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O que são os ciclos de dióxido de carbono (CO2)?

O ciclo do carbono é um processo biogeoquímico essencial que descreve a circulação do carbono entre a atmosfera, a biosfera, a hidrosfera e a litosfera. Este ciclo é fundamental para a manutenção da vida na Terra, uma vez que o carbono é um componente-chave das moléculas orgânicas, como as proteínas, os hidratos de carbono ou os ácidos nucleicos presentes em todos os organismos vivos.

O ciclo do carbono pode ser dividido em duas partes principais: o ciclo biológico e o ciclo geológico.

Ciclo Biológico

Fotossíntese: As plantas, algas e algumas bactérias capturam CO2 da atmosfera e, através da fotossíntese, convertem-no em glicose e oxigénio. Este processo é a base da cadeia alimentar.

Respiração: Todos os seres vivos, incluindo as plantas e os animais, realizam a respiração celular, onde a glicose é convertida em energia, libertando dióxido de carbono de volta para a atmosfera.

Decomposição: Quando os organismos morrem, os decompositores (bactérias e fungos) decompõem a matéria orgânica, libertando dióxido de carbono e metano para a atmosfera.

Ciclo Geológico

Sedimentação e Formação de Rochas: O carbono pode ser armazenado em rochas sedimentares, dando origem, progressivamente, num processo que demora milhões de anos, a combustíveis fósseis. Através da erosão e da atividade vulcânica, esta fonte de carbono pode ser libertada novamente para a atmosfera.

Dissolução nos oceanos: O dióxido de carbono atmosférico pode dissolver-se na água dos oceanos, onde pode ser utilizado por organismos marinhos para formar carbonatos, que eventualmente se depositam no fundo do oceano como sedimentos.

As atividades humanas, como a queima de combustíveis fósseis e a desflorestação, têm perturbado o equilíbrio natural dos ciclos do carbono, aumentando a concentração de CO2 na atmosfera e contribuindo para o aquecimento global. Por esse motivo, os sistemas de captura, utilização e armazenamento de carbono (CCUS), entre outras soluções capazes de reduzir a quantidade de CO2 emitida para a atmosfera, são tão importantes.

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O que é a CCUS e porque é tão importante?

A CCUS (Carbon Capture, Utilisation and Storage) – sigla em inglês para captura, utilização e armazenamento de carbono – é uma tecnologia inovadora que implica a captura de dióxido de carbono libertado, por exemplo, por unidades industriais ou centrais energéticas que funcionam com combustíveis fósseis ou biomassa. Se não for usado no local, o carbono pode ser capturado, comprimido e transportado, para ser utilizado em diversas aplicações ou injetado em formações geológicas profundas, como reservas esgotadas de petróleo e gás natural ou aquíferos salinos.

Esta tecnologia tem vindo a assumir grande importância, especialmente no âmbito da transição energética, pois permite reduzir as emissões de gases com efeito de estufa (GEE) em indústrias onde tal diminuição é difícil (hard-to-abate sectors, ver pergunta seguinte). O potencial desta tecnologia para atingir as metas de descarbonização é cada vez mais reconhecido por especialistas e por empresas responsáveis por grandes emissões. De acordo com o plano Net Zero by 2050 da Agência Internacional de Energia, a CCUS é a tecnologia que terá maior impacto na redução das emissões. Estima-se que será responsável por 55% das reduções até 2050.

À medida que a aplicação da tecnologia for generalizada, espera-se que os custos associados à mesma diminuam, aplicando-se aqui o conceito de escalabilidade, ou seja, quanto maior e mais ampla for a adoção desta tecnologia, mais barata será. Da mesma maneira, quanto mais a tecnologia estiver desenvolvida, avançada e se apresentar com solidez, tanto maior a sua adoção.

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O que são hard-to-abate sectors?

São os setores de atividade onde a descarbonização é mais desafiante e complexa, isto é, que enfrentam grandes desafios para reduzir as suas emissões de GEE e onde normalmente a eletrificação não é aplicável. Estes setores incluem a produção de aço e ferro, cimento, alumínio, produtos químicos, transporte rodoviário pesado, transporte marítimo e aviação.

As dificuldades para descarbonizar estes setores devem-se sobretudo a barreiras tecnológicas e económicas. Entende-se que é crucial abordar estas dificuldades, pois estes setores representam uma parte significativa das emissões globais de GEE.

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Quanto carbono é possível capturar com esta tecnologia?

Estima-se que cerca de 90% do CO2 emitido pelas diversas fontes referidas anteriormente (unidades industriais que utilizam combustíveis fósseis ou biomassa para a geração de eletricidade, entre outras) pode ser capturado através de sistemas de CCUS.

Para a captura de percentagens superiores de carbono, por exemplo, para atingir 90%, são necessários equipamentos maiores, mais etapas do processo e, maior consumo de energia por tonelada de CO2 capturada. Tudo isto faz com o processo se torne menos eficiente e economicamente inviável.

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Em que ponto estamos em termos de implantação/utilização da CCUS a nível global?

De acordo com a Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês), a utilização da tecnologia de CCUS cresceu substancialmente nos últimos anos, contando já mais de 700 projetos em vários estágios de desenvolvimento em toda a cadeia de valor da CCUS. Destes, cerca de 45 estão já em operação, nomeadamente, os que estão associados a processos industriais, transformação de combustíveis e produção de energia, sendo responsáveis pela captura de mais de 50 milhões de toneladas por ano (Mtpa) de dióxido de carbono.*

Ainda segundo a mesma fonte, em 2023, a capacidade de captura anunciada para 2030 aumentou 35%, enquanto a capacidade de armazenamento anunciada aumentou 70%. Isto eleva a quantidade total de CO2 que poderá ser capturada em 2030 para cerca de 435 Mtpa e a capacidade de armazenamento para cerca de 615 Mtpa de CO2. Isto significa que, no cenário de Zero Emissões Líquidas até 2050 (NZE – Net Zero Emissions), é expectável que cerca de mil milhões de toneladas de CO2 sejam capturadas e armazenadas, por ano, até 2030.

Por sua vez, as previsões da Wood Mackenzie, fornecedora de soluções de dados e análises para os setores de energia renovável, energia e recursos naturais, são ligeiramente diferentes, estimando que, até 2033, a capacidade de captura de dióxido de carbono aumentará mais de sete vezes, passando dos 50 Mtpa em 2023 para cerca de 370 Mtpa em 2033.

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Que países estão a destacar-se?

Segundo a IEA, os EUA e a União Europeia (UE) destacam-se na atribuição de apoio financeiro a projetos de CCUS. Os primeiros anunciaram, em 2023, um investimento de 1,7 mil milhões de dólares para projetos relacionados com a captura de carbono e 1,2 mil milhões de dólares para centros de captura direta de ar (DAC, na sigla em inglês).

A UE concedeu cerca de 1,5 mil milhões de dólares para projetos CCUS no âmbito do Fundo de Inovação, e mais de 500 milhões de dólares para projetos de transporte e armazenamento de CO2 através do programa Mecanismo Interligar a Europa (Connecting Europe Facility). De realçar ainda a Estratégia para a Gestão Industrial de Carbono, lançada pela Comissão Europeia (CE) no início de 2024, que fornece detalhes sobre como estas tecnologias poderão contribuir para reduzir as emissões em 90% até 2040 e alcançar a neutralidade climática até 2050. Em particular, esta estratégia contribui para atingir o objetivo de a UE ter capacidade instalada para armazenar 50 Mtpa de carbono até 2030 e 280 Mtpa até 2040.

Ainda na Europa, salta à vista o financiamento promovido pelos Países Baixos (7,3 mil milhões de dólares), nomeadamente, no projeto Porthos, que se espera que venha a injetar 2,5 Mtpa de CO2 em campos de gás offshore a partir de 2026, durante 15 anos. A Dinamarca destaca-se também em termos de investimento nesta tecnologia (1,2 mil milhões de dólares).

A Alemanha identifica igualmente a CCUS como determinante para cumprir os seus objetivos de neutralidade carbónica até 2045, devendo, para o efeito, alterar a legislação para permitir todas as operações relacionadas com esta tecnologia, nomeadamente, o armazenamento offshore. Países como a França e a Alemanha estão, da mesma forma, a desenvolver em paralelo as suas próprias estratégias no que diz respeito aos sistemas de CCUS.

Também o Japão está a avançar na adoção desta tecnologia, prevendo captar e armazenar cerca de 13 Mtpa de CO2 em 2030 e, ao mesmo tempo, está a estabelecer um quadro jurídico para CCUS em todo o país.

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Qual o grau de maturidade destas tecnologias?

Além do financiamento, um fator determinante para o contributo destas tecnologias é a sua maturidade. Uma das formas de avaliar esta maturidade é através da escala TRL (Technology Readiness Level) (ver infografia abaixo). O nível de TRL das tecnologias CCUS varia consoante a fase da cadeia de valor, i.e, captura, utilização ou storage, e ainda consoante o setor emissor de CO2 (cimento, aviação, etc).

Segundo a IEA, no cenário de desenvolvimento sustentável, até 2070, quase dois terços das reduções cumulativas de emissões provenientes de CCUS têm origem em tecnologias que se encontram atualmente em fase de protótipo ou demonstração. O outro terço provém de tecnologias já maduras ou em fase de adoção inicial, as quais podem ser rapidamente ampliadas, proporcionando melhorias tecnológicas crescentes e poupança de custos. Estima-se que, na década de 2030, estas tecnologias contribuam com cerca de metade da poupança cumulativa de emissões.

O custo das tecnologias de CCUS é influenciado pela necessidade de infraestruturas avançadas, requisitos energéticos e obstáculos regulamentares. Todos estes fatores precisam de ser abordados para que a tecnologia se torne economicamente mais viável em grande escala.

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Qual é o papel da CCUS na transição energética?

Os sistemas de CCUS desempenham um papel estratégico importante   na transição energética, constituindo uma opção para ajudar a mitigar os efeitos climáticos, porque:

  • Descarboniza setores difíceis, hard-to-abate, reduzindo emissões diretas como indiretas. Ou seja, é uma alternativa viável a considerar em inúmeras áreas de atividade, nomeadamente, naquelas em que a redução direta de emissões é difícil (como as relacionadas com cimento, aço ou produtos químicos – os hard-to-abate-sectors), mas podendo contribuir também para a redução indireta de emissões;

É uma fonte de carbono, que se juntarmos a hidrogénio pode dar origem a hidrocarbonetos sintéticos. No entanto, os hidrocarbonetos sintéticos podem ser sustentáveis apenas se forem produzidos com energia renovável e matérias-primas como o carbono capturado da atmosfera. No entanto, a sua sustentabilidade depende de como cada etapa do processo é realizada, e qualquer uso de fontes fósseis ou ineficiência energética implica que não seja sustentável;

  • Captura direta da atmosfera. A CCUS é um complemento a outras soluções, e que ajuda a reduzir as emissões durante a transição energética, especialmente em setores difíceis de descarbonizar.
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Há algum projeto de CCUS em Portugal?

Atualmente, o projeto PilotSTRATEGY (com apoio da CE, no âmbito do programa Horizonte 2020) está a investigar locais geológicos de armazenamento de CO2 em regiões industriais do Sul e do Leste da Europa – incluindo a Bacia Lusitaniana, que se estende pela zona Oeste de Portugal – para apoiar o desenvolvimento da CCUS em grande escala. Além de Portugal, integram o estudo países como França (Bacia de Paris) e Espanha (Bacia do Ebro), entre outros.

Antes deste, vários outros projetos de investigação sobre CCUS foram já desenvolvidos no nosso país, nomeadamente, o COMET, através do qual se procurou analisar a capacidade de armazenamento de carbono em aquíferos salinos profundos, em Portugal, resultando em estimativas efetivas da capacidade de armazenamento de até 7,6 Gt de CO2, a grande maioria (acima de 90%) em ambiente offshore.

Portugal integrou ainda o Projeto Strategy CCUS, financiado pela UE, que decorreu entre 2019 e 2022, e teve como objetivo apoiar o desenvolvimento da energia e da indústria de baixo carbono no Sul e Leste da Europa. A investigação envolveu 17 parceiros oriundos de dez países europeus, sendo que, em Portugal, o projeto estudou a captura e utilização de CO2 na Bacia Lusitaniana, tendo como parceiros nacionais a Direção-Geral de Energia e Geologia, a Universidade de Évora, a Faculdade de Ciências da Universidade Nova de Lisboa e a CIMPOR.

Em Portugal, é de referir a Net4CO2, que é a única instituição no nosso país dedicada ao CCUS, com vários projetos concretos e estrutura adequada.

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O que é necessário acontecer para aumentar a utilização da tecnologia CCUS?

Política, regulamentação e financiamento: É considerado fundamental que haja apoios governamentais – financeiros e regulatórios – para ajudar a cobrir o investimento necessário para implementar os sistemas de CCUS e mitigar o risco de investidores;

Investimento competitivo: É importante que haja identificação de locais para a instalação de sistemas de CCUS que reúnam custos competitivos no que diz respeito a energia, mão de obra e materiais;

Indústria alinhada: A existência de sinergias com unidades industriais existentes, bem como uma cadeia de abastecimento viável serão fatores que ajudarão a impulsionar o investimento em CCUS;

Incentivos em Investigação & Desenvolvimento: Sobretudo direcionados para o desenvolvimento de novas tecnologias e redução dos custos das tecnologias existentes;

Destinos de armazenamento: É necessário identificar os potenciais locais para armazenamento do CO2 capturado.