Um post publicado no Facebook, que tem sido replicado por vários utilizadores, diz que o antigo professor da Universidade de Harvard Charles Lieber foi preso por ter vendido o novo coronavírus à China. Esta informação, que já foi partilhada centenas de vezes na sua versão em português e que já circula em várias línguas, é falsa.

Imagem da publicação que tem circulado com a informação falsa

Antes de demonstrar o que é falso naquele post, vale a pena dizer o que verdadeiramente aconteceu e que foi noticiado em janeiro: Charles Lieber, que até então era o diretor do Departamento de Biologia Química da Universidade de Harvard, foi detido por alegadamente ter mentido num depoimento feito ao Departamento de Justiça. O processo dizia respeito a um possível envolvimento em diferentes iniciativas académicas financiadas pelo regime chinês.

Nesses depoimentos, que a justiça norte-americana crê serem falsos, Charles Lieber terá mentido sobre ter participado num programa da Universidade Tecnológica de Wuhan (que tinha o objetivo de atrair cientistas de todo o mundo) e também sobre ter recebido, alegadamente, 1,5 milhões de dólares (1,39 milhões de euros) para montar um laboratório naquela universidade, além de um salário mensal de 50 mil dólares (46.290 euros).

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O crime de que Charles Lieber é acusado não tem relação direta com a alegada ligação à Universidade Tecnológica de Wuhan, mas sim com o depoimento que prestou ao Departamento de Justiça, quando este investigava casos de roubo de propriedade intelectual e de espionagem industrial por parte da China. Como tal, Charles Lieber foi acusado de “falso testemunho” e detido a 28 de janeiro, tendo sido suspenso das suas funções na Universidade de Harvard. Dois dias depois, saiu sob pagamento de uma fiança no valor de 1 milhão de dólares (930 mil euros).

Assim sendo, o que é que Charles Lieber tem a ver com o novo coronavírus? A resposta é simples: nada. O post que aqui desmentimos tenta, ainda assim, passar essa ideia de duas maneiras.

Primeiro, pega no facto de haver suspeitas de que Charles Lieber tem ligações a uma universidade em Wuhan (a cidade chinesa onde se registou o primeiro surto de Covid-19) e aproveita-se dessa coincidência para extrapolá-la. Quando, em nenhum momento do processo que envolve o depoimento que fez ao Departamento de Justiça, é referida qualquer ligação à nova estirpe de coronavírus. A suspeita é a de que o professor tenha mentido sobre ter participado num programa da Universidade Tecnológica de Wuhan.

Segundo, o post é acompanhado por um excerto de um telejornal da televisão WCVB, que é uma filial da ABC News, que noticia a detenção de Charles Lieber. Porém, bastaria ouvir com atenção aquilo que é dito naquela peça jornalística para entender que não há qualquer relação entre Charles Lieber e o novo coronavírus. Talvez por isso, o vídeo não é legendado — dando, junto de quem chegar àquele post sem saber falar inglês, uma ideia de legitimidade da informação falsa veiculada naquele artigo. O que a peça em questão revela é a detenção por falso testemunho

Conclusão

É falso que Charles Lieber tenha sido “preso” por “vender” o novo coronavírus à China. Na verdade, Chares Lieber foi detido — e não preso — por suspeitas de ter mentido ao Departamento de Justiça num depoimento a propósito da investigação de roubo de propriedade intelectual e de espionagem industrial por parte da China nos EUA — e que, importa sublinhá-lo, nada tem a ver com o novo coronavírus e a doença ele provoca, a Covid-19.

Assim, segundo a classificação do Observador, este conteúdo é:

Errado

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

Nota 2: O Observador faz parte da Aliança CoronaVirusFacts / DatosCoronaVirus, um grupo que junta mais de 100 fact-checkers que combatem a desinformação relacionada com a pandemia da COVID-19. Leia mais sobre esta aliança aqui.

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