A ivermectina saltou para a ribalta no início da pandemia de Covid-19, quando passou a ser apontada por vários líderes políticos e celebridades como um possível tratamento contra o novo coronavírus. O ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro ou o apresentador Joe Rogan foram algumas das personalidades que fizeram vários apelos nesse sentido, tendo repetidamente mencionado o medicamento como a solução para o tratamento da Covid-19 (ainda que sem nunca darem provas dessa mesma eficácia). Dentro da própria comunidade científica, houve quem manifestasse divergências sobre este tema, com alguns médicos e farmacêuticos a defenderem a utilização de ivermectina para prevenir e tratar a Covid-19, e outros a argumentarem a falta de evidência científica robusta sobre este tratamento.
Ivermectina contra a Covid-19: onde está a verdade e em que é que podemos confiar?
Durante os primeiros meses de pandemia – marcados pela desinformação nas redes sociais, pela crença em teorias da conspiração e pela falta de confiança na ciência –, o consumo da ivermectina e de outros medicamentos do género, como a hidroxicloroquina, dispararam e estes medicamentos foram usados por muitos em alternativa à vacinação. Só no Brasil, a venda deste fármaco cresceu 857% no espaço de um ano, de acordo com uma pesquisa feita pelo Conselho Federal de Farmácia.
Fact Check. Toma massificada de ivermectina permite travar a pandemia?
Agora, mais de três anos depois do início da pandemia, a ivermectina volta a estar em destaque nas redes sociais. Uma publicação no Facebook alega que a “ivermectina cura a maioria das doenças”, inclusivamente a Covid-19 e o cancro. O autor acusa os meios de comunicação de esconderem informação sobre este tratamento e lembra as acusações nesse sentido feitas pelo ex-Presidente dos Estados Unidos Donald Trump — que também insistiu no tratamento com hidroxicloroquina. O autor do post dá mesmo os parabéns a Trump e reforça a ideia de que a alegada eficácia da ivermectina na cura de várias doenças está a ser encoberta e que, como consequência, a população está a ser enganada e envenenada com tratamentos alternativos. Mas será que há dados que comprovem estas alegações?
A ivermectina é um remédio antiparasitário capaz de paralisar e promover a eliminação de vários tipos de parasitas, usado principalmente contra sarna e piolhos. Ao Observador, a oncologista do Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto Cláudia Vieira refere que este “fármaco tem aprovação no tratamento de parasitoses intestinais (mais comuns nas crianças)”. Admite que o medicamento é alvo de “estudos de investigação em cancro, nomeadamente em associação aos tratamentos convencionais, para vencer a resistência do tumor aos tratamentos atuais” — por exemplo no cancro do intestino. No entanto, Cláudia Vieira sublinha que “são estudos muito iniciais” e, por isso, “nunca podem chegar a justificar a utilização do fármaco em Oncologia”.
Na resposta enviada ao Observador, a especialista do IPO do Porto reforça que os dados até agora conhecidos não permitem concluir que este fármaco é suficiente para curar o cancro, sendo apenas “mais uma arma terapêutica”, isto se “efetivamente se chegar a algum resultado positivo (inexistente até ao momento)”.
Uso de ivermectina não reduz risco de hospitalização por Covid-19
Já em relação ao novo coronavírus — e ainda que o tema tenha provocado divisão durante a pandemia —, mantém-se a evidência da ineficácia da ivermectina no tratamento da Covid-19. A Organização Mundial da Saúde desaconselhou a utilização do medicamento, recomendando que o mesmo seja usado exclusivamente nos ensaios clínicos. A mesma posição foi defendida pela Agência Europeia do Medicamento. Também a Food and Drug Administration, que regula fármacos e alimentos nos Estados Unidos, alertou os americanos para não tomarem o fármaco. Em Portugal, o Infarmed pronunciou-se no mesmo sentido, referindo que “não existem evidências que apoiem a utilização deste medicamento na profilaxia e tratamento da Covid-19”.
Fact Check. Toma massificada de ivermectina permite travar a pandemia?
Deste então, não foram conhecidos novos dados que permitam tirar uma conclusão alternativa. Aliás, um estudo divulgado no ano passado pelo The New England Journal of Medicine concluiu mesmo que o medicamento antiparasita não apresentou resultados na redução do risco de hospitalização. O estudo comparou mais de 1.300 pessoas infetadas com o coronavírus SARS-CoV-2 no Brasil que receberam ivermectina ou um placebo, acabando por descartar o uso do medicamento como um tratamento contra a Covid-19.
Conclusão
Não há evidências científicas de que o medicamento antiparasita ivermectina seja eficaz no tratamento da generalidade das doenças, particularmente cancro e Covid-19. Em relação ao tratamento do cancro, os estudos realizados até agora são ainda muito iniciais e, por isso, insuficientes para sustentar o uso deste fármaco. No que diz respeito à Covid-19, o tema causou divisão durante a pandemia, mas a posição das organizações médicas continua a ser de desaconselhamento da utilização da ivermectina no tratamento da SARS-CoV-2.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:
FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.