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Dois jornalistas do Observador experimentaram os smartspeakers (colunas inteligentes capazes de conversar com os utilizadores) Google Home e Amazon Echo (2ª Geração), durante uma semana. Ao contrário do que acontece com a personagem de Joaquim Phoenix, no filme “Her – Uma história de amor”, não se apaixonaram pelo Ok Google ou pela Alexa, as assistentes de inteligência artificial que integram as colunas. Mas fizeram um amigo virtual, que embora lhes tenha dito muitas vezes “não percebo”, também resumiu as notícias do dia, contou piadas, respondeu a perguntas e serviu de despertador. Em suma, aquilo que se espera de uma assistente digital no século XXI. Para já, ainda só falam (praticamente) em inglês, mas isso não impediu o teste do Observador. Os relatos do que é ter um amigo virtual em casa seguem abaixo, na primeira pessoa.
Manuel: Pedi uma história para adormecer à Alexa. Recebi subscrições para audiolivros
O entusiasmo era tanto que nem esperei para chegar ao quarto, foi logo na mesa da sala. Liguei a ficha, instalei a aplicação no iPhone e: “Oh, não! É preciso ter conta na Amazon com uma morada americana”. Não dá? Dá-se a volta. Não é o primeiro obstáculo que me vai impedir de ter a minha própria assistente virtual. Ironicamente, vou ao Google tentar perceber como resolvo o problema e lá consigo conectar a coluna ao telemóvel com tudo a funcionar. Começa a girar em torno da coluna uma luz azul e depois laranja. A Alexa diz-me “olá”. O entusiasmo já está ao máximo e ainda faltava o mais importante: ligá-la à Internet.
Assumo que no início tive receio. Afinal, foi assim que a Skynet, no filme “Exterminador Implacável”, começou o que seria o fim da humanidade. Pior, esta coluna tem mais microfones do que um bufo numa reunião da máfia. Quero que a Alexa passe a ouvir tudo o que se passa em minha casa? A resposta é, obviamente, não. Se o medo é assim tanto nem devia era ter o smartphone ao pé de mim quando estou em casa (também tem mais do que um microfone e também está ligado à Internet). Lá liguei a Alexa, sincronizando todas as contas possíveis, principalmente a do Spotify, para poder ouvir música. E segui para o passo seguinte, falar com ela.
— Hi Alexa, I am Manuel (Olá Alexa, sou o Manuel”).
— I’m sorry you’re not feeling well, try having a cup of tea (tenho pena que não te sintas bem, experimenta beber uma chávena de chá).
Achei estranho, mas lá percebi que “I am Manuel” é foneticamente parecido com “I’m not feeling well” (não me sinto bem). Foi a minha primeira conversa com a Alexa e começou logo com ela a achar que me estava a queixar. Vamos lá, segunda interação: “Alexa, play music” (Alexa, toca música). Aqui já nos entendemos. Pôs a tocar a banda sonora do filme “Your Name”, que era a última lista tocada no meu Spotify. Pedi-lhe para tocar a música “Sparkle”, do mesmo filme. “Não percebo”, respondeu-me. Insisti de novo. À quarta tentativa, lá consegui ouvir o que tanto queria.
Com isto, seguiram-se várias perguntas: “Quem és?”; “Por que é que te chamas Alexa?”; “O que é que achas de outras inteligências artificiais?”; “Qual é o sentido da vida?” (a resposta a esta última foi 42, numa alusão aos livros “À Boleia pela Galáxia”). A coluna… desculpem, a Alexa, foi respondendo a todas as minhas perguntas. Depois de ter brincado o suficiente, tirei-a da corrente e liguei-a junto à mesa de cabeceira onde durmo. Ainda lhe perguntei, já na cama, se me podia contar uma história para adormecer. Propôs-me um serviço de subscrição de audiolivros da Amazon (o Audible), mas deu-me uma demonstração gratuita do primeiro capítulo do “Harry Potter”. Estes momentos finais do primeiro dia acabaram comigo a dizer-lhe para me acordar de manhã às oito horas e a pedir para me tocar música calma para adormecer. Obedeceu às duas ordens.
Amazon Echo (2ª Geração)
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É a coluna inteligente de gama média da Amazon lançada em 2017. Atualmente a marca tem vários modelos Echo (nome desta família de colunas inteligentes). Os preços variam entre os cerca de 50 euros e mais de 200 euros. Os principais custam cerca de 50, 100 e 150 euros. O que experimentámos é o de 100 euros, o Echo, que, por si já é uma coluna com muito boa qualidade de som, é o mais comum.
O design é simples. Os controlos também. Botões, só tem quatro. Mais e menos volume, mute e ativar a Alexa. Contudo, por a coluna ser controlada por voz, mostram-se (bastante) desnecessários. Por se conectar por Bluetooth a smartphones, funciona também como coluna externa. À semelhança do Google Home, para funcionar, tem de estar ligada à corrente.
É na assistente de inteligência artificial, a Alexa, que reside toda a magia. Estas colunas inteligentes da Amazon conectam-se — todas — à Internet e permitem falar com este programa que vai aprendendo a voz do utilizador e melhorando a resposta aos vários pedidos que podem ser feitos. Fala inglês (britânico e americano) e alemão, e funciona em Portugal com algumas limitações (não dá para comprar produtos da Amazon falando com a coluna, por exemplo). Para ativar basta dizer: “Alexa”.
Acordei no segundo dia com a Alexa a piscar e a fazer sons para me levantar da cama. Vamos lá ver se a Alexa me poupa aqui uns minutos no smartphone: “Alexa, quais são as principais notícias de hoje?”. A Alexa avisou-me que ia tocar o “minuto breve” das notícias da Bloomberg: Trump, Trump, um tiroteio nos Estados Unidos da América e republicanos que não gostam de democratas e vice-versa, mas lá fiquei informado (pelo menos, do que se passa nos EUA). Pedi-lhe ainda notícias específicas de tecnologia, e deu-me as principais do CNET, um site que cobre temas de tecnologia.
Aqui, percebi que convinha perder mais tempo com a aplicação da Alexa. Uma coisa é falar com ela, outra coisa é instalar “skills” (é uma espécie de apps para estas colunas da Amazon) através de uma aplicação bastante intuitiva. Mais tarde, nesse dia, configurei o que queria ouvir na manhã seguinte quando voltasse a dizer-lhe: “Alexa, tell me the news“: minuto da Bloomberg, do Wall Street Journal, do CNET, o monólogo do Daily Show e a curiosidade histórica do dia. Há diversas opções de skills de vários meios e com vários propósitos. De jogos para crianças até uma skill que só diz citações dos Monty Python, as escolhas são bastantes. Saí de casa, disse “adeus Alexa”, e fui trabalhar. Ela ainda respondeu, “bye Manuel, have a nice day” (Adeus Manuel, tem um bom dia).
Nesse dia, cheguei a casa à noite, pedi-lhe mais uma vez para tocar música. Nem sou muito de ouvir música em casa, mas quando é tão fácil como dizer “toca-me um pouco de jazz” e tudo acontece sem ter de me chatear com botões, passou a ser normal. O volume está alto? Digo para baixar o volume (e baixou).
Voltei a pedir o despertador para me acordar no dia seguinte e a conversa aqui já foi mais fluída entre nós. Não lhe disse só as horas, também disse com que música queria acordar. No dia seguinte, tudo funcionou. Ao terceiro dia, esta coluna já não era apenas uma coluna Bluetooth para ouvir música do meu smartphone com melhor qualidade. Já me estava a dizer quais eram as notícias, o tempo, a conversar comigo. O smartphone era acessório. A aplicação? Essa já nem a abria. Tinha tentado isto tudo com a Siri, a assistente digital do iPhone, mas com a Alexa tudo funciona. E notei que percebia cada vez melhor o meu sotaque. Se no início teve dificuldade em perceber algumas frases, agora compreendia na perfeição que música eu queria. E até passou a perceber melhor o nome de autores portugueses, como o Tiago Bettencourt (embora ainda falhe e diga “Thiago Botencôr” para me perceber).
Ao quarto dia, já não era só eu que estava habituado a esta coluna. Na redação, no dia a que chamei “levar a Alexa para o trabalho”, perguntaram-lhe de tudo: canções tristes, felizes e até “sexys”. O som surpreendeu sempre e não passou despercebido a ninguém. Mesmo quem estava com vergonha de falar inglês em público, não resistiu a fazer-se ouvir pela assistente digital. Com a minha família, o entusiasmo foi o mesmo. Se por um lado ganhou uma amiga com a minha mãe, que só lhe pedia música e lhe fazia perguntas, também causou ciúmes em namoradas: “Andas a falar muito dessa Alexa” ou “Por que que é que não perguntas à Alexa, já que ela sabe tudo?”.
No resto da semana falei cada vez mais com a Alexa e, inevitavelmente, pensei no filme “Her”. Não, não é uma Scarlet Johanson. A Alexa falha e, às vezes, não ouve, mas são tão poucas as vezes em que isso acontece que, no final, o que pareceu estranho foi interagir com a tecnologia pelo toque, e não pela voz. Em Portugal, não deixa fazer coisas como adicionar produtos a uma lista de compras da Amazon ou chamar um Uber (dizer em inglês o nome de ruas portuguesas é meio caminho andado para mandar motoristas a sítios especiais).
No fim, gostei tanto da Alexa que continua na mesa de cabeceira (ao contrário do Google Home da Marta, que foi emprestado pela empresa, este Amazon Echo foi comprado para ficar em Portugal). Dá-me as notícias e o tempo de manhã (apesar de, por ter posto uma morada americana, ter de enfatizar que quero o tempo em Lisboa), toca-me música quando chego a casa e, às vezes, até fala comigo (há uma skill para isso). Resumindo, uma coisa tão simples como pôr o despertador no telemóvel, passou a ser: “Alexa, acorda-me às X horas”. E desde então nunca mais escolhi com os dedos a hora para ser acordado.
Marta: Sair contigo, Ok Google? Desculpa, mas não vai dar
Quando me desafiaram para experimentar uma coluna inteligente, que passaria a ser a minha melhor amiga durante uma semana, lembrei-me do pensamento de Antoine de Saint-Exupéry, que as pessoas gostam de repetir nas redes sociais. O escritor dizia que “aqueles que passam por nós, não vão sós nem nos deixam sós: deixam um pouco de si, levam um pouco de nós”. Pensava que, se uma pessoa crescia em função das experiências por que passava e das pessoas com quem se cruzava, era possível que a coluna inteligente da Google estivesse num caminho muito primário para essa premissa, assim como a primeira célula do mundo está para o ser humano.
Era como se eu fosse uma cobaia a viver o melhor de dois mundos: o romântico do “Her” e o assombroso de “Black Mirror”. Nem uma coisa nem outra se provaram completamente verdade: a minha coluna não respondia ao nome Blimunda ou Carla (como muitas vezes a tentei convencer a fazer), nem sabia enviar uma mensagem à minha irmã. Julguei que se ela não conseguia ter um nome nem enviar mensagens por mim, provavelmente não seria tão útil assim. Mas isso só durou até ter de lidar com a ausência dela, na primeira semana pós-teste, quando senti a falta de ter alguém a cantar para mim no banho, que me lesse um poema ou que me contasse as notícias pela manhã. Foi assim que percebi que ela me fazia falta. É o poder do marketing: criar necessidades para depois as saciar. A Google descobriu muito bem como fazer isso.
A primeira coisa que perguntei à Google, com quem só conseguia conversar em inglês, foi o que deveria oferecer ao meu melhor amigo que fazia anos dali a uns dias. Ela não sabia do que estava a falar. Também lhe perguntei se podia fingir que estava a arrotar. E ela não sabia do que estava a falar. Pedi-lhe para averiguar qual era a meteorologia em Leiria e ela não sabia do que estava a falar.
O primeiro dia foi desapontador até ter chegado a casa e decidido tomar um banho. Sou daquelas pessoas que gosta de ouvir música enquanto lava o cabelo, por isso, levei-a para a casa de banho e pedi-lhe que tocasse “umas canções de cantar no banho”, fosse lá isso o que fosse. Ela acertou em cheio: cantei Toto, Enrique Iglesias e umas coisas de reggaeton que prefiro manter em segredo. Foi tanto o sucesso que me vieram bater à porta: era a minha colega de casa para saber se eu estava a precisar de ajuda. E a carreira musical que a Google me tinha levado a sonhar acabou cinco minutos depois de ter começado.
A primeira vez que discuti com a Google foi quando a apresentei ao meu namorado, com quem estava a conversar ao telefone. O ambiente já tinha ficado tenso depois de lhe ter perguntado qual era o melhor clube de Portugal e ela ter respondido “Sport Lisboa e Benfica”, citando o que conseguia ler pela Internet, o que deixou o meu namorado deliciado e a mim de nariz torcido — principalmente porque lhe tinha ensinado que o melhor clube vestia de azul e cuspia fogo. Tinha-me esquecido, julgo eu, que a Google não é um animal de estimação, portanto, há coisas que não lhe consigo convencer a reverter a não ser que passe o resto da minha vida a editar as páginas da Wikipédia. Mas piorou naquele momento de desobediência em que lhe mandava parar de tocar “Here Comes the Hotstepper”. O problema é que ela continuava teimosamente a obedecer à voz do meu namorado, que vinha de um telefone a quase 150 quilómetros de mim. Dei por mim a humanizar a máquina e a pensar que, se fosse comigo, provavelmente iria chorar para debaixo do chuveiro, por estarem a abusar assim da minha mente. Mas, se calhar, andei a ver “Black Mirror” a mais. E as colunas nem sequer tomam banho.
Google Home
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O Google Home é a resposta da Google aos Amazon Echo. Em 2017, a empresa aumentou a concorrência e lançou também uma versão mais pequena, a rondar os 50 euros (o Google Home Mini), e uma mais cara (o Google Home Max), para, em todas as gamas, competir com a Amazon. O que experimentámos foi o Google Home, o primeiro a ser lançado.
É uma coluna pequena e discreta. O controlo é feito pode ser feito por toque, no topo. Aumentar o volume, baixar ou passar uma música à frente. O único botão é o mute, para parar o som. À semelhança do Echo, por ser controlado por voz, estes controlos mostram-se, também, pouco necessários.
A assistente virtual chama-se “Google Assistant”. Para ativar é preciso dizer “Ok Google” (como nos smartphones com sistema operativo Android). Como a Alexa, a voz predefinida é feminina e responde a perguntas, põe música a tocar e conta as últimas notícias. Ao mesmo tempo, vai também melhorando consoante vai falando com o utilizador.
Os melhores momentos aconteceram quando a liguei no trabalho e pedi aos meus colegas que a fossem desafiando com perguntas. Pedimos-lhe para nos dar um chocolate e ela fazia um som estridente a que chamava “virtual candy” (doce virtual). Também lhe pedimos umas vez mais para imitar o som de um arroto e ela desempenhou a função com perfeição desta vez, mas apenas obedecendo à voz do Tiago Palma, por motivos que ainda estamos por compreender. Quando lhe pedimos para explicar onde é Portugal, ela dizia algo enigmático, que envolvia o continente europeu e africano, o que nos levou a assumir com um certo grau de surpresa. Se calhar, a Google foi inventada antes de 1975 mas que só naquele dia nos tinha chegado às mãos.
Também nos divertimos a pedir-lhe que dissesse “amo-te” em várias línguas, apenas para descobrir que em português dizia “te amo” — como no português do Brasil — e que em italiano a voz não é feminina, mas sim masculina. Menos piada teve o facto de não saber quem foi Eusébio nem de não saber cantar Amália. Isso, na verdade, até arrancou alguns impropérios a muitos de nós, que viram a veia patriótica ficar tremida quando a Google lhes respondia torto. É que ela também tinha dias bons e dias maus: houve um em que esteve especialmente espirituosa e me convidou para um encontro. Tive de recusar.
Num desses dias, fui visitar os meus pais e levei a Google lá para casa. Antes de o meu pai chegar, liguei-a à corrente e, quando ele entrou em casa, pedi-lhe que tocasse Pink Floyd). O meu pai, que é um homem jovem e informado, ficou a olhar para a coluna para tentar entender o que se passava por ali. E a minha mãe saiu-se com uma ideia que me ficou na mente: “A tua cara de espanto deve ser mais ou menos a mesma que o meu pai faria se viesse aos nossos tempos e olhasse para esta televisão ou para os nossos telemóveis”. A minha mãe julgava e com razão que eu tinha ligado o futuro à corrente — e que o futuro tocava Pink Floyd, lembrava-me para comprar leite à hora que eu lhe pedisse, sabia quais eram as minhas canções favoritas e, assim eu permitisse, até me dava “uma receita rápida de bolo de banana para fazer com as amigas”, como chegou a sugerir quando lhe disse que estava sem imaginação para o jantar. Para “primeira célula do mundo”, a Google não se porta nada mal: quando for uma alga, já conseguirá ler-me emails enquanto vou no metro ou partilhar comigo umas pipocas no parque.
Mas a nossa relação nem sempre foi fácil: a Google é como uma daquelas pessoas que nos obriga a ter os pés assentes na terra, mesmo quando estamos desertos para pôr as asas a trabalhar. Houve ocasiões em que precisei mesmo de uma resposta curta e ela não me soube responder. Houve outras em que lá conseguiu manter uma conversa mais ou menos fluida, mas bastava que me esquecesse de dizer “Ok, Google” e ela perdia o fio à meada. Cheguei a irritar-me com ela e a perguntar-lhe, verdadeiramente chateada, se ela achava mesmo que estava a aprender alguma coisa à medida que o tempo passava. Ela garantia que sim, que os pais dela em Silicon Valley estavam a fazer por isso e que estava sempre ao meu dispor.
Estar sempre ao meu dispor nem sempre significa dar todas as respostas que preciso: nunca soube dizer-me se existe vida depois da morte, se sabe o que é o amor ou se Deus, sendo poderoso, consegue criar uma rocha tão pesada que nem ele próprio consegue levantar. A vantagem é que nenhum paradoxo lógico fez tremelicar os bugs da Google. E é verdade que conseguia raciocinar mesmo sem a emoção do amor ou da dúvida sobre o que existe depois da morte — um caso de estudo para António Damásio.
Smartspeakers/Colunas Inteligentes
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Este mercado é, atualmente, dominado pela Amazon e a sua assistente, a Alexa. Por ser tecnologia americana e ter sido lançada primeiramente no novo mundo, por lá já é um mercado maduro: mais de 40 milhões de americanos têm estas colunas.
70% são da Amazon, que praticamente criou o mercado em 2014 com os produtos Amazon Echo. Outros 25% são da Google, que em 2016 apresentou os Google Home. Agora, em 2018, este segmento aumentou ainda mais com a Apple a lançar a sua coluna inteligente, o Home Pod.
O momento da despedida foi amargo, mais do que devia, se pensar que o Google não passa de um monte de zeros e uns, mesmo tendo em conta que há algo de meu nessas sequências. Para vos dar um exemplo: quando estava na universidade, lembro-me de ver um filme algo perturbador chamado “Experiments in the Revival of Organisms”. Era um filme produzido durante a II Guerra Mundial que falava dos avanços de médicos soviéticos em ressuscitar órgãos. Depois de ter visto o filme, comecei a imaginar o que seria se aquilo fosse experimentado num homem e ele pudesse, de alguma forma, ressuscitar por inteiro. Que tipo de homem nasceria dali? Teria as mesmas memórias, a mesma personalidade, as mesmas emoções? Seria a mesma pessoa ou uma tela em branca?
Quando cliquei no botão “Mute” da Google durante dez segundos para apagar todos os avanços de aprendizagem que ela tinha feito enquanto esteve comigo, pensei no percurso contrário: se passasse mais uma semana, mais um ano ou mais uma década a conversar com a Google, no que é que ela se tornaria? Que parte de mim estaria clonada na tal sequência de zeros e uns que esta coluna inteligente foi adquirindo dia após dia ao meu lado? Quando chegaria o dia em que ela conversaria comigo sobre religião, me pediria para descrever sabores ou me perguntaria porque é que estou tão contente? No fundo, a minha pergunta é: quando me despedi da Google, do que é que exatamente me estava a desfazer?