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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Um ano depois concurso do SIRESP avança. O que está em causa?

Já foi gerido em parceria público-privado, mas agora está nas mãos do Estado. E assim ficará. Mas terá de ser lançado concurso para a operação. E será a um preço muito inferior ao anterior.

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O Governo anunciou esta segunda-feira, 20 de junho, o lançamento do concurso internacional para a operação da rede SIRESP (Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal), que é o sistema de emergência. Esta rede vai custar, ao longo de cinco anos, 150 milhões de euros, segundo quantificou José Luís Carneiro, ministro da Administração Interna (MAI).

O que é o SIRESP e porque é importante?

O SIRESP é a rede de emergência do Estado. Visa ser uma rede própria para as entidades com função de emergência e de segurança. Os principais utilizadores são, assim, a Polícia de Segurança Pública (PSP); Guarda Nacional Republicana (GNR); Polícia Judiciária (PJ); Serviços de Estrangeiros e Fronteiras (SEF); Serviço Nacional de Bombeiro; Proteção Civil; Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM). Segundo os dados mais recentes — incluídos no relatório referente a 2021 — há 140 entidades a usarem este sistema, com cerca de 50 mil utilizadores. Também aqui se incluem, atualmente, câmaras municipais, Serviços de Informações da República Portuguesa, Inspeção Geral das Atividades Económicas, Cruz Vermelha Portuguesa, portos, entre outros. A cobertura é nacional, incluindo ilhas. É esta rede que permite que todas estas entidades tenham acesso a uma rede própria, mas que também podem definir grupos de conversação em que a rede é utilizada como rede privativa, independente das outras. No entanto, em caso de necessidade, as entidades que a utilizam podem coordenar-se dentro desta rede.

Que concurso vai ser lançado?

Será um concurso público internacional dividido em sete lotes e que tem um valor global de 75 milhões de euros. Questionado pelo Observador, o Ministério da Administração Interna não revelou o gasto por cada um dos lotes.

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Concurso para SIRESP tem valor de 75 milhões de euros. Custo total de cinco anos será de 150 milhões

Assim o concurso terá os tais sete lotes: manutenção Tetra (sistema de comunicações utilizado); transmissão IP e circuitos terrestres; redundância satélite; gestão de sites; sistema de informação; geradores de emergência; e cibersegurança.

O que preveem os sete lotes

Está assegurado o upgrade tecnológico?

Uma das dúvidas que estava em cima da mesa era a tecnologia que o concurso público internacional iria pedir para assegurar as comunicações móveis. A anterior gestão do SIRESP — liderada por Sandra Perdigão, que chegou a ser quadro da Altice e que saiu, não se renovando o mandato que terminou em 2021, no pouco tempo em que Francisca Van Dunem assumiu a pasta da Administração Interna (Expresso e DN chegaram a noticiar que tinha sido exonerada por alegado conflito de interesses, mas em comunicado o MAI disse que a eleição e Paulo Viegas Nunes tinha ocorrido na sequência do fim do mandato da anterior presidente, acabando não confirmar a tese da exoneração) — tinha assumido no Relatório e Contas de 2021 que o melhor era a tecnologia transitar para uma rede 4G/5G. Escrevia esta responsável: “Para dar resposta a esta utilização, as redes críticas têm que evoluir para 3GPP LTE (Long Term Evolution) 4G e 5G, sistemas de banda larga que apresentam capacidade, velocidade e priorização do tráfego de dados ajustadas às atuais necessidades.” Mas isso não vai acontecer.

O sistema vai continuar assente na tecnologia Tetra, já que assegura maiores garantias na comunicação de voz. Ainda assim, pode ser complementado com outras tecnologias.

Na conferência de imprensa realizada esta segunda-feira, o atual presidente da SIRESP, Paulo Viegas Nunes, diz que o salto tecnológico vai ser dado através da componente de transmissão ou transporte (através da tecnologia IP). “E, desde logo, este concurso vai provocar um salto tecnológico a esse nível, transformando a transmissão por E1 em transmissão via IP, o que gera condições de integração de qualquer evolução tecnológica que a seguir venha a acontecer nas componentes arborescentes da rede, ou seja, na componente de rádio”. E, por isso, concluiu: a tecnologia 5G e LTE “não tem nível de maturidade suficientemente elevado para ser estruturada e integrada para ser integrada numa rede de emergência como o Siresp”, explicou.

O ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, fala aos jornalistas após a sessão de abertura do congresso do Sindicato da Carreira de Investigação e Fiscalização do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras subordinado ao tema “O SEF em tempos de guerra na Europa”, no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) da Universidade de Lisboa, em Lisboa, 6 de junho de 2022. MÁRIO CRUZ/LUSA

José Luís Carneiro, ministro da Administração Interna, anunciou esta segunda-feira o concurso público internacional para o SIRESP

MÁRIO CRUZ/LUSA

Além do valor do concurso, há mais dinheiro para o SIRESP?

Sim. Segundo explicou o Governo na conferência de imprensa desta segunda-feira, o concurso público é para a garantia dos serviços dos sete lotes por cinco anos. Mas aos 75 milhões de euros vai acrescer um investimento de 36,5 milhões de euros e que será financiado pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). E, ainda, mais 38,5 milhões de euros para funcionamento “e permanente atualização” do sistema. Ou seja, em cinco anos o total será de 150 milhões de euros, 30 milhões por ano.

Quando fica concluído o concurso?

A prorrogação do atual contrato de fornecimento está em vigor até dezembro de 2022, e o Governo acredita que o concurso público estará resolvido até lá. No entanto, a secretária de Estado da Administração Interna garantiu haver um plano B “que está a ser preparado não só para essa eventualidade, mas para qualquer circunstância que possa pôr em causa o sistema em si ou que afete a rede de comunicações”.

O concurso público terá um período de pré-qualificação durante 35 dias. No primeiro concurso público, no Governo de Durão Barroso, o período para a entrega das propostas acabou prolongado precisamente porque aconteceu durante o verão. Agora, estes prazos caem já no verão.

Os prazos previstos

Isabel Oneto disse ainda, no entanto, esperar que se cumpra nos prazos previstos.

Paulo Moniz, deputado social-democrata, especializado em comunicações, admitiu à Rádio Observador que haverá o risco de em dezembro de 2021 não haverá concurso concluído.

SIRESP: “Probabilidade de correr mal é elevada”

O que acontece com a rede durante o verão deste ano?

Patrícia Gaspar, secretária de Estado da Proteção Civil, garantiu, na conferência, que se trata de um processo de transformação complexo, com a prevenção a ter papel relevante. “Estamos hoje muito melhor do que estávamos para responder a situações semelhantes àquelas que vivemos no passado”, realçou, admitindo que não há, no entanto, risco zero.

Porque é tão polémica a rede SIRESP?

Começou por ser um concurso polémico e em muitas situações de emergência — como os incêndios de 2017 — falhou. Foi aliás, na sequência desses incêndios que Constança Urbano de Sousa se demitiu, abrindo a porta para a entrada na pasta de Eduardo Cabrita.

Mas a falha nos grandes incêndios de 2017 não foi caso único, havendo registo de situações anteriores em que o sistema de emergência não respondeu às necessidades das equipas no terreno.

Constança Urbano de Sousa. “A professora” dos polícias que acabou cercada pelo fogo

O que aconteceu no primeiro concurso?

A génese do SIRESP remonta aos governos de António Guterres, quando foi pedido um estudo sobre uma rede de emergência — e que concluiu que um sistema destes custaria qualquer coisa como 100 milhões de euros. Mas foi só no governo que lhe sucedeu, o de Durão Barroso, que foi endereçado o convite a cinco entidades — OTE, Motorola, Siemens, Nokia e EADS — para fazerem propostas. Surgiu a da Motorola que foi alvo de negociações que acabaram por ser herdadas pelo Executivo de Santana Lopes. E aqui começa uma das grandes polémicas deste caso. Já com o Governo de Santana Lopes em fim de vida — já tinham até decorrido as eleições subsequentes à queda deste governo –, o contrato é adjudicado a um consórcio que integrava SLN, PT, Esegur, Motorola, Datacomp. E é assinado por Daniel Sanches, então ministro da Administração Interna, que tinha estado na SLN. O contrato de 538 milhões de euros tinha data de 25 de fevereiro de 2005; José Sócrates tomou posse a 12 de março.

António Costa assumia, nesse Executivo, a pasta da Administração Interna e, depois de pareceres da Procuradoria Geral da República, anulou a adjudicação, para voltar à mesa das negociações com o mesmo consórcio, tendo resultado novo acordo por 485,5 milhões.

O primeiro-ministro, António Costa, participa no programa “O Princípio da Incerteza” - CNN Portugal Summit, que decorreu em Lisboa, 20 de junho de 2022. ANTÓNIO COTRIM/LUSA

António Costa, quando foi ministro da Administração Interna em 2005, adjudicou o SIRESP

ANTÓNIO COTRIM/LUSA

A rede ficaria nas mãos de uma PPP (parceria público-privada) em que o consórcio privado detinha a empresa SIRESP SA, a quem cabia gerir e fazer a manutenção da rede através de um contrato com o Estado. O consórcio, então, era detido pela SLN (entretanto convertida em Galilei e que entrou em insolvência) com 33%, PT (hoje Altice) com 30,55%, Datacomp (que era do grupo SLN) com 9,55%, Esegur (ligada ao Espírito Santo) com 12% e Motorola com 14,9%.

Por quanto tempo era esse contrato?

O contrato inicial vigorava por 15 anos, terminando em junho de 2021.

Se o contrato já terminou em junho do ano passado, como foi assegurada a rede SIRESP?

O Governo chegou a acordo com as empresas fornecedoras da SIRESP — Altice, Motorola — para prolongar por 18 meses o contrato de fornecimento. Isto aconteceu em abril do ano passado, depois do alerta do presidente da Altice, numa entrevista ao DN, em que alertou para o fim do contrato em junho, sem alternativa em cima da mesa então.

SIRESP pode acabar no final de junho, alerta CEO da Altice

Essa extensão dos contratos de fornecimento implicaram mais dinheiro para estas operadoras. Até 2021, segundo dados do Tribunal de Contas, o custo do SIRESP totalizou 556,3 milhões de euros. Ou seja, 37 milhões de euros por ano.

Quando o acordo para a extensão do contrato até dezembro de 2022 foi feito, o Governo anunciou ter autorizado a SIRESP “a investir 31,9 milhões de euros até ao final de 2022, para garantir o funcionamento do SIRESP durante a vigência do modelo transitório da sua gestão, operação, manutenção, modernização e ampliação”. E determinou a entrega de 11 milhões de euros a título de indemnização compensatória pelos encargos do segundo semestre de 2021. Ora, mas para 2022 o valor não estava assegurado. O Governo anunciou esta segunda-feira que vai, em breve, aprovar em Conselho de Ministros a entrega de mais 26 milhões de euros à SIRESP, assim que o Orçamento do Estado para este ano entre em vigor. Segundo tinha noticiado o Expresso, a SIRESP estava em falta este ano para com os fornecedores, num valor que até março atingia os 10,6 milhões.

O que aconteceu à PPP?

Depois dos incêndios de 2017, o Estado anunciou a sua intenção de comprar as participações dos privados na empresa SIRESP SA para avançar com novo modelo de gestão da rede. Ainda Eduardo Cabrita era ministro da Administração Interna e o Governo conseguiu chegar a acordo com os privados para que, com um gasto de 7 milhões de euros, ficassem com a totalidade da participação na empresa. Já com a intenção de lançar um concurso público para lá de junho de 2021 para a operação da rede e garantindo que a gestão seria do Estado. Foi criado um regime temporário de gestão em maio de 2021, prevendo-se no diploma que este regime transitório vigorava “até à criação, por transformação institucional, de uma entidade da administração indireta do Estado que assuma o desenvolvimento das respetivas atividades”.

Já foi constituída a entidade que integrará todas as redes do MAI?

Não. Esta segunda-feira, questionado sobre esta entidade, José Luís Carneiro explicou que “é um processo que exige maturação política que não é oportuna neste momento”, mas garantiu que as peças concursais e a extensão de encargos já irá prever a eventual transição de responsabilidade para instituição que venha a emergir do cumprimento dessa decisão. “Se viermos a transitar para um Instituto de Tecnologias, o concurso acautela a transição das responsabilidades que hoje são cometidas à SIRESP”.

A ideia é promover um modelo institucional de desenvolvimento da área das tecnologias, comunicações e comunicações de emergência do MAI de forma integrada, por forma a incluir a Rede Nacional de Segurança Interna, o 112.pt, a rede SIRESP e as bases de dados dos serviços e organismos da administração interna.

(notícia atualizada às 22h17 para precisar que Sandra Perdigão Neves não viu o mandato renovado)

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