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Discursos polémicos em algumas autarquias fazem soar alerta entre socialistas sobre alinhar ideias sobre como responder à investida populista.
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Discursos polémicos em algumas autarquias fazem soar alerta entre socialistas sobre alinhar ideias sobre como responder à investida populista.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Discursos polémicos em algumas autarquias fazem soar alerta entre socialistas sobre alinhar ideias sobre como responder à investida populista.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Socialistas pressionam guião para autarcas para evitar discursos parecidos com os do Chega

Dois autarcas PS com discursos que, na forma, se confundem com linha mais populista, deixaram socialistas incomodados e a pedir correção. Ou, pelo menos, um debate sobre imigração e apoios sociais.

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No maior partido da oposição não há uma teoria única sobre o que fazer com o tema ‘Chega’ e isso começa a criar alguma preocupação. Sobretudo, à medida que os socialistas ouvem alguns dos seus autarcas usarem um tipo de discurso e exemplos que mimetizam as tiradas do Chega. Temas como o aumento da imigração e a atribuição de determinados apoios sociais colocam especial pressão sobre o poder local e, no PS, sente-se a falta de uma reflexão sobre o que fazer verdadeiramente. Há quem entenda que o partido deve liderar uma abordagem humanista, outros que querem um discurso mais pragmático e ainda quem defenda um guião sobre o que fazer para não se ceder ao discurso populista.

Entre os socialistas ouvidos pelo Observador, a ideia geral é de que o espaço de discussão destes temas não deve ser deixado ao partido liderado por André Ventura, que tem, na ótica socialista, aproveitado para “criar uma perceção falsa“, tanto sobre a imigração, como sobre a atribuição de subsídios pelo Estado. Há dois dias, no jornal Público, Francisco Assis defendeu que se defina uma “linha orientadora” no partido para evitar a replicação no PS do discurso do Chega.

Assis está longe de ser o único a fazê-lo. André Pinotes Batista, que já tinha falado das iniciativas em Setúbal (o distrito cuja federação socialista lidera) para responder à pressão migratória, diz que no próximo congresso apresentará uma moção a defender diretrizes no partido para enfrentar temas sensíveis que o Chega está a tomar para si, conseguindo impor uma narrativa.

“O próximo Congresso deve aprovar uma linha de orientação para reconhecer que o aumento do stock populacional tem impacto seja pela natalidade seja pelas migrações”, diz o socialista ao Observador. “O que está errado é não haver uma diretriz“, assume o líder da federação do PS de Setúbal, que lamenta que a “discussão esteja a ser reativa e não estruturada”.

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"Os discursos tornaram-se mais vocais e com menos vergonha", assume o Eurico Brilhante Dias, que lembra a esse propósito o caminho que foi "explorado pela direita" no passado e que "não começou hoje"

Socialistas contra o erro de enfiar a cabeça na areia

Outro destacado dirigente do PS ouvido pelo Observador aponta o mesmo caminho para responder a uma outra área, a atribuição e fiscalização de apoios sociais, onde o discurso do Chega tem estado a ganhar terreno — e onde já foi seguido, na forma, por autarcas socialistas, como aconteceu no famoso caso de Ricardo Leão, em Loures e, mais recentemente, por Sónia Sanfona, em Alpiarça. Os socialistas não querem o partido a cair na tentação de repetir discursos populistas mas, ao mesmo tempo, consideram um erro enfiar a cabeça na areia em temas que afetam eleitores que vivam em determinados territórios mais pressionados.

“O discurso do PS não pode simplesmente achar que o humanismo responde a problemas concretos que se vivem nesses territórios por vezes associados a problemas de segurança ou de fraude”, diz ao Observador um dirigente do partido, que considera que “a ideia de ser exigente na atribuição de apoios sociais ou ter autoridade nos bairros municipais ou sociais é fundamental para a relação que se estabelece com eleitores que sejam trabalhadores e tenham vidas modestas ou que vivam nesses territórios”.

“O PS não pode ignorar esta dimensão”, afirma o mesmo socialista, acrescentando, ao mesmo tempo, que concorda com a ideia de Francisco Assis e até propõe um caminho a Pedro Nuno Santos: “Encarregar a Associação Nacional dos Autarcas do PS de definir algumas recomendações que tivessem solidez jurídica e que pudesse representar um sinal de preocupação.”

Para este socialista, seria uma forma de o PS “liderar o debate em vez de ficar a discutir o caso A ou B”, diz, referindo-se à celeuma interna levantada pelas declarações de Leão sobre o despejo de inquilinos de prédios municipais, em Loures, mas também às recente declarações de Sanfona, presidente da Câmara de Alpiarça, sobre a retirada de apoios sociais a crianças cujos pais apresentem sinais exteriores de riqueza.

Em declarações ao Observador, Francisco César, deputado socialista, dirigente do partido e próximo de Pedro Nuno Santos, “ser de esquerda” não pode ser sinónimo de “não ter rigor”. Uma coisa é ser rigoroso, outra coisa “é penalizar quem efetivamente não tem culpa nenhuma” do comportamento dos familiares — como pareceu sugerir Ricardo Leão, em Loures, ou Sónia Sanfona, em Alpiarça, embora o deputado não se refira a estes dois casos em concreto, preferindo usar sempre o exemplo que veio dos Açores e envolve PSD e Chega.

Há dois dias, no jornal Público, Francisco Assis defendeu que se defina uma "linha orientadora" no partido para evitar a replicação no PS do discurso do Chega. Francisco Assis está longe de ser o único a fazê-lo

Francisco César pede que haja apenas “bom senso”

Francisco César dá o exemplo do que aconteceu nos Açores, onde lidera a estrutura socialista. Em julho, o parlamento regional aprovou uma resolução (com os votos de Chega, PSD, CDS e PPM) para priorizar, no acesso a creches gratuitas, as crianças cujos pais têm emprego. “A discussão dos partidos democráticos não deve ser fazer com que as crianças sejam penalizadas, mas como fazer para que as regras sejam melhor cumpridas”, aponta. Quanto à possível necessidade de haver guião comum para orientar dirigentes e autarcas socialistas, César relativiza e defende apenas que haja “bom senso“.

Nem todos concordam, naturalmente. André Pinotes Batista, por exemplo, decidiu não esperar pela direção do partido e já implementou, no seu distrito (onde o PS gere seis das 13 câmaras), uma Agenda para as Migrações Humanistas, coordenada pela antiga secretária de Estado da Proteção Civil, Patrícia Gaspar, e o atual autarca de Sines, Nuno Mascarenhas. O objetivo é promover programas de inclusão de jovens imigrantes em associações locais e desportivas, por exemplo.

O socialista defende que há uma “perceção de insegurança que tem sido explorada pelo Chega”, que está relacionada com a imigração e que, argumenta, é preciso desmontar — antes que a perceção se torne ainda mais difícil de combater e motive um sentimento de rejeição generalizado. “O aumento do fluxo migratório traz pressão sobre o estado social. Sem uma intervenção humanista junto dessas populações, e se nada for feito, a longo prazo vai mesmo haver problemas“, considera.

Outros socialistas defendem uma atitude discursiva, pelo menos, mais assertiva. “Exigência perante a fraude”, pede um dirigente do partido já citado, não excluindo, por exemplo, que o PS entre mesmo por outros debates como “aumentar os instrumentos que promovem a segurança, como a videovigilância, por exemplo”. “Não vejo porque é que o PS deve ser contra”, argumenta o mesmo socialista, lamentando os “imensos traumas e complexos” que existem no partido.

O discurso do Chega tem estado a ganhar terreno — e já foi seguido, na forma, por autarcas socialistas, como aconteceu no famoso caso de Ricardo Leão, em Loures, e, mais recentemente, com Sónia Sanfona, em Alpiarça. Os socialistas não querem o partido a cair na tentação de repetir discursos populistas

“Os autarcas do PS não precisam de linhas orientadoras”

Pedro Ribeiro, presidente da Associação Nacional de Autarcas do Partido Socialista (ANA) e presidente da Câmara Municipal de Almeirim, contraria a posição de Francisco Assis e diz que “os autarcas do PS não precisam de linhas orientadoras”, aconselhando o eurodeputado a deixar o guião que quer aplicar “em Bruxelas”. “Os autarcas socialistas não precisam de linhas orientadoras. Temos perfeitamente bem definidas as linhas orientadoras da nossa ação”, diz ao Observador. Pedro Ribeiro garante que os autarcas do PS sempre defenderam que “há direitos e há deveres” e diz que a ideia de que não falam de “apoios sociais, penalizações e imigração é uma falácia“.

O Observador questionou oficialmente a direção do PS sobre se existe ou não a necessidade de criar um guião para os autarcas, mas foi remetido para a posição oficial do partido quando confrontado com as declarações de Sónia Sanfona. “Os critérios de atribuição de apoios e prestações sociais são definidos na lei, uniformes para todo o território nacional e com instrumentos de verificação de rendimentos dos agregados. As autarquias locais executam os que são da sua competência, não lhes cabendo criar critérios adicionais. Naturalmente, podem e devem fiscalizar o cumprimento da lei em vigor”, informou a direção nacional do PS.

Numa entrevista ao Observador, Porfírio Silva, antigo deputado e diretor do Ação Socialista, afasta a ideia de que seja preciso um guião para os autarcas e dirigentes do partido para lidar com temas que estão a ser explorados, sobretudo, pelo Chega. Mas não deixa de notar que o partido não pode “mimetizar a extrema-direita” e tem de “aprofundar o debate acerca das melhores respostas a dar aos problemas que cada território tem”. “Esse debate nunca foi interrompido e nunca é interrompido. Está em curso e é partilhado entre todos aqueles que têm as responsabilidades”, fez questão de sublinhar o socialista.

Também ao Observador, Eurico Brilhante Dias mostrou-se um bocadinho mais preocupado com o discurso que vai sendo assumido por algumas figuras do partido, sugerindo que o PS tem de “refletir” sobre o que fazer para encontrar um equilíbrio virtuoso entre defender o “combate às fraudes” e a importância das “prestações sociais” no combate à pobreza e à exclusão. O deputado e antigo líder parlamentar socialista assume que a questão tem trazido um desafio maior aos autarcas, que “sentem mais pressão nas assembleias municipais e nas reuniões camarárias e muitas vezes são tentados a responder”.

“Os discursos tornaram-se mais vocais e com menos vergonha“, assume o Brilhante Dias, que lembra a esse propósito o caminho que foi “explorado pela direita” no passado e que “não começou hoje” — Paulo Portas já fazia campanhas eleitorais apoiadas no combate à necessidade de apertar a fiscalização ao então rendimento mínimo garantido, por exemplo. “Há uma certa pressão sobre a ‘subsidiodependência’ e a construção de uma discussão que coloca os pobres contra os muito pobres”, aponta.

Pedro Ribeiro, presidente da Associação Nacional de Autarcas do Partido Socialista (ANA) e presidente da Câmara Municipal de Almeirim, contraria a posição de Francisco Assis e diz que "os autarcas do PS não precisam de linhas orientadoras", aconselhando o eurodeputado a deixar o guião que quer aplicar "em Bruxelas". "Os autarcas socialistas não precisam de linhas orientadoras. Temos perfeitamente bem definidas as linhas orientadoras da nossa ação", diz ao Observador

“Alguma esquerda vê fascistas em todo o lado”

Pedro Ribeiro, presidente da Câmara de Almeirim, reconhece que “os autarcas, por lidarem mais diretamente com as pessoas, acabam por ser confrontados com coisas que ao legislador nunca lhe passou pela cabeça”. Nos dois casos mais polémicos — o de Leão e o de Sanfona —, estava em causa um apertar de regras, através da alteração do regulamento municipal, e eventuais consequências para quem comete irregularidades. Ribeiro desafia então aqueles que, a nível nacional, são contra este tipo de competências, que o assumam. “Se há quem diga que o regulamento não pode ser mais restritivo, então que se faça este caminho”, atira.

A grande dificuldade é encontrar um equilíbrio entre não permitir que o partido se deixe confundir com o Chega e, ao mesmo tempo, não deixar que essa questão limite a ação do partido, ao ponto de, pelo pânico de ser confundido com o adversário, ficar arredado de todo e qualquer debate. “Não pode ser tudo colocado no mesmo saco”, ouve-se no PS, enquanto se desabafa: “Alguma esquerda vê fascistas em todo o lado.”

A estratégia passa por encontrar uma forma de liderar o debate sobre temas sensíveis sem cometer erro de copiar o Chega, pelo menos, na forma. “Não queremos mimetizar aquilo que a extrema-direita faz”, começou por defender Porfírio Silva na já referida entrevista ao Observador. “A extrema-direita fala de uma certa maneira sobre problemas, mas o que nos interessa não é falar sobre os problemas, é resolver os problemas.”

O socialista admitiu também que é importante que o partido não se deixe confundir “em momento algum” com aqueles que “não fazem ideia nenhuma” de como é que se resolve os problemas, “que nunca fizeram isso” e “que não estão nada interessados nisso”. “Só estão interessados em explorar o ruído acerca disso. Não podemos nunca dar essa oportunidade a esses oportunistas que andam por aí”, considera.

E, nesse sentido, há uma linha que o PS não pode ultrapassar, aponta um dirigente socialista já citado: o partido de Ventura “identifica nacionalidade e etnias” e discrimina em função disso; o PS nunca pode fazê-lo. Pedro Ribeiro vai pelo mesmo caminho e diz que “a diferença dos populistas de extrema-direita e os socialistas é que os socialistas entendem que todos os que precisam devem ter apoios, enquanto a extrema-direita considera que há determinados grupos que não deviam ter”.

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