente, sendo um país onde faz muito frio [a Rússia], eles acham que a nossa água [do mar] é muito fria. E preferem países do Mediterrâneo”.
Russos compraram imóveis para obter autorizações de residência
Muitos dos clientes russos compraram imóveis, indicam os responsáveis, sobretudo na região de Lisboa e na linha do Estoril, com o objetivo de obter uma autorização de residência para investimento (ARI), os chamados vistos gold. De outubro de 2012, quando este regime arrancou em Portugal, até abril deste ano, foram concedidas 10.636 autorizações de residência, sendo 431 para investidores russos.
Do total de vistos concedidos, 9.872 foram para aquisição de imóveis, num total de 5.652 milhões de euros de compras. Da Rússia chegaram cerca de 278 milhões de euros de investimento, segundo dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF).
O Ministério dos Negócios Estrangeiros, numa altura em que ainda era tutelado por Augusto Santos Silva, e já depois da invasão da Ucrânia pela Rússia, suspendeu a atribuição de vistos gold a cidadãos russos. O que aconteceu no final de fevereiro. Este ano, só nas estatísticas de janeiro surgem autorizações de residência a cidadãos russos — foram sete para a Rússia num total de 94 atribuídas.
10636
Desde outubro de 2012 foram concedidas 10.636 autorizações de residência (vistos gold).
431
A Rússia garantiu, desde outubro de 2012, um total de 431 vistos gold para investimento.
Rússia não está nos países com mais compradores
“A Rússia não constitui a nacionalidade com maior peso no volume de investimento residencial em Portugal, ainda que tenha aumentado a sua presença desde o ano 2019”, salienta ao Observador Alexandra Gomes, da Savills Portugal, remetendo os principais compradores estrangeiros para França, Reino Unido, China, Brasil e, mais recentemente, Estados Unidos da América.
Segundo dados disponibilizados por esta imobiliária, a Rússia nunca esteve no top 5 de transações de não residentes. Mas surge no top 10, se recuarmos a 2012. Neste ano foram responsáveis por 4,5% do total de aquisição de imóveis por não residentes.
Já no imobiliário comercial, segundo dados disponibilizados pela CBRE ao Observador, a Rússia não faz parte dos maiores investidores. A imobiliária escusou-se a comentar estas possíveis sanções porque não está, no entanto, autorizada, de acordo com as regras internacionais, a pronunciar-se sobre o conflito nem possíveis consequências ou impactos no setor.