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DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Regime de dedicação plena com fraca adesão em Lisboa. Gestores hospitalares na expectativa quanto ao aumento de cirurgias e consultas

Cerca de 25% dos médicos hospitalares já aderiram ao regime, mas a maioria trabalha no Norte. Em Lisboa, o setor privado condiciona a decisão dos médicos. Gestores hospitalares na expectativa.

O Ministério da Saúde fez saber, esta terça-feira, que quase 2900 médicos hospitalares do SNS — cerca de 24% do total de clínicos elegíveis — já aderiram ao regime de dedicação plena, que prevê um acréscimo do rendimento mensal de 25% em troca do aumento do horário das horas extra anuais e do trabalho aos sábados, entre outros aspetos. No entanto, como acontece frequentemente, a média nacional esconde grandes assimetrias regionais, com alguns hospitais da região norte a registarem taxas de adesão de 30%, enquanto, nos maiores hospitais da região de Lisboa menos de 20% dos clínicos aderiu ao regime.

Ao fim de dois meses, 2860 médicos aceitaram trabalhar no SNS ao abrigo do regime de dedicação plena, o que representa cerca de 24% do universo de 12 mil especialistas que trabalham nos hospitais do SNS e que podem aderir ao regime, segundo dados enviados pelo Ministério da Saúde ao Observador.

O número total de médicos especialistas nos hospitais do SNS é de cerca de 15 mil, mas mais de 2.500 estão no regime de dedicação exclusiva, um outro modelo cujas adesões encerraram há vários anos mas em que ainda se mantêm um número significativo de médicos. Há ainda cerca de 10 mil internos, que não são elegíveis, uma vez que o regime se aplica apenas a médicos especialistas.

Hospitais do norte registam maior adesão. Setor privado condiciona médicos no sul

Para a tutela, o balanço dos dois primeiros meses de adesão à dedicação plena “é francamente positivo”. Contudo, o impacto do aumento do tempo de trabalho dos médicos no SNS não se está a fazer sentir da mesma forma em todo o país. Analisando os dados por Unidades Locais de Saúde (ULS), percebe-se que o modelo de dedicação plena tem tido uma adesão bastante forte na zona norte, que concentra quase 60% dos 2860 médicos que aderiram ao regime. Já a região de Lisboa e Vale do Tejo tem apenas 23,7% dos médicos aderentes, seguida da região Centro, com 13,4%, do Algarve, com 2,4% e do Alentejo, com 0,9%.

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Apenas um quarto dos médicos aderiu ao regime de dedicação plena

O Observador questionou as ULS que registaram mais adesões (em termos absolutos) ao regime de dedicação plena, de modo a perceber quantos médicos fazem parte dos quadros e, assim, apurar a percentagem de clínicos que aderiu ao modelo. As ULS de São João e Santo António, ambas no Porto, foram as que registaram o maior número de adesões de especialistas. No primeiro caso, 355 dos 1050 médicos especialistas já aderiram (cerca de um terço, 34%), enquanto na ULS de Santo António aderiram 253 dos 891 especialistas, ou seja, 28% dos médicos do quadro.

Por outro lado, nas regiões onde existe maior carência de médicos (nomeadamente em Lisboa e Vale do Tejo), a adesão tem sido reduzida. Na ULS Santa Maria, em Lisboa, aderiram a este regime apenas 147 médicos especialistas. Tendo em conta que, segundo informação da ULS enviadas ao Observador, trabalham 916 médicos elegíveis nesta ULS (que engloba os hospitais de Santa Maria e Pulido Valente), o regime de dedicação plena convenceu apenas 16% dos clínicos.

Hospital São João, Porto

Mais de 350 médicos da ULS de São João já aderiram à dedicação plena, o melhor registo a nível nacional

LUSA

Já na maior ULS do país, a de São José (que engloba seis unidades hospitalares) registaram-se apenas 164 adesões. Um número pouco significativo, tendo em conta que, nos hospitais de São José, Santa Marta, Capuchos, Curry Cabral, Estefânia e Maternidade Alfredo da Costa, trabalham 1456 médicos, como revelou ao Observador fonte oficial desta ULS. Feitas as contas, apenas 11% dos especialistas estão em dedicação plena. Já na ULS Amadora Sintra registaram-se 103 adesões entre os 453 médicos especialistas, isto é, cerca de 23% do total.

Na maior ULS da região Centro, a de Coimbra, o regime também parece não ter convencido os médicos. Aderiram apenas 212 dos 1361 médicos, ou seja, pouco mais de 15%.

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Para o presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares, a diferença expressiva na adesão à dedicação plena entre o norte e a região de Lisboa está relacionada com o maior envolvimento dos médicos que trabalham a sul com os hospitais privados. “Quem adere [à dedicação plena] tem de estar disponível para fazer até 250 horas por ano e isso pode ser mais do que muitos profissionais estão disponíveis para fazer, sobretudo aqueles que trabalham no setor privado”, explica Xavier Barreto, ao Observador, acrescentando que,” uma vez que existem mais unidades privadas em Lisboa e com mais necessidade de mão de obra, é provável que os profissionais não queiram estar sujeitos ao risco de fazer essas horas no SNS, ficando menos disponíveis para o privado”, onde são, ainda assim, mais bem remunerados.

FNAM critica fim do descanso compensatório, que afasta os médicos do sul

Já a presidente da Federação Nacional dos Médicos (FNAM) reafirma as críticas ao regime de dedicação plena e não manifesta surpresa pela fraca adesão, sobretudo na zona sul do país. Joana Bordalo e Sá sublinha que o modelo é penalizador para os profissionais que fazem trabalho noturno, uma realidade muito mais comum em Lisboa do que a norte. “Este regime é muito penalizador para quem faz noites, porque acaba com o direito ao descanso compensatório. No centro e no sul temos serviços mais desfalcados, com maior necessidade de fazer noites”, lembra a responsável sindical ao Observador.

Para Joana Bordalo e Sá, o balanço que se pode fazer dos primeiros dois meses é “negativo”, ao contrário do que diz o Ministério da Saúde. “O regime deveria ser apelativo. Quando temos menos de um quarto de adesões, não pode ser considerado um resultado satisfatório“, defende a também médica oncologista, reafirmando as falhas que, na ótica da FNAM, enfraquecem a atratividade do regime de dedicação plena.

A presidente da Federação Nacional dos Médicos (FNAM), Joana Bordalo e Sá (C), participa na manifestação de médicos junto ao Hospital São João no Porto, convocada pela Federação Nacional dos Médicos (FNAM), 14 de novembro de 2023. Os médicos estão em greve para exigir "salários justos e condições de trabalho dignas para todos os médicos no Serviço Nacional de Saúde (SNS)". ESTELA SILVA/LUSA

Para a presidente da FNAM, Joana Bordalo e Sá, o regime de dedicação plena é "penalizador" para os médicos

ESTELA SILVA/LUSA

“É um regime que, sobretudo para os médicos hospitalares, tem princípios que ferem a Constituição e as diretivas europeias. A FNAM vai continuar a batalhar para que esses princípios sejam retirados, como o aumento das horas extra de 150 para 250, o fim do descanso compensatória depois do trabalho noturno, o aumento da jornada diária para 9 horas e o trabalho aos sábados para quem não faz urgência”, enumera Joana Bordalo e Sá. Recorde-se que a FNAM solicitou, em dezembro, à Procuradoria-Geral da República que este órgão pedisse, por sua vez, ao Tribunal Constitucional a fiscalização da lei do decreto-lei 103/2023, de 7 de novembro de 2023, que define as condições do regime de dedicação plena. Depois disso, em janeiro, o Ministério Público enviou o pedido de fiscalização aos juízes do Palácio Ratton.

Mais moderada é a posição do Sindicato Independente dos Médicos em relação ao regime da dedicação plena. “Não diabolizamos este regime. Como sindicato responsável, não criamos fantasmas e não inventamos problemas onde eles não existem. O que temos dito aos nossos associados é que devem analisar e verificar o que é melhor para a sua vida pessoal e para a organização dos serviços”, refere ao Observador o secretário-geral Jorge Roque da Cunha, admitindo que os quase 2900 médicos que aderiram ao regime, desde 1 de janeiro, superam as expectativas que o SIM tinha.

Sindicato Independente admite “melhor organização a norte”

Este balanço não inclui as especialidades de saúde pública e de medicina geral e familiar, uma vez que estas duas especialidades têm um modelo de adesão automática ao novo regime, devendo os médicos que não pretendam trabalhar em dedicação plena apresentar a sua renúncia a este regime até ao dia 25 de março.

Ainda assim, e a apesar de não recusar a dedicação plena, Roque da Cunha sublinha as debilidades do modelo. “Não é atraente para os médicos, sobretudo devido ao aumento do horário de trabalho extra para 250 horas e à alteração do local de trabalho (está em causa a questão das urgências metropolitanas, isto é, está previsto que os médicos se possam deslocar para estas urgências, sobretudo na área de Lisboa e Vale do Tejo e nalgumas especialidades como Otorrino, Oftalmologia, Pediatria e Obstetrícia)”, explica o também médico de família. Quanto à diferença entre norte e sul, Roque da Cunha admite que “o que há muitas vezes é falta de informação por parte dos hospitais e poderá haver melhor organização a norte”.

O que não queremos é ver médicos a dizerem que trabalham ao sábado mas não fazem atividade assistencial
Xavier Barreto, presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares

Com a dedicação plena, o objetivo do governo é fixar médicos no SNS e, com isso, aumentar a produção hospitalar, gerando uma maior capacidade de resposta em várias áreas e alargando o acesso, que, neste momento, se encontra comprometido em praticamente todo o país. No entanto, a adesão de quase 2900 clínicos não garante, por si só, o cumprimento desses objetivos, alertam os administradores hospitalares.

Gestores hospitalares esperam para ver se regime vai aumentar produção e melhorar o acesso

“Temos mais horas de trabalho líquidas, e isso tem de ser traduzir em mais atividade: consultas, cirurgias, etc. O que temos de fazer agora é acompanhar a implementação e perceber em que se traduz em termos de produção e de acesso“, sublinha o presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares, deixando um alerta aos médicos.

“O que não queremos ver é estratégias de tentativa de mitigação do potencial impacto do regime, como médicos a dizerem que trabalham ao sábado mas não fazem atividade assistencial. Não é isso que está previsto na lei”, avisa Xavier Barreto.

SNS. Dedicação plena impõe metas a médicos e proíbe cargos de chefia no privado

O responsável admite que ainda “possa existir algum equívoco e falta de informação”, relativamente à acumulação do regime de dedicação plena com a atividade no setor privado e que o receio de incompatibilidade possa estar a afetar mais a zona de Lisboa e Vale do Tejo, onde muitos médicos acumulam funções. “Algumas pessoas pensam que não podem acumular a dedicação plena com o setor privado, o que não é verdade“, salienta o administrador hospitalar do São João. De acordo com o Estatuto do SNS, a dedicação plena é apenas incompatível com o exercício de funções de direção técnica, coordenação e chefia em instituições privadas e do setor social.

Ao Observador, um outro administrador hospitalar, da zona de Lisboa, garante que a opção de muitos médicos tem “sido esperar para ver como vai ser o próximo ciclo político”, também tendo em conta que a adesão ao regime de dedicação plena tem associado um período mínimo de permanência de dois anos. Segunda a mesma fonte, a maioria das adesões tem-se registado entre médicos mais velhos, que “querem aumentar o rendimento na fase final da carreira (assegurando uma bonificação na reforma) e também evitam, dessa forma, a deslocação entre hospitais públicos e privados, uma prática desgastante”.

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