Rebentos, micro ervas, plantas, vegetais e frutas da época dominam cada vez mais as bancadas das cozinhas dos restaurantes portugueses. Além de uma preocupação com o meio ambiente, estes negócios acreditam que o futuro da gastronomia pode mesmo passar pela sustentabilidade e pelo desperdício zero. Sem a carne e o peixe como protagonistas do prato, nestes três restaurantes reinam confeções simples com ingredientes sazonais, empratamentos coloridos, criativos e minimalistas, e opções quentes e fritas para provar a qualquer hora do dia. Também nos copos se sente a tendência, veja-se pelos sumos naturais, os vinhos biológicos ou as cervejas e as sidras feitas de forma completamente artesanal.
Tia Tia
Rua do Almada, 501 (Porto). Tel.: 96 786 6236. Terça a quinta, das 9h às 16h; sexta e sábado, das 19h30 às 23h
Depois de albergar os restaurantes Mondo Deli e Esporão, o número 501 da rua do Almada, uma das principais artérias da baixa do Porto, recebeu no final do ano passado um conceito diferente. A culpa é do chef Tiago Feio, arquiteto de formação que se apaixonou pela cozinha, foi subchefe de Miguel Castro e Silva e até teve o seu próprio restaurante na Mouraria, o Leopold, mas depois de oito anos a trabalhar na capital decidiu regressar à Invicta e abrir um negócio próprio que “pudesse contribuir para a transformação da cidade”.
Tiago Feio juntou-se a Cátia Roldão, artista plástica que trabalhou vários anos na hotelaria e na restauração em São Paulo, no Algarve e no Porto, e ambos inauguraram o Tia Tia em novembro passado, depois de uma pequena experiência em formato take away durante o confinamento. O conceito reúne ingredientes sazonais e locais, vinhos naturais, biodinâmicos e biológicos, música e arte num único espaço, onde a carne não é usada e o foco está numa confeção simples de pratos preparados na hora e apresentados de forma criativa e minimalista.
Durante a semana, o menu varia diariamente e baseia-se em opções para o pequeno almoço e almoço. Granolas com doce de marmelo ou doce de tangerina, pão ázimo, banana bread, ovos com tomate e chilli, bolo de azeite, caldo de cogumelos, cenoura, espinafres e miso ou uma salada de inverno com couve roxa, abóbora e requeijão, regados com vinagre de cidra são apenas alguns exemplos de uma oferta que se quer “descontraída e reconfortante”.
Ao jantar o conceito aprimora-se e torna-se mais criativo, sofisticado e contemporâneo, a “carte blanche” inclui seis momentos com harmonização vínica, a um preço fixo de 36€/pessoa. Tangerinas, cenouras e acelgas, corvina, alface e amêndoas ou robalo, cogumelos e romã são algumas combinações da época disponíveis que podem e devem ser acompanhadas por vinhos naturais de pequenos produtos nacionais, sumos, sidras ou cervejas artesanais.
O espaço tem capacidade para 35 pessoas, está divido entre as duas zonas interiores e o jardim nas traseiras, a cozinha está visível a olho nu e na sala saltam à vista a mesa comunitária e uma estante repleta de vinis. “A coleção foi emprestada pela minha mãe numa tentativa d quebrar a música ambiente de elevador. A ideia é que o próprio cliente escolha um e o ponha a tocar, ressuscitando todo o ritual à volta do vinil”, explica Tiago Feio ao Observador.
A decoração do Tia Tia é ainda marcada pelas madeiras claras, a loiça rústica, os vasos com plantas e a arte exposta nas paredes. Na primavera a intenção do restaurante é lançar uma coleção apresentada por artistas locais, eventos pop-up planeados com cozinheiros convidados e produtores de vinho para degustações e pairings.
Seiva
Rua Sarmento Pimentel, 63 (Leça da Palmeira). Tel.: 91 054 6756. Terça a sábado, das 12h às 15h; das 19h às 22h; Domingo, das 12h às 15h
David Jesus é natural de Setúbal e o sotaque não o deixa mentir, cresceu a ver os avós a cultivar na terra e foi nessa ligação à natureza que descobriu que é mais feliz. Estudou produção alimentar em restauração em Cascais e, já com a ideia de um dia ser cozinheiro, passou por restaurantes como o Fortaleza do Guincho e o Feitoria, em Lisboa, e, mais tarde, o Quique da Costa ou o Diverxo, em Espanha.
Em 2019 regressou a Portugal à procura de novos desafios, que lhes permitissem abrandar o ritmo e equilibrar a profissão com a vida pessoal, e encontrou no Porto um terreno fértil. “Não tinha qualquer ligação à cidade, acho que nunca tinha vindo cá, mas apaixonei-me completamente”, recorda ao Observador. Depois de colaborar com o império gastronómico de Sérgio Cambas – responsável por restaurantes badalados da cidade como O Paparico ou a Cervejaria Brasão – o chef sentiu que, apesar da incerteza e das consequências da pandemia, estava na altura certa de abrir portas a um projeto próprio.
O Seiva nasceu a um passo do mar, em Leça da Palmeira, e expressa as suas origens à mesa, “num capricho à saudade”, com uma oferta plant based, recheada de micro ervas e rebentos, e que varia consoante a estação. Nas entradas, indicadas para comer à mão e partilhar, reinam os churros de batata com molho de tomate assado e gema de ovo, o pastel de massa tenra recheado com estufado de legumes e agridoce de marmelo ou um niguiri de abóbora com caril vermelho.
Nos pratos principais, David Jesus destaca a paella da Ria, feita com arroz de Alcácer do Sal, salicornia e spirulina, a lasanha tailandesa, com tofu estufado, especiais, coco, caril e molho de tomate assado, o pica pau de seitan ou o trigo sarraceno com favas e caldo verde. Para fechar a refeição em bom conte com uma rabanada de amêndoa, creme de leite e tamarino, um folhado de compota de maçã com raiz de aipo e sésamo ou uma panna cotta de abóbora, amendoim e limonete.
“O meu ponto de partida passa sempre pelo que encontro no mercado diariamente”, sublinha o chef, que trabalha essencialmente com ingredientes nacionais. A partir de março, o Seiva terá ainda uma carta para pequenos almoços e brunches, onde não faltarão torradas com pão de fermentação lenta, bowls de aveia, bulgur ou quinoa, chia com kefir e frutos secos, omeletes de claras, panquecas, quiches, tartes, bolos caseiros e algumas especialidades como pão naan (indiano) com pasta de tremoço, tofu, tomate, pepino e cenoura, pão a vapor barbecue (chinês) com tofu fumado, mayonese vegan e cebola frita, tapioca com azeitona, tomate, tofu e pesto, scones de aveia e alfarroba ou babka, pão brioche 100% vegetal com chocolate e manteiga de frutos secos.
O espaço luminoso, com direito a madeira rústica, plantas suspensas, cestos de mercearia recheados de frutas coloridas e azulejos, tem 40 lugares sentados, alguns uma vista privilegiada para a cozinha, local onde não há qualquer desperdício. “Já pedimos à Câmara Municipal de Matosinhos um horto para podemos instalar um centro de compostagem e atribuir os compostos orgânicos à produção de alguns dos nossos agricultores e fornecedores”, explica o chef, que, além de partilhar as receitas dos pratos do Seiva nas redes sociais, também organiza workshops mensais no restaurante.
Ginger
Rua Roberto Ivens, 989 (Matosinhos). Tel.: 22 938 3678. Segunda a sábado, das12h às 23h; domingo, das 12h às 16h
Tornar a comida vegana mais apelativa e suculenta é a premissa principal deste novo restaurante em Matosinhos, aberto desde o mês passado. Cátia Silva, uma das responsáveis, trabalhou vários anos no vegetariano Da Terra, conhecido pelos seus buffets. “Pensei que este tipo de gastronomia merecia mais formalidade e empratamentos vistosos, afinal os olhos também comem. As pessoas têm a ideia de que a comida vegana se resume a verdes e saladas, aqui queremos mostrar que há muito além disso”, começa por dizer ao Observador.
Numa zona junto ao mar onde não faltam negócios ligados ao peixe e ao marisco, o Ginger quer marcar a diferença e ainda está a afinar detalhes. A carta está disponível tanto ao almoço como ao jantar e promete incluir novidades com alguma frequência, mas tudo dependerá da oferta diária das mercearias locais que funcionam como fornecedores.
Nas entradas atente aos croquetes de beringela, ao ceviche de banana com chips de batata doce, o tártaro de beterraba com abacate, as batatas bravas com maionese de lima e wasabi ou as gyozas recheada com legumes. Os principais balançam entre o tofu marinado, o cuscuz marroquino com puré de edamame, o bife de couve flor com risotto de lima e alcaparras ou os cogumelos assados com puré de grão de bico e molho miso.
Se não tiver muito tempo para se sentar à mesa, saiba que além da sopa, diferente todos os dias, existem outras opções rápidas e igualmente eficazes na hora de aconchegar o estômago. São exemplos disso o hambúrguer de feijão, quinoa e tomate, as sanduíches ou os wraps com maçã verde, abacate, queijo mozarella vegan, espinafres, curgete e maionese de sala. No universo mais guloso, conte com uma mousse de chocolate com pasta de tâmaras, um merengue de lima e um folhado de maçã com gelado de gengibre.
Madeiras irregulares, mosaicos hidráulicos, candeeiros imponentes, feitos em ráfia ou palha, paredes verdejantes e objetos de cerâmica marcam a decoração o restaurante, que agora ocupa o espaço de uma antiga mercearia. “Aqui até os guardanapos são reciclados”, frisa Cátia Silva, numa preocupação “constante” com a sustentabilidade e o meio ambiente, tanto no prato como fora dele.