Foram 13 horas de Conselho Nacional para definir três questões fundamentais: a VII Convenção da Iniciativa Liberal vai realizar-se a 21 e 22 de janeiro, em Lisboa; e as listas aos órgãos podem ser apresentadas até 6 de janeiro; e só poderão votar e participar nessa eleição quem já fosse militante até este domingo. Quanto ao mais, as diferenças programáticas dos dois candidatos conhecidos ainda não foram debatidas e a maior tensão veio mesmo de um símbolo do passado do partido.
Quinze dias separaram o anúncio de João Cotrim Figueiredo, que decidiu abandonar a liderança do partido, e o dia das decisões que o partido tinha de tomar. Quinze dias com duas candidaturas — Rui Rocha que tem o apoio de Cotrim Figueiredo e de grande parte da elite do partido e Carla Castro que tem apostado na conquista das bases — e com ameaças de que há espaço dentro do partido para que apareçam mais nomes, nomeadamente na oposição que tem sido marcada pela ala mais conservadora.
Foi perante um clima que se foi tornando mais quente nas últimas duas semanas que dezenas de conselheiros (alguns remotamente) se juntaram a uma discussão que se esperava mais ideológica do que técnica e que acabou por girar à volta de pontos do regimento para a próxima Convenção, dezenas de propostas e discussões minuciosas (até para alterações de vírgulas).
A principal proposta colocava os dois candidatos em polos opostos: Rui Rocha chegou-se à frente (ainda antes do anúncio da candidatura adversária) para propor um adiamento da reunião magna para janeiro e Carla Castro deixava claro, numa entrevista à Lusa, que não via “qualquer necessidade em adiar”.
À entrada da reunião não se atravessou tanto como chegou a fazer nessa entrevista e à saída, já depois de aprovado o adiamento, reiterou que “estava tranquila” com qualquer uma das datas. Rui Rocha foi mais longe para enaltecer aquilo que considerou uma “vitória para a IL”: “Seria um erro insistir num calendário mais restrito.”
A Iniciativa Liberal ainda não revelou as votações oficiais referentes ao Conselho Nacional, mas o Observador sabe que a votação não deixou margem para dúvidas: 45 votos a favor, oito contra e nove abstenções.
O que também viu luz verde foi o caderno eleitoral: só os membros que se filiaram até este domingo podem vir a inscrever-se para participar na VII Convenção, sendo que têm até 6 de janeiro para o fazer. No mesmo sentido, também as listas aos órgãos têm de oficializar candidaturas até esta data.
Ainda sobre as possíveis mudanças para a reunião magna, os conselheiros chumbaram uma proposta que apenas podia ter efeitos com a apresentação de mais uma lista: a existência de uma segunda volta caso não houvesse maioria absoluta numa primeira eleição. Sem o ‘sim’, a IL vai manter a “maioria simples” para a votação da moção estratégica que decidirá o novo líder liberal.
O clima de tensão teve um nome: Miguel Ferreira da Silva
A discussão foi acesa, mas vários conselheiros confirmam ao Observador que ocorreu sempre de forma tranquila e elevada, nomeadamente por parte de Carla Castro, que, à partida, poderia ter menos apoio dentro da sala do Conselho Nacional. A exceção foi Miguel Ferreira da Silva, presidente fundador da Iniciativa Liberal, e apoiante da candidatura da ex-coordenadora do gabinete de estudos, que protagonizou o momento mais quente do dia.
“Sei que não estão interessados, mas o presidente demissionário do partido tentou calar o presidente fundador do partido”, disse Miguel Ferreira da Silva à saída do Conselho Nacional, antes de abandonar o hotel onde decorreu o evento e sem deixar tempo para perguntas.
O Observador sabe que o descontentamento de Miguel Ferreira da Silva se deve a um dos maiores momentos de tensão da reunião. Em causa estavam os dias necessários para que os membros se inscrevessem e toda a logística que implica a realização da reunião magna. Havia uma proposta para 20 dias e outra para 10 e Miguel Rangel, secretário-geral — responsável por arranjar espaço para o evento — comprometeu-se com uma data intermédia: 15 dias (o que acabou por vencer até com a concordância do último proponente).
O presidente fundador do partido não terá gostado do desfecho e, segundo relatos de conselheiros ao Observador, dirigiu-se a Miguel Rangel de forma “desagradável”, o que levou a maior parte dos presentes a prosseguirem sem resposta ao fundador do partido — o que terá deixado Miguel Ferreira da Silva desconfortável, já depois de várias intervenções vocais ao longo da reunião. A proposta acabou aprovada e os membros têm de se inscrever com 15 dias de antecedência.
A corrida começa agora
Num dia que tanto Rui Rocha como Carla Castro descreveram como “feliz” para a Iniciativa Liberal, os dois candidatos voltaram a ensaiar alguns dos trunfos que vão levar para a campanha. Carla Castro fez questão de notar que se trata da “primeira vez” na história do partido em que há duas candidaturas.
Além disso, a candidata, que já tinha dito que queria uma direção pequena, este domingo concretizou-o: 15 pessoas. O objetivo, disse, é ter uma equipa com o “mínimo possível”, para que o partido seja capaz de “adotar um modelo de gestão mais participativo, mais descentralizado e colaborativo”.
“Objetivo é ter uma dimensão mais reduzida, mas trabalhar com outras estruturas do partido”, afirmou, o que remete para a ideia de que não irá apresentar listas aos restantes órgãos para “abrir o partido”.
Falou mais para dentro, para as soluções internas e para as mudanças que separam os dois candidatos, apesar de ter dito que é preciso “aproveitar a fase de debate interno para mostrar ao país o valor da IL”.
Rui Rocha focou grande parte da declaração, ainda antes das questões dos jornalistas, na resposta que o partido deve dar ao país. Aos olhos do liberal, o adiamento “é fundamental para esclarecimento dos membros e para que o país possa acompanhar a discussão sobre liderança”.
Em causa está, sublinhou, um “processo de fortalecimento da IL” para que haja “debate interno”, para que os liberais escolham uma nova liderança e porque é preciso virar o foco para o nível nacional: “Continuamos a ter um país lá fora onde a presença da IL é fundamental face à degradação do ambiente político, do contexto político, às dificuldades que os portugueses apresentam”.
“Estou muito feliz pelo resultado dessa clarificação interna que vai ser possível fazer do ponto de vista do debate de ideias, da escolha de uma nova liderança, quer das condições que daqui saem para que a IL possa crescer e a afirmar-se e fazer um combate político, às políticas socialistas que estão a condenar o país a mais anos de estagnação e dificuldade económica.”
Rui Rocha entende que, para a IL ter um “crescimento”, é preciso pessoas com “novas propostas e ideias” e uma equipa que “cubra diversas valências e que traga diversos conhecimentos e experiências”. Como tal, distancia-se da adversária no número de membros da Comissão Executiva: “A minha CE será uma maior do que esse número (15) porque considero que temos de ter as competências necessárias dentro da CE para que a IL possa crescer e afirmar-se no panorama político português.”
Agora que o calendário interno está fechado, Rui Rocha e Carla Castro vão começar a medir forças e a tentar mostrar verdadeiramente o que os distingue. A corrida já começou.
Nota: O Observador recebeu um Direito de Resposta a este artigo.