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Quando chega ao poder em outubro de 2022 após o mandato curto de Liz Truss, Rishi Sunak prometeu trazer "estabilidade e unidade" ao Reino Unido, querendo conciliar os britânicos com os conservadores

POOL/AFP via Getty Images

Quando chega ao poder em outubro de 2022 após o mandato curto de Liz Truss, Rishi Sunak prometeu trazer "estabilidade e unidade" ao Reino Unido, querendo conciliar os britânicos com os conservadores

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Rishi Sunak de saída? Conservadores preparam-se para derrota pesada — e nem o círculo eleitoral de Thatcher escapa

Finchley e Golders Green é um bastião dos conservadores — foi onde Thatcher foi sempre eleita —, mas deverão perdê-lo nestas eleições. Sunak enfrenta prova de fogo e substituição está a ser estudada.

São várias ruas de moradias com fachadas bem cuidadas e um pequeno jardim. Em Finchley, no norte de Londres, a tranquilidade reina esta segunda-feira de manhã, longe da azáfama que caracteriza o centro da capital britânica. Há mulheres com carrinhos de bebés, pessoas a fazer desporto e ouvem-se pássaros a cantar. Foi em representação desta localidade — um subúrbio residencial — que a “dama de ferro” e antiga primeira-ministra, Margaret Thatcher, foi eleita para o Parlamento britânico pelo Partido Conservador entre 1959 e 1987.

Esse facto parece passar despercebido nas ruas deste bairro. O único vislumbre da herança da antiga primeira-ministra na localidade é uma casa de tijolos de três pisos, em que está localizada a sede do Partido Conservador em Finchley. Nas janelas do edifício estão colados pósteres a apelar ao voto em Alex Deane, antigo chefe de gabinete do antigo primeiro-ministro e atual ministro dos Negócios Estrangeiros David Cameron, que espera ser eleito por este círculo eleitoral para a Câmara dos Comuns. Essa tarefa, porém, não será nada fácil.

Antigo bastião conservador e herdeiro da influência de Margaret Thatcher, o círculo eleitoral de Finchley e Golders Green (controlado pelos tories desde 2010) deverá mudar de mãos e passar ou para os trabalhistas, ou para os liberais democratas, segundo indicam as sondagens. E a localidade está longe de ser a única em que esta tendência se deverá verificar no próximo dia 4 de julho. Em termos gerais, o Partido Conservador, liderado pelo primeiro-ministro Rishi Sunak, deverá obter uma derrota de proporções históricas e, no pior dos cenários, poderá ficar em terceiro lugar, atrás do Reform UK, liderado por Nigel Farage.

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Margaret Thatcter numa ação de campanha num quartel de bombeiros em Finchley

Bettmann Archive

“Estou cansada do Partido Conservador. Tenho votado neles, mas o que aconteceu nos últimos anos é inexplicável. Não o reconheço. Fiquei chocada com o que se passou com Boris [Johnson] e com Liz Truss. Como é que aconteceu isto com um partido sério?”, desabafa ao Observador Linda Aspel, uma agente imobiliária na reforma que vive em Finchley. A mulher aludia às sucessivas crises que enfrentaram os conservadores nos últimos anos: desde a demissão do ex-primeiro-ministro por causa das festas durante a pandemia de Covid até ao mandato de apenas 45 dias de Liz Truss em 2022.

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Quando chegou ao poder em outubro de 2022, após o mandato curto de Liz Truss, Rishi Sunak prometeu trazer “estabilidade e unidade” ao Reino Unido, aspirando reconciliar os britânicos com os conservadores. Até ao momento, segundo as sondagens e os resultados das últimas eleições locais, o primeiro-ministro não está a conseguir cumprir esse objetivo. A 4 de julho, concorrendo pela primeira vez no desempenho destas funções, o chefe do executivo britânico vai enfrentar a prova derradeira.

A convocação de eleições e o “escândalo desnecessário” do Dia D

As sondagens para estas eleições gerais mostram que o Partido Trabalhista deverá vencê-las com cerca de 40% das intenções de voto. Num muito distante segundo lugar ficarão os conservadores, com 20%, muito perto do Reform UK (17%). Este poderá ser o pior resultado de sempre do Partido Conservador. Há que recuar a 1906 para encontrar um valor tão negativo; naquele ano, os tories obtiveram 19,6% dos votos.

Sede do Partido Conservador em Finchley

OBSERVADOR

Ainda assim, Rishi Sunak não se dá por vencido. Numa entrevista este domingo à BBC, o primeiro-ministro do Reino Unido disse acreditar numa surpresa eleitoral e na tese de que os conservadores ainda podem sair por cima. “Estou a trabalhar muito e penso que as pessoas estão a acordar para o perigo real do que um governo do Labour pode significar”, assinalou, admitindo ainda que — apesar das polémicas — está “muito orgulhoso da campanha” que tem feito.

O primeiro-ministro britânico decidiu convocar eleições antecipadas para julho, que teriam de ser marcadas apenas até 28 de janeiro de 2025. Embora as sondagens já mostrassem um panorama muito desfavorável, Rishi Sunak arriscou, amparado pelos bons resultados económicos, nomeadamente a descida da inflação e o crescimento da economia no primeiro trimestre de 2024. Os tories acreditavam que seria o seu maior trunfo eleitoral; aliás, uma das publicações nas redes sociais mais partilhadas pelos conservadores consiste numa tabela que aponta que a economia britânica foi a que mais cresceu entre o G7.

Mas este assunto acabou por ficar perdido na campanha, dado que esse crescimento da economia não foi propriamente sentido pelos consumidores. Rishi Sunak reconheceu, na entrevista à BBC, que os últimos anos foram “difíceis para todos”, mas descartou a ideia de que os britânicos viviam melhor antes do Brexit. “É completamente errado. Rejeito totalmente este tipo de narrativa”, frisou, sublinhando que o Reino Unido é um “melhor sítio para viver agora do que em 2010”.

Placard de apelo ao voto no Partido Conservador em Finchley

OBSERVADOR

Em Flitchey, perto do edifício do Partido Conservador na localidade, Helen Morris caminha sozinha. A advogada de 54 anos diz ao Observador que “está de férias” e que tem acompanhado atentamente a campanha, não fosse ela simpatizante dos conservadores — votou sempre neles — e “interessada por política”. “Sei que as coisas não estão fáceis [para o Partido Conservador], mas talvez as sondagens se enganem. Quer dizer, acho bastante provável que ganhe o Labour, mas não vai ter uma vantagem tão significativa”, prevê.

Questionada sobre a campanha de Rishi Sunak, Helen Morris concorda que poderia ter sido melhor. “Penso que o sr. Sunak é uma pessoa capaz de governar o Reino Unido, só que acho que cometeu alguns erros durante a campanha.” Com um suspiro, a advogada aponta o episódio do Dia D como o ponto mais negativo: “Acho que esse momento foi péssimo. Deu a ideia de que o sr. Sunak não se preocupa com o Reino Unido e que coloca o partido acima do país.”

Nas celebrações dos 80 anos do Dia D — o desembarque das tropas dos Aliados nas praias da Normandia durante a Segunda Guerra Mundial —, Rishi Sunak abandonou a meio a cerimónia, em que estiveram presentes o Presidente norte-americano, Joe Biden, e o Chefe de Estado francês, Emmanuel Macron, entre outros nomes. O motivo? A gravação de uma entrevista que só iria ser publicada uns dias depois. “Foi um escândalo desnecessário”, conclui Helen Morris.

As ruas com moradias bem cuidadas em Finchley, antigo círculo eleitoral de Margaret Thatcher

OBSERVADOR

Ainda recentemente, numa polémica que também afetou os rivais trabalhistas, os conservadores viram-se enredados na controvérsia das apostas em determinadas candidaturas. Em reação, Rishi Sunak disse estar “furioso” e prometeu expulsar e agir contra todos aqueles que cometeram estas práticas. Contudo, acabou por ser mais uma situação negativa para os tories, cuja campanha não dava margem para deslizes.

Mau resultado pode abrir portas à saída a Rishi Sunak

A hipótese está já a começar a ganhar destaque na imprensa britânica — e até já se fazem apostas. Se o mau resultado nas sondagens se confirmar, Rishi Sunak poderá demitir-se da liderança do Partido Conservador. E isso abrirá novamente um novo ciclo dentro dos conservadores, que, numa década, já tiveram cinco líderes: David Cameron, Theresa May, Boris Johnson, Liz Truss e o atual primeiro-ministro.

Em declarações ao Observador, Tim Bale, professor de Ciência Política na Queen Mary University of London — e especialista no Partido Conservador —, considera provável a demissão de Rishi Sunak se os maus resultados nas sondagens se confirmarem. “Se as eleições recentes provam alguma coisa, é que um líder de um partido severamente derrotado demite-se no imediato, mesmo que fique de forma interina até um substituto ser escolhido”, explica o especialista.

"Se as eleições recentes provam alguma coisa, é que um líder de um partido severamente derrotado demite-se no imediato, mesmo que fique de forma interina até um substituto ser escolhido"
Tim Bale, professor de Ciência Política na Queen Mary University of London

Neste caso, Tim Bale considera que o partido pode querer “ter tempo para escolher” quem será o sucessor de Rishi Sunak e também quem vai desempenhar a função de líder da oposição. Os conservadores, estima o professor universitário, podem adiar uma “decisão final até à conferência anual” do partido, que se realiza normalmente em outubro.

Para além de toda a importância política que a escolha de um novo líder político acarreta, o investigador acrescenta outra: os conservadores vão ter uma “grande decisão para tomar” em termos ideológicos. Com o advento do Reform de Nigel Farage e com um Partido Trabalhista que se tem aproximado do centro sob a liderança de Keir Starmer, os tories vão ter de escolher onde se querem posicionar. “Ou tentam ser um partido de direita radical populista, ou direcionam-se para o centro da política britânica, que é onde se vence normalmente as eleições”, afirma Tim Bale.

Nos corredores do Partido Conservador, segundo o Telegraph, um dos nomes falados para substituir Rishi Sunak é o da ex-ministra da Administração Interna, Suella Braverman, claramente à direita e com um discurso contra as migrações. Também Penny Mordaunt, líder da Câmara dos Comuns do Reino Unido, um pouco mais moderada, tem algumas hipóteses de vir a liderar os tories. Mas o nome que reunirá mais consenso é o de Kemi Badenoch, atual ministra para Mulheres e Igualdade, que tem como bandeira as políticas “anti-woke”.

epa10523675 Britain's Home Secretary Suella Braverman attends a cabinet meeting at Downing Street in London, Britain, 15 March 2023. British Chancellor Jeremy Hunt will announce his Spring Budget in a statement to Parliament.  EPA/NEIL HALL Cabinet meeting

Penny Mordaunt, Suella Braverman, Kemi Badenoch são três dos nomes indicados para substituir Rishi Sunak

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Judeus não estão desiludidos com Sunak, mas podem preferir Starmer

O círculo eleitoral de Finchley e Golders Green é composto por duas localidades, bastante distintas entre si. Se Finchley é mais um subúrbio de classe média-alta, Golden Green é um pouco diferente, destacando-se a elevada percentagem de judeus que habitam nesta zona de Londres. Estima-se que metade da população seja judaica, havendo cerca de 40 sinagogas e 30 escolas judaicas.

Quem anda pelas ruas de Golden Green rapidamente reconhece a população judaica, principalmente os ultraortodoxos, devido às barbas e ao uso dos típicos fatos pretos com camisas brancas e quipás ou chapéus. Ouve-se ainda hebreu e não inglês. As ruas do subúrbio têm também estabelecimentos que vendem produtos alimentares Kosher, que respeitam as leis inscritos na Tora — o livro sagrado para os judeus —, ou lojas que vendem artigos religiosos.

Outro pormenor que salta à vista de quem palmilha as ruas desta localidade no norte de Londres são os vários pósteres com fotografias dos reféns israelitas levados para a Faixa de Gaza a 7 de outubro. Existem muros preenchidos com as fotografias dos cerca de 240 reféns que foram sequestrados pelo Hamas e pela localidade estão colados autocolantes com a estrela de David com a inscrição: “O nosso amor é mais forte do que o vosso ódio.”

Judeus ortodoxos a conversarem na rua
Pósteres com fotografias dos reféns israelitas
Pósteres com fotografias dos reféns israelitas

Como parte da sua campanha, o primeiro-ministro deslocou-se este domingo a Golden Green. Esteve na sinagoga Machzike Hadath, assistiu a um evento religioso, foi a uma padaria e prometeu lutar contra o antissemitismo no Reino Unido. “O antissemitismo é uma doença e eu estou determinado a confrontá-lo. Agora, infelizmente, não o podemos curar de um dia para o outro, mas eu vou liderar um esforço a longo prazo para assegurar a segurança [dos judeus], defendendo os valores democráticos liberais”, disse Rishi Sunak, num discurso citado pelo jornal Independent.

Sobre a guerra em Israel, o chefe do executivo britânico assegurou ainda que não vai fazer “bullying a Israel” e pressionar o país a fazer concessões. “Eu nunca me irei esquecer de quem foi o culpado daqueles atos de terror horríveis [a 7 de outubro]. Eu vou continuar a estar ao lado de Israel nestes tempos difíceis. Israel merece viver em paz e segurança”, sublinhou Rishi Sunak.

Em Golden Green veem-se alguns símbolos de apoio quer aos conservadores, quer aos trabalhistas. Ao Observador, Elazar Parnas disse ter visto no domingo Rishi Sunak e sinaliza que o apoia nestas eleições. “É o candidato mais bem preparado e é aquele que defende Israel no plano internacional contra o Hamas e o Irão”, refere. Questionado sobre o que pensa do Labour (partido que teve o seu antigo líder, Jeremy Corbyn, suspenso por causa de comentários antissemitas), o homem reconhece que os trabalhistas “estão melhores” sob a liderança Keir Starmer, mas “continua a não confiar neles”.

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Rishi Sunak na sinagoga Machzike Hadath este domingo

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Atualmente, as sondagens realizadas à população judaica britânica mostram que o Partido Trabalhista é o favorito (com resultados entre os 40 e os 45%), mas o Partido Conservador não fica muito longe, com intenções de voto entre os 30 e os 35%. Os ultraortodoxos continuam, não obstante, a preferir os tories — e a ação de campanha de Rishi Sunak no domingo talvez se tenha inserido na lógica de continuar a obter o apoio desta população.

A poucos dias das eleições, o primeiro-ministro britânico continua a andar pelo país em campanha à espera de um milagre na quinta-feira aquando da divulgação dos resultados. Se tudo correr como previsto pelas sondagens, Rishi Sunak não voltará a Downing Street — e quem sabe se não será fatal para a sua carreira política.

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