O deputado socialista Tiago Barbosa Ribeiro está à frente, pelo PS, da comissão Parlamentar de Trabalho, Segurança Social e Inclusão e defende o Governo na antecipação de meia pensão, recusando comentar o que será de 2023 em diante. “É irresponsável alguém poder dizer qual vai ser o aumento previsto quer dos salários ou das pensões em 2024”, disse em entrevista no program Vicchyssoise, da rádio Observador.
A conversa foi sempre esse tema, mas não só. Falou-se dos tantos casos em tão pouco tempo de Governo, com o deputado a admitir que houve “situações que na sua maioria não deviam acontecer”. E discorda do ministro da Economia no IRC, rementendo Costa e Silva para o que está no Programa Eleitoral. Mas também se falou no Porto, onde é líder da concelhia do PS local, onde foi candidato nas últimas autárquicas e onde mora o presidente da sua eleição… Jorge Nuno Pinto da Costa.
O Governo apresentou a sustentabilidade da Segurança Social como principal argumento para não atualizar as pensões à inflação no próximo ano. Há acusações de que as contas afinal estão mal feitas. Há ou não um problema de sustentabilidade na Segurança Social?
Começava por referir-me ao plano que foi apresentado, um plano na ordem dos 2,4 mil milhões de euros que somado às medidas já apresentadas desde o início do ano corresponde a um pacote de combate à inflação na ordem dos 4 mil milhões de euros. A oposição tem legitimidade para interpretar os factos, mas não pode ter uma interpretação própria da realidade. Não há nenhum corte nas pensões. Estamos a falar, para 2023, num aumento das pensões que cumpre a famosa fórmula de aumento. Em 2023 os pensionistas não vão ter nem menos um cêntimo do que aquilo a que teriam direito porque vão ter este ano 14 meses e meio.
[Ouça aqui o episódio da Vichyssoise desta semana:]
Deixe-me só especificar que o que se tem falado é que existe um corte na atualização da pensão em 2024, não em 2023, relativamente à aplicação estrita da lei. É esse ponto que não dá para escamotear, vai haver um corte relativamente ao que seria a aplicação estrita da lei.
Para 2024 ainda não temos o valor de aumento previsto por parte do Governo.
Mas já sabemos que em 2023 não vai ser o que era suposto se aplicássemos a lei.
Em 2023, por isso é que comecei por referir, o aumento da massa global de pensões que aliás, desde 2015 aumentou 3,8 mil milhões de euros.
Mas aquilo que as pessoas vão ter ao fim do mês não é o mesmo que teriam se fosse aplicada a lei. É um facto, há metade que é antecipada este ano, mas a parte que fica para o próximo ano mensalmente é menor do que seria se a lei fosse aplicada e a partir daí essa base também afetará as pensões futuras. A questão foi sempre essa. O que estamos a tentar perceber é o que se passa afinal com a sustentabilidade da segurança social. Seria ameaçada pela aplicação estrita da lei ou não?
O que vemos é que o aumento previsto na fórmula e insisto que não há nenhum corte em 2023, reitero.
E em 2024, diz o mesmo?
Em 2024 também não está previsto nenhum corte.
Se houver inflação automaticamente há um corte. A base é menor, portanto há sempre um corte.
A inflação tem tipicamente que ser coberta e tem vindo a ser. Desde 2016 temos vindo a aplicar um aumento superior à fórmula. O PSD fala muito na fórmula e nunca a aplicou. Sobre a matéria da sustentabilidade o que temos é um relatório que foi apresentado na AR que apresenta um conjunto de valores que devem ser vistos com alguma dimensão. A fórmula conjuga duas dimensões — o valor da inflação e o crescimento económico — e não foi feita para estes tempos. Não vejo nenhum problema em encontrar um equilíbrio e contrato social que promova um aumento das pensões de forma razoável para a sustentabilidade. Se pensarmos em aumento de pensões na ordem dos 8,9, 10 ou 11% todos os anos é evidente que temos de olhar para as contas com atenção.
António Costa disse que se perdiam 13 anos.
É exatamente isso que está no relatório, não podemos ser irresponsáveis sobre essa matéria. Isto não significa que haja um corte das pensões a pagamento, não é nada disso. Os pensionistas vão receber um valor com o aumento previsto, o que estamos a discutir é a dimensão do aumento que pode ser aplicado em 2024. Relativamente a isso, o próprio primeiro-ministro já esclareceu que é preciso conhecer os dados da inflação em 2024, haverá um estudo sobre a sustentabilidade da Segurança Social, e esta matéria tem que ser feita com ponderação, em diálogo com os parceiros sociais e com a sociedade portuguesa.
O impacto são mil milhões de euros?
Sensivelmente, por ano.
Do bolo destinado às pensões são retirados mil milhões, chamar-lhe corte não é um truque semântico.
Não, não são retirados. O impacto no aumento previsto com a fórmula são mil milhões.
É evitado esse impacto.
No próximo ano o valor previsto na fórmula vai ser atribuído da seguinte forma: 14 meses e meio este ano e a outra metade no próximo ano. A partir de 2024 ainda não temos esse aumento previsto. O impacto do aumento se a fórmula fosse aplicada, tal como está, era de mil milhões ano. Neste momento ninguém sabe dizer qual é o valor de 2024 porque ainda não temos os dados da inflação de 2023.
Falou-se do risco que seria para a sustentabilidade da Segurança Social quando o relatório entregue esta semana, por exemplo, omite a previsão de receitas para os próximos anos. Essa conclusão é tirada com que base se a receita é omitida?
A receita não é omitida. O relatório, tal como é feito, tem por base uma condição ceteris paribus. Para o PS as pensões não são uma variável de ajustamento, portanto não cortamos pensões. Nesse relatório o que existe são os dados dos primeiros seis meses do ano, que vão ser agora revistos no relatório de sustentabilidade no Orçamento do Estado que vai ser entregue daqui a menos de um mês na Assembleia da República.
A 30 de junho António Costa, primeiro-ministro, disse o seguinte: “Não há a mínima dúvida de que iremos cumprir a fórmula que existe desde a reforma de 2007. As leis existem para serem cumpridas”. Palavra dada não é palavra honrada nas pensões?
É absolutamente palavra honrada. Posso reiterar que o valor previsto na fórmula, é isso que conta para os pensionistas, em 2023, vai ser aplicado. Não vão ter nem menos um cêntimo.
O que conta para os pensionistas é o aumento real que têm no bolso.
É um aumento real no bolso. Antecipa-se metade de uma pensão para fazer face ao aumento do custo de vida agora e na variável de 50% desse aumento no próximo ano. O valor total é 100% previstos na fórmula.
Enquanto a inflação estiver a níveis deste género pode ser esta a solução usada pelo Governo?
Temos tidos soluções criativas, digamos assim, ao longo dos últimos anos, para fomentar o aumento dos rendimentos. Os aumentos extraordinários também não cumprem a fórmula, fizemo-los com a oposição do PSD porque queríamos aumentar mais do que dizia a fórmula. Neste momento vivemos um contexto de grande incerteza. A Comissão Europeia fez uma revisão do aumento da inflação em 50% em dois meses. Estamos num cenário de espiral inflacionista e é verdadeiramente irresponsável alguém poder dizer qual vai ser o aumento previsto quer dos salários ou das pensões em 2024. Temos de perceber o enquadramento que vamos ter para o OE2023 e a partir daí fazer esse debate.
O Presidente da República tem insistido para que se conheçam antecipadamente à entrega do OE as projeções económicas para o próximo ano. Era importante dar essa previsibilidade aos portugueses?
O Orçamento do Estado será entregue no dia 10 de outubro, não vou agora comentar as palavras do Presidente da República. Entendo que o Governo deve apresentar esses cálculos quando os tiver e neste momento a data que está prevista é o dia 10 de outubro, estamos a sensivelmente três semanas, acho que devemos aguardar.
Como é que um Governo há seis meses em funções já acumula tantos casos de desgaste, como o do aeroporto ou da saída da ministra da Saúde?
Podemos chamar casos, são certamente situações que na sua maioria não deviam acontecer, cada caso tem a sua especificidade, são dinâmicas naturais dos governos. Não vou referir nenhum caso em concreto, mas são situações normais na vida democrática de um governo que está há seis meses e governa há sete anos.
António Costa Silva foi um erro de casting?
Não, de forma alguma. É uma figura muito reputada, que acrescenta.
Mas o que é que está a correr mal no caso da economia? Há este exemplo do IRC.
Não sei se há algo a correr mal.
A própria taxação dos lucros extraordinários avançado por António Costa Silva e que acabou por ser afastada pelo primeiro-ministro?
Não vou comentar as dinâmicas internas do Governo. No caso do sistema fiscal, e especificamente na questão do IRC há um programa de Governo, prévio há ainda um programa eleitoral, e devemos cumpri-lo.
O ministro não cumpriu o que estava no programa?
Essa medida não está neste momento em cima da mesa. O ministro fez uma observação sobre isso.
O PS passou boa parte da campanha a atacar a proposta de Rui Rio para uma descida generalizada do IRC nas empresas, não está no programa do PS que queria uma descida apenas para situações concretas. O ministro da Economia não leu o programa?
Certamente leu ambos, acho que isso não está em causa.
Mas concorda com esta necessidade de baixar agora impostos para as empresas ou não?
Com uma baixa transversal do IRC não estou de acordo. Parece-me que existem outras medidas. E nem isso beneficia as empresas, se formos ver aquilo que são as reivindicações dos empresários não está propriamente uma redução global do IRC, até porque ela atingirá uma fatia muito residual de empresas.
Bom, a CIP recorrentemente exige isso.
Mas se formos falar com alguns empresário no terreno, percebemos… e nem é preciso ir aí. Se virmos a escala de redução que seria aplicada nesse cenário seria um número reduzido das empresas e não a maioria das empresas portuguesas. Creio que será abaixo de 50%. Bom, o Governo já se pronunciou sobre isso…
Parte do Governo, o ministro da Economia tem outro entendimento. Há aqui uma divergência e isso é preocupante?
Não vejo nenhum divergência. Vejo a expressão de uma opinião por parte do ministro.
Que é um ministro e faz parte de um órgão colegial, o Conselho de Ministros…
Exatamente, e o que temos em cima da mesa é a preparação do Orçamento do Estado para o próximo ano, no qual participará e está a participar o ministro da Economia. Não vou comentar essa matéria, não faço parte do Governo nem me sento no Conselho de Ministros.
O líder comunista disse numa entrevista ao Público e à Renascença que o Governo pode não chegar até ao fim e que o PS tem tendência para “implosões”. Acredita que o Governo vai levar o mandato até ao fim?
Acredito firmemente que o Governo vai levar o mandato até ao fim. Implosões não é tanto no PS, mas noutras zonas do mundo e neste momento o que temos é um Governo comprometido com o que está a fazer. Vivemos num cenário muito complicado, com as consequências da guerra, com o aumento da inflação e dos juros e o Governo está firme e solidário a cumprir aquilo para que foi eleito.
É conhecido como alguém da ala esquerda do PS. Lamenta que não haja uma solução como a geringonça?
Isso das alas seria toda uma outra conversa sobre o partido socialista. Essa é uma matéria que foi decidida pelo povo português no dia das eleições e é isso que representa a maioria que o PS tem na Assembleia da República.
Não é só esquerdista, também é pedronunista. O episódio do aeroporto retirou-lhe a hipótese de ser o sucessor de António Costa?
Não, eu vejo com muita atenção as reflexões e até alguns guiões e novelas sobre essa matéria das sucessões no PS. O partido tem uma liderança estável, lidera o Governo há sete anos e nãos e coloca no horizonte mais próximo — espero eu — qualquer tipo de questão relativa a essa matéria de sucessões e disputas no PS. Isso não está em cima da mesa, não é matéria que preocupe os socialistas. É algo que ainda está muito longínquo.
Nesse cenário de sucessão, Pedro Nuno é a figura do PS mais bem preparada para o ser?
É extemporâneo e não está em cima da mesa.
Ainda ontem o vice-presidente do Chega foi chumbado pela terceira vez no Parlamento. Não estão constantemente a dar destaque ao Chega, permitindo que ganhe protagonismo cíclico nos plenários?
Não, o Chega tem direito a apresentar um candidato a vice-presidente e os deputados são livre de chumbar esse candidato, como foi o meu caso, naturalmente. Na maior parte dos países europeus onde estão representados partidos da família política do Chega existe esta preocupação dos partidos não extremistas ou do arco democrático, se lhes podemos chamar assim, em isolarem esses partidos. Acontece na Alemanha, França, acontecia em Espanha, mas tem acontecido assim também em Portugal. É entendimento da esmagadora maioria dos deputados, como se viu nessa votação, que o Chega não deve ter essa representação ou estaria a ter um processo de normalização ou de institucionalização na Assembleia da República.
Falando de outras eleições, as Presidenciais. O PS está fora de Belém já há muitos anos e se não vencer em 2026 arrisca ficar afastado da Presidência 30 anos. É importante que tenha uma candidatura forte? E que a comece a preparar quando?
É importante que tenha uma candidatura forte e é importante que a comece a preparar assim que os órgãos do partido considerem que é adequado prepará-la.
Mas já estão a preparar, ao colocar por exemplo Augusto Santos Silva já como uma hipótese? E concorda com esta ideia de que é um candidato à altura?
Acho interessante que o PS tenha mais personalidades do que menos personalidades que possam apresentar-se nessa disputa e as eleições presidenciais não são, por natureza, eleições partidárias. Portanto, depende muito da disponibilidade de uma personalidade que depois é apoiada pelos partidos. Augusto Santos Silva, que conheço bem no Porto e quem tenho acompanhado e travado vários combates, reúne condições e qualidades que lhe permitiram desde logo ser eleito presidente da Assembleia da República e alguém que tem uma vastíssima carreira política, é um estadista e, portanto, é normal que o nome seja referenciado. Não tenho dúvidas de que existirão outros e o PS terá tempo para fazer esse debate e encontrar as suas opções.
É vereador no Porto. O presidente da câmara do Porto, que está consigo no conselho superior do FCP, chamou perfeito imbecil a um jornalista por ter feito uma pergunta ao jogador Taremi num jogo anterior. Revê-se nesta crítica ou considera as declarações infelizes?
Quem representa ou está num cargo público deve ter alguma moderação na forma como se exprime. Todos já tivemos os nossos momentos e quem está na vida pública de forma tão reiterada e ao longo de algum tempo é quase inevitável que incorra nesses momentos. Nesse caso, foi num perfil privado [do Facebook] e sou amigo dele, vi essa publicação e acho que não terá sido um bom momento.
Ainda alimenta a esperança de ser sucessor de Rui Moreira?
Não, nunca tive obsessões ou ambições dessa natureza. Acho que na vida pública devemos ir fazendo o nosso percurso e muitas vezes somos colocados perante problemas e adversidades a que temos de dar resposta como foi a eleição autárquica de 2021.
Teve um resultado abaixo de Manuel Pizarro, quatro anos antes. Agora com Pizarro ministro, acha que ganha destaque e se posiciona para poder suceder a Rui Moreira?
Espero que o Manuel Pizarro tenha o maior sucesso nas novas funções, é alguém de quem sou bastante amigo. E relativamente às autárquicas, a resposta é muito semelhante à das Presidenciais: ainda estão muito longe.
Vamos aos desafios, no Carne ou Peixe, em que tem de escolher uma de duas opções:
Que levava para ver consigo um jogo do Porto no camarote presidencial do Dragão: Augusto Santos Silva ou Carlos César?
No camarote presidencial tem de ser convidado pelo presidente Pinto da Costa, eu não posso convidar nenhum dos dois, sendo amigo de ambos.
Quem convidava para jantar no restaurante Barril, nas Antas: Manuel Pizarro ou Ana Mendes Godinho?
Se calhar convidada Ana Mendes Godinho porque o Pizarro está frequentemente lá e creio que Ana Mendes Godinho ainda não conhece esse local.
Se tivesse que escolher um Presidente que melhor o representasse: Jorge Nuno Pinto da Costa ou Marcelo Rebelo de Sousa?
Jorge Nuno Pinto da Costa, sem dúvida.
Preferia ser ministro num Governo de Pedro Nuno Santos ou num Governo de António Costa?
Sinto-me muito bem como deputado na Assembleia da República.